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Esse jogo de sete minutos levou o homem a ser um medíocre a meu ver e a mulher também Você gastar sete

Capítulo Quatro Análises

J: Esse jogo de sete minutos levou o homem a ser um medíocre a meu ver e a mulher também Você gastar sete

também. Você gastar sete minutos para convencer alguém?! Vai ter que mentir adoidado!

P: C’est fini! C’est fini!42

Nessa CE vemos a presença de João, mas não a de Sara. Apesar de o aluno estar diante de Sara para realizar o diálogo, a aluna não se manifesta em nenhum momento, somente a professora o faz emitindo suas correções a cada frase de João. A interlocução, portanto, se restringe apenas ao aluno e professor. Nesse caso, o que está em jogo, mais uma vez, não é o dizer ou a possibilidade de tomar a palavra na língua estrangeira, mas a acuidade do dizer. A enunciação entre professor e aluno se dá em torno disso e usa-se (literalmente!) a língua estrangeira apenas para falar da língua, ou seja, faz-se o tempo todo um “meta-dizer”43. O aluno evidencia no início da aula que esse tipo de conquista proposto no speed dating não o agrada, como podemos perceber no dizer: “C’est… très fatigué... [...] Dans cette situation je serait célibataire pour tout ma vie/” (cf. tópico 4.1.1). Contudo, diferentemente de Timóteo, João parece querer entrar no jogo. Dessa forma, ao observarmos no vídeo o diálogo de João com Sara, percebemos que a postura de sua companheira de diálogo não o ajuda na dinâmica do jogo, visto que Sara não emite nenhum som oral, expressão ou qualquer outra marca que

42 Tradução da CE (3) - J: Eu me chamo João. Você pode me chamar de senhor Mouton/ P: Não, pequeno Mouton/ meu pequeno Mouton/ senhor Mouton não vai “rolar”/

J: Você pode me chamar pequeno Mouton (risos)/ Eu sou uma pessoa muito agradável/ adoro a literatura, a

música, o pecador/

P: A pesca

J: A pesca e todas as mulheres tranquilas/ P: Amáveis

J: Amáveis P: Tímida

J: Tímida também/ mas não gosto [INCOMP] eu quero dizer que eu sou uma pessoa muito companheira? P: muito, muito próxima

J: eu posso lhe dizer P: lhe dizer

J: Eu posso lhe dizer que eu sou uma pessoa muito muito compreensível/ amável/ e adoro sair nos finais de

semana/ todos os fins de semana para ir ao cinema, ao Louvre...

P: Acabou seu tempo!

J: Eu posso falar um pouco em português? P: Mas não senhor/ é proibido!

J: Um pouco! P: Meio minuto!

J: O bom vendedor que não é o meu caso, nesse exato momento porque eu não me preparei, o bom vendedor ele

tem que vender o peixe dele em um minuto.

P: Muito bem! Eu penso que você não conseguiu..

J: Esse jogo de sete minutos levou o homem a ser um medíocre a meu ver e a mulher também. Você gastar sete

minutos para convencer alguém?! Vai ter que mentir adoidado!

P: Acabou! Acabou!

43 Expressão articulada por TAVARES, Carla ao refletir, a partir dessa situação, sobre o uso que se faz da língua

estrangeira para falar do que é correto dizer nessa língua. Essa expressão designa justamente um dizer que parece deslocado da função de produção de efeitos. O que acontece na cena é um dizer sobre o dizer correto ou não do aluno. Assim sendo, a produção de sentidos entre dois interlocutores parece ser o que menos importa.

pudesse dizer de seu engajamento com aquela atividade. Ao contrário, ela fixa o olhar em João e apenas o ouve falar. Outra dificuldade que se coloca diante de João são as intervenções da professora na direção de corrigi-lo.

É possível perceber, a partir da entonação de João, sua preocupação com a forma da língua, a pronúncia correta das palavras; isso porque ele fala pausadamente e no momento em que tem dúvida com relação ao uso de uma palavra, ele a utiliza em francês, com entonação ascendente, como uma interrogativa, esperando a confirmação ou correção da professora: “[...] je suis une personne très compagnon?[...]. Em entrevista conosco, João enfatizou seu cuidado em falar bem a língua. Para ele:

Recorte (2)

“falar bem [...] é falar corretamente, pronunciar as palavras como elas devem ser pronunciadas sem nenhum vício de linguagem [...] Professor pode me corrigir, ele não vai me bloquear” (Entrevista - João).

Aqui a relação do sujeito com a língua parece ser “normatizada pela gramática” (TAVARES, 2010), ainda mais quando o aluno, na cena analisada, compara-se a um vendedor ao dizer: “ [...] O bom vendedor que não é o meu caso, nesse exato momento porque eu não

me preparei, o bom vendedor ele tem que vender o peixe dele em um minuto...”. Em outras

palavras, basta ser bom, para ter sucesso; o bom aqui é o fato de conhecer a língua e estar preparado para falá-la. Nesse sentido, esse dizer de João nos chama a atenção, porque a necessidade dele de se preparar para falar nos diz muito a respeito de sua relação com a língua. Podemos inferir por esses dizeres, que o aluno parece ter uma ilusão de controle sobre a linguagem, que bastaria se apropriar das regras da língua para ter certa autonomia no que diz (TAVARES, 2010) e, por conseguinte, “vender seu peixe”.

A língua para ele parece ser um meio “domável” e utilitarista que o possibilita alcançar aquilo de que precisa. Essa concepção vai na direção contrária daquilo que estamos defendendo neste trabalho. Para nós, não basta ser bom e estar preparado para conseguir falar na língua estrangeira, ou seja, não é na acuidade ou proficiência que estamos apostando aqui. Na verdade, estamos tratando de um processo que para nós é complexo porque envolve identificações com a língua. Uma tomada da palavra pode se dar inclusive em níveis mais básicos do aprendizado da língua como, por exemplo, quando alguém que mesmo sem saber muito bem a língua e como dizer-se nela se lança nessa tentativa e, no processo de errância

(termo que será melhor desenvolvido no tópico 4.2.1), se vale do que sabe da língua estrangeira para dizer de si, em uma mistura de língua materna e língua estrangeira.

A preocupação excessiva com uma linguagem correta pode ser um fator que inibe João a lançar-se na língua. Até porque a palavra “lançar” nos remete a inúmeros sentidos, dentre os quais destacamos o fato de arriscar-se e entregar-se, que perfazem esse mo(vi)mento do sujeito frente à língua estrangeira. João, dado o modo sistemático e cauteloso com relação à forma da língua, não parece ter o perfil de alguém que se arrisca, até porque possui o hábito de sempre escrever e sistematizar antes aquilo que irá falar.

Outro fator inibidor possível de ser apontado é a prática de correção, constitutiva do ritual de sala de aula, o que parece bloquear João no processo de sintagmatização- semantização da língua. Apesar de João dizer em entrevista que não é bloqueado por essa prática, o que percebemos no todo da CE2 é o oposto, visto o modo e o teor das correções que, de início, não parecem permitir ao aluno escolher a própria maneira como deseja se apresentar:

Excerto (6)

J: Je m’appelle João. Vous pouvez m’appelez monsieur Mouton/