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4 O PROCESSO DE CIRCULAÇÃO DO DINHEIRO E A FUNÇÃO OCULTA DO

4.4 O ESTADO IMPERIALISTA

A capacidade do dinheiro enquanto dinheiro de se autonomizar cada vez mais do processo de circulação de mercadorias faz com que ele desponte da esfera puramente nacional para a esfera mundial. 57 O dinheiro nas suas diversas funções, ainda estava preso nas fronteiras do Estado nacional capitalista. Assim, ele desfilava nas mais diversas figuras de valor. Dentro das fronteiras do Estado capitalista, o dinheiro é símbolo nacional na figura da moeda, mero signo de valor. Com o curso forçado pelo Estado, meros papéis são convertidos em medida de valor e meio circulante. No sistema financeiro nacional, o dinheiro desfila como meio de pagamento nos diferentes títulos públicos ou privados, lançados por bancos estatais ou particulares, mas articulados dentro da política monetária estatal.

Ao sair das fronteiras do Estado nacional, o dinheiro se reencontra com a sua forma original em barras de ouro. 58 Assim, a forma dinheiro volta a ostentar sua função como equivalente universal, “cuja forma natural é, ao mesmo tempo, forma diretamente social de realização do trabalho humano em abstrato” (OC I, p. 119; MEW 23, p. 156).

Todas as possibilidades levantadas de intervenção do Estado na esfera nacional são potencializadas no mercado mundial. No mercado nacional, o Estado era a força extra- econômica que auxiliava a burguesia durante as crises econômicas e a circulação livre da

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“A análise do dinheiro abandona o palco nacional e o conjunto da sociedade burguesa é lançado no turbilhão do mercado mundial. O longo processo de totalização conceitual desemboca na negação de toda particularidade nacional abstrata, as múltiplas particularidades nacionais transformam-se em meros momentos de uma totalidade que é mundial. A economia nacional se transforma em elo da economia mundial e as contradições nacionais se transformam em contradições do mercado mundial. A possibilidade abstrata das crises, restrita ainda às formas nacionais menos desenvolvidas do dinheiro, se transforma em possibilidades efetiva e universal” (ANTUNES, 2005, p. 153).

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“O dinheiro em seu processo de efetivação desdobra-se em seus vários momentos analíticos. Agora trata-se de analisar o mesmo dinheiro em seu momento sintético supremo, o momento superior que reúne todos os

momentos anteriores mais abstratos e unilaterais, o momento em que o dinheiro retorna sobre si mesmo, em que o dinheiro se reencontra com sua natureza plenamente efetiva e determinada: o dinheiro como uma

universalidade concreta, o dinheiro despido de seus uniformes nacionais, o dinheiro como dinheiro mundial” (ANTUNES, 2005, p. 153).

mercadoria privada capitalista. No mercado mundial, o Estado age em favor das burguesias nacionais em busca de novos mercados. Da mesma forma que no uso da força utilizada nos processos internos, o Estado também pode se utilizar da força no mercado mundial.

Alias, o desenvolvimento do capitalismo na esfera mundial deve-se a “pitadas ardentes” de guerras entre Estados e povos para conseguirem novos mercados para exportação de mercadorias. Por isso é indispensável que com o desenvolvimento da circulação, o Estado se apropriasse de parte do dinheiro em circulação para transformar em fundo de reserva para eventuais momentos turbulentos econômicos ou mesmo políticos. Assim, as funções do dinheiro enquanto fundos de reserva do Estado surgem com a própria função do dinheiro como meio interno de circulação ou meio de pagamento e, portanto, como dinheiro mundial. Os fundos de reserva estatal são exigidos como mercadoria monetária universal e efetiva expressamente caracterizada em ouro e prata, diferentemente dos mercados nacionais, onde podem existir diversos signos de valor.

Por outro lado, a circulação das mercadorias no mercado mundial é acompanhada pela mudança do padrão de grandeza de valores da moeda nacional, ou o mercado cambial. Para evitar especulações com o dinheiro – o que é profundamente normal quando se fala do circuito autônomo do dinheiro – e para evitar uma bancarrota no seu território, o Estado acumula grandes quantidades de reservas em ouro, forma material absoluta de riqueza, para guiar a política econômica nacional.

No mercado internacional, os meios de pagamentos são em última instância ouro e prata ou “a materialização social absoluta da riqueza geral (absolut gesellschaftliche Materiatur des Reichtums überhaupt)” (OC I, p. 119; MEW 23, p. 157). A balança de pagamentos é um bom indicador da riqueza nacional. Ao comparar a materialização social absoluta de riqueza, os países têm a exata noção do grau que se encontram seus desenvolvimentos e suas posições internacionais. Como já vimos não é o dinheiro quem cria a circulação da mercadoria, mas é a circulação da mercadoria quem cria o dinheiro. O movimento da mercadoria atrai para perto de si o dinheiro. O desenvolvimento das forças produtivas nacionais atrai para perto de si o dinheiro na sua forma absoluta no comércio mundial. “O dinheiro distribui-se pelas nações segundo suas necessidades [...] ao ser atraído sempre pelos produtos” – diz Marx citando Trosne na nota 111 do Capital. Os Estados que possuem grande participação no comércio internacional terão grandes capacidades de atrair ouro e prata na forma de dinheiro mundial.

Longe de instabilidades, o Estado capitalista precisa regular a circulação da mercadoria e do dinheiro para evitar uma crise de proporções nacionais. Assim, regula a quantidade de dinheiro nos bancos nacionais e as oscilações do ouro no tesouro nacional. Mas com a busca desenfreada dos produtores em acumular mais dinheiro, nacional e mundialmente, a forma absoluta do dinheiro pode vir a se desdobrar em formas relativas de riqueza e signo de valor em escala nacional e mundial.

A desregulamentação do mercado de moedas nacional e mundial é regra e não a exceção no mundo que tem o dinheiro como amante. Os “doces impedimentos” - diz Marx – não são mais que barreiras inúteis para o dinheiro que procura se autonomizar do processo e fugir da própria tutela do Estado nacional e ganhar o mundo, mesmo que seja com a ajuda do próprio poder do Estado no comércio mundial.

Marx termina o capítulo III, mostrando que o crescimento da reserva monetária em países desenvolvidos sinaliza para diversas interpretações. Utilizando Willian Petty, importante teórico da economia, na última nota do capítulo III, Marx conclui:

O dinheiro é apenas a gordura do corpo do Estado, e por isso seu excesso afeta tanto sua mobilidade quanto sua falta torna-o doente [...] como a gordura lubrifica o movimento dos músculos, substitui alimentos faltantes, aplaina desníveis e embeleza o corpo, assim o dinheiro facilita os movimentos do Estado, traz alimentos do exterior, quando há carestia no país, paga dívidas [...] e embeleza o conjunto; porém os indivíduos que possuem muito dele (OC I, p. 121; MEW 23, p. 160, nota 114).

Com o acúmulo do dinheiro na forma de tesouro nacional, o Estado pode vir a enfrentar uma crise, pois parte do dinheiro foi arrancada da circulação. Pode ser também o anúncio desenfreado de investidas do Estado em guerras imperialistas em grandes proporções. Muito mais que um processo de anomalia, a crise e a ação do poder violento do Estado são dois momentos simultâneos e violentos que sustentam a produção de mercadorias.

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