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Parte IV Processando

7.2. Era pós-blogs de moda

Ao que se leva a crer, estamos vivendo a era pós-blogs de moda, onde a geoinformação (MITCHELL, 2004) vai modular a atitude participativa dos usuários nas redes. Nesse sentido, o streetstyle (POLHEMUS, 1994) adquire ainda mais relevância, a partir da possibilidade de taxar as imagens de moda a um local urbano e compartilhá-la instantaneamente via mídias locativas.

De acordo com Lemos (2007), é impossível dissociar a computação ubíqua de um novo modelo de construção da informação a partir da geografia, para o autor as tecnologias sem fio estão transformando as relações entre pessoas, espaços urbanos, criando novas formas de mobilidade. A narrativa de moda apresentada pelas blogueiras na rede social Instagram exemplifica as práticas apontadas por Lemos em torno da comunicação móvel. Ao invés de inibir as situações lúdicas, comunitárias e imaginárias da vida social, as novas tecnologias vão agir como vetores dessas situações.

Para Caron e Caronia (2007), quando duas pessoas mantém seus smartphones ligados em um encontro, o que antes era uma simples conversa passa a uma negociação de direitos e deveres, expectativas e novas maneiras de se encontrar face a face, pois quem não está ali presente fisicamente pode interferir no diálogo a qualquer momento, mudando os rumos da participação de um evento. Da mesma forma que os autores observam uma mudança na estrutura de um encontro entre indivíduos, no que diz respeito à mediação de eventos de moda, pode-se dizer que esses dispositivos incrementam uma prática hedonista que sempre existiu.

Sem a possibilidade de fotografar e compartilhar uma imagem de moda através de um dispositivo móvel, possivelmente alguém se vestiria, se olharia no espelho antes de sair de casa e guardaria o reflexo da imagem na memória. Atualmente, além de mirarem-se no espelho, as pessoas têm a oportunidade de compartilhar a ação na rede social Instagram no momento em que ela acontece.

Esta é uma grande virada cultural e sociológica inaugurada pelas mídias locativas: compartilhar algo que antes ficava restrito ao âmbito pessoal. Fator que

vem a corroborar com a ideia lançada por Lévy (apud CASALEGNO, 2006), segundo a qual as redes facilitam o processo de difusão e compartilhamento de memória.

Uma vez ligadas a contextos locativos, as postagens, de uma maneira geral, fazem menção ao movimento das blogueiras. A rede social, por sua vez, exerce o papel de diário de viagem, de moda, de estilo, de beleza, de vida. Christopher Lash, citado por Domenico De Masi (1999) sugere que novas formas sociais exigem novas formas de personalidade, novas formas de socialização e novos sistemas de organização da experiência.

O Instagram vem a ser um sistema de organização da experiência da moda atual. Não basta vestir-se para determinada ocasião, é preciso compartilhar esse evento com as pessoas nas redes, atitude que é um reflexo do desejo de partilhar emoções e excitações comuns, que segundo Maffesoli (2006) caracteriza a sociedade contemporânea.

No que diz respeito às hashtags, todas as postagens analisadas estão tagueadas ou fazem menção a outras contas no Instagram através do sinal de @. Nas legendas das postagens das blogueiras, não se observou hashtags de uso comum, a criação e o uso das hashtags ocorrem de forma individual, muitas vezes substituindo o texto, ligando a imagem a contextos específicos.

Nesse aspecto, reside um grande diferencial do Instagram como rede social, pois a linguagem que a hashtag inaugura é inovadora e muito específica das mídias locativas. A conversão da informação de moda veiculada pela revista Vogue em hashtags, como se procurou retratar através das categorias de análise, inaugura uma experiência distinta de organização e obtenção da informação que é própria das novas mídias: “New media also allow us to create versions of the same object that differ from each other in more susbtancial ways” (MANOVICH, 2002, p. 39)108.

O que é apresentado na revista em formato de imagem e texto desdobra-se na rede social em uma infinidade de imagens. Ao digitar a hashtag #skirtandshirts, por exemplo, todas as imagens marcadas com essa hashtag são localizadas. Quanto mais popular se torna a hashtag, mais conteúdos relacionados a ela podem ser encontrados. Esses conteúdos variam entre imagens de usuários e repostagens (fotografias produzidas pelos meios tradicionais e recompartilhadas na rede social).

108As novas mídias também permitem criar versões do mesmo objeto que diferem uma da outra de

forma mais substancial. [tradução da autora]

Como tudo está interligado, amparado à nuvem computacional (WEISER, 1991), dificilmente uma imagem reproduzida em uma revista escapa da rede social. A própria conta Vogue Magazine divulga imagens da edição impressa da revista no Instagram. Com a globalização impulsionando o transito de pessoas entre os países (HALL, 2003), as tendências/categorias não percorrem mais o globo somente através das revistas de moda, cinema e televisão. As blogueiras de moda põem em prática esses conceitos no momento em que eles são lançados pelas passarelas e pela imprensa de moda e compartilham essa experiência através das imagens que postam nas redes. Essa experimentação condiciona a atitude participativa sugerida por Jenkins (2011).

Lipovetsky (2011) comenta que o luxo desceu à rua. O luxo é o fiel representante da indústria da moda e, se ele desce às ruas, esse movimento sinaliza uma mudança sendo gestada. Para o autor, a acessibilidade define uma ruptura nos padrões de consumo. Indo ao encontro do pensamento de Jenkins, Lipovetsky acredita que o consumo está muito mais ligado à realização pessoal, a uma premissa afetiva, do que a uma lógica distintiva, como se observou na primeira fase da moda, ainda na era moderna.

Da mesma forma, Harvey (2010) fala em uma ressignificação propiciada pelo acesso facilitado à informação, onde o consumo é galgado na volatilidade e efemeridade dos produtos, da moda, das técnicas de produção, dos processos de trabalho, das ideias e ideologias e dos valores e práticas estabelecidos. Fazendo- nos crer que a mediação da moda pelas novas tecnologias está ligada a uma mudança que tem muito mais a ver com padrões de consumo de bens e produtos, do que necessariamente com o caráter da informação propriamente dito.