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Ensino Médio profissionalizante: o dilema do dualismo escolar

No documento tatianaoliveiracoutosilva (páginas 52-54)

II. ANÁLISE DO CONTEXTO DIDÁTICO-PEDAGÓGICO E DO RENDIMENTO

2.1. Ensino Médio profissionalizante: o dilema do dualismo escolar

Conforme Cunha (2000), o dualismo escolar de nível médio, que faz a separação entre a escola para ricos e a escola para pobres - existente entre a educação propedêutica (formação geral para posterior especialização em determinada área do conhecimento) e a educação profissional - tem profunda relação com as transformações históricas do trabalho humano e sua representação social no país.

Cunha (2000) apresenta três especificidades da dualidade escolar brasileira, sendo o papel social de separação entre trabalho intelectual e trabalho manual produzido com o final da escravidão; o processo de industrialização do país que exigia a formação de uma grande massa populacional de força de trabalho em relação aos poucos postos de trabalho de supervisão e administração das indústrias ocupados pela burguesia e as especificidades da educação para o trabalho artesanal, agrícola, manufatureiro e industrial no país.

A dualidade da escola brasileira sempre esteve vinculada às representações sociais2 sobre o trabalho e por isso traz historicamente uma ideia ainda presente em nossa sociedade atual: de que o trabalho intelectual e a educação propedêutica pertencem aos brancos e ricos e a educação profissional e artesanal é direcionada aos afro- brasileiros e de classes sociais baixas (CUNHA, 2000).

Conforme Frigotto, Ciavatta e Ramos (2012), este dualismo escolar teve um caráter estrutural principalmente com a criação das leis orgânicas promulgadas na gestão do ministro Gustavo Capanema, na década de 40. A Lei Orgânica do Ensino Secundário de 1942 acentuava a antiga tradição do ensino secundário propedêutico, acadêmico e aristocrático.

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Conforme Sá (2000), a Teoria das Representações Sociais (TRS) surge em Paris, nos anos 70, a partir das discussões e teorias de Moscovicie Jodelet na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais e chega ao Brasil na década de 80. A TRS tem por objetivo explicar os fenómenos do homem a partir de uma perspectiva coletiva, sem perder de vista a individualidade do sujeito. A TRS, no contexto acadêmico da psicologia social e das ciências humanas, está relacionada com o estudo das simbologias sociais, ou seja, com o estudo das trocas simbólicas desenvolvidas em nossos ambientes sociais e nas nossas relações interpessoais e de como esses símbolos influenciam a construção do conhecimento cultural de um povo em determinada época.

A equivalência entre os ensinos secundário e técnico veio a ser estabelecida, primeiro, nos anos de 1950, com as Leis de Equivalência e, depois, a equivalência plena somente com a LDB de 1961, podendo os concluintes do colegial técnico se candidatar a qualquer curso de nível superior. (FRIGOTTO, CIAVATTA e RAMOS, 2012, p. 32).

Na década de 90, a criação do Decreto Lei nº 2.208/97, formalizou a separação entre o ensino propedêutico e o profissional no ensino médio, reforçando ainda mais o dualismo escolar e a exclusão social da classe trabalhadora, tornando cada vez mais distante o sonho de frequentar uma universidade, uma vez que diante da escolha, a formação profissional imediata seria mais rápida e necessária para entrar no mercado de trabalho.

Apenas em 2004 o princípio da integração do ensino médio à educação profissional, defendido desde 1930 por Anísio Teixeira, e resgatado, com a revogação do Decreto nº 2.208/97 e a criação do Decreto nº 5.154/04.

Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2012), a proposta de integração no ensino médio trazida pelo Decreto nº 5.154/04, que em 2008 foi integrada ao texto da Lei 11.741/08 que estabelece diretrizes para a organização e oferta da educação profissional, marca a história do ensino brasileiro, pois aponta uma proposta fundamentada na concepção de uma educação tecnológica e/ou politécnica para uma formação omnilateral3, “centrada no trabalho, na ciência e na cultura, numa relação imediata com a formação profissional específica que se consolida em outros níveis e modalidades de ensino” (FRIGOTTO, CIAVATTA e RAMOS, 2012, p.44).

Segundo Bremer e Kuenzer (2012), a proposta do ensino médio integrado apresentada no Decreto nº 5.154/04 e na Lei nº 11.741/08 trazem para o cenário da educação pública brasileira.

(...) os princípios fundamentados em Marx, Engels e Gramsci para a formação omnilateral dos sujeitos, através da oferta de uma formação profissional que incorpora em sua concepção o trabalho como princípio educativo, a união entre ensino, trabalho produtivo e cultura (politecnia), para que seja possível dar continuidade à identificação de estratégias de formação humana necessárias para a reapropriação do domínio teórico-prático do trabalho pelos alunos da escola pública (BREMER E KUENZER, 2012, p. 7).

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Omnilateral é um pensamento da teoria marxista que defende que o homem deve se sentir completo com seu trabalho e sua convivência na sociedade, oposta a formação unilateral das relações de trabalho alienado, da divisão social do trabalho e da divisão de classes sociais. Uma educação omnilateral prepara o indivíduo de forma completa, para a vida e para o trabalho (NEVES, 2009).

Um dos objetivos político-pedagógicos dos Institutos Federais é superar o dualismo escolar, possibilitando a todos os estudantes, principalmente aos oriundos da classe trabalhadora, uma sólida formação geral ofertada no ensino propedêutico integrada a uma formação profissional de qualidade, além de uma formação para a cidadania crítica.

Os investimentos do governo nos Institutos Federais devem ser aplicados em aquisição de recursos humanos, materiais e tecnologias que possibilitem a criação de escolas focadas na qualidade do ensino, na produção e na inovação científica e tecnológica, onde atuam professores pesquisadores portadores de excelentes qualificações profissionais.

Este padrão de escola atrai o público das classes sociais mais abastadas, pela oferta de educação pública, gratuita e de qualidade, por isso a necessidade de existirem as cotas sociais e raciais para ingresso na instituição, visando a não elitização do público atendido pelos Institutos Federais, cuja criação tem como alvo ser uma escola de qualidade de acesso para todos. Entretanto, um dos obstáculos para que os Institutos Federais cumpram sua função social de formar com qualidade, autonomia e sucesso profissional os seus alunos, é a questão da reprovação escolar, que discutiremos a seguir.

No documento tatianaoliveiracoutosilva (páginas 52-54)

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