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ESTEREÓTIPOS POSITIVOS E NEGATIVOS E SUAS CONSEQUÊNCIAS NO DIA-A-DIA DAS IMIGRANTES BRASILEIRAS

MEMÓRIA CONCEPTUAL

I ESTEREÓTIPO E PRECONCEITO

I.1. ESTEREÓTIPOS POSITIVOS E NEGATIVOS E SUAS CONSEQUÊNCIAS NO DIA-A-DIA DAS IMIGRANTES BRASILEIRAS

Embora os estereótipos sejam frequentemente associados a aspectos negativos de uma pessoa ou grupo social, o certo é que também podemos falar em estereótipos positivos, quando determinadas características positivas são consideradas como intrínsecas a uma pessoa ou grupo social. No caso particular dos brasileiros, como já foi citado anteriormente, a alegria é o principal estereótipo positivo associado a essa nacionalidade, o que acaba por constituir vantagens no mercado de trabalho. Nesse sentido, encaixar-se no estereótipo positivo do português sobre o brasileiro facilita, na verdade, a vida do(a) imigrante.

31 Considerados como alegres, extrovertidos, simpáticos, criativos, cordiais, festivos, sempre bem humorados, bons comunicadores, seres de bom coração e sempre dispostos a ajudar, os brasileiros são muitas vezes preferidos em serviços que envolvem o contato direto com o público, como na restauração, bares e comércio. Acontece que estes estereótipos ´positivos` acabam por se tornar, na opinião de Machado (Malheiros, 2007:177), uma espécie de ―prisão simbólica‖, no sentido em que os imigrantes, na tentativa de conseguir empregos, passam por um ―processo de exotização‖, ou seja, acabam por submeter-se a uma representação estereotipada do Brasil e da identidade brasileira, num mecanismo de submissão aos estereótipos, que reforça o seu lugar de subalternidade enquanto imigrante, mas do qual os mesmos imigrantes tiram partido.

Assim, os próprios imigrantes acabam por reforçar essas imagens pré-concebidas, passam por vender profissionalmente a simpatia, uma vez que os lugares a eles oferecidos pelo mercado de trabalho português estão relacionados com esses mesmos estereótipos: dançarinos, assistentes do público em geral, músicos, professores de capoeira ou de educação física, animadores e jogadores de futebol. Entre os estereótipos negativos mais frequentes, os(as) brasileiros(as) são vistos como mal educados; não são considerados bons profissionais; não são vistos como competentes e cumpridores; são considerados pouco sérios e desonestos. Assim, a comunidade brasileira sofre manifestações de preconceito com uma certa regularidade, como exemplifica Machado:

―São as desconfianças em aceitar um cheque de um Brasileiro, os olhares desconfiados nos locais públicos, as dificuldades para alugar uma casa, os comentários maldosos sobre o Brasil, as cantadas ofensivas que qualquer mulher

brasileira recebe, etc (Machado in Malheiros (org.), 2007:181, grifos nossos).

No caso específico das mulheres brasileiras, embora a grande maioria das imigrantes trabalhe em atividades como o comércio, limpeza, restauração e hotelaria, o certo é que, pela presença de imigrantes brasileiras na indústria do lazer e do sexo, criou-se um imaginário que associa a brasileira a estereótipos como ´prostituta`, ´quente`, ´exuberante`, ´sensual`, ´exótica`, ´fácil` e ´oferecida`. Os media colaboram, reforçando esses estereótipos, dando especial atenção aos casos de prostituição que envolvam brasileiras. “Na actualidade, o tema da imagem da mulher brasileira em

Portugal, em directa relação com o estereótipo da prostituta, não pode ser ignorado quando se fala da brasileira imigrante em Portugal” (Padilla in Malheiros

(org.), 2007:125, grifos nossos). Na verdade, essa imagem da brasileira relacionada com a prostituta determina a forma como essas mesmas imigrantes são, muitas vezes,

32 tratadas no dia-a-dia, mesmo pelos seus compatriotas, como é exemplificado pelo cantor e compositor brasileiro Márcio Faraco na sua peça musical ―Vida ou Game”:

―Passaporte brasileiro A polícia nem escuta Se é homem é traficante Se é mulher é prostituta‖

Tornou-se mundialmente famoso o caso das ´Mães de Bragança`, da cidade com o mesmo nome, que se organizaram numa verdadeira cruzada contra as mulheres brasileiras que trabalhavam em bares e discotecas da cidade, acusando-as de ―seduzirem os homens casados e destruírem seus casamentos‖ (Malheiros, 2007:29). Era, na verdade, como esposas e não como mães que protestavam, pois diziam que os seus maridos gastavam todo o dinheiro em casas de alterne instaladas na região, onde a maioria das prostitutas que lá trabalhavam era brasileira. As tais ´mães`, então, na defesa da ordem e da moralidade, e principalmente dos seus casamentos, organizaram-se para protestar e expulsar as tais intrusas que ameaçavam os seus matrimónios. ― (…) as casas de alterne já eram um negócio antigo na região, que foi optimizado pelas redes internacionais de tráfico e prostituição que identificaram nas mulheres brasileiras o produto sexual, por excelência, do imaginário masculino português‖ (Cunha, 2005:550, grifo da autora).

Portugal, que raramente é destacado nos media internacionais, teve páginas e páginas dedicadas a este assunto, naquele ano de 2003, salientando-se a grande reportagem da edição europeia da revista Time. A repercussão da notícia deu origem a muita discussão moralista sobre o assunto. O facto é que tal acontecimento gerou uma associação generalista entre as mulheres brasileiras e a prostituição, cujo reflexo se faz sentir até os dias de hoje. Esse epísódio das Mães de Bragança, somado ao crescente número de casamentos mistos envolvendo portugueses, só ajudou a reforçar a já negativa imagem associada às brasileiras, fazendo com que muitas mulheres portuguesas adicionassem novos estereótipos à lista: ´oportunistas`, ´ladras de marido` e ´destruidoras de casamentos`. Esses casamentos transnacionais entre brasileiras e portugueses têm sido, muitas vezes, associados erroneamente pelos media, ao ´oportunismo` e ´casamentos por conveniência` para conseguir o visto português, contribuindo para a perpetuação de estereótipos discriminatórios (Togni, 2008:13).

33 Até estereótipos positivos, como a alegria, a simpatia e a sensualidade, que para os homens brasileiros garantem pontos no mercado de trabalho, funcionam para as mulheres como uma armadilha, pois estas características acabam por adquirir uma conotação pejorativa, pois se associam ao comércio do sexo e à permissividade sexual, sendo constantes vítimas de assédio sexual, como podemos constatar, através das opiniões de Padilha e Malheiros:

―A simpatia, em conjunção com a imagem estereotipada da mulher brasileira, leva a que ela seja vista como prostituta ou fácil, em muitas circunstâncias. Isto acaba por condicionar o quotidiano da mulher que, mesmo sem ter em conta a sua aparência, classe social e raça, é frequentemente vista como uma possível prostituta ou ―menina de programa‖ (Padilla in Malheiros (org.),2007:133).

―Além disso, o comportamento dos homens portugueses perante as mulheres brasileiras é frequentemente marcado por atitudes que, explícita ou implicitamente, podem considerar-se assédio sexual‖ (Malheiros,2007:29).

Sejam positivos ou negativos, a realidade é que os estereótipos dificultam a integração das imigrantes brasileiras na sociedade portuguesa, pois embora os estereótipos positivos possam facilitar a entrada no mercado de trabalho, também podem ser mal interpretados e resultar em situações discriminatórias, no caso das mulheres.

34 II. A CONSTRUÇÃO, DIVULGAÇÃO E PERPETUAÇÃO DO IMAGINÁRIO SENSUAL DOS TRÓPICOS