Em 1985, Perdew & Levy publicaram uma discuss˜ao sobre a possibilidade de obter estados excitados no contexto da DFT usual (48). O questionamento ´e interessante, pois os teoremas fundamentais da DFT garantem que a densidade do estado fundamental retorna
3.7. Estados excitados e a DFT 81 o m´ınimo do funcional de energia daquele sistema, mas nada fala sobre estados excitados.
At´e recentemente, esta possibilidade de obter estados excitados da formula¸c˜ao da DFT para estado fundamental (constrained search) n˜ao havia sido observada. A primeira publica¸c˜ao exibindo esta caracter´ıstica pertence ao nosso grupo de pesquisas, Freire & Egues (PRL 2007) (35). Este trabalho chamou a aten¸c˜ao de Perdew e colaboradores no artigo recente onde discutem quest˜oes fundamentais da DFT (63). No cap´ıtulo de resultados desta tese, mostramos que nos sistemas estudados aqui tamb´em ´e poss´ıvel observar os estados excitados.
No que se segue procuro esclarecer os pontos fundamentais deste trabalho de Perdew & Levy, omitindo quest˜oes secund´arias como as representabilidades e defini¸c˜oes sobre varia¸c˜oes da densidade. Para maiores detalhes consulte o trabalho original (48).
Limite inferior para energia do estado excitado
Este argumento segue imediatamente da defini¸c˜ao do funcional universal obtida pelo m´etodo constrained search apresentado anteriormente, Se¸c˜ao 3.2. Nesta formula¸c˜ao, o funcional de energia foi definido como
E[˜n(r)] = Z
v(r)˜n(r)dr + F [˜n(r)], (3.63) F [˜n(r)] = minαhϕα˜n| ˆT + ˆU |ϕαn˜i, (3.64)
sendo que o funcional universal F [˜n(r)] busca o estado |ϕα ˜
ni que minimiza a energia cin´etica
ˆ
T e de intera¸c˜ao Coulombiana ˆU , sujeito ao v´ınculo hϕα ˜
n|ˆn|ϕαn˜i = ˜n(r).
Considere uma densidade ni(r) referente a um estado excitado |ϕii do Hamiltoniano ˆH,
com energia Ei = hϕi| ˆH|ϕii. Por constru¸c˜ao |ϕii pertence ao conjunto de estados usado
na busca definida pelo funcional universal F [ni(r)]. Portanto segue a desigualdade
Ei ≥ minαhϕαni| ˆH|ϕ
α
nii = E[ni(r)], (3.65)
definindo o funcional de energia como o limite inferior para a energia de um estado excitado com densidade ˜n(r). Note que a igualdade vale apenas se o estado |ϕii retornar o m´ınimo
Extremos do funcional de energia
Considere varia¸c˜oes infinitesimais da densidade δn(r) = ǫf (r), tal que ǫ seja um infinitesimal, |f(r)|/n(r) seja finita em todo espa¸co, e R δn(r)dr = 0. Nestas condi¸c˜oes vale a expans˜ao do funcional em s´erie de Taylor,
E[n(r) + δn(r)] = E[n(r)] + Z dr δE δn(r)δn(r) +1 2 Z drdr′ δ 2E δn(r)δn(r′)δn(r)δn(r ′ ) + · · · . (3.66)
Se a densidade ˜n(r) ´e solu¸c˜ao da equa¸c˜ao de Euler-Lagrange, δE δn(r) n(r)=˜n(r) = constante, (3.67) as varia¸c˜oes da energia s˜ao claramente da ordem de ǫ2, constituindo um extremo do
funcional como esperado.
Na Eq. (3.67), a densidade do estado fundamental retorna como constante o potencial qu´ımico do sistema. Outras solu¸c˜oes retornam diferentes constantes, sem interpreta¸c˜ao f´ısica imediata.
Equa¸c˜oes de Kohn & Sham e estados excitados
As equa¸c˜oes de Kohn & Sham s˜ao obtidas no processo de minimiza¸c˜ao da energia sujeito ao v´ınculo de n´umero de part´ıculas ou potencial qu´ımico fixo, c.f. Se¸c˜oes 3.3 e 3.4, satisfazendo a equa¸c˜ao de Euler-Lagrange, Eq. 3.67. Neste ponto estabelecemos a primeira conclus˜ao do artigo de Perdew & Levy (48):
I. (i) Todo extremo do funcional de energia do estado fundamental E[n(r)] corresponde a um autoestado do sistema interagente. Por´em, (ii) nem todo autoestado corresponde a um extremo do funcional.
A primeira parte (i) desta conclus˜ao enfatizada no quadro acima segue imediatamente das Eqs. (3.66) e (3.67). J´a a nega¸c˜ao descrita na segunda parte (ii) ´e mais delicada. Usarei o exemplo discutido no artigo de Perdew & Levy (48) para esclarecer estes pontos.
3.7. Estados excitados e a DFT 83 Considere um sistema atˆomico composto por dois el´etrons n˜ao-interagentes sujeitos ao potencial v(r) = −1/r. O funcional de energia do estado funcional pode ser obtido usando a rela¸c˜ao ψ(r) =pn(r) , v´alida apenas para o estado fundamental, pois seu orbital ´e real e positivo, obtendo Ev[n(r)] = Z drn1/2(r) −12∇2 n1/2(r) − Z drn(r)/r. (3.68) Como estamos considerando um sistema n˜ao-interagente, a equa¸c˜ao de Kohn & Sham ´e idˆentica a equa¸c˜ao de Schr¨odinger,
−12∇2− 1r
ψ(r) = εψ(r). (3.69) As solu¸c˜oes desta equa¸c˜ao s˜ao os orbitais atˆomicos: 1s, 2s, 2p, 3s, etc. Neste exemplo consideraremos os seguintes autoestados de dois el´etrons: 1s2, 1s12s1 e 2s2. Na Fig. 3.2
estas solu¸c˜oes est˜ao marcadas por cruzes.
Para analisar o funcional Ev[n(r)], parametriza-se a densidade por uma vari´avel cont´ınua
y, de forma que os valores y = 0, 1/2 e 1 correspondem `a densidade dos estados considerados 1s2, 1s12s1 e 2s2, respectivamente, c.f. Fig. 3.2. No artigo os autores consideram duas
parametriza¸c˜oes, sendo que apenas a convencional satisfaz os crit´erios de validade da expans˜ao em s´erie de Taylor usada na Eq. (3.66). Aqui discutimos apenas este caso por simplicidade.
Figura 3.2– Figura extra´ıda da Ref. (48). Solu¸c˜oes n˜ao-interagentes de um sistema atˆomico com dois el´etrons: 1s2, 1s12s1 e 2s2, marcadas por cruzes. As linhas continuas correspondem ao funcional de energia calculado sobre duas parametriza¸c˜oes da densidade (vari´avel y define a parametriza¸c˜ao). Aqui consideramos apenas a parametriza¸c˜ao convencional.
Primeiramente, note que, na Fig. 3.2, o funcional de energia satisfaz a desigualdade da Eq. (3.65), estabelecendo o limite inferior para a energia dos autoestados. Neste exemplo os autoestados 1s2 e 2s2 satisfazem a igualdade da Eq. (3.65), ou seja as fun¸c˜oes
de onda referentes a estes estados retornam o m´ınimo na constrained search para suas respectivas densidades. Uma vez que estes estados pertencem a curva do funcional de energia Ev[n(r)] e s˜ao solu¸c˜oes de Kohn & Sham, e consequentemente de Euler-Lagrange, a
densidade associada a estes estados correspondem a extremos do funcional. Estes exemplos correspondem a primeira parte da primeira conclus˜ao destacada no in´ıcio desta discuss˜ao.
J´a o estado 1s12s1 n˜ao satisfaz a igualdade na desigualdade (3.65). Ou seja, a fun¸c˜ao
de onda associada a constrained search para a densidade referente a este estado n˜ao ´e solu¸c˜ao de Kohn & Sham e Euler-Lagrange. Neste caso o termo linear na expans˜ao em s´erie de Taylor do funcional Ev[n(r)] n˜ao ´e nulo, e esta densidade n˜ao retorna um extremo
do funcional. Este exemplo corresponde a segunda parte da primeira conclus˜ao. Desta discuss˜ao estabelecemos a segunda conclus˜ao de Perdew & Levy,
II. A condi¸c˜ao necess´aria e suficiente para que um autoestado do sistema seja extremo do funcional de energia ´e que sua fun¸c˜ao de onda retorne a menor energia na constrained search referente a sua pr´opria densidade.
As conclus˜oes I e II destacadas acima s˜ao verdadeiras para qualquer autoestado do sistema. No que se segue nos restringiremos a autoestados que sejam non-interacting V-representable, ou seja, estados cuja densidade pode ser descrita pelo estado fundamental de algum potencial n˜ao-interagente efetivo. No caso simples da Fig. 3.2, apenas o m´ınimo global, estado fundamental, ´e um exemplo trivial do que discutiremos a seguir.
Tais solu¸c˜oes non-interacting V-representable s˜ao obtidas como solu¸c˜oes das equa¸c˜oes de Kohn & Sham cujas densidades s˜ao calculadas seguindo a distribui¸c˜ao de Fermi-Dirac do estado fundamental, ou seja, segundo o princ´ıpio aufbau. Nesta formula¸c˜ao o potencial efetivo ´e constru´ıdo com base no funcional universal referente `a constrained search. Por constru¸c˜ao a solu¸c˜ao pertence a curva do funcional Ev[n(r)] e satisfaz a condi¸c˜ao descrita
na conclus˜ao II.
Chegamos finalmente a ´ultima conclus˜ao,
III. Toda solu¸c˜ao autconsistente de Kohn & Sham, que satisfaz a distribui¸c˜ao de Fermi-Dirac para o estado fundamental com potencial qu´ımico ´unico, retorna a densidade e energia de um autoestado do sistema interagente correspondente a um extremo local do funcional de energia.
´
E importante notar que o estado 2s2 do exemplo da Fig. 3.2 ´e extremo do funcional
3.8. Topologia da densidade de estados e a resistividade longitudinal 85