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3. Os Manuais

3.2. O manual escolar

Partindo das palavras de Ferreira (2013): “O manual escolar é o recurso didático mais utilizado pelos professores e alunos no processo de ensino-aprendizagem.” (p. 18). Propôr uma análise do manual escolar, enquanto instrumento potenciador do trabalho em sala de aula, coloca-nos perante algumas questões fundamentais: Qual será a importância deste material nas aulas de hoje em dia? Como é que podemos tirar o melhor partido do mesmo? Antes de pensarmos nestas questões, é necessário definir o que é o manual escolar. Até quase metade do século XX, os estudos relacionados com este material eram muito escassos, sendo os historiadores os primeiros a verem o recurso como algo que deveria ser abordado e examinado. Porém, apenas nos anos 70, como refere Choppin (2002), diversos investigadores começam a demonstrar que o manual escolar é algo que deve ser estudado.

Ao longo dos anos, este material foi tendo várias nomenclaturas, desde “livros de leitura”, ou “livros de texto”, nomes que “remetem tanto ao conteúdo intelectual, ao suporte material, a uma ou outra de suas múltiplas funções” (Choppin, 2008b, p. 25). Atualmente, pode dizer-se que houve uma transposição, em alguns casos, e noutros, uma generalização

para o termo “manual”, após o seu uso por diversos investigadores (Santo, 2006; Choppin, 2008).

Podemos ainda referir a definição apresentada no Diário da República, Decreto-Lei n.º 369/90, de 26 de novembro, Artigo 2.º: “(…) entende-se por manual escolar o instrumento de trabalho, impresso, estruturado e dirigido ao aluno, que visa contribuir para o desenvolvimento de capacidades, para a mudança de atitudes e para a aquisição de conhecimentos propostos nos programas em vigor (…).” (p. 4936). Esta conceptualização de caráter político determina a função do manual em apoiar os alunos a atingir e desenvolver as capacidades definidas pelo programa (Martins, 2012).

Gérard e Roegiers (1998), ao falarem do manual, determinam-no como “um instrumento impresso, intencionalmente estruturado para se inscrever num processo de aprendizagem, com o fim de lhe melhorar a eficácia.” (p. 47), ou seja, há uma generalização do termo, não havendo tanto foco no programa, mas sim a sua integração no processo de aprendizagem.

Voltando ao contexto nacional, Viseu e Morgado (2011) apresentam uma definição mais sucinta do manual como “uma pequena obra de fácil manuseamento e que integra conteúdos considerados fundamentais para uma dada disciplina ou área de saberes, sem prejuízo de poderem existir vários manuais sobre a mesma temática, elaborados por distintos autores e editoras.” (p. 992).

Para além de definirmos o que é o manual, é ainda importante reconhecermos a diferença entre os manuais que existem no que concerne o seu utilizador: o professor e o aluno. O manual para o professor, segundo Gérard e Roegiers (1998), apresenta-se com diferenças segundo o seu “carácter aberto ou fechado” (p. 91).

O termo manual fechado aplica-se no sentido deste recurso ser considerado um apoio ao livro do aluno, havendo um foco nas orientações pedagógicas que o docente pode seguir de forma a complementar os exercícios preteridos pelo manual dos aprendentes, ajudando a melhorar as suas práticas, quase como um complemento (Ibidem). Outras nomenclaturas, segundo os autores, como “guia pedagógico” ou “livro do professor” são alguns dos exemplos que estes tipos de manuais podem ter. Ademais, Santo (2006) determina alguns pontos que estes manuais devem seguir, a saber: “1) Informação científica e geral; 2) Formação pedagógica ligada à disciplina; 3) Ajuda nas aprendizagens e na gestão das aulas; e um 4) Apoio na avaliação das aquisições.” (p. 106).

O manual aberto está iminentemente ligado a um grau de reflexão maior por parte do docente, fornecendo ao professor diferentes “propostas relativas à condução da aprendizagem em geral.” (Gérard & Roegiers, 1998, p. 91). Outra característica fundamental que estes tipos de guias têm é o seu grau de independência do livro do aluno, podendo, contudo, fazer referência a este. Em termos terminológicos, os autores atentam para o facto de muitas vezes partilharem as mesmas denominações que os tipos de manuais precedentes, como livro do professor ou manual do professor, por isso é necessário rever este instrumento segundo a sua função e não segundo o nome que o determina.

A variedade de recursos didáticos existentes hoje em dia não impede o professor de considerar o papel relevante que o manual escolar tem nas suas aulas (Vieira, 2016), sendo as suas vantagens significativas. Sobre isto, Brito (1999) refere que: “Os manuais escolares constituem um auxiliar relevante entre os instrumentos de suporte destinados ao processo de ensino-aprendizagem e que favorecem o processo educativo” (p. 139). Ademais, a autora, posteriormente, indica que:

“(…) o manual escolar tende a vincular a ideologia dominante e, embora nem sempre se preste atenção à sua “música”, porque é demasiado silenciosa, a verdade é que ela é “ouvida” e “divulgada”, sensivelmente, na Escola, instituição que, neste processo, desempenha um papel dominante”. (Ibidem)

O texto supracitado demonstra, ainda hoje, o papel do manual escolar no processo educativo, não só como apoio ao professor, mas também ao aluno.

Este recurso pode ser algo bom para o professor, como afirma Vasconcelos (2012), pois apresenta um seguimento dos Programas para as diferentes disciplinas, mas também oferece uma forma diversificada de ensinar, dado os diferentes exercícios que contém.

No entanto, Brito (1999) alerta que: “(…) é o manual escolar, transformado num instrumento todo-poderoso, que influencia e determina a prática pedagógica (…) como uma “bíblia”, cujo conteúdo é totalmente assumido como única verdade (…)” (p. 142). Com esta afirmação, a autora acautela os professores para o uso do manual escolar como único material estruturador das aulas.

Para não cair neste erro, é ainda importante atentar nas informações que o manual do professor contem. Gérard e Roegiers (1998) dividem estas em três: essencial; complementar; e pedagógica (p. 93). No primeiro caso, a informação essencial é aquela dada ao docente, mas não presente no manual do aluno, para que o professor possa ajudar o aprendente a procurá-la. A informação complementar é aquela que vai apoiar o professor com algo que não conhecia e que irá “enriquecer as aprendizagens” (Ibidem). Por último, as informações pedagógicas são aquelas que não estão ao acesso do docente, pressupondo uma autonomia pedagógica maior por parte do mesmo.

Carvalho (1999) fala do manual como um “elemento estruturador dos conteúdos de determinada disciplina e dos processos da sua transmissões (…)” (p. 179), assumindo a importância, deste modo, do recurso fundamental que é o manual escolar. Ademais, Martins (2012) refere ainda que “os manuais escolares ocupam hoje um lugar de referência no panorama dos materiais didáticos.” (p. 114), reafirmando as possibilidades que este material tem em relação aos outros.

Por estes motivos é importante analisar o produto final que a editora oferece aos professores, de forma a que seja o melhor para as necessidades dos alunos e para um recurso do qual o professor possa retirar o melhor (Oliveira, 2014).

A análise dos manuais escolares tem sempre uma base na lei, ou seja, “(…) não pode abstrair-se dos contextos legislativos e normativos que o regulamentam ou que regulamentam a sua concepção, produção, difusão, financiamento e utilização.” (Choppin, 2008, p. 12). Isto está claramente ligada com as adoções dos manuais escolares, cabendo às entidades reguladoras, como o Ministério da Educação, que devem ter em mente a utilidade do mesmo aquando da escolha deste recurso (Brito, 1999).

A escolha, avaliação e cerificação de um manual escolar é feita por uma comissão definida por despacho do Ministério da Educação que, segundo Ferreira (2013), dispõe:

“(…) de autonomia científica, técnica e pedagógica, organiza-se por ciclo, por ano de escolaridade, por disciplina ou por área curricular e é constituída por um mínimo

de três e um máximo de cinco especialistas, tais como docentes e investigadores do

ensino superior das áreas científicas e pedagógicas, docentes do quadro de nomeação

membros de sociedades ou associações científicas e pedagógicas de área relacionada

com a avaliação em causa.” (p. 19)

Os membros que integram a comissão de escolha dos manuais escolares têm uma função basilar, pois são aqueles que definem critérios e escolhem o manual a adotar por aquele grupo disciplinar. Porém, Brito (1999) atenta para que os elementos que constituem a comissão devem manter “sempre (…) uma posição crítica para que, com êxito, os nossos alunos sejam como os frutos que ultrapassam as promessas das flores” (p. 147). Esta metáfora de Brito (1999) é reforçada, posteriormente, por Martins (2012) que atenta para que: “Usado sem crítica e, portanto, sem escolha consciente e sem critério, restringe os movimentos dos sujeitos.” (p. 108), sendo que, neste caso, os sujeitos são tanto os alunos como os professores que utilizam esse recurso didático.

A “posição crítica” que é defendida pode ser confrontada com o que é definido QECRL:

“Embora possam desejar fazê-lo, os autores de manuais e os organizadores de cursos não são obrigados a formular os seus objectivos em termos das tarefas para a

realização das quais desejam que os aprendentes estejam preparados ou das

competências e das estratégias que devam desenvolver.” (Conselho da Europa, 2001, p. 198)

Este documento acrescenta ainda que a grande função de quem organiza um manual escolar é que estes são: “obrigados a tomar decisões concretas e pormenorizadas acerca da selecção e progressão dos textos, acerca das actividades, do vocabulário e da gramática, a serem apresentados ao aprendente.” (Ibidem)

Ou seja, podemos concluir que a seleção de um manual escolar apresenta algumas dificuldades para as comissões e até para os próprios professores, no entanto é necessário ter sempre o aprendente em mente quando se faz esta escolha, equacionando a forma como o manual está escrito, a clareza das instruções das tarefas, entre outros fatores, como as funções

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