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II DO QUE OS SUJEITOS PUDERAM NOS MOSTRAR AO QUE PUDEMOS COMPREENDER

2.1 As versões produzidas e contadas sobre e para as crianças-alunos

2.1.2 O QUE A ESCOLA 9 DIZ SOBRE ESSES ALUNOS

A professora/educadora na construção da criança-aluno fracassada

Para iniciarmos a exposição deste item, gostaríamos de esclarecer que, diferentemente do que o título pode sugerir, não se trata de uma pesquisa cujo teor é a culpabilização do professor pelo “fracasso” do aluno. Procuramos voltar o olhar para o contexto escolar e seus atores, bem como para as suas próprias falas e impressões.

9 Embora a escola deva ser compreendida como constituída por todos os atores envolvidos no processo

educativo – pais, professores, diretores, coordenadores, demais funcionários da educação e alunos -, vamos aqui considerar, para a nossa exposição, a escola como o conjunto dos agentes da prática educativa dentro da escola – professores, direção e demais funcionários.

Mais especificamente, nesta parte da pesquisa, trazemos as falas e as impressões dos próprios professores e demais agentes escolares. Reconhecemos o sofrimento pelo qual passa o professor, as suas qualidades, os desafios enfrentados e superados no dia-a-dia da sala de aula, o envolvimento afetivo com os alunos, a vontade de melhorar o seu trabalho através da busca de novos materiais, de atividades e projetos diferenciados; não há dúvida de que estes fatores devem ser levados em consideração quando se realiza uma pesquisa no cotidiano escolar. Por isso, e para não dar margem a uma compreensão errônea de que o professor é o culpado pelos problemas decorrentes da má qualidade da escola pública, as suas falas, ações, manifestações... estarão dimensionadas dentro do contexto político e social mais amplo. Salientamos, contudo, que devido às limitações da própria pesquisa, não podemos nos aprofundar nos aspectos referentes ao professor, pois poderíamos correr o risco de perder o objetivo maior de nossa pesquisa e o sujeito de nosso olhar – que é a criança-aluno considerada fracassada. O professor, no nosso caso, pode ser compreendido como um componente do cenário onde as crianças vão elaborar as suas representações. A seguir falaremos do professor a partir desta relação com a criança-aluno e da perspectiva proposta por esta pesquisa.

Assim, o olhar e o discurso, em especial das professoras, vêm carregados de preconceitos e de atitudes de desvalorização para com os alunos, havendo uma baixa expectativa quanto a sua competência intelectual, uma descrença na sua capacidade para a construção de novos conhecimentos, e uma crença sedimentada num tipo de comportamento hostil e anormal, reflexo, na opinião delas, de sua proveniência social e de seu modo de vida. Mas há também situações em que elas se mostram solidárias, preocupadas com as dificuldades de seus alunos e procuram alternativas para superar os problemas.

Deparamo-nos com diversas situações em que a atitude das professoras são violentas, agressivas e autoritárias, impedindo a defesa, imobilizando a ação e

impondo estereótipos, contribuindo para que o estigma de mau aluno, de pior classe se construa e se consolide no interior da escola. Contribui ainda para o estigma em relação às famílias desses alunos e para aquilo que eles imaginam que serão no futuro. Aceitar ou não o estigma é mais uma tarefa cotidiana dessas crianças/alunos.

Em relação à classe da 3aB, parece haver na própria escola o status de "pior", disseminado de tal forma que, por mais de uma vez, alunos de outras classes perguntaram se sabíamos que aquela era a pior classe da escola e que os alunos só bagunçavam.

Falas e ações que desqualificam os alunos foram freqüentes nas salas de aulas.

Assim, numa das primeiras observações na sala da 3aB, a professora, ao lado da carteira de Marcos, disse em voz alta, dirigindo-se a nós: “não é possível que um aluno na 3a série não consiga fazer nada”.

Tal atitude, além de desqualificar o aluno frente aos colegas e a um adulto estranho, ainda ataca a sua auto-estima, já tão deteriorada.

Enquanto os alunos realizavam as atividades de uma prova de matemática, Alessandra conversava consigo mesmo e passava batom. Catarina chamou-lhe a atenção “por que será que não aprende? Será o que que fica pensando, né, Alessandra?”

Noutro momento dirigiu-se novamente a Alessandra e disse: “Você não faz nada, mas tenho que ter uma prova de que não sabe, por isso tenho que colar – as atividades da prova. Não sabe fazer continhas simples, não vai fazer essa”.

Desta forma, a professora não investe em Alessandra: deixa-a com a sua angústia de não saber, reforçando apenas o seu sentimento de inadequação.

Agressões verbais, bastante impactantes, contra os alunos desta classe foram comuns.

Numas das aulas a professora Catarina foi bastante agressiva na solicitação de que os alunos ficassem em silêncio e disciplinados, chamando-os inclusive de “bichos”.

Em outra ocasião a professora Edna10 explodiu e disse a todos que eles eram “uns bichos”. “Uns animais no pasto, um bando” e que não escapava nenhum - "todos eram uns bichos". Em tom de desabafo, disse que aquela classe era impossível. Não estava acostumada com aquele tipo de comportamento e que aquela era a pior classe da escola.

Apesar de o estigma recair sobre a classe como um todo, sobre alguns alunos pesam mais os rótulos de agressivos, indisciplinados, incapazes, etc.

Desta forma, a professora Edna dirige-se a Leonardo, dizendo: “hoje você faz isto na classe, amanhã estará matando alguém na rua”. A fala é decorrente da desobediência de Leonardo ao pedido de silêncio e disciplina. Ao ser repreendido, ele continua rindo e olhando para os colegas.

A professora se exaspera paralisando os alunos. Leonardo se defende, agride, o que não significa desespero menor, mas talvez revele a descrença na escola como local em que possa aprender e ser respeitado.

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A aluna Bárbara é a primeira a terminar a atividade em uma determinada aula de reforço. A professora a elogia e pergunta se na classe da manhã ela também é assim. Ela não responde e João Luís diz que ela é "burra" porque não fala. A aluna Alessandra concorda com ele. Já João Luís é visto como aquele que não aprende porque não pára quieto, não presta atenção e é terrível. Portanto, contrário à Bárbara. Essas características depreciativas acompanham João Luís nos diversos momentos em que está na escola. Assim, no intervalo, João Luís corre pelo pátio, tira o boné de Valter, puxa os cabelos das meninas. Isaura mostra-se desolada com o comportamento de João Luís, Vera11 pergunta se ele tem algum problema. Isaura disse acreditar que sim. A cozinheira, que está próxima às duas, diz: “ele é inconsertável”, “é todo estragado”.

Desta forma, os alunos recebem rótulos de incapazes para a aprendizagem e para o convívio social. São vistos com olhares suspeitos, como “objetos estragados” e “inconsertáveis”, não somente pelas professoras, mas por toda a escola, seja porque aparecem demais ou porque aparecem de menos. O estigma, portanto, ultrapassa as paredes da sala de aula.

Na sala de reforço, as atitudes de desqualificação não são diferentes das da sala da 3aB; entretanto, a primeira preocupação da professora é saber qual é a constituição familiar dos alunos, adepta da crença de que a desestruturação familiar pode causar problemas emocionais e dificuldades para aprender. Assim, desqualifica também a família na medida em que a culpabiliza pelos problemas pedagógicos que os filhos – seus alunos – vêm enfrentando.

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A desqualificação se traduz às vezes numa total descrença no aluno e pode levar à expulsão. Assim, Isaura pega João Luís pelo braço e diz que ele não tem jeito mesmo, “se continuar daquele jeito não precisa vir mais, pois só atrapalha”.

A desqualificação quase sempre é explícita, incisiva e constrangedora.

Enquanto copiavam a professora pegou os cadernos de Valdir e começou a olhá-los. Dizia: “Isso é um absurdo”, “é terrível”. O aluno mostrou-se constrangido e continuou copiando da lousa. Os conteúdos dos cadernos de Valdir são cópias, quando há alguma atividade em que precisa escrever sozinho a sua escrita/texto se resume às letras TMÃO. O que ele busca expressar com a sua escrita é ignorado, escreve para si próprio, o sonho não se revela e a escrita só serve para reproduzir o que na lousa a professora determina.

A violência verbal também é explícita e muitas vezes destitui o aluno de qualquer direito.

Assim, pouco depois de entrarem na sala de aula, a professora retirou Vitor12 de seu lugar e o colocou na última carteira de uma das fileiras. Vitor abaixou a cabeça e começou a chorar. Ele continuava de cabeça baixa, quando a professora lhe chamou a atenção perguntando se ele não ia fazer nada, “de novo”. Ele respondeu quase chorando que ela o tinha tirado do seu lugar. Ironicamente, ela perguntou se ele tinha comprado aquele lugar, pois “as coisas só são da gente quando nós compramos” e disse-lhe que fizesse os exercícios senão chamaria novamente os seus pais.

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Esta atitude serve para incutir o princípio da propriedade privada – máxima do capitalismo selvagem – levado ao seu extremo, ao desapropriá-lo do mundo escolar, espaço que por direito deveria ser (também) dele.

A violência em relação aos conteúdos, à leitura e à escrita também aparece, principalmente quando o aluno não corresponde ao esperado pela professora. Desta forma, Catarina chama a atenção do aluno Adilson, dizendo que “nem mesmo ele” é capaz de entender o que escreve. Disse que da próxima vez irá arrancar a folha de seu caderno e fazê-lo fazer novamente a lição. Na aula de reforço Isaura toma leitura individual de Davi13. Ele não consegue ler. Ela lhe diz que nem mesmo ele entende o que havia escrito - “Se copia errado não consegue entender mesmo”.

A frustração frente à dificuldade de aprendizagem dos alunos era constantemente frisada pela professora do reforço, que dizia “é um absurdo” e “eu não acredito”, quando os alunos erravam ou diziam que não conseguiam aprender ou fazer alguma atividade. Sempre que isso acontecia, ela dizia que era um absurdo e que eles não aprendiam por preguiça de fazer ou de pensar. Em uma das aulas, João Luís retrucou dizendo que ele não tinha preguiça. Ela pediu então que ele calasse a boca e a respeitasse.

Outra forma de violência se dá quando o aluno é inquirido frente à classe, mas não tem direito à defesa.

A professora chamou a atenção da aluna Paula, querendo saber o motivo de ela faltar tanto à escola. Já adiantando a resposta, de forma depreciativa, perguntou se era por preguiça ou se era por que ela perdia a hora. A professora insistiu, mas Paula nada respondeu. Mas o que ela deveria responder? A professora já não tinha todas as

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respostas? As alternativas que a professora ofereceu não a satisfaziam e ela não daria outras opções. Noutra ocasião, ao fazer a chamada, a professora constatou que o aluno Vitor havia faltado e disse “ele vem um dia e falta dois”.

Há um tipo de violência que se faz mais intensa e mais constrangedora.

Quase ao final da aula, o aluno Tiago arrancou uma folha de seu caderno, a professora gritou com ele dizendo que ele não sabia o quanto aquilo custava e que não adiantava pedir outro. Disse que se ele trabalhasse saberia como é duro o trabalho. Por que o trabalho é duro? O que o faz tão penoso para essa professora que demonstra uma total falta de energia para lidar com seus alunos? Tiago respondeu que trabalhava e sabia como era. Ela disse que ele não sabia e encerrou a conversa.

A maioria dos pais dos alunos dessa escola é trabalhador rural e muitas crianças ajudam nos finais de semana; portanto, elas sabem da dureza desse trabalho.

Outro momento de violência explícita e causadora de grande mal-estar na sala de aula se deu quando Catarina pediu a Tiago e João Luís que se sentassem direito, que virassem para a frente e fechassem a boca. Tiago resmungou e disse que a professora era chata. Ela lhe disse “cala a boca, vê se não perturba, não. Não faz nada, então cale a boca”. Depois dessa fala, mudou Tiago, à força, de lugar, arrastando-o até a última carteira da primeira fileira, longe dos demais alunos. Ele reagiu dizendo que não queria e não ficaria lá e se sentou em outra carteira. Catarina disse para ele voltar para a carteira onde ela o havia colocado. Ele resistiu, e ela disse “Você não vai fazer o que quer”, “aqui na classe quem manda sou eu”. Catarina o levou arrastado para a diretoria.

A atitude da professora demonstra um extremo autoritarismo e a dificuldade que encontra para dialogar e buscar uma solução menos perturbadora e

estigmatizadora. Mas por que esta atitude de Catarina para com Tiago? Já não é conseqüência dos estigmas consolidados? Tiago é visto por vários na escola como aquele aluno que sabe, mas não se interessa em fazer nada. Aliás, Tiago, na opinião deles, só quer fazer o que gosta.

Precisamos pensar então por que algumas crianças “não querem aprender ou não querem fazer”. Para Alicia Fernandez, no processo ensino-aprendizagem, pode ocorrer o que ela denomina de “problema de aprendizagem reativo”, que se dá quando há um choque entre a instituição educacional, “que funciona explusivamente”, e a criança. No caso de Tiago, mas não só dele, o vínculo com a instituição está marcado pelo lugar do fracassado; portanto, não aprender só pode ser uma reação – um rebelar-se – contra o estabelecido. Segundo Fernandez (1991, p.88), “não aprendemos de qualquer um, mas daquele a quem outorgamos confiança e direito de ensinar”. Bem, se não se sentem amados e respeitados, também “não aprendem” ou “não querem aprender”. Assim, algumas crianças se colocam ou são colocadas no lugar de fracassadas por se oporem às formas violentas de vínculo estabelecidos com elas na escola.

A atitude insensível da professora é mais uma violência que atinge a história de vida dessas crianças. Um exemplo desse tipo de ação se deu quando Tiago disse que não iria pintar a mensagem para o dia das mães. Catarina disse que, se ele não o fizesse, ela não lhe entregaria e sobraria mais para outros que quisessem. Disse que, se fosse mãe dele, “teria vergonha de ter um filho assim e nem iria à comemoração”.

A agressão foi tão intensa que Tiago ficou cabisbaixo e pensativo. Talvez pensasse que realmente a mãe tem vergonha dele, pois é filho adotivo e um dos maiores medos de seus pais é que ele se torne igual aos pais biológicos: alcoólatras e “vagabundos”. As queixas da escola tendem a aumentar o temor dos pais quanto ao futuro do filho, assim como reforçam as atitudes punitivas para com ele.

A violência se dá também fora da sala de aula. Assim, o estigma de maus alunos acaba refletindo na maneira como os funcionários se relacionam com eles.

Durante o intervalo as crianças, como de costume, foram tomar lanche. A merendeira foi muito agressiva com Eduardo, chamando-o de “espertinho” pois, na sua interpretação, ele queria pegar bolachas duas vezes. A merendeira também chamou Valdir de “folgado” pois, para ela, ele toma lanche duas vezes, já que estuda no período da tarde. Mas o que houve foi um equívoco da mesma, já que nem um e nem outro tomaram lanche anteriormente uma vez que estavam na sala de aula.

A desvalorização do aluno tanto nos conhecimentos que tenta expor, como na sua fala, faz parte da prática do cotidiano de sala de aula. Assim, o aluno Valter leu razoavelmente bem o texto que a professora havia solicitado; contudo, mostrou-se lento para escrever. Isaura chamou sua atenção para que copiasse mais rapidamente; como não conseguiu o seu intento, começou a dizer que ele não copiava por preguiça e perguntou aos seus colegas se de manhã (classe da 4a série) ele também era assim.

Por não ser correspondida, a professora vale-se de uma atitude de desvalorização, dá a entender que aquele aluno não tem jeito mesmo. Aliás, essa foi a atitude adotada por Isaura no seu relacionamento com Valter e João Luis.

Em uma das aulas, João Luís conversava com Valter. Isaura o tirou de seu lugar e pediu-lhe que ficasse em silêncio e copiasse. João Luís reclamou que a carteira era muita alta, “muito ruim”. Ela lhe disse “preguiça. Tudo é difícil”. João Luís continuou conversando com Valter. Ela pediu para copiarem, pois depois tomaria a leitura. João Luís disse que não copiaria porque não sabia. Isaura perguntou porque ele vinha para o reforço. João Luís disse que vinha “porque não posso faltar”.

A partir deste acontecimento, Isaura passou a deixá-los de lado, desejava apenas que colaborassem fazendo silêncio, mas deixou claras as providências que tomaria, caso fossem seus alunos: “se vocês fossem meus alunos vocês ficariam de castigo todos os dias”.

Outra maneira de desvalorização e de violência para com o aluno e a sua forma de vida pôde ser exemplificada quando Isaura entregou um livro de histórias infantis a Luís, e de forma agressiva mandou-o lavar as mãos porque “não queria nenhum porco ali na classe”. Luís resmungou e Isaura disse que se ele tinha ido também para bagunçar arranjaria um jeito de expulsá-lo.

Essas crianças vivem numa constante insegurança. Ninguém as deseja. Ameaças de punição e de expulsão são corriqueiras. Se a hostilidade é o que move a relação professor/aluno como é possível que os alunos estabeleçam um outro tipo de relação com a escola?

Atualmente, a violência tem sido tema de muitos trabalhos e mesmo de argumentos para reportagens da grande mídia. Discute-se com muita ênfase a violência na escola, do aluno para com o outro, e a violência contra a escola. Entretanto, pouco se questiona sobre as violentas relações que se estabelecem com esses alunos. Relações que os destituem dos seus direitos básicos, que atacam a sua auto-estima, que os relegam a quase nada na medida em que não lhes permitem que se apropriem do conhecimento que ali deveria ser construído e compartilhado. Ainda, as relações afetivas são impossibilitadas e, quando ocorrem, se dão por meio de um olhar de piedade, que de novo os coloca como incapazes, como aqueles que devem ser tutelados e assistidos por quem detém o saber e o poder.

Outra forma de desrespeito e desconsideração para com os alunos são as promessas que, de antemão, sabe-se que não poderão ser cumpridas. Assim, antes de

terminar o horário da aula, a professora Edna interrompeu o filme dizendo que continuaria no dia seguinte, pois faltava muito para terminar e ela precisava dar um recado a eles. Este filme não teve continuidade no dia seguinte pois quem deu aula foi a professora titular, fato que a professora substituta sabia que iria acontecer.

As falsas promessas são feitas como estratégias de controle e manutenção da ordem, e quase sempre não funcionam pois os alunos também sabem que não serão cumpridas.

Edna pediu várias vezes aos alunos que ficassem em silêncio. Prometeu-lhes que, na aula seguinte, se eles ficassem quietos, iria trazer o gravador com uma fita “bem legal” de música clássica. Os alunos acharam legal, mas queriam uma fita com música de capoeira. Ela disse que não. Novamente a professora fez uma promessa sabendo que não poderia cumprir, pois não daria aula nesta sala no dia seguinte.

A ausência de escuta muitas vezes resulta em humilhação, colocando o aluno em situação vexatória diante dos colegas.

Catarina dirigiu-se a Daniel e Adilson “Estão fazendo rolo de novo?” Daniel: "Não, só estou olhando o desenho dele”. Catarina: “É melhor você se sentar no seu lugar, já que não está fazendo nada mesmo”. “Senão vai dar problema para o seu lado também”. Referia-se ao episódio em que levou Tiago arrastado para a diretoria. Não escuta a fala do aluno e ainda o ameaça.

A agressão também se faz presente nos momentos em que os alunos cumprem o solicitado pela professora, causando surpresa e estranheza. Catarina foi até o grupo no qual Bárbara estava e lhe pediu, em tom agressivo, que se sentasse na cadeira: “não precisa subir na cadeira”. Bárbara estava ajoelhada na cadeira enquanto pintava um desenho. Havia entusiasmo enquanto trabalhava mas, após a advertência

da professora, ela se mostrou menos animada e sem graça. A atitude é cruel, pois barra o desejo, é como “jogar água sobre o fogo que começara a se formar”. Que entusiasmo terá essa criança para aprender?

Às vezes, os professores tendem a fazer perguntas que na verdade não são feitas com a intenção de obterem respostas. Quando Isaura fez a chamada, perguntou se eles sabiam o motivo de os demais alunos não estarem indo ao reforço. Bárbara respondeu que Marcos ficara na esquina jogando “burquinha”. A professora respondeu que não tinha nada com isso e que ela veio para dar aula na escola e não para ficar buscando aluno na rua.

Para manter a disciplina, ou para conter a indisciplina, os professores recorrem a vários subterfúgios, desde os mais amenos até a agressão explícita.