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Foram feitas 12 entrevistas em profundidade, 6 com indivíduos que tiveram experiências de consumo surpreendentemente negativas e 6 com indivíduos que vivenciaram experiências surpreendentemente positivas (o roteiro das entrevis tas encontra-se no anexo A). Foram encontrados aspectos comuns e aspectos que diferenciam os dois tipos de experiência.

O grande ponto em comum entre as experiências positivas e negativas está nos eventos ou resultados inesperados. Em ambos os casos, a surpresa partiu de algo que não está situado no que seria considerado normal para o evento ou produto. Observe -se o comentário a seguir a respeito de um sentimento de surpresa positiva, é o típico caso de uma experiência em que haviam determinadas expectativas (mesmo que fossem de que tudo seria normal) e elas não foram confirmadas:

“Pensei que seria uma escovada normal, que o gosto acabaria e pronto. Mas foi tipo um Halls, mais forte, um gosto que eu não esperava.”

“Achei a experiência legal, há tempo não acontecia, muito menos de eu contar para alguém.”

E sobre experiências negativas, em relação às quais também existiam expectativas:

“Pensei que seria algo que satisfizesse meu desejo de comer uma torta gostosa, mais molhadinha, com cobertura de chocolate. O creme era fraquinho, o pão-de-ló era seco, o recheio não era de leite condensado.”

“Se já soubesse que isso poderia acontecer não teria sido um problema tão grande, mas fiquei totalmente insatisfeita.”

A surpresa manifestou-se, também, em momentos em que não se tinha expectativas, ou seja, em que nada se esperava e algo de diferente aconteceu. O primeiro relato refere-se a uma experiência de surpresa positiva, com uma cerveja, e o segundo de uma experiência negativa, com a assinatura de uma revista:

“Eu não esperava muito [...] mas por existir similares não esperava que tivesse outro sabor, outra consistência.”

“Não imaginei que renovariam automaticamente. Pensei que me ligariam, nunca imaginei esse desfecho.”

Fica evidente, pelos exemplos acima, que o evento inesperado, de acordo com a avaliação feita pelos entrevistados, gerou satisfação ou insatisfação, algo inerente a experiências de consumo. Às vezes, não se tinha expectativas em relação ao que podia acontecer, principalmente em relação a produtos de baixo envolvimento, como a cerveja por exemplo, o que indica a ocorrência de surpresa neste caso também. Ou seja, quando as expectativas estão mal formadas ou o consumo habitual do produto faz como que não se tenha muitas expectativas a

respeito do que pode acontecer, qualquer atributo diferente pode causar surpresa, tanto positiva quanto negativa.

Um achado importante é o de que a experiência de consumo surpreendente acaba gerando mais (in)satisfação do que se as coisas tivessem acontecido como planejado. O re lato abaixo, por exemplo, é sobre um carro, cujos problemas posteriores não apagaram a marca deixada pela surpresa positiva:

“Foi mais do que satisfatória. Nem o probleminha que tive depois (um barulho) mudou minha opinião.”

E este, sobre uma pasta de dente nova que surpreendeu:

“Fiquei mais satisfeita do que se fosse apenas boa, justo pela surpresa.”

Pelos relatos acima, e pelos demais apresentados, fica clara a questão levantada sobre o aumento da satisfação em experiências surpreendentes em relação a experiências satisfatórias sem surpresa. Ou seja, a melhor maneira de gerar um nível de satisfação nos consumidores que supere o que, por exemplo, os concorrentes possam oferecer, é o uso da surpresa, já abordado em pesquisas sobre encantamento do consumidor, que está intimamente ligado a uma junção de surpresa e satisfação.

É importante salientar também a alta incidência de comentários com terceiros (propaganda boca-a-boca) sobre as experiências relatadas:

”Estava no banheiro, escovando os dentes, e senti que o gosto não era aquele de pasta de dente, era mais forte, e logo comentei com meu namorado.”

“...Acabei contando isso para muitas pessoas.”

Dividir o prazer ou frustração com outras pessoas parece ser a regra quando se fala em surpresa. Percebe-se que o evento normal, aquele que confirma as expectativas, não parece merecer tantos comentários quanto em situações em que a

desconfirmação de expectativas é transformada em surpresa. Assim, quando algo diferente acontece, a primeira reação é prevenir as pessoas, no caso da surpresa negativa, ou tentar propiciar a outros a alegria sentida, o que também pode estar ligado à necessidade de confirmação de que a experiência é de fato satisfatória, já que a novidade é um conceito presente em experiências surpreendentes.

Por fim, reportando-se ao principal objetivo das entrevistas em profundidade da pesquisa, não foram relatadas emoções diferentes daquelas apresentadas na Escala de Emoções Diferenciais de Izard (1977). Congruente ao objetivo de Izard, de apresentar emoções básicas que pudessem explicar grande parte do comportamento emocional do indivíduo, as emoções reportadas nas experiências foram iguais às presentes na escala. Dentro desse contexto, o dado que chama mais atenção é a respeito das experiências negativas, geradoras de emoções de igual valência. Somando-se todos os relatos, as 7 emoções negativas da escala foram citadas, mas dificilmente elas apareceram em conjunto. Isto é, as pessoas poderiam sentir-se bravas ou desprezar algum produto, mas jamais foi citado algo que envolvesse vergonha, culpa, desprezo, raiva, enfim, todos esses sentimentos ao mesmo tempo. Quando perguntados sobre emoções além daquelas referidas, os entrevistados afirmaram não ter sentido emoções em tamanha quantidade, mas sim em intensidade, uma medida que é prevista na Escala de Emoções Diferenciais.

Os objetivos de conhecer melhor o problema de pesquisa e de entender as emoções resultantes de experiências de consumo surpreendentes foram cumpridos. Como principal implicação das entrevistas em profundidade, optou-se por não incluir emoções alternativas no instrumento de coleta da etapa descritiva da pesquisa, cujos principais resultados são abordados a seguir.

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