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2.8 LIGAS DE BRASAGEM LIVRES DE PB (LEAD-FREE SOLDER ALLOYS)

2.8.2 ESTANHO E SUAS LIGAS

Alguns elementos têm diferentes formas alotrópicas, sendo que cada uma delas apresenta propriedades físicas e químicas bastante distintas, como é o caso do estanho. Existem três formas alotrópicas para o estanho:

Sn-α 13,2°C↔ Sn-β 161°𝐶↔ Sn-γ

O estanho branco (Sn-β) é a forma mais conhecida e utilizada e sua estrutura cristalina é tetragonal de corpo centrado. Possui aspecto branco prateado, é bom condutor elétrico e moderadamente dúctil. O estanho cinzento (Sn-α) possui uma estrutura do tipo diamante, é um semicondutor, não dúctil, de aspecto cinza escuro não metálico na forma de pó e não tem aplicabilidade. A transformação do estanho

branco para o estanho cinzento ocorre por um processo de nucleação. Sabe-se que a velocidade de transformação do alótropo β para α é muito lenta e pode ser aumentada pela diminuição da temperatura. A transformação ocorre mais facilmente em estanho puro e a presença de elementos solúveis, como bismuto, chumbo e antimônio suprimem essa transição e outros elementos como cádmio, ouro e prata, retardam. Acima de 161°C, o estanho branco (Sn-β) converte-se em estanho rômbico (Sn-γ) que é quebradiço e possui uma estrutura cristalina ortorrômbica que se funde a 231,8°C (FIORUCCI et al., 2012).

Com relação ao bismuto, tem-se que é um metal quebradiço de coloração prata esbranquiçada de baixa dureza, e se encontra na família dos metais representativos. A densidade do bismuto é de 9,807 g/cm³ e possui ponto de fusão em 271,5°C. Por fim, o antimônio é um semi-metal quebradiço de coloração branco prateada, com densidade de 6,685 g/cm³ e ponto de fusão de 630,9°C. O antimônio sólido pode ser encontrado em várias formas alotrópicas (GUERRA et al, 2011).

Dentro dos sistemas à base de Sn, destacam-se as ligas do sistema Sn-Bi, as quais são alternativas promissoras para substituir ligas Sn-Pb. Com uma temperatura eutética relativamente baixa de 138°C, ligas Sn-Bi apresentam vantagens como boa resistência mecânica, excelente resistência à fluência e baixo custo. Por outro lado, estudos indicaram que as ligas Sn-Bi apresentam algumas desvantagens como baixa ductilidade, baixo grau de molhamento, e segregação (DONG et al., 2008; GOH et al., 2013).

A microestrutura solidificada de um eutético depende da taxa de resfriamento. Baixas taxas produzem uma microestrutura eutética clássica, em que as duas fases constituintes se alternam, enquanto altas taxas podem inibir a formação da estrutura eutética, produzindo fases não previstas em equilíbrio termodinâmico. Puttlitz (PUTTLITZ, 2004) reportou que a microestrutura da liga eutética Sn-58%Bi solidificada rapidamente apresenta uma estrutura lamelar irregular das fases ricas em Bi e em Sn.

Na temperatura eutética o bismuto exibe solubilidade sólida significativa de 21% em peso no estanho, de modo que Bi precipita na fase rica em Sn no estado sólido a baixa temperatura. Glazer (GLAZER, 1995) descreve o eutético Sn-Bi como sendo lamelar com material degenerado nos limites dos grãos eutéticos para taxas moderadas de resfriamento. A Figura 11 apresenta o diagrama de fases do sistema Sn-Bi onde se pode observar a temperatura de transformação em cada composição.

A reação eutética acontece a 138° ou 139° em uma composição de 57% ou 58% Bi (em peso) apresentando uma microestrutura constituída de uma mistura eutética, Bi+Sn, como mostra a Figura 12.

Figura 11: Diagrama de fases do sistema Sn-Bi (adaptado de Okamoto, 1992).

Figura 12: eutético Sn-Bi (Sakuyama, 2009).

Silva et al. (2015) verificaram que a liga solidificada direcionalmente Sn- 52%Bi sob regime transiente de fluxo de calor apresentou uma microestrutura composta de dendritas ricas em Sn e precipitados de Bi em seu interior, circundadas por uma mistura eutética de com duas dimensões características, um eutético mais

fino (Figura 13a) apresenta-se como “ilhas” isoladas e um eutético mais grosseiro (Figura 13b), predominante em todo o lingote fundido. Uma outra estrutura observada foi o eutético do tipo escama de peixe (Figura 13c), que se localiza preferencialmente próximo às lamelas ricas em Bi, como pode ser observado na Figura 13.

Osório et al. (OSÓRIO et al. 2013) estudaram a solidificação das ligas alternativas Sn-3,5%Ag, Sn-9%Zn e Sn-40%Bi. Tais autores reportaram que a liga Sn-40%Bi possui um menor alongamento específico (δ), cerca de duas vezes menor quando comparada a liga Sn-40%Pb, enquanto que o nível do Limite de Resistência à Tração (σt) exibiu um comportamento duas vezes maior. A liga Sn-40%Bi

apresenta valores entre 72 a 76 MPa para σt e 17% para δ.

(a) (b)

(c)

Figura 13: Estruturas eutéticas da liga Sn-52%Bi: (a) fina, (b) grosseira e (c) tipo Fishbone (Silva, 2015).

Outro sistema à base de Sn que merece atenção é o sistema Sn-Sb, principalmente para aplicações em brasagem de alta temperatura (entre 230° e 350°C). Existem mais de dez variantes do diagrama de fase deste sistema, e cada um deles diferem em algum aspecto. A razão para isso são as propriedades

Sn Bi Sn Bi Eutético fishbone

especiais das ligas Sn-Sb, isto é, a baixa taxa de transformações químicas e de fase, e a capacidade para formar estados metaestáveis. O sistema da liga binária Sn-Sb apresenta um ponto peritético em 11,5%Sb em peso, onde ocorre a formação de duas soluções sólidas distintas: uma solução sólida rica em Sn e outra solução sólida intermediária (SnSb). Observa-se que o limite de solubilidade do Sb no Sn diminui de 1,2% em 127°C para 0,4% em 97°C e para quase zero em 67°C (VASIL’EV, 2003; DIAS FILHO, 2016).

O antimônio em ligas binárias Sn-Sb forma um precipitado intermetálico quando a quantidade de Sb excede o limite de solubilidade no estado sólido, essa liga binária é reforçada quando dois mecanismos de endurecimento são combinados, solução sólida e precipitação. Morozumi et al.(2015) estudaram a influência do antimônio (2,5,8,10,13 e 15%) em ligas binárias Sn-Sb, e verificaram que o limite de resistência à tração aumenta conforme o aumento do teor de Sb. A precipitação do intermetálico SnSb melhora a resistência à tração e a vida útil do ciclo térmico. Além disso, a dureza medida no composto intermetálico SnSb foi cerca de três vezes maior do que na matriz Sn-Sb, enquanto o modulo de elasticidade é o mesmo, tanto na matriz quanto no composto.

Esfandyarpour et al (2011) estudaram a microestrutura e comportamento à tração da liga Sn-5%Sb contendo Bi e Cu. A adição de 1,5% de Bi e Cu na liga binária resultou em um aumento na resistência à tração e na ductilidade. O aumento da resistência da liga Sn-5%Sb-1,5%Bi foi devido ao endurecimento por solução sólida do Bi no Sn, enquanto que o da liga Sn-5%Sb-1,5%Cu, se deu devido à formação de partículas Cu6Sn5. A melhoria da ductilidade foi devido ao refino

microestrutural promovido pelos elementos de liga. A Figura 14 mostra imagens MEV das ligas Sn-5Sb, Sn-5Sb-1,5Bi e Sn-5Sb-1.5Cu, destacando as fases formadas. Vale ressaltar a presença de partículas SnSb finas e bem dispersas nos contornos de grãos.

Figura 14: Microestrutura das ligas (a) Sn-5%Sb, (b) Sn-5%Sb-1.5%Bi, (c) Sn-5%Sb- 1.5%Cu (adaptado de Esfandyarpour et al. 2011).

Sakuyama et al (2009) investigaram a microestrutura e as propriedades mecânicas da liga eutética Sn-58%Bi adicionando pequenas quantidades (0,5% em peso) de prata, cobre, zinco e antimônio. A adição de antimônio foi o mais eficaz em melhorar a ductilidade, diminuindo o tamanho de grão na microestrutura eutética e aumentando o alongamento em até 40%. Apesar de a temperatura liquidus ser aumentada, o composto intermetálico SnSb, precipitado finamente na fase β-Sn impede o engrossamento da estrutura eutética, melhorando a ductilidade. O antimônio não forma compostos intermetálicos com o bismuto. A Figura 15 apresenta a microestrutura da liga eutética Sn-58%Bi com adição de 1%Sb.

Figura 15: Imagens MEV (a) do eutético da liga Sn-58%Bi-1%Sb (b) destacando a

presença do intermetálico SnSb na fase β-Sn (adaptado de Sakuyama, 2009).

As propriedades de tração da liga Sn-57,5%Bi-0,5%Sb foram investigadas e comparadas com as ligas Sn-58%Bi e Sn-3%Ag-0,5%Cu (SAC305) por KUBOTA et

al. (2014). Estes autores mostraram que a resistência à tração (σt) em temperatura

ambiente da liga Sn-57,5%Bi-0,5%Sb é similar ao valor da liga eutética Sn-58%Bi, enquanto que em altas temperaturas a σt passa a ser menor que as encontradas

para as ligas Sn-58%Bi e Sn-3%Ag-0,5%Cu. Por outro lado, o alongamento específico é ligeiramente superior ao da liga Sn-58%Bi e muito superior ao da liga Sn-3%Ag-0,5%Cu.

O efeito da adição de Sb (0, 3 e 6% em peso) na liga eutética Sn-58%Bi foi investigada por TORRES et al. (2012). As três ligas apresentaram a temperatura de fusão menor (139°C, 147°C e 149°C, respectivamente) que a liga eutética tradicional Sn-37%Pb (183°C). As propriedades mecânicas das ligas Sn-Bi-Sb foram superiores à medida que a quantidade de antimônio aumentava, ou seja, elevando os níveis de resistência à compressão e a dureza. Esses aumentos estão relacionados com a formação do composto intermetálico SnSb na microestrutura das ligas Sn-Bi-Sb. A Figura 16 apresenta as microestruturas para a liga eutética Sn-58Bi, com adição de 3 e 6% de Sb, onde observam-se estruturas eutéticas lamelares orientadas aleatoriamente e estruturas regulares eutéticas (destacadas por setas vermelhas) próximas de lamelas de Bi e uma fase rica em β-Sn na forma de glóbulos grosseiros para a liga com adição de 3%Sb. A adição 6%Sb induz uma alteração na estrutura eutética de ligas Sn-58Bi-xSb, a qual agora passa a ser uma estrutura eutética tipo irregular, com lamelas de Sn e Bi crescendo de forma aleatória. Isso ocorre pela instabilidade da interface de crescimento da fase rica em Sn (causada pelo teor de Sb), que agora também apresenta uma morfologia dendrítica.

(a) (b)

Figura 16: Imagem MEV das ligas (a) Sn-58%Bi-3%Sb e (b) Sn-58%Bi-6%Sb (TORRES, 2012).

De acordo com Zhang et al. (2014) duas reações podem ocorrer para composições (em peso) entre Sn-(52-48)%Bi-(1,8-2,4)%Sb. A primeira é a reação eutética L (líquido) (Sn)+(Bi). A outra é uma reação quaternária quasi-peritética L+β(Sn)+(Bi). No que concernem os aspectos microestruturais foi reportada a presença de duas regiões conforme mostrado na Figura 17 a seguir, uma mais refinada (parte A) e outra mais grosseira (parte B), sendo atribuídas as formações das regiões A e B devido às reações quasi-peritética e eutética, respectivamente. O aumento de teor de Sb provocou aumento da fração de estrutura quasi-peritética.

A Figura 18 apresenta a projeção calculada da superfície liquidus do sistema ternário Sn-Bi-Sb. É possível observar as fases α que possui uma estrutura romboédrica, formada pela solução de Bi e Sb miscível em todas as proporções; a fase intermediária β do composto (SnSb) que possui estrutura romboédrica, mas pode ser considerado com uma estrutura de NaCl levemente distorcida; a fase γ rica em Sn que possui estrutura tetragonal de corpo centrado; e um composto estequiométrico Sb2Sn3. Além de duas reações invariantes U1: (L + Sb2Sn3 ↔ β + γ)

a 244°C para uma composição química de 1,1%Bi, 91,3%Sn e U2: (L + β ↔ α + γ) a

140°C para teores de 38,2%Bi, 59,6%Sn (GHOSH, 1994; OHTANI, 1998).

Figura 17. Regiões com presença alternada de fases em ligas Sn-Bi-Sb oriunda da

Figura 18: Superfície liquidus calculada para o sistema ternário Sn-Bi-Sb (OHTANI,

3 PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL

A metodologia usada no estudo experimental desenvolvido neste trabalho envolveu as seguintes etapas: i) Cálculo estequiométrico, corte e pesagem dos materiais; ii) Fusão, homogeneização e aferição das ligas obtidas; iii) Montagem da lingoteira com termopares posicionados em pontos estratégicos; iv) Vazamento da liga fundida na lingoteira já posicionada no dispositivo de solidificação direcional ascendente; v) Refusão e estabilização do metal líquido; vi) Início do experimento mediante o acionamento da refrigeração na parte inferior da chapa molde; vii) Aquisição dos perfis térmicos para determinação das variáveis térmicas de solidificação; viii) Cortes nos lingotes solidificados nos sentidos transversal e longitudinal destinados a obtenção de amostras para caracterização microestrutural através das microscopias ótica e eletrônica de varredura, seguidos da quantificação dos parâmetros microestruturais, além da difração de Raios-X e Fluorescência de Raios-X. ix) Realização de ensaios mecânicos de tração das ligas analisadas. O diagrama da Figura 19 ilustra as etapas envolvidas na metodologia adotada no decorrer do estudo experimental deste trabalho.

As etapas de preparação e fusão das ligas Sn-52%Bi-1%Sb e Sn-52%Bi- 2%Sb foram realizadas com a colaboração do grupo M2PS/DEMA (Microestrutura e Propriedades em Processos de Solidificação) no Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar, sob a coordenação do Prof. José Eduardo Spinelli.

Figura 19: Fluxograma do procedimento experimental.

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