1.
O Decreto-Lei 115-A/ 98 - o decreto da Autonomia
O modelo organizativo das escolas introduzido pelo Decreto-Lei 115-A/ 98 de 4 de
Maio, é sobejamente conhecido. Por isso a nossa tarefa está à partida facilitada. Mas
que nos seja permitido elencar aqui algumas considerações sobre tal Decreto-Lei
destacando o que nele consideramos fundamental, salvo melhor opinião. Desse modelo
destacamos pois os seguintes aspetos:
"Aplicava-se aos estabelecimentos públicos da educação pré-escolar e dos ensinos
básico e secundário, regular e especializado, bem como aos seus agrupamentos."
(Artigo 1º)
Regulava a criação dos Conselhos Locais de Educação. (Artigo 2º) - que são estruturas
de participação dos diversos agentes e parceiros sociais, com vista à articulação da
política educativa com outras políticas sociais, nomeadamente em matéria de apoio
socioeducativo, de organização de atividades de complemento curricular, de rede,
horários e de transportes escolares"
17.
O Dec. Lei 115-A/ 98 Apostava na autonomia das escolas (Artigo 3º) definindo-a como
o poder reconhecido à escola pela administração educativa de tomar decisões nos
domínios estratégico, pedagógico, administrativo, financeiro e organizacional, no
quadro do seu projeto educativo e em função das competências e dos meios que lhe
estão consignados. Consagrava o Projeto Educativo, o Regulamento Interno e o
Plano Anual de Atividades como instrumentos fundamentais dessa autonomia.
Subordinava a gestão das escolas a princípios orientadores (Artigo 4º):
a) Democraticidade e participação de todos os intervenientes no processo educativo, de
modo adequado às características específicas dos vários níveis de educação e de ensino;
17
Compete esclarecer que os Conselhos Locais de Educação já tinham sido previstos e criados pela Comissão de Reforma do Sistema Educativo. De facto esta comissão, no que diz respeito ao Sistema Educativo, apresenta uma proposta de descentralização em diferentes níveis que inclui mesmo a criação de um órgão de coordenação de natureza local (Conselho Local de Educação) que era omisso na Lei de Bases, mas que se insere numa lógica de política de descentralização.
b) Primado de critérios de natureza pedagógica e científica sobre critérios de natureza
administrativa;
c) Representatividade dos órgãos de administração e gestão da escola, garantida pela
eleição democrática de representantes da comunidade educativa;
d) Responsabilização do Estado e dos diversos intervenientes no processo educativo;
e) Estabilidade e eficiência da gestão escolar, garantindo a existência de mecanismos de
comunicação e informação;
f) Transparência dos atos de administração e gestão.
Criava os agrupamentos de escolas (artigo 5º) entendendo-os como uma unidade
organizacional, dotada de órgãos próprios de administração e gestão, constituída por
estabelecimentos de educação pré-escolar e de um ou mais níveis e ciclos de ensino, a
partir de um projeto pedagógico comum. e atribui-a a esses agrupamentos finalidades
específicas (Artigo 5º):
a) Favorecer um percurso sequencial e articulado dos alunos abrangidos pela
escolaridade obrigatória numa dada área geográfica;
b) Superar situações de isolamento de estabelecimentos e prevenir a exclusão social;
c) Reforçar a capacidade pedagógica dos estabelecimentos que o integram e o
aproveitamento racional dos recursos;
d) Garantir a aplicação de um regime de autonomia, administração e gestão, nos termos
do presente diploma;
e) Valorizar e enquadrar experiências em curso.
- Define critérios e princípios relativos a tais agrupamentos (Artigo 6º):
a) A constituição de agrupamentos de escolas considera, entre outros, critérios relativos
à existência de projetos pedagógicos comuns, à construção de percursos escolares
integrados, à articulação curricular entre níveis e ciclos educativos, à proximidade
geográfica, à expansão da educação pré-escolar e à reorganização da rede educativa.
b). Cada um dos estabelecimentos que integra o agrupamento de escolas mantém a sua
identidade e denominação próprias, recebendo o agrupamento uma designação que o
identifique, nos termos da legislação em vigor.
c) O agrupamento de escolas integra estabelecimentos de educação e de ensino de um
mesmo concelho, salvo em casos devidamente justificados e mediante parecer favorável
das autarquias locais envolvidas.
d) No processo de constituição de um agrupamento de escolas deve garantir-se que
nenhum estabelecimento fique em condições de isolamento que dificultem uma prática
pedagógica de qualidade.
Consagrava ainda (Artigo 7º) os Órgãos da Administração e Gestão das Escolas, e
Agrupamentos: Assembleia; Conselho Executivo ou Diretor; Conselho Pedagógico;
Conselho Administrativo, que se orientam segundo os princípios que são definidos no
referido artigo 4º.
Este Decreto-Lei 115-A /98 teria as suas primeiras alterações com a Lei 24/99 de 22 de
Abril. De acordo com a publicação que já citámos - Autonomia, Administração e
Gestão das Escolas Portuguesas - 1974-1999 Continuidades e Ruturas - devemos ter em
conta o seguinte:
" Esta lei veio dar uma especial atenção às escolas do 1.º ciclo do ensino básico e aos
jardins de infância, integrando-os, numa organização coerente de autonomia,
administração e gestão, dos estabelecimentos públicos de educação, tomando em
consideração a dimensão muito variável destas escolas e salvaguardando a sua
identidade própria.
Por outro lado esta lei permite soluções organizativas adequadas às escolas de maiores
dimensões e às escolas mais pequenas e/ou isoladas e consagra, ainda, a possibilidade
de desenvolvimento de estratégias de agrupamento de escolas resultantes das
dinâmicas locais e do levantamento rigoroso das necessidades educativas,
nomeadamente através de cartas escolares concelhias. Preconiza, deste modo, a
realização de uma política coerente e eficaz de rede educativa, numa perspectiva de
territorialização das políticas educativas, numa lógica de ordenamento do território, de
descentralização e de desenvolvimento económico, social e cultural, sustentado e
equilibrado.
Esta lei favorece a dimensão local das políticas educativas e a partilha de
responsabilidades, com a conceção de uma organização da administração educativa
centrada na escola e nos respetivos territórios educativos, assente num equilíbrio entre
a identidade e a complementaridade dos projetos e na valorização dos diferentes
intervenientes no processo educativo, professores, pais, alunos, pessoal não docente e
representantes do poder local (a verdadeira comunidade educativa). Neste sentido, a
Lei n.º 159/99, de 14 de Setembro, que estabelece o quadro de transferência de
atribuições e competências para as autarquias locais, no seu Art.º 19.º (Educação) dá
um passo importante para a concretização desse objetivo. "
2.
O balanço do Decreto-Lei 115-A 98
Qualquer que seja a análise que se faça, há alguns aspetos que não podemos deixar de
considerar relativamente ao Dec. Lei 115-A 98 e às suas posteriores alterações.
Muitos estudos em matéria de administração educativa parecem considerar ser
inequívoco que este modelo de gestão representa uma rutura importante com uma
tradição secular de centralização educativa. E, por oposição à Reforma Educativa dos
anos 80, esta nova estratégia, centrada no diálogo social e na identificação dos
interlocutores teve potencialidades que permitiram centrar as organizações escolares,
num contexto de progressiva diversificação.
Como sabemos este Dec. Lei terminou a sua vigência em 2009. Restar-nos-á aguardar
que os estudos mais apurados sobre a execução e aplicação desse decreto nos possam
explicar este desejo de mudança na gestão e administração das escolas, condenando um
modelo que, quanto a nós, ainda não teria esgotado todas as suas potencialidades.
Admitimos que tal modelo fosse suscetível de ser melhorado e defendemos que essa
teria sido a melhor solução. Não há modelos perfeitos. Há modelos mais ou menos
eficientes. E por isso mesmo faz parte da natural evolução das sociedades e das
instituições a procura do aperfeiçoamento e da melhoria. A mudança é um fator
emergente em qualquer realidade social e cultural. A mudança séria exige sempre
correção, adaptação, abertura a novos desafios. Mas tem de ser sempre uma mudança
segura. Mudar por mudar, sem uma avaliação séria dos modelos vigentes, pode ser um
risco. E é isso que poderá acontecer com a entrada em vigor do Dec. Lei 75 /2008.
No documento
A Gestão Escolar do alvor da Democracia à Escola da Autonomia
(páginas 44-49)