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Outro dado que revela a magnitude deste processo na Espanha é a ampliação do estoque acumulado de moradias novas sem vender no país. Vale destacar que estes dados não são precisos, mas sim, estimativas que nos ajudam a ter uma ideia geral do comportamento da demanda por imóveis ao longo dos anos43.

Neste sentido, o gráfico 10 nos permite verificar que há um aumento gradual no volume total do estoque acumulado de moradias novas sem vender na Espanha entre os anos de 2005 e 2009, sendo a variação interanual positiva em toda esta série histórica (com destaque ao período entre os anos de 2006 e 2007 em que a variação chegou a 51%). Em números absolutos havia no país, no ano de 2005, um estoque acumulado de 195.184 moradias novas sem vender, este volume aumenta de maneira paulatina de modo que, no ano de 2006, foram registradas 273.363 unidades, 413.642 em 2007, 583.033 no ano de 2008, 649. 780 no ano de 2009 (o volume máximo) e uma pequena diminuição no ano seguinte, totalizando 642. 793 moradias novas sem vender no ano de 2010.

Gráfico 10. Espanha (2005- 2010): Estoque acumulado de moradias novas sem vender.

Fonte: Ministério de Fomento, 2018 (Governo Espanhol) - Organização própria.

É notório que a crise na Espanha impactou diretamente a demanda por imóveis no país, ampliando sobremaneira o estoque de moradias novas sem vender neste período. Sendo assim, este enorme estoque de moradias novas sem vender na Espanha […] plantea importantes

43 A estimativa do estoque de moradias novas sem vender foi realizada a partir de métodos indiretos baseados em

informações administrativas. Os dados sobre moradias iniciadas consideraram as estatísticas de Transações Imobiliárias do Ministério de Fomento e os indicadores sobre o total de moradias terminadas foram obtidos a partir dos certificados de fim de obra do Colégio de Arquitetos Técnicos (MINISTERIO DE FOMENTO, 2012).

0% 40% 51% 41% 11% -1% -10% 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 0 100.000 200.000 300.000 400.000 500.000 600.000 700.000 2005 2006 2007 2008 2009 2010

consecuencias para el mercado de viviendas a corto, medio y largo plazo, así como graves problemas territoriales que luego señalarán (BURRIEL DE ORUETA, 2014. p. 107).

O mapa 11 sintetiza a distribuição espacial (por províncias) deste estoque de moradias novas sem vender no ano de 2012. A primeira classe deste mapa representa as províncias que possuem o menor volume de estoque de moradias novas sem vender (até 6,7 moradias por 1.000 habitantes), o que é o caso das províncias de Madri, Cáceres, Badajoz, Huelva, Cantábria, Vizcaya, Alava e Navarra. No outro extremo, ou seja, na classe que representa o maior estoque de moradias no país está apenas a província de Castellón, na classe que varia entre 34,7 e 46,2 moradias novas sem vender por 1.000 habitantes. As províncias de La Rioja, Toledo e Almería encontram-se na classe intermediária, que varia entre 25,4 e 34,7 moradias por 1.000 habitantes

Mapa 11. Espanha (2012): Estoque de moradias novas (unidades hab./ 1.000 hab.).

Este marcante contraste no território espanhol entre províncias com maior ou menor estoque de moradias novas sem vender reflete o caráter que a produção imobiliária adquiriu no contexto do boom imobiliário, ou seja, [...] escapando de manera muy clara a la intensidad de la crisis, están los territorios que no conocieron una burbuja inmobiliaria destacada: Vizcaya y Guipúzcoa con un descenso escasos de su actividad constructiva (BURRIEL DE ORUETA, 2014. p. 105). Para este autor há, portanto, uma correlação direta entre intensidade do boom e

os efeitos da crise nestes espaços, de modo que as províncias que apresentaram um boom imobiliário mais intenso no período anterior também são aquelas que mais sofrem com os efeitos da crise atualmente.

Las diferencias entre las provincias resultan sobre todo de la mayor o menor presencia en ellas de zonas que tuvieron una burbuja intensa: los índices más altos son los de Castellón, Alicante, Las Palmas, Tarragona y Lleida y los más bajos, a gran distancia de aquellos, son los de Guipúzcoa, Barcelona, Vizcaya, Álava y Girona (BURRIEL DE ORUETA, 2014. p. 119).

De um ponto de vista geográfico, ou seja, considerando os efeitos que a crise econômica deixou materializado no território, um outro aspecto que será destacado em nossa análise sobre a crise refere-se aos projetos urbanos que não foram finalizados por conta da conjuntura pela qual atravessa o país. Esta interrupção de projetos urbanos, cuja denominação se diferencia de acordo com os autores44 analisados, retrata bem o que foi o processo de urbanização recente no país, ou seja, uma urbanização intensiva – considerando o volume produzido em um curto espaço de tempo – mas também extensiva, dada a importante expansão do tecido urbano espanhol (REIS, 2016; BELLET; OLAZABAL, 2018).

Apoiando-se na terminologia empregada por Burriel de Orueta (2014), a crise na Espanha fez com que inúmeros projetos fossem interrompidos, conformando um “urbanismo

vazio” que são [...] áreas vacías de edificios y de población pero en las que el suelo está

completamente artificializado por la parcelación y urbanización (BURRIEL DE ORUETA, 2014. p. 122), ou seja, tratam-se de espaços dotados de infraestrutura urbana e que não foram ocupados pela demanda projetada, o que, inclusive, supõe um importante problema a ser resolvido pelos municípios que investiram nestas áreas, sobretudo, [...] porque han realizado una importante inversión en el proceso de urbanización que no van a poder rentabilizar en muchos años, mientras que sin embargo tienen que suportar la mayor imposición de un IBI urbano (BURRIEL DE ORUETA, 2014. p. 128).

Neste sentido, retomaremos agora um caso concreto de projeto urbano desenvolvido no âmbito do boom imobiliário e que foi, posteriormente, interrompido pela crise internacional e espanhola. Apresentaremos o emblemático caso do bairro Arcosur, situado ao sudoeste da província de Zaragoza.

44 Ruinas modernas foi a terminologia utilizada pela arquiteta Julia Schulz-Dornburg em sem livro intitulado

“Ruinas modernas: uma topografia do lucro” (2012), sobre a crise imobiliária na Espanha. Desertos urbanizados (BURRIEL DE ORUETA, 2014) também é um termo bastante frequente na literatura para se referir a este processo de obras urbanas inacabadas no contexto da crise espanhola,

3.2 O EMBLEMÁTICO BAIRRO ARCOSUR NA PROVÍNCIA DE ZARAGOZA Como apontamos brevemente no item anterior a aprovação de Lei de Solos na Espanha flexibilizou o processo de urbanização com vistas a atender as demandas projetadas pelo mercado imobiliário. Em um contexto de forte crescimento econômico e boom imobiliário foram extinguidos praticamente todos os deveres dos proprietários de terras em detrimento, sobretudo, dos direitos que os mesmos possuíam. Isso gerou um intenso processo de requalificação de solos que exigiu uma série de novas articulações entre os agentes econômicos e poder público em suas diversas escalas (local, regional e nacional).

Neste contexto, houve na província de Zaragoza (mapa 12) a consolidação de projetos urbanos que convergiam diretamente com os interesses do mercado imobiliário: é o caso da

Exposição Internacional de 2008 e do bairro Arcosur. Ainda que ambos estejam diretamente

relacionados, buscaremos aprofundar como se deu o desenvolvimento deste bairro residencial na cidade de Zaragoza e a atual situação deste projeto 10 anos após da crise de 2008.