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Estação Niterói-Rio Branco: O número, a descrição, a análise

ESTRUTURA DE PESQUISA

1.2 ARQUITETURAS DE CONEXÕES

1.3.3 Estação Niterói-Rio Branco: O número, a descrição, a análise

A Estação Niterói-Rio Branco, localizada em Canoas, é exposta no Capítulo I como objeto do estudo de caso na forma recorrente de análise, buscando na veracidade dos fatos levantados uma denúncia de como pensamos, produzimos e utilizamos arquitetura a partir do número. Como forma de conhecimento (e controle), necessitamos de respostas objetivas oriundas de base quantitativa, suas fontes numéricas devem ser planejadamente (e representativamente) confiáveis, com dados completos e precisos que se refletem nos desenhos (técnicos), na forma de pensar (racional) e na configuração e funcionamento dos espaços. Portanto, a arquitetura e

20 Estações correspondentes aos números: 1 Mercado, 2 São Leopoldo, 3 Santo Afonso, 4 Fátima, 5

Anchieta, 6 Niterói, 7 Novo Hamburgo, 8 Sapucaia, 9 Rio dos Sinos, 10 Canoas, 11 Mathias Velho, 12 Luis Pasteur. 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

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a própria cidade, na forma que operam e trabalham, devem responder com eficiência a padrões gerais (numéricos).

O número, portanto, acompanha todo o pensamento ocidental, é o mecanismo essencial na reprodução, representação e nas relações de poder da arquitetura. No mundo moderno e contemporâneo, o número tornou-se componente de domínio e exploração, padrão de desempenho (e exclusão), estabelecendo-se através do poder econômico, financeiro (e político), regrando o funcionamento e a forma das cidades e até mesmo a distribuição (desigual) da riqueza da população.

As cidades tornaram-se um ambiente submerso em dados. Devemos perceber e reconhecer o poder e o perigo que os números podem exercer na sociedade contemporânea. Como exemplo, para podermos viver bem na sociedade atual, precisamos ser instruídos e alfabetizados quantitativamente, devemos ter habilidades técnicas e pensamento sistemático. O número deve se tornar um hábito da mente, uma abordagem acerca da lógica e da certeza atreladas ao mundo empírico.

Para Zerzan (2009), o número como linguagem da ciência e do progresso tecnológico acaba instaurando o discurso da garantia e da certeza e, assim, o brilho da alienação. O autor diz estarmos em crise, um vazio imerso num espírito artificial da matéria. O número deixou de ser uma ferramenta de apoio e tornou-se uma meta a atingir. Na mesma direção, Merleau Ponty (1999) diz que o mundo aparece pelo número, e passivamente, tratamos apenas de descrevê-lo e não de interpretá-lo. Distante da interpretação, ingenuamente registramos aquilo que está presente aos olhos, decompondo a realidade num criterioso exame de dados e buscando a perfeição do todo e a eliminação de erros ou defeitos – buscamos compreender a estrutura e não o conteúdo.

Num processo consciente e lógico de projeto e planejamento de uso, o arquiteto, o técnico e o engenheiro transformam a arquitetura em cadastro, tudo deve ser numerado, fichado, a vida torna-se real pelo número, ele é a marca do tempo presente retirando do objeto arquitetônico (e da cidade) a máxima eficiência no menor tempo e energia. Assim, apresenta-se o número e a descrição como linguagem original e, ao

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mesmo tempo, expõe-se as tensões e contradições existentes entre aquilo que se planeja e a realidade movida pela necessidade do sujeito.

O estudo de caso e suas formas de interpretação trazem um questionamento e, ao mesmo tempo, uma forma de alerta sobre a artificialidade que domina e “produz” nossas vidas. Mas, para ir além, devemos entender o discurso utilitário, a estrutura lógica de montagem e o princípio de funcionamento. Habermas (1988), nesse sentido, aponta que devemos nos voltar à lógica da técnica para interpretá-la. Como um jogo, deve-se expor e analisar, de forma analítica, com a linguagem precisa da razão, aquilo que se diz verdadeiro.

Portanto, nesta etapa, sobre a Estação Niterói-Rio Branco foram levantados os principais condicionantes nas suas escalas de intervenção, prevendo futuras reinterpretações e releituras. Entende-se como condicionantes os múltiplos fatores (físicos, climáticos, legais, morfológicos, programáticos, etc.) que influenciam de forma direta ou indiretamente a tomada de decisão no processo de projeto arquitetônico. Sobre o entorno próximo, levantou-se os elementos relativos à mobilidade urbana e morfologia do local, representados em mapas e dados sobre o território. Nos levantamentos físicos e dimensionais da estação, foram cadastrados e localizados nas plantas (principalmente nas praças e no entorno) os elementos de acessibilidade, sinalização e programação visual, mobiliário e equipamentos públicos, infraestrutura, vegetação, as questões programáticas, os materiais e estado de conservação, objetivando a correta e precisa representação dimensional do conjunto por meio de plantas, vistas e cortes. E, por outro lado, também se objetivou revelar que os levantamentos, diferentemente do que se imagina (e planeja), seguem um discurso próprio a partir das incertezas e dos acasos; os espaços são dimensionais e numéricos na sua origem, mas carregam a força dos encontros pelas marcas dos afetos, histórias e desejos do homem comum.

Para analisar as características e os atributos do espaço, o levantamento cadastral da estação percorreu duas escalas. A primeira volta-se ao objeto arquitetônico, buscando entender como o espaço projetado influencia e induz a ação e o comportamento dos usuários; e a segunda volta-se ao contexto urbano e à autonomia (totalitária) da

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arquitetura, chegando nos espaços das praças da estação para perceber sua influência nos bairros e nas pessoas, numa aproximação metafórica com a ideia de “porta”.

O número, a descrição e a análise permitem perceber de que forma as coisas se apresentam ou se representam como estrutura formal, programada e disciplinar, e revelam, nas “entrelinhas”, a força dos espaços, manifestada na livre ocupação e na causalidade dos encontros. O número manifesta-se naquilo que é descrito; a descrição é a forma textual ou gráfica que a técnica encontra de comunicação com o mundo vivido, porém revela sua limitação ao apreender a complexidade entre o projetado e o vivido.

Assim, os dados da Estação Niterói foram numericamente levantados21 pelos alunos

da disciplina de Projeto Arquitetônico II, descritos e, por fim, analisados pelo autor na sua forma tradicional de verificação e propagação de um conhecer baseado em dados e padrões quantitativos. Cabe salientar que as informações levantadas e descritas pelos alunos foram interpretadas pelo autor buscando nas análises um maior aprofundamento, aproximando-se assim dos objetivos do trabalho.