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Parte II – Aproximação ao tema e abordagem ao caso de estudo

4. Linhas de água construídas: tipologias, ocupação do espaço e usos

4.2. Engenhos de moagem no Barrocal

Os moinhos de água no Barrocal algarvio inserem-se em tipologias fortemente influenciado por condicionalismos locais, à semelhança do que ocorre na generalidade do território português. Deste modo e antes da análise prévia dos sistemas, que assentará no trabalho de campo, será importante abordar de uma forma genérica os seus aspetos tecnológicos, tendo em conta a distribuição destas estruturas no território português. Neste contexto os trabalhos de Jorge Dias, Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano e de Benjamim Pereira, desenvolveram uma classificação das estruturas de moagem em Portugal, fundamental para a análise das estruturas identificadas.

Partindo do universo do território nacional, os engenhos hidráulicos de moagem subdividem- se em moinhos de roda horizontal e de roda vertical, com especificidades

105

- MAGALHÃES, Joaquim Romero, 1993, O Algarve Económico 1600-1773, p.12. 106

- Idem, p.12. 107

- REYS, João Vasco, 1999, O Tempo das Azenhas – Azenhas e Moinhos de Maré do Rio Arade, p.21. 108

-ANTT – PT/TT/MPRQ/14/95 – Freguesia de Estoi. 109

-ANTT – PT/MPRQ/27/14 – Freguesia de Paderne. 110

40 próprias. Segundo Ernesto Veiga de Oliveira, Fernando Galhano e Benjamim Pereira111 os engenhos hidráulicos de moagem em Portugal repartem-se em dois grandes grupos: os engenhos movidos por água doce e os engenhos movidos pelas marés.

Dentro dos engenhos movidos por água doce temos os moinhos de roda horizontal e as azenhas. Os moinhos de roda horizontal subdividem-se em moinhos de rodízio fixo ou móvel ao longo da pela, e de rodete submerso em poço ou em dornas. As azenhas podem ser de propulsão superior à frente ou atrás, ou de propulsão inferior em moinhos fixos ou em barcas. As azenhas podem ter um carácter permanente ou temporário e ter uma ou duas rodas. Por fim os moinhos de maré associados a estuários de rios com influência das marés subdividem-se em engenhos de rodízio ou de rodete.

Os moinhos mais frequentes no Barrocal associados a sistemas ou a cursos de água com caudal sazonal são os moinhos de rodízio. Estes moinhos distinguem-se pelo modo como é executada ligação entre a roda hidráulica propulsora e a pela (veio de transmissão entre a roda propulsora e o engenho). Este é o sistema mais frequente e adequado aos locais de a orografia mais acidentada, e onde o caudal da água não tem grandes variações.

O modo de funcionamento desta tipologia processava-se através da retenção da água proveniente das ribeiras num açude. A partir do açude, e de acordo com as necessidades do moleiro, a água era libertada e conduzida através de uma levada até aos canais onde se encontrava a roda horizontal propulsora, dando assim início ao processo de moagem. Dentro desta tipologia de moinhos de rodízio surge ainda uma subcategoria de moinhos que combina o açude com um reservatório localizado junto do edifício do moinho.

A época de laboração dos moinhos de água de rodízio ocorria durante o Inverno, dado o regime torrencial das ribeiras, prolongando o seu funcionamento de forma variável consoante a disponibilidade da água no açude.

As azenhas são outra tipologia de engenhos de moagem presentes no Barrocal que, na maior parte dos casos, estavam associadas aos sistemas de reaproveitamento de água de nascente. O tipo de azenhas comuns ao Barrocal são as de propulsão superior que apenas se distinguem das de propulsão inferior na forma como a água impulsiona a roda.

As azenhas de propulsão superior implantam-se em zonas declivosas aproveitando a força da água gerada pela grande diferença de cotas, promovendo o movimento da roda vertical. Este sistema permite a obtenção de uma força constante e adequada à moagem a partir da força gerada por caudais relativamente restritos.

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- OLIVEIRA, Ernesto Veiga de, GALHANO, Fernando e PEREIRA, Benjamin, 1983, Tecnologia tradicional portuguesa: sistemas de moagem.

41 No Barrocal, as azenhas integradas nos sistemas de reaproveitamento de água de nascente, laboravam de forma articulada e em simultâneo com engenhos da mesma tipologia ou com moinhos de rodízios a partir da mesma linha de água. Dentro da tipologia de reaproveitamento de água de nascente são conhecidos os sistemas de Alte, Salir e Quinta do Rosal, em Loulé, a Alface em Estoi, Faro e os moinhos da Rocha em Tavira associados à nascente do pego do Inferno. De entre estes casos identificados as azenhas surgem nos sistemas da Alface, Quinta do Rosal e Salir

O regadio, presente no Barrocal algarvio, integrava as noras, engenhos usados para elevar as águas dos poços, legados pela presença árabe. Estas estruturas surgiam sempre associadas ao regadio, através das quais se processava a elevação da água para aquedutos, levadas até aos tanques, caneiros e valas de distribuição pelas hortas e pomares. Além da nora os árabes também introduziram a picota e o açude como sistemas alternativos.

Podemos classificar as noras em três categorias segundo a tipologia do seu eixo: comprido (com três rodas para três funções diferentes); alto, e curto (com a roda de tirar água e a roda dentada combinadas numa só), estas últimas conhecidas como “noras mouriscas”. Em todas, a operação era feita com recurso a bestas muares ou a gado vacum que se deslocavam de olhos vendados à volta do engenho.

Na região do Algarve as noras são bastante frequentes, sendo comuns as noras de eixo curto baixo a Barlavento e mais raras na zona do Sotavento112. As noras de eixo curto surgem normalmente associadas a parcelas de menor dimensão, sendo que as noras de eixo comprido estão associadas a parcelas de maior dimensão e onde a água tem que ser conduzida para distâncias maiores113. À generalidade das noras também estão associadas outras estruturas hidráulicas designadamente aquedutos, levadas e tanques, que se destinam à gestão da água para rega.

4.3. Ocupação do espaço: sistemas hidráulicos dependentes dos cursos de água

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