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ES: Avanço da colonização sobre os territórios indígenas (1850-1900)

É possível constatar que, até o ano de 1850, a colonização no Espírito Santo se restringia ao litoral do estado; e até o ano de 1900, avançou ao interior, ao sul do Rio Doce. Até esse período, no Norte do estado a colonização margeava o litoral, se restringindo aos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, se estendendo pelo interior do estado até a proximidade do atual município de Nova Venécia, pelo Rio São Mateus, e pela margem esquerda do Rio Doce, onde atualmente se encontra a cidade de Linhares (BERNARDO NETO, 2012).

Porém, é necessário considerar que a Colonização avançou sobre os territórios indígenas − Puri, ao sul, Krenak e Pojichá, ao norte do Rio Doce − e não em um “vazio demográfico”, como evidencia DARÉ (2010). Avançar sobre territórios comunais foi uma velha prática do processo de colonização europeia, que ideologicamente considerava desocupada toda a extensão territorial da América Latina, invisibilizando a população residente (e resistente), como os astecas, maias, incas, chimus, aimarás, chibchas, entre outros, homogeneizando todos como “índios” (LANDER, 2005; QUIJANO, 2005). A população indígena, assim como outros povos, foi invisibilizada para justificar a territorialização inter e intraestadual, a partir de 1900, como tem ocorrido no período mais recente, no processo de implantação e expansão dos monocultivos de eucalipto sobre as comunidades indígenas, quilombolas e camponesas.

Até o ano de 1814, o governo capixaba já havia doado 174 sesmarias, porém, até o ano de 1828, a maioria delas permaneceu sem ser cultivada, como foi o caso das 82 existentes nas margens do Rio Doce e da Lagoa Juparanã, onde apenas duas se encontravam cultivadas. Entre as terras cultivadas, a maioria da população dedicava-se ao cultivo para o autossustento, principalmente das lavouras de cana-de-açúcar, mandioca, algodão, milho, café, feijão e arroz. Machado e fogo eram as principais formas de preparo e cultivo dos terrenos. Entre as criações, a bovinocultura era a principal atividade, com 8 mil unidades, mas existia, em menor quantidade, o rebanho de equinos (1.600 unidades), além de muares, caprinos, ovinos, suínos e aves (galinhas, patos, perus, marrecos e pombos). Havia, nesse período, 143 casas comerciais em toda a província do Espírito Santo. Diversos produtos eram abastecidos através da importação, como foi o caso de farinha de trigo, carne seca, sal, queijo, manteiga, dentre outros (incluindo alimento, material higiênico, ferramentas, material de construção). Dentre os itens de exportação (ano de 1826-1927), estava a farinha de mandioca, principal produto, em grande parte produzida em São Mateus. Mas também exportava açúcar, fio de algodão, cachaça, arroz, milho, feijão, cal, poaia, café, entre outros. Era proibida a exportação de madeira de construção naval e o Pau-Brasil (OLIVEIRA, 2008).

Vale destacar que a produção da farinha de mandioca não ocupou um lugar central na economia colonial, mas sustentou essa estrutura, alimentando vilas, povoados e até mesmo fazendas que se especializavam em produções monocultoras. A farinha de mandioca também era o principal alimento nos navios negreiros que saíam do Porto de São Mateus para buscar a mercadoria escravo nas terras africanas; e serviu, ainda, como moeda de troca por gente escravizada nessas terras. Nesse sentido, a farinha de mandioca sustentou indiretamente o comércio negreiro e a economia colonial. Daí a importância da região de São Mateus para esse período.

Em relação à indústria, existiam, nesse início do século XIX, fábricas de açúcar e aguardente e olarias; e existiam também as profissões de carpinteiros, marceneiros, sapateiros, seleiros, pedreiros, alfaiates, ferreiros, carniceiros, tecelões e latoeiros. Ferreiro curioso substituía a falta de dentista, que não havia na época. Os meios de transporte eram, principalmente, canoas e lanchas, em função das residências estarem situadas próximas aos rios, que por sua vez constituíam as principais “estradas”. Carros de bois eram utilizados para o transporte terrestre de pouca distância, além de equinos e muares para pequenas cargas. O oceano era o caminho principal entre as vilas, como no caso de São Mateus e Guarapari, em função da inexistência e/ou da situação precária dos caminhos por terra. A maioria das casas era de pequeno porte e as ruas de algumas vilas eram iluminadas por lampiões. As igrejas e capelas para os cultos romanos existiam em abundância; todas as vilas e povoados possuíam uma matriz. Os negros, na condição de escravos, possuíam templos separados dos demais.

A população do estado foi constituída pelos diversos povos que já residiam na província e pelos que vieram, fossem eles colonizadores, escravizados ou imigrantes – indígenas, negros, portugueses colonizadores e dos imigrantes, que em sua maioria veio da Europa. A miscigenação formada pelo conjunto de povos instalados no estado compõe a população da atualidade.

Gráfico 1 – ES: População do estado por período (1780-2014)

Fonte: Criação nossa, com base em Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – Censo demográfico e Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) (OLIVEIRA, 2010).

Até o ano de 1900, o Espírito Santo, com apenas 209,7 mil habitantes, era um dos estados menos populosos do Brasil, à frente apenas do Mato Grosso, que tinha 118,0 mil habitantes. Em 1950, ainda com menos de um milhão de habitantes, o Espírito Santo estava na 10ª colocação entre os estados menos populosos. No ano de 2014, com uma população de 3,894 milhões de habitantes ficou em 16º colocação entre os estados menos populosos, o que significou a ampliação absoluta e relativa em comparação aos demais estados da federação.

Uma população majoritariamente rural foi gradativamente aglomerada nos centros urbanos. Enquanto no Brasil a população urbana superou numericamente a população rural na década de 1960, no Espírito Santo, essa inversão ocorreu na década de 1970. O gráfico a seguir explicita essa mudança no Espírito Santo.

15,6 42,0 82,0 135,9 209,7 457,3 790,1 957,2 1.418,3 1.617,8 2.063,6 2.598,5 3.094,3 3.514,3 3.894,0 P opu la çã o

Gráfico 2 – ES: Evolução % da população rural e urbana 1950/2010

Fonte: Criação nossa, com base em Censo Demográfico (Contagem da população).

Em apenas 60 anos (1950-2010) a população rural capixaba caiu de 79% para 17%, e saiu também dos municípios interioranos para a capital. Em 2010, 56,59% da população urbana capixaba estava concentrada na Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV) (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 1950; 2010). Segundo o IBGE, a população capixaba que no ano de 2000 era de 3,194 milhões de habitantes, se elevou para 3,697 milhões em 2010. Conforme o próprio órgão, a projeção para o ano de 2020 é de 4,138 milhões, e para 2030, é de 4,481 milhões de habitantes.9

Até a década de 1950, a região da Serra dos Aimorés10 continuava territorial e

administrativamente indefinida entre os estados do Espírito Santo e Minas Gerais. Parte dessa área passou a pertencer ao Espírito Santo nesse período, incluindo sua população nos Censos Demográficos seguintes. No período de 1764-1823, segundo Russo (2009), parte do Norte do estado (norte do Rio Doce) pertenceu à jurisdição da Bahia, contabilizando a população nesse estado. Trataremos do Norte do Espírito Santo e sua área de litígio no tema que segue.

9 Segundo o Dieese (2014) em escala nacional, a projeção da população rural brasileira para 2050 é que seja

reduzida para apenas 8%, ampliando a concentração urbana. Com uma população estimada em 226,3 milhões de habitantes, prevê-se que a população rural se reduza para 18,1 milhões. Considerando que a população rural brasileira no ano de 2010 era de 30 milhões, significa que, segundo essa perspectiva, mais de 12 milhões de pessoas saiam do campo. A população ocupada (de 10 anos de idade e mais) no meio rural se reduziu de 17,9 milhões de trabalhadores para 15,2 milhões no período de 1995-2013. Portanto, em um período de apenas 18 anos, houve um esvaziamento do campo, com a saída de 2,7 milhões de trabalhadores.

10 Conforme EHRENRREICH (2014), o nome Aimorés (derivado do Tupi Goyai-mura), se refere aos indígenas

dessa região e significa ‘inimigo que vagueia’, pois assim eram os nativos, seminômades, de extrema bravura na defesa de seu território, temidos e odiados pelos colonizadores. Os Aimoré pertencem ao Tronco Macro Jê e organizam tradicionalmente seu modo de vida prática da caça. Nesse sentido, não são sedentários como os povos agricultores. 21 28 45 64 74 78 80 83 79 72 55 36 26 22 20 17 P er ce ntua l

ES - Populaçao rural e urbana (%)

3.1.1 O norte do Espírito Santo

As divisões administrativas do Espírito Santo sofreram modificações ao longo de sua história, sendo ajustadas conforme os planejamentos estratégicos do estado e/ou a seu serviço. Na atualidade existe uma regionalização definida pelo Estado, que divide esse território em macrorregiões e microrregiões, base para a gestão administrativa, conforme prancha a seguir.