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ENTREVISTA COM ANDRÉ RIZEK – JORNALISTA DO CANAL SPORTV E APRESENTADOR DO PROGRAMA REDAÇÃO SPORTV.

Entrevistador (E) Resposta (R)

E: A mídia tem um papel muito importante na construção da noção de torcida organizada, principalmente no jornalismo esportivo, onde a torcida é o telespectador. Você não acha que por essa proximidade, a imprensa esportiva não deveria abrir mais espaço para ouvir esse torcedor?

R: Primeiro, eu acho que a imprensa esportiva tem muita dificuldade de falar de tudo que sai da quadra. Então, quando a gente fala desse assunto, que é um tema complexo, de segurança pública, de comportamento, já há uma dificuldade natural. A gente já não gosta de tratar nada que seja fora das quatro linhas. Há uma grande dificuldade de falar sobre isso, porque o jornalismo esportivo em sua maioria gosta mais de falar mesmo de jogo, de tática. Essa é uma questão. Eu não sei se a gente deveria ouvir mais os líderes de torcida organizada, porque acredito que a maioria infelizmente tem muito pouco a falar. Posso te falar que a maioria dos que eu conheço são realmente “brucutus”, falam mal, são pessoas violentas, são bandidos na sua maioria. Então, não sei se é o caso de se ouvir mais, mas há uma questão que acho chave. Eu não sou a favor da proibição das torcidas organizadas. Até porque quando eu era moleque, eu tinha um sonho de montar uma torcida organizada com vários amigos meus. Você vai proibir que um grupo de pessoas vá com uma faixa ao estádio? Acho isso um contrassenso. Acredito na tese do sociólogo Mauricio Murad de que a maioria das pessoas sejam pessoas de bem. O que eu acho que falta para a imprensa esportiva não é ouvir os torcedores, os dirigentes, é buscar mais personagens interessantes das organizadas e mostrar que não é só porradaria, mostrar esses exemplos que existem, e discutir esse assunto com uma profundidade maior do que “Ah! É bandido, é gangue, vamos fechar as organizadas!”. O Brasil tem um problema grave de segurança pública, de impunidade e o futebol sofre com isso. Acho que a imprensa esportiva dá pouco espaço para a discussão desse problema, menos do que ele merece, porque o Brasil é líder no ranking mundial de violência no futebol, de

mortes ligadas ao futebol, como diz Maurício Murad, e pouquíssimos jornalistas esportivos estão debruçados sobre essa questão. A gente vê poucas reportagens e investimentos nesse assunto.

E: Sempre que tem briga entre torcidas organizadas ou morte de algum torcedor sempre é noticiada. A questão é o quão profundo é essa notícia, não?

R: Exatamente. A gente noticia e torce para o assunto sair logo no noticiário, pra gente parar de falar, mas os casos continuam acontecendo. Goiás, Ceará, são Estados que estão vivendo um drama esse ano e a gente muitas vezes para de acompanhar. Por exemplo, os torcedores do Palmeiras partiram para cima de policiais militares, durante um jogo do time contra o Botafogo em Araraquara. A imprensa não foi cobrar para saber se já identificaram os torcedores, para saber se já foram interrogados. A gente mostra e espera para ver se o assunto vai ser esquecido e eu acho que isso é uma falha que a gente tem.

E: Um argumento utilizado na entrevista anterior para justificar a não abertura da imprensa para estes torcedores de organizadas é que na opinião destes, a torcida organizada não teria uma parcela pacífica. Seria essa uma justificativa então?

R: Aqui entra outra questão. Por que a gente não procura esse torcedor? Porque o torcedor organizado ele não faz diferente do torcedor comum. Acho que é uma bobagem a gente sempre querer falar com os presidentes e chefes de torcidas como, por exemplo, a Gaviões da Fiel. A maioria da torcida do Corinthians, do Flamengo e do Vasco não é de organizada, não se enxerga nesses seres uniformizados. Esse é um ponto. A gente tem que ouvir torcedores de torcida organizada para falar dos problemas de torcida organizada. Usar torcedor de torcida organizada como representante da torcida como um todo seria um erro, porque eu acredito mesmo que a maioria das pessoas e dos torcedores não se vê representado por esses caras que hoje dominam as organizadas. Acho que torcida e torcida organizada são coisas bem diferentes.

E: Mas diante dessa produção de matérias sobre violência em torcidas e utilizando essa ideia de que só se fala de torcida organizada quando for um problema de torcida organizada não seria uma maneira de generalizar que todo torcedor organizado é violento?

R: O que acontece é que hoje, infelizmente, o que a gente tem de notícia de torcida organizada não é a festa, não são mosaicos, não são mobilizações para ajudar o time. O que se vê, infelizmente, são tiros, casos de vandalismo, depredação, assassinatos... Esses são os assuntos que a gente vem tendo. Poderia ser maravilhoso, a gente ter notícia de que as torcidas organizadas estão fazendo um carnaval maravilhoso em São Paulo, mas o que gente tem de notícia é o contrário disso. É pancadaria, é depredação, brigas, cenas lamentáveis.

E: Segundo Maurício Murad, as torcidas organizadas mantêm outros tipos de atitudes como a alfabetização de crianças, escolinhas de futebol, entre outros projetos. Para ele, essa seria uma alternativa para a cobertura da mídia e que ajudaria na construção de outra ideia sobre as torcidas.

R: Eu não acho que a imprensa tem que ajudar a construir imagem das organizadas. Quem tem que fazer isso são eles. A imprensa tem que ter a liberdade de selecionar o que ela acha que é pauta. Eu até hoje não tive notícia de um trabalho interessante, social, de uma torcida organizada. Pode ser desconhecimento meu, mas nada que eu ache que mereça uma reportagem minha, por exemplo. Pelo contrário, o que me chamou atenção como jornalista até hoje, infelizmente, é a organização de guerras, a maneira como eles se organizam para espancar as pessoas.

E: De que forma você acha que na construção do jornalismo, das pautas, os jornalistas poderiam ajudar nessa questão da não produção de violência entre torcidas?

R: Acho que o nosso papel é mostrar as coisas. Então, quanto mais o Sportv, no meu caso no programa Redação Sportv quando eu posso, eu sempre falo, quanto mais a gente falar que o estado é de calamidade, que a situação é grave, quanto mais mostrarmos esses números que nunca se matou tanto no Brasil... Acho que a nossa missão é retratar, mostrar e cobrar as pessoas. Eu não tenho poder de polícia, mas posso cobrar das autoridades. Eu acho que a gente ajuda sim, mostrando o que está acontecendo e dando o espaço que esse assunto merece

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