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CAPÍTULO I: IMAGEM E CONHECIMENTO: REPERCUSSÃO NA

3. A escola frente à imagem e à Mídia

A escola tem a função de transmitir os conhecimentos e se apropriar deles, ora legitimando os interesses da classe burguesa, ora fornecendo instrumentos de luta à classe popular contra a dominação. E na contemporaneidade, novas atribuições foram agregadas a ela, tendo em vista o progresso e a emancipação humana, no tocante ao seu desenvolvimento integral.

Atualmente, novos desafios são atribuídos à escola: formação intelectual, qualificação profissional, promoção da cidadania etc. Essas e outras ações precisam ser contempladas para que a escola seja de qualidade. Nessa realidade, o trabalho do professor aumenta, pois não mais se precisa desse profissional que mantenha, ainda, uma postura tradicional, mas daquele que seja reflexivo e debatedor de temáticas, questionador crítico, que conduza o seu aluno à reflexão, ao desenvolvimento de aptidões e de conhecimentos que auxiliem para que sua realidade seja modificada.

Contribuir com a formação da dimensão humana, política e social, sobretudo dos alunos das classes desprivilegiadas é função real da escola. Contudo, ela necessita de uma estrutura organizacional que permita tal cumprimento, baseada em ações democráticas, em que os atores que compõem sua dinâmica possam participar dos seus processos de decisão e contribuir com aquilo que é peculiar à escola: a socialização do saber.

Com o intento de alcançar sua proposta, a escola lida com diferentes áreas do conhecimento, como a História, a Linguística, a Geografia, a Arte e outras, que recorrem à imagem para falar do seu objeto, constituir sua estrutura. Essas áreas são estimuladas e instigadas por imagens de diferentes naturezas, o que torna um território a ser explorado pelos professores, em que eles poderão desenvolver metodologias buscando sua significação. A escola, como espaço de mediação e produção cultural, é também cenário social onde se efetiva a circulação de sentidos e significados produzidos pelas imagens.

O fluxo excessivo de imagens disseminadas pelos diferentes espaços e contextos nos coloca diante de uma realidade escolar: o despreparo dos profissionais da educação para lidar com essa ferramenta na sala de aula. Por isso, a instituição escolar precisa abrir o leque de oportunidades para trabalhar com as diferentes linguagens no ambiente da sala de aula, não restringir, apenas, à dimensão oral e escrita, mas explorar sua riqueza expressiva, criativa e comunicativa, emitida, principalmente, pelas imagens.

Fomentar essa reflexão no âmbito da escola denota avanço nas práticas pedagógicas, como também instrumentaliza o aluno para fazer leitura crítica das imagens. Porém, a escola está aquém dessa realidade social e resiste a uma pedagogia da imagem. Morán (Apud OROFINO, 2005, p. 67) expõe rigorosamente a postura da escola frente às imagens:

A escola desvaloriza a imagem e toma as linguagens audiovisuais como negativas para o conhecimento. Ignora a televisão, o vídeo; exige somente o desenvolvimento da escrita e do raciocínio lógico. (...). Não se trata de opor os meios de comunicação às técnicas convencionais da educação, mas de integrá-lo, de aproximá-lo para que a educação seja um processo completo, rico estimulante.

Aderindo à ideia do autor, entendemos que as escolas deveriam estar vivenciando momentos de euforia e de mudanças, devido à inclusão das novas tecnologias e da internet na educação, em que diferentes linguagens serão contempladas no currículo. Esse fato tende a provocar impactos significativos tanto na qualidade da formação do professor quanto na vida do aluno, o que enriquece o seu cotidiano, valoriza sua cultura e potencializa sua aprendizagem. Porém, na escola, presenciamos certa resistência a essas ferramentas, seja por parte das professoras, que não dominam tecnicamente esses recursos e desconhecem os potenciais pedagógicos, seja por receio de aderir ao que é novo.

Nos espaços escolares, é comum os (as) professores (as) não adentrarem os laboratórios de informática, por exemplo, por que têm medo de manusear a máquina, o que

bloqueia o desenvolvimento das possíveis práticas pedagógicas com o recurso. Outra realidade admitida, por alguns professores, é sua oposição e recusa ao uso das ferramentas tecnológicas, alegando ser dispensável a usabilidade destes recursos em processos de ensino e aprendizagem. As posturas adotadas por esses profissionais denotam o não reconhecimento do potencial pedagógico que essa ferramenta traz consigo, o que requer da gestão da escola comprometimento e investimento na capacitação dos professores.

Assim, a equipe de especialistas e a gestão da escola devem dar importância ao uso das novas linguagens, incluindo-as no projeto político-pedagógico, oferecendo oficinas de capacitação para professores, de modo que esses possam enriquecer sua prática pedagógica e, consequentemente, oferecer aporte necessário para desenvolvimento integral dos alunos.

Apesar das tímidas iniciativas, já podemos vislumbrar experiências que contemplam o uso da imagem da escola de forma sistemática, pois há uma necessidade emergente de se trabalhar com as diferentes linguagens demandadas pelas novas tecnologias. Nesse processo, o papel do (a) educador (a) é o de nutrir a cultura das diferentes linguagens e propiciar ao aluno aprendizagens significativas, o que possibilitará um diálogo com a linguagem visual.

Essa preocupação ganhou aparato normativo através da Resolução CNE/CP/ Nº01 02/02, que, ao estabelecer as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professor, contemplou, em seu Artigo II, formas de orientar a formação do docente, para que se fizesse o uso das tecnologias: o uso das tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias, estratégias e materiais de apoio inovadores. Outro ordenamento jurídico que reflete a linguagem como conteúdo pedagógico são os PCNs de Artes (Brasil, 2007 p. 46), que trazem a seguinte reflexão para os ciclos I e II: “Reconhecimento e utilização dos elementos da linguagem visual, representando, expressando e comunicando por imagem: desenho, pintura, gravura, modelagem, escultura, construção, fotografia, cinema, vídeo, televisão, informática e eletrografia”.

Esses dispositivos legais ratificam a necessidade de se trabalharem as múltiplas linguagens em nossa contemporaneidade, posto que abarcam as imagens como ferramentas educativas e inserem, nesse meio, a pedagogia da imagem. Nessa direção, a atuação do educador é mister, por permitir que o uso da imagem seja considerado no currículo escolar e possa ser tratado como um conteúdo, para que o aluno adentre o mundo emblemático das imagens e tome uma atitude diante das suas representações, fazendo emergir a pedagogia da representação.

Giroux e Mclaren propõem a pedagogia crítica da representação, assentada em ideais que possibilitam a leitura e a interpretação de imagens, para desmistificar seu poder convincente, que nos leva a aceitá-las, mostrando o teor de sua mensagem e permitindo a construção de leitores ativos e críticos. Assim, desmembra as múltiplas faces que mascaram a representação da imagem. Esses autores (1995, p.144) ratificam sua ideia, alegando o seguinte:

Uma pedagogia crítica da representação reconhece que habitamos uma cultura fotocêntrica, auditiva e televisual na qual a proliferação de imagens e sons eletronicamente produzidos serve como forma de catecismo da Mídia, uma pedagogia perpétua, através da qual os indivíduos ritualmente codificam e avaliam os envolvimentos que fazem nos vários contextos discursivos da vida cotidiana.

Considerando os aportes dos autores, a pedagogia crítica da representação denota perspectiva de desenvolvimento no espaço da escola, porque problematiza a regra de funcionamento e circulação das imagens advindas da Mídia e se torna lócus de contestação das estruturas discursivas que impõem a representação social. Os signos icônicos, que alicerçam as representações sociais, poderão ser conhecidos, decodificados e reconhecidos pelos alunos, desde que seja fomentada a pedagogia da representação na escola, pois ela fornece ferramentas que desnaturalizam convenções ideológicas, pondo em xeque os conteúdos da Mídia, tornando-os visíveis e abertos aos questionamentos. Assumir um discurso contra-hegemônico, para criar a possibilidade de resistência à opressão dos grupos que dominam o fluxo das informações proferidas pela Mídia, configura meta da pedagogia da representação (GIROUX e MCLAREN, 1995).

O profissional da educação que assumir a pedagogia crítica da representação estará cultivando a dimensão política do aluno, assentada no espírito da investigação e da reflexão. Para tanto, é nevrálgico que ele seja alfabetizado para a Mídia, que enxergue a realidade global e que interfira no local. Dito de outra maneira, que o educador conheça os efeitos causados pelas ideologias massificantes e que possa intervir, favoravelmente, na realidade concreta dos alunos, principalmente daqueles desprovidos de uma leitura aguçada de mundo.

As imagens, com o seu conteúdo real e simbólico, que emanam poder atrativo e fascínio, penetram os espaços sociais e provocam mudanças em nossos relacionamentos, nossas aprendizagens e expressividade. Esse fato mostra o potencial pedagógico que elas carregam, porquanto podem ser utilizadas, pensadas e analisadas no espaço da escola, fazendo

emergir um processo de alfabetização para a Mídia. Alfabetizar para a Mídia não significa, nesse contexto, repelir, distanciar ou rejeitar a cultura midiática e seu contexto, mas apropriar- se criticamente dela e em favor dos interesses próprios dos jovens e dos adultos populares. Kellner (1995, p.107) mostra os benefícios da alfabetização para a Mídia:

O objetivo será desenvolver um alfabetismo crítico em relação à Mídia, um alfabetismo que contribua para tornar os indivíduos mais autônomos e capazes de se emancipar de forma contemporânea de dominação, tornando- se cidadão/ãs mais ativos/as, competentes e motivados/as para se envolverem em processos de transformação social.

De posse dessa ideia, reconhecemos a relevância do processo de conscientização para a Mídia, o que permite abertura no terreno cultural para a análise crítica, na qual o indivíduo ocupa lugar de destaque, pois desempenha papel ativo na reconstituição de novas estruturais sociais. Ao interpretar os textos sociais, o indivíduo sinaliza que já detém um considerável repertório de informações e de competências cognitivas para atuar eficazmente no seu cotidiano, ressignificando sua postura frente ao mascaramento da realidade social. Ser portador da competência da leitura de imagem, em que se reconhece o processo de legitimação, de exploração e de dominação da realidade, significa estar em constante rastreamento da indústria cultural, trazendo à tona o engenho que produz conhecimento da contradição e da oposição, em que gera processos de marginalização e de ascensão das diferentes classes socais.

Pensar no potencial humano e permitir que ele se desnude do véu da ignorância e rescinda o seu confinamento social, mobilizando saberes essenciais à sua vida e decifrando os signos da linguagem imagética é o que propõe Kellner (1995, p. 105), que postula assim a pedagogia crítica:

E assim precisamos aprender a ler essas imagens, essas formas culturais fascinantes e sedativas, cujo impacto massivo sobre nossas vidas apenas começamos a compreender. A educação certamente deveria prestar atenção a essa nova cultura, tentando desenvolver uma pedagogia crítica que estivesse preocupada com a leitura de imagens. Um tal esforço seria parte de uma pedagogia radical que tentasse ir à raiz de nossa experiência, nosso comportamento e conhecimento que objetivasse a liberação da dominação e a criação de novos eus, plurais, fortalecidos e mais potentes-ideais, características tanto da teoria moderna quanto da pós-moderna.

uma pedagogia crítica que auxilie o aluno a ler a imagem. Ele argumenta que a cultura da imagem vai nos moldando, construindo socialmente os nossos eus, predeterminando comportamentos, experiências e linguagens.

Partindo dessas propostas, a escola passa a ser o locus de discussões da cultura midiática e a exigir dos professores uma postura crítica acerca da linguagem imagética e consumista da Mídia, de forma que instrumentalize o aluno para que possa enxergar as estruturas de produção do capitalismo que geram o consumismo, a exclusão, as disparidades de classes e a negação dos direitos do cidadão.

No tocante ao aluno da EJA, por exemplo, o texto escrito é considerado referência e exigência social, em que o indivíduo precisará possuir devida competência para poder se sobressair em suas práticas sociais. Nessa modalidade, porém, eles detêm uma bagagem de conhecimento oral sobre o mundo, que é marcadamente imagética, por isso a imagem é um poderoso recurso pedagógico no processo de alfabetização e de letramento dessas pessoas, posto que permite uma leitura das suas produções e do meio. Dessa maneira, os alunos da EJA poderão interagir com essa realidade e estabelecer um diálogo com as diferentes linguagens e imagens, para apreciar sua mensagem. Belloni (Apud PORTO, 1998, p. 26) enfatiza que é preciso educar esse estudante para as diferentes linguagens:

(...) é preciso educar o olhar, o ouvido, a percepção para preparar os estudantes para serem sujeitos ativos do processo de educação e de comunicação, sujeitos capazes de pensar, criar e expressar-se por meio de diferentes linguagens. A escola, além de educar o aluno, o receptor crítico, precisa formar o professor usuário dessa comunicação (...).

Como se vê, há uma necessidade de educar nosso olhar e nossa escuta, nossa percepção e inteligência, a fim de que possamos compreender e conhecer as linguagens da Mídia. Com o desenvolvimento dessa competência, podemos analisar, com mais profundidade, as formas e os conteúdos da mensagem veiculada.

Problematizar a questão da imagem, no âmbito da escola, especificamente na EJA, significa “lançar sementes” para se conquistar a autonomia do indivíduo. É também possibilitar conhecimentos que conscientizem o olhar daqueles que passam horas em frente à TV, à internet e a outros meios midiáticos eletrônicos.

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