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Escolha do local de implantação e do tipo de barragem

No documento ESTRUTURAS HIDRÁULICAS. Barragens (páginas 30-37)

1. INTRODUÇÃO

1.4. Escolha do local de implantação e do tipo de barragem

Considerações gerais

A selecção do local de construção e do tipo de barragem a construir deverão ficar definidos nas fases de planeamento e projecto. Os estudos preliminares poderão apontar para vários tipos possíveis. A alternativa a projectar é definida tendo em conta considerações

de ordem técnica, económica e ambientais. A selecção do tipo de barragem poderá exigir a cooperação entre economistas, hidrologistas, geólogos, engenheiros hidráulicos e de estruturas, de modo a ter em conta os diferentes factores que influenciam a selecção – a topografia, a hidrologia, a geologia e condições das fundações, a disponibilidade em materiais, a sismicidade do local e a economia.

Figura 1.14. Planta da Barragem de arco-gravidade de Castelo de Bode (CNPGB).

Figura 1.15. Transmissão dos esforços aos encontros e à fundação numa barragem de arco- gravidade (Barragem de Castelo de Bode).

Topografia

A morfologia do vale joga um papel da maior importância na definição da localização e do tipo de barragem a construir. Nessa definição, dever-se-á ter em conta a configuração do terreno a ocupar pela albufeira e pela barragem, mas também as acessibilidades ao local de construção e a possíveis locais de empréstimo de materiais.

Figura 1.16. Corte transversal de uma barragem de contrafortes (barragem da Pracana, CNPGB).

Figura 1.17. Panorâmica de uma barragem de contrafortes (barragem da Pracana, CNPGB). A implantação ideal e mais económica para a barragem será numa garganta apertada com encostas estáveis precedida a montante por um alargamento acentuado do vale, com talvegue de fraco declive (ideal <1%). Esta localização ideal, que permitirá maximizar o volume da albufeira e minimizar a dimensão (volume) da barragem, raramente se encontra na natureza.

Para determinar o volume de água possível armazenar é necessário possuir um levantamento topográfico. Para as pequenas barragens (com áreas inundadas abaixo dos 500 ha) pode fazer-se um levantamento topográfico clássico nas escalas 1/2000 a 1/10000, com curvas de nível lançadas de metro a metro ou de 5 em 5 metros. Para áreas inundadas acima dos 500 ha, deve recorre-se à aerofotogrametria.

Figura 1.18. Planta de uma barragem de contrafortes (barragem da Pracana, CNPGB). Para calcular os volumes de água acumulados há vários métodos. Na planta obtida por processos topográficos medem-se, a planímetro, a área circunscrita por cada curva de nível. Se a equidistância entre curvas de nível for pequena, por exemplo um ou dois metros, não haverá grande erro se se calcular o volume total acumulado V através do somatório dos volumes parciais entre duas curvas de nível consecutivas

⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ + = + E 2 A A V Cj Cj 1 (1.1)

em que E é a equidistância natural e ACj e ACj+1 são, respectivamente, as áreas circunscritas pela

curva de ordem j e pela seguinte.

Se a equidistância for grande, é melhor usar a expressão

(

)

(1.2) ∑ + + = ACj ACj+1 ACjACj+1 3 E V

Um outro processo, usado quando se deseja rapidez no levantamento, consiste em seccionar a albufeira em vários perfis transversais equidistantes. A semi-soma entre as áreas de duas secções consecutivas, respectivamente Aj e Aj+1, multiplicada pela respectiva distância d dá o volume parcial

acumulado entre os dois perfis. O volume total acumulado será, assim, determinado através da expressão ∑ ⎟⎟ ⎠ ⎞ ⎜⎜ ⎝ ⎛ + = + d 2 A A V j j 1 (1.3)

• um vale estreito, com encostas abruptas e rochosas, sugere a construção de barragens de enrocamento ou de betão, com o evacuador de cheias, a descarga de fundo e a tomada de água (ou pelo menos alguns destes órgãos) incorporados na barragem;

• um vale largo, de vertentes suaves e em terra, sugere a construção de barragens em terra, com o evacuador de cheias independente do corpo da barragem, podendo, porém, ser mais favorável uma solução de barragem de betão, de gravidade ou de contrafortes.

A localização do evacuador de cheias, o órgão de segurança mais importante, é um factor determinante na escolha do tipo de barragem a construir e que é fortemente influenciada pela topografia local.

Esta leitura inicial das condições do terreno deverá ser, contudo, confirmada pelas condições das fundações.

Hidrologia

Na maioria das situações, é o volume de água necessário ao fim em vista, ou o volume útil a dar à albufeira, que condiciona toda a concepção da barragem. Normalmente, o que se pretende é garantir um volume de água suficiente para o fim em vista durante um determinado período, ou um volume disponível para encaixar e amortecer cheias, caso das albufeiras de detenção (ou retenção).

O primeiro trabalho a realizar, por isso, é determinar sobre a carta topográfica os volumes de água acumulados (usando um dos métodos apresentados), considerando a altura a dar à barragem e os diferentes locais de construção possíveis.

O segundo trabalho a realizar é exclusivamente de natureza hidrológica – verificar se, para a bacia hidrográfica referida à secção de implantação da barragem, as afluências asseguram o armazenamento pretendido, sem se ultrapassar o risco pré-definido.

A definição da cheia de projecto e, consequentemente, do caudal de dimensionamento dos sistemas evacuadores de cheias, é também definida através dos estudos hidrológicos.

As barragens de betão e de alvenaria respondem melhor às incertezas associadas a estes estudos hidrológicos ou à inexistência de dados hidrológicos de base fiáveis, uma vez que podem ser facilmente galgadas, ao contrário das barragens de terra.

Geologia e condições das fundações

As características das diferentes rochas e solos em presença são importantes na definição dos materiais de construção a usar e no tipo de fundações a realizar. A natureza, a resistência, a deformabilidade, a fracturação e a permeabilidade das formações encontradas no local da construção constituem um conjunto de factores determinantes no tipo de barragem a construir.

As barragens rígidas em betão ou em alvenaria só permitem, com excepção das barragens de pequena altura, fundações em rocha sã. Pelo contrário, as barragens de aterro admitem fundações aluvionares, mas com boa resistência mecânica.

i)Fundações rochosas – Com excepção das rochas muito fissuradas e de má qualidade, as

fundações rochosas são adequadas para todo o tipo de barragens. Apresentam boa resistência aos esforços, à erosão interna e à percolação. Poderá haver necessidade de limpeza e remoção dos materiais muito alterados e tratamento eventual das fracturas através de injecções, sendo frequente em grandes barragens atingir-se uma profundidade de escavação de 10 m. O estudo das correspondentes características deverá ter em conta a resistência à compressão e ao corte da fundação e dos encontros e as suas deformabilidades.

ii)Fundações arenosas (ou com seixos) – Quando bem compactadas, servem sobretudo às barragens

de aterro, pelo menos do ponto de vista mecânico. As pequenas barragens de betão também poderão ser construídas, depois de asseguradas algumas precauções relativamente aos riscos de percolação e assentamentos diferenciados.

Estas fundações são muito permeáveis, podendo ficar sujeitas a elevadas taxas de percolação. Assim sendo, exigem habitualmente dispositivos de drenagem e de impermeabilização.

iii)Fundações areno-siltosas – As fundações de areia fina e/ou silte (limo) podem ser usadas nas

pequenas barragens de gravidade em betão e nas barragens de terra e não deverão ser usadas nas barragens de enrocamento. Os cuidados a ter em conta são, nomeadamente, os associados aos riscos de assentamentos diferenciados, percolação excessiva, erosão interna (também chamada erosão retrorregressiva ou “piping”) e necessidade de protecção da fundação contra a erosão junto ao pé de barragem de jusante.

iv)Fundações argilosas – As fundações argilosas permitem a adopção de barragens de terra, mas

requerem tratamento especial. Dando lugar a consideráveis assentamentos, especialmente se a argila é não consolidada e contem elevada percentagem de humidade, não são adequadas para suportar barragens de enrocamento e de betão. De facto, devido à necessidade de definir taludes pouco inclinados e à fraca resistência da argila ao corte, habitualmente não é económico construir barragens de enrocamento ou de gravidade em betão nessas condições.

Disponibilidade em materiais

A disponibilidade de materiais de construção em quantidade e qualidade suficientes localmente ou em zonas de empréstimo próximas condiciona, muitas vezes de forma decisiva, a escolha do tipo de barragem. Por exemplo, a disponibilidade local de boa terra em quantidade suficiente determina, quase sempre, a escolha de uma barragem de terra. Por sua vez, a existência de pedra de qualidade e quantidade suficiente é importante para as barragens de enrocamento, de terra com enrocamento superficial do(s) talude(s) (“riprap”) ou até para a obtenção de betão ciclópico para as barragens de betão.

A possibilidade de retirar esses materiais da área da albufeira permite aumentar a capacidade útil da mesma, minimiza a necessidade de limpeza superficial do terreno (retirada do horizonte superficial do solo, rico em matéria orgânica que iria contribuir substancialmente para a eutrofização das águas a armazenar) e minimiza geralmente os custos de transporte e de remoção dos materiais.

De modo geral, pode dizer-se que, se se dispuser de solos limosos ou argilosos de qualidade (teor em elementos finos, plasticidade e estado) e em quantidade suficiente (1,5 a 2 vezes o volume do aterro), adopta-se, quase sempre, como solução a barragem de terra homogénea ou zonada. Se se dispõe de materiais impermeáveis em quantidade limitada e materiais grosseiros e/ou pedra em quantidade suficiente, a solução a adoptar é, habitualmente, uma barragem de terra zonada ou de enrocamento com núcleo impermeável. Esta solução exige a construção por zonas e restringe a possibilidade de mecanização da construção.

Se apenas se dispõe de materiais grosseiros, estes podem ser usados na construção do aterro, sendo necessária a construção de núcleo central impermeável ou a impermeabilização do paramento de montante (betão ou membrana).

Quase sempre, o tipo de barragem mais económico é o que garante a disponibilidade local (ou em sítios razoavelmente próximos) da maioria dos materiais a usar: terras para o aterro; pedras para enrocamento e “riprap”; areias, gravilhas e pedras para betão.

No Quadro 1.5, apresentam-se algumas indicações de ordem geral a ter em conta na escolha do tipo de barragem em função dos materiais disponíveis.

Evacuador de cheias. Caudal de dimensionamento e localização

O evacuador representa, habitualmente, uma parcela importante do custo da barragem e das obras acessórias.

Os condicionamentos impostos ao evacuador de cheias agravam-se com o aumento do caudal de dimensionamento. Esses condicionamentos dizem respeito à estrutura do evacuador e às condições topográficas e geotécnicas para a sua implantação. Não podem aceitar-se assentamentos diferenciados do evacuador que ponham em perigo a obra.

Nalguns casos, a possibilidade de incorporar numa barragem de betão o evacuador de cheias (e outras obras acessórias) pode aconselhar esse tipo de barragens.

Evacuadores de cheias com a estrutura sobre aterros de barragens de terra ou de enrocamento são de evitar, sendo só admissíveis excepcionalmente em barragens de pequena altura. Com efeito, são inevitáveis assentamentos diferenciais do aterro sobre o qual assentaria o evacuador, após a actuação da carga hidrostática correspondente à albufeira cheia. Tais assentamentos teriam vários inconvenientes: dar lugar ao arrastamento do material do aterro por fugas de água através de fissuras e juntas do betão; levantamento de lajes da estrutura, em resultado da actuação de elevadas pressões hidrodinâmicas quando o escoamento sobre o evacuador encontrasse lajes desalinhadas. Por outro lado, a superfície de descontinuidade terra-betão provoca, habitualmente, uma forte aceleração do mecanismo de erosão interna.

As soluções de evacuadores de cheias compatíveis com barragens de aterro são as de canal a céu aberto, nos encontros ou em portelas laterais, ou de evacuadores em poço seguidos de galerias escavadas na rocha ou construídas em betão, a céu aberto ou cobertas, fora ou através da barragem.

Quadro 1.5. Escolha do tipo de barragem em função da disponibilidade de materiais.

Tipo de barragem Materiais necessários Observações

Barragem em terra,

homogénea ou zonada - Material impermeável para todo o aterro (barragem homogénea), ou para o núcleo (barragem zonada) com qualidades mecânicas adequadas - A indisponibilidade de materiais suficientemente impermeáveis pode determinar a escolha da impermeabilização do paramento de montante - Materiais diversos de recarga nas

barragens zonadas

- Materiais para drenos e filtros - A sua qualidade insuficiente pode ser compensada com a utilização de geotêxteis Barragem mista:

terra+gabiões;

terra+gabiões+enrocamento

- Para além dos materiais já citados, dever-se-á assegurar a disponibilidade de pedra de boa qualidade e dimensões

adequadas

-Caixotões industriais de gabiões, de preferência

Barragem de enrocamento - Pedra em grande quantidade

- Materiais para impermeabilização - A impermeabilização superficial do talude de montante com recurso aos geotêxteis exige a respectiva disponibilidade a preços razoáveis e ainda de areia para as camadas de transição e protecção ao geotêxtil

- a existência de núcleo central impermeável de betão betuminoso exige

disponibilidade de areia e betume

Barragem de betão - Areias e agregados em grande quantidade e cimento a preço interessante

Barragem de alvenaria - Areias, agregados e pedra de boa qualidade

No documento ESTRUTURAS HIDRÁULICAS. Barragens (páginas 30-37)

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