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Esoterismo Ocidental: elementos constituintes de um imaginário

No documento MARCELO LEANDRO DE CAMPOS (páginas 41-43)

1.3 Esoterismo Ocidental Contemporâneo em perspectiva histórica

1.3.3 Esoterismo Ocidental: elementos constituintes de um imaginário

A fim de complementarmos nossa análise acerca dos aspectos que caracterizam o esoterismo ocidental moderno, vale discorrer mais detidamente sobre alguns dos elementos que estruturam o imaginário encantado e as práticas esotéricas que o caracterizam e que mais diretamente influenciaram o movimento gnóstico de Samel Aun Weor. Neste sentido destacamos a figura do guru ocidental e da Grande Fraternidade Branca, recorrentes entre os místicos acima destacados. Segundo as formulações de Peter Washington116, professor norte- americano de literatura, a emergência do esoterismo moderno ocorre a partir de duas dinâmicas estruturais: a consolidação da figura do guru ocidental - uma figura profundamente carismática que combina a atuação de um mestre espiritual oriental com as práticas de um mago ocidental - e, em paralelo, a construção de um imaginário fantástico em torno de uma fonte privilegiada de emanação do conhecimento espiritual. Esta última aparece associada a um grupo de seres supostamente dotados de capacidades especiais, responsáveis pelo próprio progresso espiritual de toda a Humanidade - a Grande Fraternidade Branca - e que constituem a fonte que legitima e autoriza, tanto o ensinamento transmitido pelo Guru, quanto o funcionamento da escola esotérica.

Guru é um termo sânscrito que pode ser traduzido como “professor”; tem diversos usos, mas, no hinduísmo - em especial na tradição vedanta - ele indica uma pessoa dotada da capacidade de transmitir conhecimento espiritual. Desse modo, acredita-se, um discípulo, para conseguir progresso espiritual, necessita colocar-se sob a orientação de um Guru.117

Como já dissemos, é Blavatsky que introduz no ocidente o imaginário em torno dos gurus himalaios, ao afirmar que estava em contato com um grupo de seres iluminados, membros de uma irmandade espiritual, a “Grande Fraternidade Branca”118

, encarregada de

115 SPEETH, Kathleen R. The Gurdjieff Work. Jeremy P. Tarcher: Los Angeles, 1989, p. 10-15. 116

Embora seja criticado pelas descrições biográficas carregadas de juízo de valor, Peter Washington é mais feliz em sua proposição de uma tipologia analítica sobre os líderes carismáticos do ocultismo.

117

VARENE, Jean. Yoga and the Hindu Tradition. Chicago: University of Chicago Press, 1977, p. 226.

118

Algumas coletâenas destas cartas podem ser vistas em SINNETT, The MAHATMA LETTERS to A. P. SINNETT from the mahatmas KH & M, publicado em 1926. Outro teósofo respeitável que testemunha as comunicações com os mestres é Charles Leadbeater; sua coletânea de cartas foi organizada e publicada por

dirigir a evolução de toda a humanidade. O primeiro deles seria seu mestre pessoal - Morya - com quem teria se encontrado fisicamente em 1851 e com quem teria vivido durante sua visita ao Tibet, em 1856. A partir de 1868, passou a receber ensinamentos de outro mestre: Kout Humi.119 Estes mestres viveriam num mosteiro situado num ponto indefinido dos Himalaias; a suprema hierarquia da fraternidade, conhecida apenas como Senhor do Mundo, viveria em outro mosteiro, o mítico Shambala,120 que tanto influenciaria o imaginário místico ocidental.121

Segundo sua experiência, a comunicação com os mestres ocorreria fisicamente, nos primeiros anos; em seguida Blavatsky passou a exibir cartas escritas pelos mestres, que teriam sido “precipitadas do astral”, diversas delas endereçadas aos principais discípulos da Sociedade Teosófica. Tais cartas continuaram sendo recebidas após a morte de Blavatsky, por Besant e Charles Leadbeater, mas, a partir de então, tornou-se mais comum que os contatos com os mestres ocorressem na forma de comunicações espirituais, as chamadas "visitas astrais"122.

A análise das escolas esotéricas do inicio do século XX não pode prescindir da compreensão deste imaginário. Culturalmente, podemos dizer que o impacto dos mahatmas dos Himalaias no esoterismo é comparável à tese darwinista da evolução das espécies na cultura européia.123 Krum-Heller, por exemplo, assim descreve a experiência que o fez dedicar o restante de sua vida ao campo da magia ritualística, num encontro com o martinista124 chileno Arturo Clement:

A conversação versava sobre os Mahatmas, grandes Mestres que viviam nos cumes dos Himalaias, mas que desprendendo-se de seu corpo material podiam aparecer em forma vaporosa al chamado do adepto iniciado. Depois que alguns haviam negado o

Jinarajadasa, em 1941 (JOHNSON, K. Paul. (1994) The Masters Revealed: Madam Blavatsky and Myth of the Great White Brotherhood Albany, New York: Suny Press, 1994.

119

No jargão teosófico os mestres são indicados pelas iniciais; Morya é chamado de mestre M e Kouti Humi de mestre K.H.; a prática se disseminou e é de uso comum em diversos outros grupos, inclusive em algumas das obras de Samael. Também são chamados de Mahatmas, e cabe à teosofia o mérito de haver popularizado este termo hindu no ocidente (CRANSTON, Sylvia. Helena Blavatsky: a vida e a influência extraordinária da fundadora do Movimento Teosófico moderno. Brasília: Editora Teosófica, 1997, p. 19).

120

Sobre o Shamballa, ver a obra de René Guenon, escrita em 1927: The Lord of the World. Coombe Springs Press, 1983.

121

WASHINGTON, Peter. O Mandril de Madame Blavatsky: historia de la teosofia e del guru occidental. Barcelona: Ediciones Destino, 1995, p. 40.

122

A mudança do modus operandi pode ter, provavelmente, relação com uma crítica crescente à autenticidade das cartas, dentro do próprio seio da Sociedade Teosófica.

123

CRANSTON, Sylvia. Helena Blavatsky: a vida e a influência extraordinária da fundadora do Movimento Teosófico moderno. Brasília: Editora Teosófica, 1997, p. 239.

124

O martinismo é uma corrente místico-filosófica baseada nos ensinamentos de Martinez de Pasqualy (1727- 1779), muito comum nos meios rosacruzes; Papus é considerado o fundador do martinismo moderno; Clement, assim como o médico francês H. Girgois, outro mestre de Krum-Heller, era seu discípulo.

feito, outros o haviam ridicularizado e o restante considerado provável ou possível a existencia destes seres, o mestre, como chamaremos ao sr. C…. a partir de agora, pega uma espada, traça no centro do cômodo um Pentáculo de Salomão (como utiliza Goethe no Fausto), pronuncia uma fórmula, para nós incompreensível, e nos pede que formemos uma cadeia de mãos dadas. Assim que o fizemos sentimos uma explosão no cômodo vizinho, como uma explosão no ar; a porta abre como empurrada por mãos invisíveis… no centro da sala vemos de frente um fantasma, e um ser vaporoso, mas compacto, avança até nos tocar. Meus pêlos ficam todos eriçados e se não fosse pelo medo de parecer medroso desmaiairia. A despeito do medo, me sentía feliz ao apalpar pela primeira vez uma materialização perfeita de um mestre do invisível. Em meu coração se levantava um grito de júbilo. Eu era um dos débeis que acreditava sem saber; agora sou forte: creio sabendo.125

No documento MARCELO LEANDRO DE CAMPOS (páginas 41-43)