III- Conjunto de Poder
10. Independência e autoconfiança
2.4 Empreendedorismo Social
Diante do colar - belo como um sonho - admirei, sobretudo, o fio que unia as pedras e se imolava anônimo para que todos fossem um...” D. Helder Câmara
2.4.1 Dimensão social do empreendedorismo
Peter Drucker ressalta, no seu livro “Inovação e Espírito Empreendedor”, dois pontos importantes na discussão sobre o empreendedorismo: primeiro, iniciar um negócio não é necessário ou suficiente para o empreendedorismo; segundo, o empreendedorismo nem sempre requer finalidade de lucro (DRUCKER, 1987). Dessa forma, “ao longo das últimas décadas, as denominadas organizações sem fins lucrativos recorrentemente têm se utilizado das ferramentas gerenciais associadas à escola do empreendedorismo, o que possibilitou a emergência de uma nova conceituação nesta área de conhecimento: o empreendedorismo social”. (SILVA, 2003)
Os empreendedores sociais são diferentes dos empreendedores que definimos anteriormente: “Empreendedores tradicionais correm riscos em benefício próprio ou da organização, a característica chave dos empreendedores sociais é
que eles correm riscos em benefício das pessoas a quem a sua organização serve”. (BRINCKERHOFF, 2000, p.1)
Para Vieira e Gauthier (2000), “Os empreendedores sociais são aqueles que criam valores sociais através da inovação e da força de recursos financeiros, independente da sua origem, visando o desenvolvimento social, econômico e comunitário (...) têm a visão, a criatividade, e a determinação para redefinirem os seus campos (...) são os pioneiros na inovação de soluções para os problemas sociais e não podem descansar até mudarem todo o modelo existente da sociedade”.
Segundo Drayton (2003), o trabalho do empreendedor social é ver onde a sociedade está estagnada e encontrar uma nova maneira de resolver o problema. Em 1981, na Índia, ele fundou a Ashoka com o objetivo de desenvolver a profissão de empreendedor social. Hoje a Ashoka é uma associação internacional que, através de apoio financeiro, permite que o beneficiado (chamado Fellow) se dedique integralmente ao desenvolvimento de seu projeto. Atualmente, ela promove ações em 42 países, inclusive no Brasil. O processo de seleção é igual em todos os países e é baseado em cinco critérios (DRAYTON, 2003): (1) idéia inovadora para gerar mudança social, (2) criatividade na solução de problemas, (3) perfil empreendedor, (4) impacto social e (5) qualidade ética.
Dees (1998; 2000) coloca o empreendedor social como o responsável pela mudança no setor social por adaptação de uma missão que sustenta o valor social (não apenas valor privado). Portanto, o empreendedor social tem o papel de agente de mudança no setor social, por:
a) Adotar a missão de gerar e manter valor social (não apenas valor privado);
b) Reconhecer e buscar implacavelmente novas oportunidades para servir a tal missão;
c) Engajar-se num processo de inovação, adaptação e aprendizado contínuo; d) Agir arrojadamente sem se limitar pelos recursos disponíveis;
e) Exibir um elevado senso de transparência para com seus parceiros e público e pelos resultados gerados.
O Quadro 6 compara algumas características do empreendedorismo privado (tradicional) e do empreendedorismo social, onde percebemos a passagem do
individual para o coletivo e do lucro financeiro para a resolução de problemas sociais.
Quadro 6: Comparação entre empreendedorismo privado e social
Empreendedorismo Privado Empreendedorismo Social
É individual É coletivo
Produz bens e serviços para o mercado Produz bens e serviços para a comunidade
Foco no mercado Foco na busca de soluções para os
problemas sociais
Sua medida de desempenho é o lucro Sua medida de desempenho é o impacto social
Visa satisfazer as necessidades dos clientes e ampliar as potencialidades do negócio
Visa resgatar pessoas da situação de risco social e promovê-las
Fonte: Melo Neto e Froes (2002, p.11)
Melo Neto e Froes (2002, p.34), analisando o perfil do empreendedor social, afirmam que “não é qualquer um que pode ser um empreendedor social. O empreendedorismo social é um misto de ciência e arte, racionalidade e intuição, idéia e visão, sensibilidade social e pragmatismo responsável, utopia e realidade, força inovadora e praticidade”.
Portanto, as características apresentadas por estes indivíduos denotam algumas diferenças em relação aos empreendedores tradicionais. A primeira delas, ideológica, os guia em sua missão social. O Quadro 7 apresenta as características e habilidades observadas num empreendedor social, conforme alguns pesquisadores da área.
Quadro 7: Características dos empreendedores sociais
Características/Habilidades Referência Cooperativos, visão social, habilidade de comunicação,
empáticos, criatividade na solução de problemas reais, forte fibra ética, pragmáticos,
Johnson (2000) Sinceros, paixão, clareza, confiança pessoal e
organizacional, planejamento, habilidade para improviso
Boschee (2002)
Criativos, líderes Melo Neto e Froes (2002)
Inovadores, arrojados, transparentes Dees (1998)
Fonte: Elaborado pela autora com base nos autores citados.
Atualmente, o empreendedorismo social é um fenômeno mundial, sendo o empreendedor social visto como o responsável na busca de soluções para os mais
variados problemas sociais, apresentando-se como um agente ativo e transformador dos valores da sociedade.
2.4.2 Empreendedorismo social no Brasil
O crescimento dos problemas sociais que gerou o paradigma da exclusão social de hoje no Brasil vem exigindo de todos os atores políticos e sociais uma nova atitude - uma atitude de mudança, inovadora em sua natureza e essência, voltada para o desenvolvimento sustentável das comunidades em geral, e, sobretudo, das comunidades de baixa renda (MELO NETO e FROES, 2002).
O Brasil tem o maior programa da Ashoka no mundo. Isso se justifica porque é um país com dimensões geográficas amplas e uma cultura diversa. Tem uma sociedade civil cada vez mais organizada, mais mobilizada e em ascensão. Tudo isso leva ao crescimento do empreendedorismo social e ao desenvolvimento de projetos de qualidade. No Brasil, os empreendedores sociais da Ashoka atuam basicamente em seis áreas: educação (área com maior número de projetos), meio ambiente, saúde, participação social civil, desenvolvimento econômico e direitos humanos. O trabalho de identificação e seleção de empreendedores sociais iniciou em 1986, atualmente já existem mais de 220 Fellows e a cada ano selecionam-se entre 12 e 15 novos fellows.
No empreendedorismo social, a economia está a serviço da comunidade; o foco do empreendedor social não está no registro de marcas e patentes, mas na divulgação e multiplicação de suas idéias, razão do impacto nacional de projetos tais como: soro caseiro, bolsa-escola, médicos de família, universidade solidária e tantos outros.
2.4.3 Intraempreendedorismo social
Jim Brown, discutindo problemas e soluções para o empreendedorismo social, afirma que, em vez de procurarmos empreendedores sociais para criar empreendimentos sociais completamente novos, devíamos formar
“intraempreendedores sociais”, pois estes seriam capazes de transformar as organizações. E conceitua intraempreendedor social como:
Um voluntário ou “empregado” de uma organização do setor público ou privado encarregado de criar um empreendimento social dentro da organização em que trabalha. Isto pode ocorrer transformando a organização inteira em um empreendimento social, ou apenas alguns produtos ou serviços existentes de forma a ter-se um novo empreendimento social. (BROWN, 2003)
Brown, em seu texto, lança o conceito, não o explora e nem define o campo e a forma de atuação deste intraempreendedor social. Apenas aponta a sua relevância e a necessidade de estudos mais aprofundados sobre o tema.