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CAPÍTULO 4. UMA GALERIA DE ARTE NACIONAL

4.1. Um museu guardião da memória da arte brasileira

4.1.2. Entre os fundadores e os panoramas: as exposições de 1940 a 1960

É emblemático que apenas dois anos antes da realização da exposição “Pedro Américo e Victor Meirelles – Retrospectiva”, o antigo prédio da Academia Imperial de Belas Artes – projetado pelo arquiteto Grandjean de Montigny, foi destruído129. A década

de 1930 marcou a atuação intensiva do recém-criado Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, cujo interesse na salvaguarda da arte colonial chegou aos muros do MNBA.

É interessante assinalar que, dentro do processo de atuação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artísitico Nacional, criado por Rodrigo Melo Franco de Andrade, em 1936, deu-se a revalorização da arte colonial. Assim, muitas obras deste período, que estavam esquecidas nos porões da Academia, foram trazidas a luz, restauradas e integradas nas exposições do acervo (SALA, 2002, p. 27).

Assim que assumiu a direção, Oswaldo Teixeira concedeu uma entrevista ao Jornal do Brasil, em que relatou que as telas “Batalha do Avaí”, de Pedro Américo e outras obras do século XIX encontravam-se muito estragadas (O MUSEU, 1937, p. 11). Apenas décadas depois as pinturas históricas mais famosas do museu foram submetidas a uma restauração completa.

No ano de sua posse, o diretor Oswaldo Teixeira esboçou o interesse em abrir espaços para a exposição da produção de arte moderna, contudo sua gestão foi marcada pelo esforço de dar visibilidade ao acervo de obras do século XIX. Além da exposição “Pedro Américo e Victor Meirelles – Retrospectiva”, outras mostras de curta duração foram realizadas nos primeiros anos da casa: “Missão Artística Francesa de 1816” (1940), “Quadros trazidos por Le Breton” (1948), “Aspectos do Rio” (1948) e “Le Breton e a Missão Artística Francesa de 1816” (1960).

Uma dessas iniciativas foi a mostra “Aspectos do Rio” 130, que apresentava

panoramas de artistas contemporâneos em paralelo àqueles produzidos por Victor Meirelles, no final do século XIX. Nessa ocasião, foram expostos os panoramas: “Entrada da Barra do Rio de Janeiro”, “Morros do Corcovado e Tijuca, “Vista do morro de Santo

129 Na ocasião, a Escola de Belas Artes já funcionava no mesmo prédio do Museu Nacional de Belas Artes,

criado em 1937. Funcionava ali o Ministério da Fazenda. Do edifício, restou apenas o seu pórtico, que foi transferido para o Jardim Botânico, do Rio de Janeiro.

130 “De 6 a 29 de agosto de 1948 foi realizada no Museu Nacional de Belas Artes a Exposição Aspectos do

Rio. Para os trabalhos de organização dessa mostra de arte o sr. diretor do Museu Nacional de Belas Artes designou os conservadores Elza Ramos Peixoto, Regina Liberalli Laemmert e Thomaz Glicério Alves da Silva. [...] [a ideia] expor, conjuntamente com os trabalhos dos artistas contemporâneos, os Panoramas do Rio de Janeiro, de autoria de Vítor Meireles”. (PEIXOTO, 1947-1948, p. 23-24)

Antônio sobre o antigo largo do Rocio”, “Ruínas da fortaleza de Villegaignon”, “Ilha das Cobras”, “Morro do Castelo e Vista sobre a Candelária”. Essas obras estavam guardadas por falta de espaço para exposição. Com a organização da conservadora do museu – Elza Ramos Peixoto, elas voltaram ao contato do público. Em artigo publicado no Anuário do MNBA, a conservadora sublinha a importância de homenagear Victor Meirelles e enfatiza sua meticulosidade, qualidade muitas vezes louvadas em 1879.

Assim teve o público oportunidade de apreciar esses esplêndidos trabalhos do grande mestre brasileiro, guardados por falta de espaço em nossas galerias, ao mesmo tempo que se rendia um preito de justa homenagem a Vítor Meireles, que tanto amou a nossa cidade, pintando-a em seus aspectos mais pitorescos, com a minúcia, a exatidão, a honestidade, que são, aliás, o característico de toda a sua vasta obra (PEIXOTO, 1948, p. 24).

Muitos panoramas de Victor Meirelles foram destruídos, três dos mais famosos – “Panorama do Rio de Janeiro”, “Panorama da Entrada das Forças Legais” e “Descobrimento do Brasil” – foram doados pelo artista à República em 1910 e abandonados no pátio do Museu Nacional, levando à sua perda. Segundo Coelho (2007), não havia interesse em preservar essas obras em um momento de transição para um novo sistema, ocupado em afirmar os valores da República e afastar-se dos símbolos da monarquia. Embora os panoramas representassem um esforço do artista em vincular-se a técnicas modernas, incluindo o uso da fotografia, e, valorizadas nas Exposições Universais, seu nome estava estreitamente amalgamado ao Segundo Reinado, das quais suas pinturas históricas eram seus estandartes. Em 1948, o Museu Nacional de Belas Artes ocupa-se de revalidar essas obras e colocá-las em diálogo com artistas contemporâneos, com o intuito de homenagear a extensa produção artística de Victor Meirelles – principal nome do acervo do MNBA.

As demais exposições – “Missão Artística Francesa de 1816” (1940), “Quadros trazidos por Le Breton” (1948) e “Le Breton e a Missão Artística Francesa de 1816” (1960) – ocupam-se dos alicerces da construção de uma arte brasileira, que fecundou o solo para a produção artística em todo o século XIX. A primeira, associou o acervo da casa à coleção das aquarelas e desenhos de Debret, recém adquirida por Raymundo de Castro Maya. A segunda mostra, apresentou as peças trazidas por Le Breton para a fundação de uma escola de arte brasileira, que tinham por objetivo inspirar os altos valores artísticos de professores e alunos através do contato com essas peças. A última, “Le Breton e a Missão Artística Francesa de 1816”, coaduna as peças do acervo da instituição com coleções de

outras instituições e de particulares, buscando traçar um panorama mais extenso da Missão e de seu objetivo de construir um celeiro de arte em terras brasileiras, sob o comando de Le Breton.

[...] na presente exposição procuramos focalizar essas mesmas telas (prosseguindo nas pesquisas realizadas por essa nossa colega [Regina Monteiro Real]), a fim de enquadrá-las nas relações de aquisição feitas por Le Breton – complementando esse valioso material com algumas obras dos principais componentes dessa Missão, pertencentes ao patrimônio deste Museu, da Escola Nacional de Belas Artes e de alguns colecionadores particulares (MUSEU NACIONAL DE BELAS ARTES, 2016, p. 43).

A valorização da memória dos primórdios da instituição através da figura de Le Breton e de sua Missão Artística, alinhada ao regaste dos porões do museu dos panoramas de seu artista mais canônico deram visibilidade ao acervo do MNBA, majoritariamente, produzido no século XIX. Esse foi o esforço do primeiro gestor da casa por vinte e quatro anos.

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