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Entrevista com Alberto Cantanhede, o Beto do Taim

Ana Caroline Pires Miranda Maiâna Roque da Silva Maia

deia do aço. Então, estávamos discutindo grandes temas, não mais a redução do peixe no rio, mas estávamos discutindo quais eram as conseqüências, qual era a razão disso, a raiz do problema. E nós aca- bamos detectando várias coisas. As comunidades, décadas passa- das, anos 40, 50, tiveram uma participação muito ativa no desflores- tamento do mangue, por exemplo, que era pra suprir o combustível das fábricas de São Luís nesse período. E era tanto a lenha, quanto a casca do mangue que deu um impacto negativo enorme no man- gue no entorno da ilha de São Luís. E isso, nós vamos resgatar já aqui nesse período de 2000, de 1994 pra frente. Quando se chega nesses grandes projetos, aí, nós percebemos que as comunidades, com re- lação ao mangue, as pessoas não viviam mais disso, [porém], o pro- duto continuava diminuindo, o peixe, as terras continuavam fracas e produzindo menos.

Pesquisadores: Desde quando isso apareceu?

Beto: O peixe, por exemplo, tem um marco do início dos anos 80, nos últimos vinte anos. Nós começamos a atribuir a partir de alguns eventos, de alguns. Por exemplo, quando a Alcoa1 fez seu primeiro

lago, era do lado de cá da BR. Os novos lagos estão do lado de lá, no Iguaraú, mas os primeiros foram feitos aqui dentro da planta da fá- brica, então, estão na cabeceira de dois igarapés grandes, que é o igarapé do Andiroba e o igarapé da Ribeira, que nasce depois de Pe- drinhas, mas tem afluentes, braços dele que tocam dentro da plan- ta dela pelo outro lado, dando volta. Então, esses dois igarapés so- freram um impacto enorme nos anos 87, já pra o início dos anos 90. Vez por outra, nós percebíamos a coloração da água do rio mu- dar, e não conseguíamos atribuir isso a nada. A lagoa que a BR cor- tou também provocava isso, invernos muito fortes traziam muitos, as ervas aquáticas vinham por cima disso e com isso a água tam- bém engrossava. Nós começamos a achar que podia ser a mesma

1. O entrevistado se refere à Alumar (Consórcio Alumínio do Maranhão) que é a sub- sidiária local da Alcoa, grande multinacional do ramo da produção de alumínio.

coisa. Só que nesse período em que era só a chuva que trazia a água da lagoa com os arbustos, nós não tínhamos redução de peixe, ao contrário vinha muito camarão da água doce, e tínhamos uma far- tura de peixe em busca do camarão. Nesse período dos anos 80, foi ao contrário, você tinha a coloração da água com o mesmo proble- ma anterior, mas nós percebíamos a fuga dos peixes, você não ti- nha mais tainha, você não tinha mais. Tem um período da sardinha que ela fica de maio até outubro mais ou menos, novembro quan- do começa a chover, ai ela foge, mas ela fica esse período todinho, e ela engorda, ela cresce, ela reproduz, e desse período pra cá, ela dei- xou de fazer esse ciclo, quando ela vem, ela passa no máximo dois meses e ela não consegue ganhar tamanho, não conseguia crescer, acho que nem reproduzia mais dentro do rio e nós começamos a observar todos esses fenômenos. Ai o recurso que nós não utilizáva- mos muito no dia a dia, que é o caranguejo, pois não temos o hábito de consumir o caranguejo no dia a dia, mas ai percebeu-se que o ta- manho dele começou a estabilizar muito. A ostra que íamos buscar muito mais por esporte: “– ah, vamos buscar a ostra para tira gosto”, então ia lá, e tira um pouco de ostra. Ostra tinha muito e hoje vo- cê não vê, são raros os igarapés, e nós percebemos, dá para atribuir- mos, porque nos igarapés aonde não tem essa influência de quími- cos, você não tem uma roça tratada com químico, não tem a vazão de um projeto desse, a gente percebe quais são os igarapés que vêm da Coca Cola, quais são os igarapés que vêm da Cervejaria Equa- torial, quais são os igarapés que saem da Alcoa, esses igarapés não tem ostras, os outros ainda tem um pouco.

Pesquisadores: Tem peixes nesses igarapés?

Beto: Tem, mas reduziu. Por exemplo, o igarapé do Andiroba, ele era uma referência pra pescaria, quando não dava em lugar nenhum no rio, estava ruim, você ainda ia no igarapé do Andiroba, tinha um po- ço imenso no meio dele, e tinha muito peixe. Hoje, esse igarapé su- biu o nível do fundo dele e não tem mais, ele ficou raso mesmo, até o poço desapareceu, então são coisas que estão na prática, não estão só na imaginação.

Pesquisadores: Quem é que estava apoiando vocês? Eram somente as

comunidades?

Beto: Nesse período, quando nós começamos a discutir os grandes projetos, nós tínhamos um grupo de pesquisadores inclusive, você ti- nha a professora Maristela de Paula Andrade, tinha o professor Poli- carpo, que contribuiu muito nessas discussões, você tinha o profes- sor Aranha, que já faleceu.

Pesquisadores: E do movimento social?

Beto: Do movimento social, você tinha a Marluze Pastor, que já ti- nha formação de Agronomia e era coordenadora da Tijupá, que de- pois virou Fórum Carajás. Tinha a Helena Heluy, que debatia, discu- tia, participava conosco, apesar da formação dela ser mais jurídica, mas participava. Tinha Ademar Pinheiro, o professor Nascimento de Morais, você tinha um grupo de estudiosos por trás das discussões, produzindo documentos para nós. E, aí, nós íamos para a prática, ha- via um estudo que nos baseamos nas conseqüências do Pólo Side- rúrgico de Camaçari, do Pólo Siderúrgico de Volta Redonda, do Com- plexo Industrial de São Paulo. E nós começamos a discutir com base nisso, que formas, as formas de enfrentamento, e se começou, por exemplo, a discutir os certificados do produto, a Alcoa tem “n” cer- tificados internacionais, de reconhecimento do produto, inclusive o que reconhece a boa relação com a comunidade, o cuidado com o meio ambiente, todos são prêmios que agregam valor ao produto de- les, então nós começamos a questionar. Porque qual é o cuidado que a Alcoa tem com o meio ambiente? Ela tem uma área que está prote- gida por próprio beneficio dos funcionários que circulam lá, mas não tem uma influência maior nisso e é um parque privado, e eles rece- bem quem eles querem. Se tu é leigo e quer visitar, ótimo, eles pas- sam o vídeo dos macacos, guaxinim que ainda circulam, para você marcar uma visita dessa, é seis meses antes. Mas na hora que você bota alguém que pode discutir o conceito da unidade, pra você ques- tionar, aí, eles já não permitem.

Pesquisadores: E como surgiu a idéia da Reserva?

Beto: Nós iniciamos a discussão que desembocou na Reserva com a questão de incluir os jovens nesses problemas. Nós só conseguimos chegar nas pessoas acima de quarenta, assim, levar mesmo pra dis- cussão, então, vamos tentar induzir a juventude e incluir. Então, nós fizemos vários processos de discussão com juventude, de formação, e nisso a gente começou a levantar as proposições e uma delas era, por exemplo, criar um fundo de financiamento para a atividade da pes- ca que era uma coisa que estava na cadeia produtiva. Então, eu, pelo movimento dos pescadores, defendia isso, o grupo do Pará também, que mora na região de Barcarena, nós defendíamos isso, vamos criar uma forma de compensação das comunidades pesqueiras que estão na cadeia do alumínio. Então, o que é que seria isso? Vamos criar um fundo do poder público pra financiar a troca de equipamentos, por- que assim ao longo do tempo quando a produção vai diminuindo, a tendência é das pessoas diminuírem as malhas da rede para au- mentar a produção, e era uma tendência ruim porque cada vez vo- cê capturava o peixe menor. Então, vamos inverter o processo, vamos criar, financiar equipamentos maiores para caso pegar cada vez os peixes maiores, mas isso diminuía a renda, diminuía a produção e ai tem que compensar de alguma forma e, então, o fundo iria compen- sar. Essa era uma proposição que chegamos a discutir com o gover- no municipal, inclusive. A empresa é que nunca participou, a Vale do Rio Doce nem a Alcoa nunca participaram disso. Nós fizemos semi- nário internacional pra isso e chamamos eles, todo mundo, o Minis- tério Público, o Poder Judiciário, os Poderes Executivos, a Assembléia Legislativa, teve até alguns deputados participando, mas a empresa nunca participou nem explicou porque não participava. Uma outra proposta que nós tínhamos era o Centro de Referência para que a gente acompanhasse os incidentes, a progressão de doenças, fazer exame do acúmulo no cabelo, do acúmulo de alumínio, do acúmulo permitido de alumínio no sangue a partir do cabelo. Mas não se con- seguiu criar o Centro de Referência, porque a proposta era o seguin- te: a sociedade civil vai ter uma participação no controle desse cen- tro, de indicar técnico, de não deixar só que o poder público indique,

porque nós sabemos que o poder público também é manipulado pe- la empresa. Para você chegar e pegar um diagnóstico de um trabalha- dor acidentado na Alumar, você não consegue chegar. Não tem médi- co que dê um diagnóstico e dizer “– fulano esteve aqui, passou tal dia e o diagnóstico dele esse”. Então, começamos a dizer: “–nós vamos querer um Centro de Referência, mas que tenha uma outra postura, onde o Poder Público, a empresa mais a comunidade tenha acesso às informações e inclusive na indicação dos técnicos que irão pra lá”. Antes disso, até o governo topou a discussão. Quando chegou nessa parte, morreu a discussão. A outra questão era como potencializar o Conselho de Meio Ambiente, e nós não pensávamos no Conselho do Meio Ambiente geral do governo do Estado para discutir “n” proble- mas, era um Conselho pra influenciar no projeto, tinha a participa- ção da empresa, do Poder Público e das comunidades circunvizinhas. Era a pretensão de instalar unidades de monitoramento, comprar equipamentos que pudesse monitorar a emissão e isso também não foi para frente. Então, nós partimos, assim, para outra alternativa e a quarta proposição foi criar unidade de conservação em torno dos projetos como uma forma da comunidade mostrar sua contribuição na preservação, não era no aspecto de se contrapor a qualquer pro- jeto ou criar embaraço para o projeto, era também mudar nossa prá- tica de usar os recursos, porque se viu o corte de mangue, a extração de pedra, a venda de madeira, que até hoje ainda acontece por falta de alternativa econômica, até hoje acontece.

Pesquisadores: Você visitou alguma Resex já criada?

Beto: Eu visitei, nós visitamos aqui no Maranhão, nós visitamos a de Frechal, ficamos lá uma semana, visitei a do Maracanã no Pará, é uma reserva no município do Maracanã, no Pará. Visitei a de Alter do Chão, também no Pará, uma reserva coordenada pelo CNS, o Conse- lho Nacional dos Seringueiros.

Pesquisadores: Porque a Resex do Taim será marinha?

Beto: Vai ser considerada marinha porque vai ter a ilha de Tauá Mi- rim, vai ter os rios envolvidos, então é Reserva Marinha.

Pesquisadores: Quando tu falas nós visitamos está se referindo às pes-

soas aqui do Taim, da Associação daqui ou não?

Beto: Nós estivemos daqui do Taim, eu e mais quatro pessoas envol- vidas alternadamente nessas visitas, agora das outras comunidades, também teve, do Porto Grande, do Rio dos Cachorros, do Cajueiro, teve pessoas envolvidas nessas visitas, então nós tivemos vários mo- mentos de participar no processo de criação.

Pesquisadores: Vocês tiveram a idéia em 1998?

Beto: Não, a idéia vem de 1996, nós fomos discutindo muito mais as- sim, nos espaços maiores, por exemplo, quando se reunia a paróquia, a paróquia de São José do Bonfim, a discussão a miúdo na comunida- de se dá a partir de 1998. Nós começamos a ir pra o Rio dos Cachor- ros, Porto Grande, e dizer “– olha, isso é viável”, até o Poder Público tinha a participação. O IBAMA, por exemplo, muito mais de especta- dor do que de intervenção mesmo. Quando chega em 2003 que o pro- cesso é finalmente oficializado, eles mandam os técnicos para faze- rem o estudo biológico, socioeconômico e tem todos os passos dados para até chegar na audiência pública em 2006.

Pesquisadores: Tinha alguém do movimento social com vocês no pro-

cesso de oficialização da Resex?

Beto: Tinha a Sociedade Maranhense dos Direitos Humanos, tinha a própria FETAEMA, com técnicos, o Fórum Carajás, a Tijupá, então ti- nha vários atores que se envolveram, inclusive na divulgação. Eu par- ticipei várias vezes em programas que a Tijupá tem todo domingo, que é “O Homem e Terra”2. Eu fui alguns momentos pra lá pra falar

desse processo, dessa proposta.

Pesquisadores: Como que vocês chegaram à conclusão de que seria

uma reserva extrativista?

Beto: Para chegar na Reserva Extrativista mesmo não demorou muito tempo. Nós começamos a pensar nela meio pingada a discussão em

1996, e começamos a aprofundá-la em 1998. Mas quando começa- mos a aprofundá-la em 1998, nós já tínhamos, por exemplo, o Centro Nacional de Populações Tradicionais, o CNPT, que subsidiava mui- to essa discussão, a partir das Reservas do Acre, que nós nunca con- seguimos ir lá, mas eles traziam essas informações nas discussões de Unidades de Conservação. Toda assembléia do GTA (Grupo de Tra- balho Amazônico), todas as assembléias do CNS (Conselho Nacio- nal dos Seringueiros), todas as assembléias da COIABE (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), que são os po- vos indígenas, todos esses grupos, todas as assembléias desses gru- pos incluía na pauta as Unidades de Conservação. Então, nós estáva- mos sempre nesses debates. Então, para chegar a conclusão de que a melhor unidade de conservação era RDS3 ou Resex não foi tão di-

fícil devido aos vários elementos que eu estou colocando. Primeiro, porque é assegurar a permanência das pessoas, segundo dar às pes- soas o direito de uso da terra, a posse continua com o governo, mas as decisões e o uso é da comunidade. Também quando ela é criada é muito difícil também derrubar. O assentamento4 resolveria parcial-

mente, você teria um passo mais rápido, vamos dizer, ou menos de- morado pra acessar recursos, porque o assentamento já trás no seu pacote. No entanto, o assentamento nos moldes originais, oficiais são pessoas que são deslocadas de um lugar, são implantadas em outro e ali se forma uma estrutura de produção, de tudo. E nós não nos en- quadramos enquanto assentamento, nós nos enquadramos enquan- to população tradicional, então, não é um assentamento, é uma co- munidade histórica, com mais de cem anos, quase duzentos anos, então nós não nos enquadramos nesse aspecto como um assenta-

3. RDS é a sigla de Reserva de Desenvolvimento Sustentável, modalidade de unidade de conservação de uso sustentado prevista na legislação ambiental brasileira. 4. Em 1996, o ITERMA (Instituto de Colonização e Terras do Maranhão), vinculado ao governo estadual, concedeu o título de assentamento rural a vários povoados da Zo- na Rural de São Luís. Esta situação, no entanto, nunca foi regularizada em cartório e, apesar de toda a propaganda política feita, então, pela Governadora Roseana Sarney Murad, os moradores de toda a região continuam sem garantias formais da titulação de suas terras.

mento, nem muito menos como ocupação como o governo quis di- zer no processo de discussão do Pólo Siderúrgico. Tem documento do Estado dizendo que as poucas ocupações que tinha, era ocupações irregulares e dos últimos quarenta anos. A cada projeto que o Esta- do pensar, ele tem que primeiro que regularizar a terra em nome de quem já está para depois comprar, indenizar e relocar em outro lugar Não fizeram nada disso para implantação da Alcoa, não fizeram na- da disso para implantação da Alumar, da Vale do Rio Doce, não fize- ram nada disso para o Pólo, para o Distrito Industrial do Maracanã, não teve nada disso, as comunidades foram simplesmente cedendo lugar para as empresas. Em 2000, houve um processo e o Estado per- deu o domínio útil das glebas Tibiri, Pedrinhas, Itaqui, Bacanga. E em 2001, o então secretario recorreu, e a secretária nacional do Patrimô- nio da União deu de volta o domínio útil ao Estado. Nós estamos no Taim, por exemplo, com famílias que estão na sexta geração e, para a lei de populações tradicionais, bastam três gerações. Os outros povo- ados também são antigos. O Porto Grande tem, o Porto Grande virou esse nome de Porto Grande por conta do porto mesmo, mas a comu- nidade original era Encantado e tinha um dos terreiros de mina mais antigos do Estado. O Rio dos Cachorros da mesma forma, a Vila Ma- ranhão tem a segunda igreja mais antiga, a de São Joaquim. Então, as- sim, não é uma ocupação qualquer, a igreja de São Joaquim só é mais nova que a de São José do Desterro, que é de 1612.

Pesquisadores: Quando você diz que algumas famílias no Taim já es-

tão na 6ª geração, elas remontam, então, ao período da escravidão?

Beto: Sim

Pesquisadores: Vocês não pensavam em, digamos, reivindicar o titu-

lo de comunidades quilombolas? Em algum momento, isso passou pe- las discussões?

Beto: Nós não chegamos a pensar nisso, porém, nos falta elementos de registro. Por exemplo, nós temos uma marca na comunidade, que é um labirinto de alicerces num período que ainda não tinha cimen- to, então, era argila com óleo de baleia, cal, coisa assim. são uns qua- dradinhos, alicerces numa área que nunca se identificou o que é que

seria mesmo aquilo, se era uma construção pra moradia, se era um labirinto pra alguma coisa, Nunca ninguém estudou isso. Precisamos de um estudo antropológico, alguma coisa desse tipo. E os documen- tos da terra que a gente sempre tentou, nós sempre perseguimos is- so, a única informação que se tem, é que na Igreja do Carmo, na pre- lazia lá dos Capuchinhos da Igreja do Carmo, existem registros, só que o acesso a isso é muito difícil, é muito complicado, não abre mui- to assim, principalmente, porque, sobretudo, não sei agora, mudou o arcebispo, mudou uma série de orientações, mas nós não conse- guimos com D. Paulo. Ele conseguiu fazer o termo de doação da ilha de Tauá-Mirim, para o governo do Estado fazer assentamento. Então, não conseguimos chegar nesses documentos, mas, nós temos infor- mações de que existem esses documentos, desse período. Há um cor- te na historia, porque antes de ser o Taim – e Taim significa a junção dos termos ita que vem do tipo de pedra encontrado nessa área com taino, um povo africano – esta comunidade aqui era chamada de La- ranjal. Conta-se que aqui era refugio, então, aquela construção era meio por essas pessoas conduzidas por freiras que cuidavam de fu- gas, dos fujões aí do litoral.

Pesquisadores: Quem é que contava isso?

Beto: Nós ouvimos essas historias do finado Maximiano de Moraes, que é das famílias mais antigas e ele era 2ª geração.

Pesquisadores: Ele já morreu?

Beto: Já morreu. E de Seu Dionísio, que é o avô de José Reinaldo e ele já era também 2ª geração

Pesquisadores: Está vivo ainda?

Beto: Não, já morreu.

Pesquisadores: Então, vocês não reivindicaram o título de remanes-

centes de quilombos porque vocês não tinham como comprovar?

Beto: Isso, não tínhamos como comprovar. Tinham documentos ofi- ciais dizendo que nós éramos invasores, então, para você reverter isso é muito mais complicado. Aqui, você ia contrapor-se, primeiro, ao go- verno do Estado que não ia concordar em fazer um estudo de identifi-

cação de comunidades remanescentes de quilombos. Quando perce- bemos essas dificuldades partimos para a unidade de conservação

Pesquisadores: Você considera que a Resex conseguirá atender às ne-

cessidades das famílias das comunidades?

Beto: Ela consegue atender algumas. A primeira delas é a posse das terras que se garante. A segunda é que nós podemos decidir a forma de uso e ser reconhecido enquanto política pública. Se nós defini- mos que a partir de agora vamos proibir que se pesque com determi- nado equipamento no rio, fazemos um acordo entre nós da unidade, o IBAMA reconhece e é obrigado a fiscalizar. Nós não vamos fazer e outros não podem fazer. Nós eliminamos algumas práticas que con- sideramos predatórias, como a extração de pedra. Todo mundo sa- be que ela é ruim, todo mundo tem essa consciência que a extração de pedra já suprimiu varias áreas que eram roças. A grande medida da Reserva Extrativista é que a comunidade pode decidir como usar e, também, as regras podem ser mudadas. Você estabelece. Ela não é