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2. Metodologia

2.3. Entrevistas

2.3.1. Entrevistas com leitores

O presente estudo considerou imprescindível a realização de entrevistas diretivas (estruturadas) com alguns destes leitores de notícias jurídicas. A abordagem fenomenológica fora aplicada à análise das respostas obtidas, dada sua capacidade de operar aspetos subjetivos e captar, da amostra, reflexões sobre seu agir.

Importa reconhecer que os dados quantitativos obtidos nas fases anteriores da pesquisa e as teorias estruturalistas aplicadas na reflexão dos dados foram acentuados pelas análise qualitativa desta fase da pesquisa, sem supor qualquer incongruência. O estudo percebe a reflexão de caráter subjetivo e reflexivo – própria da abordagem fenomenológica – como fundamental para a análise em profundidade das representações dos agentes pelo estudo observados – elementos que dados matemáticos não são capazes de revelar. Ora:

This approach concentrates on the analysis of the life-worldly conditions for the constitution of diverse social phenomena such as power, domination, violence, friendship, love, humor, and many more. This perspective not only allows sociologically investigating the social construction of these phenomena. It also includes the phenomenological description of the consciousness activities and life-worldly preconditions involved in the constitution of social phenomena. (Dreher & Santos, 2017, p.386)

Sobre a relação estrutura-subjetividade, Peters (2011, p.90) acrescenta:

Conhecemos a famosíssima tese de Marx segundo a qual os seres humanos “fazem sua própria história, mas não a fazem sob circunstâncias de sua escolha e sim sob aquelas com que se defrontam diretamente, legadas e transmitidas do passado” (Marx, 1974, p. 17). Embora tendamos espontaneamente a identificar

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tais circunstâncias societárias não escolhidas porém “legadas e transmitidas do passado” às coações exteriores que compõem os diversos loci societais e institucionais estruturados previamente à intervenção agencial de qualquer ator, também podemos ver agora que elas podem ser internas aos agentes, fatores condicionantes da ação existentes sob a forma “interior” de tudo aquilo que suas motivações subjetivas e capacidades práticas presentes devem às suas múltiplas experiências passadas, as quais deixam no seu rastro um conjunto de propensões a (inter)agir, pensar e sentir de determinadas formas.

2.3.1.1. Objetivo

A entrevista estruturada visa ao estudo, já dotado dos dados sociodemográficos e da análise dos produtos jornalísticos e dos comentários dos leitores, compreender de que modo estes (sobretudo os que comentam notícias jurídicas, nos espaços destinados ao leitor por estes veículos) se enxergam enquanto leitores e críticos, o que pensam e como pensam seu agir.

Aqui, importa definir que o sequenciamento das pesquisas (tanto das coleta de dados quanto da publicação das análises no estudo) atenderam ao explanatory

sequencial design, notadamente na decisão de elaborar e aplicar as entrevistas

estruturadas somente após a análise do inquérito por questionário e das análises de conteúdo. O estudo considerou que os dados anteriormente obtidos e analisados auxiliariam (como de facto auxiliaram) na elaboração e realização das entrevistas estruturadas e na interpretação das respostas obtidas, sobretudo quando alguns dados revelaram-se inesperados (Morse, 1991, as cited in, Ivankova, Creswell e Stick, 2006).

2.3.1.2. Planos de contingência

As dificuldades logísticas impostas pelo isolamento social resultante da pandemia do novo coronavírus (Covid-19) impediram a execução das entrevistas pessoalmente, como anteriormente previsto. A pandemia exigiu do estudo, bem como de toda a comunidade acadêmica, alterações de logística nos procedimentos de pesquisa e, nomeadamente, das entrevistas aplicadas pelo estudo. O plano de

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contingência definido para esta situação fora a execução de entrevistas estruturadas por via online12.

A grelha de entrevista por pautas, definida com “certo grau de estruturação” (Gil, 1999, p.120), considerou a necessidade de conduzir os entrevistados a respostas espontâneas, porém aprofundadas e subjetivas, o que implica no “desenvolvimento mais flexível da entrevista” (Gil, 1999, p.120). Razão pela qual as questões, embora pré- estabelecidas pelo guião de entrevistas13, são razoáveis (quanto a complexidade da proposta) e flexíveis (na abordagem) o que permitiu interpretações diversas pelos entrevistados, conforme suas capacidades de análise.

Ora, faz-se mister considerar que o constrangimento da submissão a uma entrevista via media digital, para fins acadêmicos e de instituição estrangeira, bem como o próprio tema em questão (de caráter jurídico), pode evocar o implícito distanciamento simbólico do entrevistado (eventualmente situado na exterioridade dos campos jurídico e acadêmico). Tal afastamento pode, como efeito, fazer com que os entrevistados “não se sintam à vontade para responder as indagações formuladas com maior rigidez” (Gil, 1999, p.120). Assim, para garantir respostas satisfatórias, dentro das limitações impostas pelo plano de contingência, reelaboradas foram algumas das questões preliminarmente definidas. Por exemplo, na pergunta: “Ações do STF afetam sua vida cotidiana?”, incluíram-se as expressões “acredita” e “quando?”. Esta pode tanto ser compreendida como “em que medida?” como “em qual ocasião?” ou “em que tipo de situação?”. A escolha tem por objetivo evitar respostas dicotômica. O mesmo entendimento se aplica à questão: “Na sua opinião, os juízes devem atender aos anseios da população ou atuar independentemente deles? Por qual razão?”.

Do ponto de vista da sistematização das atividades, temos que, paralelamente ao processo de recolha de dados, o estudo qualitativo realizará a análise de conteúdo e

12Entrevista estruturada por via escrita, à partir do sistema Google (Forms), posto que a desigualdade de acesso à internet e à medias avançadas de comunicação no Brasil impõe ainda duras restrições ao desenvolvimento de entrevistas via live-stream ou aplicativos de vídeo chamadas para notebooks e tablets – que só pode ser realizada, à muito custo, na entrevista com o especialista, como veremos adiante. 13Tabela 2, conforme Índice de Tabelas.

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decodificação do material, percebendo e dividindo-o por pautas. O estudo também atentou-se para a saturação teórica – percebida já na décima segunda entrevista.

O estudo também definiu como plano de contingência para o eventual baixo interesse dos leitores pela entrevista a convocação de cerca de 20% da amostra da fase de inquérito por questionário, isto é, entrevistados que se dispuseram a prosseguir no dialogo, oferecendo seus e-mails para contato.

2.3.2. Entrevista com especialista

O estudo encerra sua análise de dados com uma entrevista semiestruturada com especialista, sendo este o prof. Dr. Clóvis de Barros Filho. O diálogo realizou-se no dia 22 de maio de 2020, através do sistema de vídeo comunicação Zoom14.

2.3.2.1. Objetivo

A entrevista atendeu a última questão que concebe o percurso narrativo do estudo: como enquadrar sociologicamente os leitores de notícias jurídicas?

Clóvis de Barros Filho fora definido como referência para auxiliar o estudo a pensar o público observado a partir da teoria de Pierre Bourdieu. O entrevistado é professor livre-docente, escritor, jornalista e palestrante, referência acadêmica brasileira sobretudo nos estudos de Comunicação Social e Ética. Entre seus anos de mestrado em Ciências Políticas pela Universite de Paris II e doutoramento em Direito pela Universite de Paris III desfrutou da convivência com Bourdieu, sobretudo no período em que este orientou seus estudos, à ocasião da pesquisa Constitution: rupture et marchandage, entre 1986 e 1988, quando teve profundo contato com a obra do sociólogo francês.

2.3.2.2. Planos de contingência

Considerando que a entrevista se realizaria, em qualquer hipótese, por plataforma de vídeo, não há que se falar em dificuldades logísticas resultantes da pandemia do novo coronavírus (Covid-19).

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