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A Escola de Chicago (Ecologia Criminal)

No documento JOSÉ ANTONIO DA SILVA (páginas 52-56)

2. CRIMINOLOGIA E SOCIEDADE

2.2 Criminologia

2.2.1 As Escolas Criminológicas

2.2.1.5. A Escola de Chicago (Ecologia Criminal)

Pode-se considerar que as maiores contribuições ao estudo da criminologia foram feitas pelos integrantes da Escola de Chicago, tanto na parte de metodologia de pesquisa científica quanto no desenvolvimento de fundamentos sociológicos no campo das políticas criminais. A adoção de uma perspectiva de “Ecologia Criminal” trouxe avanços nesses estudos, passando a valorizar a observação do ambiente em que vivia o acusado, assim como, as suas características pessoais. De acordo com Sérgio Salomão Shecaira (2020, p. 171):

A principal contribuição da escola de Chicago deu-se nos campos metodológico e político-criminal. Suas investigações científicas em amplas áreas da cidade inauguram uma tradição irreversível da sociologia criminal e da criminologia. Fomentaram a utilização de métodos de pesquisa que propiciam o conhecimento da realidade da cidade antes de estabelecer a política criminal adequada para

intervenção estatal. Mais do que isso, permitiram o envolvimento de toda a comunidade por meio de seus diferentes canais – junto com o Estado – para o enfrentamento do problema diagnosticado.

As propostas da Escola de Chicago se voltam para a realidade social de cada comunidade, e apontam para a necessidade de forte atuação do Estado nas comunidades por meio da prestação de amplos e variados serviços sociais. Essa característica coloca a Escola de Chicago como a principal base de conhecimento para fundamentação da teoria da coculpabilidade penal do Estado, uma vez que ataca exatamente os problemas sociais que são provocados pela omissão ou pela deficiência do Estado na prestação dos serviços públicos essenciais à população.

Os principais itens relacionados à Escola de Chicago para o enfrentamento do problema da criminalidade, segundo Sérgio Salomão Shecaira, envolvem as seguintes premissas:

1 – Os métodos individualizados não serão suficientes para diminuir substancialmente a criminalidade;

2 – Tratamento e prevenção, para terem sucesso, demandam amplos programas que envolvem recursos humanos junto à comunidade e que concentrem esforços dos cidadãos em torno das forças construtivas da sociedade. Isto é, instituições locais, grupos, igrejas, escolas, associações de bairros, para obviar à desorganização social precisam envidar esforços para reconstituir a solidariedade social e aproximar os homens no controle da criminalidade.

3 – A unidade de operação é a vizinhança. Se o crime é um fenômeno associado à cidade, a reação ao crime também o é. Deve abranger áreas restritas em extensão e com, no máximo, 50.000 habitantes nessa área;

4 – O planejamento e administração dos projetos devem ser feitos por áreas delimitadas. Isto incluirá a formação de comitês envolvendo as entidades mais representativas da comunidade: igrejas, sociedades, associações laborais, sindicatos profissionais, grupos de negócios (associações comerciais, por exemplo), clubes esportivos e outros.

5 – Deve-se buscar o envolvimento dos trabalhadores locais, que mais conhecem a cidade, nas ações da comunidade. Podem-se usar, ainda, os desempregados como meio de envolvimento nos valores comunitários, com a vantagem de se reduzir este grave vetor criminológico, que é o desemprego, além de

diminuir a pobreza por meio do apoio estatal para a redução e/ou minimização das parcelas existentes à margem da sociedade;

6 – As famílias devem ser procuradas para esse esforço mediante a criação de comitês de apoio de pais e mães para dar suporte comunitário no envolvimento das instituições e grupos locais.

7 – Devem ser criados programas comunitários que incluam a intensificação de atividades recreativas, escotismo, fóruns artesanais, viagens culturais, excursões, piqueniques como medida de preenchimento do tempo de crianças, além de intensificação da formação sociocultural.

8 – Deve-se buscar a melhoria das condições sociais, econômicas, educacionais das crianças (em especial) para eliminar o padrão desviante provido pelas cidades;

9 - Devem ser feitos esforços para melhoria das residências, conservação física dos prédios e melhoria sanitária das condições de alguns bairros pobres da cidade.

Analisando esses nove itens apresentados por Shecaira como principais pontos defendidos pela Escola de Chicago, verifica-se que todos se voltam para a melhoria das condições de vida nas comunidades mais carentes, envolvendo diferentes aspectos das relações sociais. Observa-se que as propostas trabalham com o envolvimento dos moradores da localidade, e isso é uma boa forma de fortalecer os laços sociais e o compromisso de cada um com a coletividade.

Esse envolvimento da comunidade nos projetos é muito importante, no entanto, considerando-se a evolução da sociedade e o panorama atual das cidades, há que se exigir maior participação do poder público, uma vez que este é responsável pelo atendimento de todas essas necessidades, e é obrigado (ou, deveria ser) a oferecer serviços como saneamento, urbanização, educação, saúde, lazer, esportes, cultura e outros.

Nota-se que a ideia central da Escola de Chicago é o investimento em ações preventivas, através do atendimento das necessidades sociais, e a consequente redução das ações de repressão à criminalidade, conforme salienta Sérgio Salomão Shecaira (2020, p. 173):

A primeira – e principal – consequência da teoria ecológica é priorizar a ação preventiva, minimizando-se a atuação repressiva. Qualquer

intervenção na cidade deve ser planejada. Iniciar-se-á pela vizinhança e deve restringir-se ao bairro ou a uma área predeterminada. É fundamental o envolvimento da sociedade com a busca da comunhão de esforços dos diferentes segmentos sociais. Programas comunitários devem ser buscados, com a utilização de atividades recreativas em larga escala.

No mesmo sentido, realçando as propostas de maior atenção na área de serviços sociais comunitários, principalmente com relação às crianças das comunidades carentes, aliado à participação dos moradores da comunidade nas definições das políticas e na realização dos programas, Nestor Sampaio Penteado Filho (2019, p. 78) afirma que:

As principais propostas da ecologia criminal visando o combate à criminalidade são: alteração efetiva da situação socioeconômica das crianças; amplos programas comunitários para tratamento e prevenção; planejamento estratégico por áreas definidas; programas comunitários de recreação e lazer, como rua de esportes, escotismo, artesanato, excursões etc.; reurbanização dos bairros pobres, com melhoria da estética e do padrão das casas.

Observa-se que Penteado Filho se alinha às propostas da Escola de Chicago (ecologia criminal), ressaltando ainda que a sua grande contribuição foi o avanço nos métodos de pesquisa (estudos empíricos) e que o ponto principal foi o destaque à prevenção, reduzindo a repressão. No entanto, o autor enfatiza que deve haver maior participação do Estado, por meio de ações concretas. “Não há prevenção criminal ou repressão que resolvam a questão criminal se não existirem ações afirmativas que incluam o indivíduo na sociedade” (2019, p. 78).

Os conceitos da Escola de Chicago trouxeram o poder público para o centro dos problemas da criminologia, passando a atribuir ao Estado uma parcela de responsabilidade na questão da criminalidade, uma vez que cabe ao Estado a prestação dos serviços que irão melhorar as condições de vida da população. Segundo Alfonso Serrano Maíllo e Luiz Regis Prado (2019, p. 101): “A orientação da Escola de Chicago incluía uma forte preocupação pela melhora das condições sociais: pela utilização da pesquisa científica para implementar programas de política social que melhorassem as condições de vida dos indivíduos”.

Analisando as premissas da Ecologia Criminal pode-se concluir que as causas dos delitos não eram atribuídas diretamente e tão somente aos delinquentes, mas ao conjunto pessoa / sociedade / Estado, de onde se pode deduzir que essa escola

criminológica deu início aos conceitos de responsabilização do Estado perante os índices de criminalidade, ou seja, pode-se dizer que foi o nascimento das teorias da coculpabilidade do Estado nessa área.

Dessa forma, pode-se dizer que a teoria da coculpabilidade penal do ;estado se alia, preferencialmente, aos preceitos estabelecidos pela Escola de Chicago, considerando-se que as melhorias das condições sociais e econômicas das populações de baixa renda seriam, primordialmente, responsabilidade do Estado; e ainda, que essas condições sociais precárias refletem em aumento da criminalidade, apresentando assim, ainda que implicitamente, a ideia de corresponsabilidade do Estado na questão da criminalidade.

No documento JOSÉ ANTONIO DA SILVA (páginas 52-56)