• Nenhum resultado encontrado

Escala de dependência discursiva: propriedades de maior dependência

CAPÍTULO V CARACTERIZAÇÃO FUNCIONAL DA

5.3 Escala de dependência discursiva: propriedades de maior dependência

Tendo em vista as discussões acima apresentadas, tudo nos leva a crer que o papel das conjunções dentro dos contextos descritos é diferente daquele desempenhado dentro da subordinação adverbial, já que passam a assumir uma Função Interacional.

As Funções Interacionais, determinadas no NI, são codificadas no NM pelas mesmas

conjunções que representam no NR as funções semânticas, entretanto, nos casos das Funções Interacionais, elas se instauram no NI indo diretamente para o NM, sem passar pelo NR.

Reconhecemos essas conjunções no NM como conjunções lexicais, ou seja, conjunções

que participam na expressão do significado, conforme sustentado por Hengeveld & Mackenzie (2008: 354). Os autores as assinalam como responsáveis por restringirem as camadas com as quais podem combinar, e apontam que, como geralmente uma camada mais alta contém todas as camadas mais baixas, construções subordinadas podem ser classificadas em termos da camada

mais alta que as contém (HENGEVELD & MACKENZIE, 2008: 363), o que então favorece a proposta de a subordinação discursiva ocorrer entre Movimentos que assinalam diversas Funções Interacionais.

Sendo assim, as conjunções porque, embora (que), mesmo (que), apesar de (que), como e

se apresentam o que parece ser um uso discursivo, isto é, um uso que não se aproxima de seu contexto mais prototípico de conjunção subordinativa, em que expressam as funções retóricas de Motivação e Concessão ou as funções semânticas de modo/conformidade e condição, entre uma

oração subordinada e uma oração principal. Ao invés disso, indicam Funções Interacionais. De acordo com Kroon (1997: 23), funções interacionais são aquelas atribuídas no nível do discurso, indicando a função de um Movimento em um Exchange interacional, diferindo-se das

funções retóricas por ocorrerem entre Movimentos e não entre Atos, como já mencionado anteriormente, e pelas propriedades que adquire enquanto tais.

Cumpre explicar que Exchanges são compreendidos aqui como porções textuais de maior

extensão que os Movimentos. Kroon (1997) é quem equaciona essa noção, assinalando que

Exchanges são unidades que consistem de pelo menos um Movimento iniciado por um falante A

e de um Movimento de reação proferido por um falante B, em que o termo par adjacente pode ser aplicado.

Embora a GDF não contemple a camada do Exchange em sua arquitetura, também não menciona nenhum tipo de restrição a respeito do reconhecimento de camadas mais altas que possam levar em conta porções textuais maiores na tentativa de explicar fenômenos linguísticos

de abrangência discursiva. Assim, propomos aqui que essa camada seja incorporada à arquitetura do modelo como uma camada mais alta do NI, denominada Discurso, consistindo-se de um ou mais Movimentos em monólogos estendidos ou em reações que constituam diferentes turnos, como parece ser necessário para explicar o uso discursivo das conjunções levadas em conta aqui.

Ao fazer isso, esta pesquisa traz uma explicação para o uso discursivo das conjunções aqui apontadas fora do domínio da subordinação adverbial, concentrando-se em outra perspectiva, o domínio da subordinação discursiva e da relação interacional, discutidas por Kroon (1997).

A autora propõe o conceito de “subordinação discursiva” para explicar as unidades do discurso que podem ocorrer como subsidiárias em termos dos propósitos conversacionais do falante com relação a unidades discursivas mais centrais do mesmo tipo (KROON, 1997:2).

Segundo a autora, esse tipo de relação central-subsidiária pode ocorrer não só entre Atos Discursivos, mas também em um nível textual mais global entre Movimentos sucessivos de um

monólogo estendido (KROON, 1997:21), como parece ser o caso para alguns Movimentos apresentados aqui.

Já o conceito de “relação interacional” é definido por Kroon (1997) como aquele que

ocorre entre Movimentos constituintes de um Exchange. De acordo com a autora, Movimentos que ocorrem nesse tipo de contexto, devem ter funções interacionais, enquanto Movimentos que ocorrem em contexto de subordinação discursiva apresentam Funções Retóricas.

Nossa proposta, entretanto defende que tanto os Movimentos que ocorrem em monólogos

estendidos quanto os que ocorrem entre turnos estabelecem relações interacionais e, por isso apresentam subordinação discursiva.

Assim, além de levar em conta os conceitos de função interacional e subordinação

discursiva, faz-se necessário incluir a noção de “estrutura temática”, que representa aqui o ponto de partida para a determinação da escala de subordinação discursiva que pretendemos propor para as relações aqui tratadas.

Como pode ser observado, os diferentes Movimentos aqui analisados, representados por

diferentes funções, parecem se distribuir diferentemente em relação ao enfoque que privilegiam: ora voltando-se para o conteúdo da mensagem, ora para o locutor, ora para o ouvinte. Isso só pode ser determinado levando-se em conta a estrutura temática dos Movimentos envolvidos, já que é a partir dela que podemos identificar se houve maior ou menor desvio em relação às

intenções pragmáticas de se organizar o discurso com respeito ao fio temático que o conduz ou em direção ao monitoramento dos participantes da situação comunicativa.

Interessa salientar que os Movimentos iniciados por porque marcam a transição entre

estruturas temáticas diferentes, reforçando o argumento que reconhece sua natureza discursiva de enfocar o conteúdo temático, já embora (que), apesar de (que), e mesmo (que) se desviam do tema para acrescentar informação contrastiva em relação ao conteúdo, mostrando um enfoque

menor em relação ao tema se comparado com a relação estabelecida pelo porque. Diferentemente, como se desvia do tema para chamar a atenção do falante para algo que já foi falado e que é importante acordar na memória do interlocutor, assinalando maior enfoque no

interlocutor, enquanto se desvia-se do tema para inserir um comentário atenuante do falante, que está preocupado em preservar sua face frente a algo que foi introduzido no discurso, consequentemente enfocando seu papel no discurso e chamando atenção para si.

Partindo dessas evidências, propomos que os três conceitos aqui enfocados –

subordinação discursiva, função interacional e estruturação temática – sejam levados em conta pela GDF no NI. Assim, deve ser considerada uma outra camada, a que denominamos Discurso, para abrigar essas novas Funções Interacionais: Transição, Adendo, Resgate e Salvaguarda. Essas

funções se diferem das outras funções desse nível: as Funções Retóricas que ocorrem entre Atos Discursivos e as Funções Pragmáticas, atribuídas à camada do Conteúdo Comunicado. Diferenciam-se também das funções semânticas, próprias do NR, quais sejam: Causa, Razão e Explicação1, Concessão, Modo e Condição.

Dessa forma, identificamos que as construções aqui tratadas compõem uma escala que parte de usos mais articulados ao tema até chegar a usos mais articulados aos interlocutores, o que define a propriedade das construções de servir a uma orientação de maior organização discursiva ou maior monitoramento discursivo.

Assim consideramos que o domínio discursivo, determinante para esse tipo de construção, é hierarquicamente superior aos domínios representacionais, morfossintáticos e fonológicos, o que, por conseguinte, nos direciona para a proposição de uma escala de dependência discursiva

em que importa evidenciar as propriedades dessas construções e não seu grau de subordinação discursiva, como ilustrado abaixo:

Figura 4: Escala de Subordinação Discursiva

Escala de Subordinação Discursiva

Funções Interativas

Transição Adendo Resgate Salvaguarda

Nessa escala todas as construções são subordinadas discursivas desempenhando uma determinada função interacional, a partir da qual se especifica sua proximidade do polo que demonstra a propriedade de organizar o discurso ou do polo que retrata a função de monitorá-lo.

Sendo assim, essa escala nos oferece um panorama do funcionamento das Funções Interacionais, em que se pode identificar entre os polos as funções que operam no plano do conteúdo (Transição), as que se afastam um pouco dela sem ainda enfocar diretamente o interlocutor (Adendo), passando pelas construções que privilegiam o ouvinte (Resgate), até

chegarmos à que enfoca o falante (Salvaguarda).

Documentos relacionados