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Weber, interpretado por Swedberg (2005, p. 69), propõe uma leitura das diferenças dos tipos de profissionais que trabalham em uma empresa, aqui chamada de firma. A leitura weberiana chama a atenção para a distinção presente entre as duas categorias profissionais, uma racional, mais culta – geralmente no setor administrativo – e a outra constituída por operários, ligados a serviços manuais.

Há dois tipos de pessoas que trabalham para uma firma: os membros da equipe administrativa e os operários. Os primeiros tendem a ser racionais em seu comportamento dentro da firma; organizam-se sob a forma de uma burocracia; e são motivados basicamente por grandes salários, ambição e um sentimento de vocação. Os operários, por outro lado, obedecem por hábito (‘disciplina’); suas tarefas no trabalho são organizadas, embora não sob a forma de uma burocracia; são motivados pelo fato de que, se não trabalharem, eles e suas famílias morrerão de fome.

Motoboys se constituem como a categoria de atividades responsável pela prestação de serviços para os membros do primeiro grupo citado. Uma burocracia que faz compras por telefone e internet para receber em casa. Sua condição social, e financeira, permite essa comodidade. Os operários, neste caso os motoboys, respondem pela urgência de obter renda e não há muita escolha a não ser realizar entregas, cenário que será melhor apresentado no terceiro capítulo.

Igualmente, no capítulo 3 nos dedicamos a análise da categoria pressa e como ela é significada pelos motoboys. Pierre Bourdieu, na obra A Distinção, expõe essas cisões (operários/burocratas) por meio de diversas entrevistas com franceses. Nela, o autor mostra, por exemplo, que as classes mais baixas estão associadas com a pressa.

Os motoboys são exemplos de categoria que está sempre correndo, a pressa é uma constante, como veremos no capítulo final. As diferenças de classes, assim, se constroem igualmente no campo do consumo.

Seguindo o mesmo caminho de Bourdieu, Souza destaca o tempo livre – para falar da realidade brasileira – como um grande diferencial para as classes mais altas conseguirem se destacar (2011, p. 37), seja porque elas têm tempo de ler jornais e revistas e podem, por exemplo, se preparar melhor para vestibulares nas universidades mais disputadas do Brasil.

No próximo capítulo – antes de discutir a rotina laboral dos motoboys, seus gostos e estilos de vida, faremos a apresentação das regras de trânsito que regem o trabalho de motoboy nas cidades. Abordaremos ainda a legislação quanto ao uso da motocicleta de forma mais geral. Essa questão é importante para entender como se constrói a ideia de pressa e quais elementos concorrem para a estatística preocupante de acidentes com a categoria na Grande Florianópolis.

3 REGRAS E PRÁTICAS DE TRÂNSITO NAS CIDADES BRASILEIRAS

O trânsito é um dos principais exemplos de regras que devem ser seguidas para tornar a vida de todos mais fácil e que conforma a nossa forma de existir e nos deslocar. O desrespeito às normas pode transformar um simples deslocamento em uma epopeia. Não seguir instruções simples, como respeitar distância do veículo da frente, ou não sinalizar mudanças de pista com a seta, pode resultar em acidentes. Ao aceitar dirigir um veículo, o indivíduo se sujeita as regras impostas pelo Estado, seus mecanismos de dominação, utilizados como forma de colocar ordem na vida em grupo. “O Estado, parece-me, deve ser pensado como produtor de princípios de classificação, isto é, de estruturas estruturantes capazes de serem aplicadas a todas as coisas do mundo, e em especial às coisas sociais.” (BOURDIEU, 2014, p. 227). Além disso, Bourdieu (2014, p. 230) também fala sobre a reprodução da ordem simbólica, essencial no trânsito, constituído quase que plenamente pela questão simbólica, como viaturas policiais ou pela própria lei.

Guisard (2016) mostra que, a necessidade de produzir mais, entregar mais, cria condições para novos serviços e novas regras, tendo o Estado que se adaptar para ficar em uma espécie de sintonia com o setor privado. Aplicativos de transporte de passageiros, como o Uber, e de entrega (iFood, Rappi) são exemplos dessa nova realidade, onde a tecnologia trouxe uma nova dinâmica para a vida, com mais facilidade, mas também trouxe novas condições de trabalho, muitas deles ferindo direitos e regras anteriormente seguidas. Cabe ao Estado definir, mudar se necessário, o que já estava estabelecido. A nova realidade no mercado de trabalho brasileiro, que ainda se encontra com alto índice de desempregados – acima de 10% da população no início de 201913 levou ao crescimento por outras fontes de renda que não aquelas em empregos com carteira assinada. Neste movimento, reportagem do jornal O Estado de S.Paulo do dia 28 de abril de 201914, mostra que mais de 5,5 milhões de pessoas usam apps de transporte para trabalhar. Seja no Uber ou no iFood essas pessoas buscam ter uma fonte de renda na ausência de outra alternativa. Pelo lado positivo temos nesta situação

13http://agenciabrasil.ebc.com.br/economia/noticia/2019-03/taxa-de- desemprego-sobe-e-fica-em-124-em-fevereiro. Acesso em 07 mai. 2019. 14https://economia.estadao.com.br/noticias/geral,5-5-milhoes-usam-apps-de- transporte-para-trabalhar,70002807114. Acesso em 07 mai. 2019.

a realocação de milhares de pessoas anteriormente sem emprego, mas o ponto negativo nos traz o aumento do número de motoboys circulando pelas cidades, o que acaba aumentando o risco de acidentes com profissionais desta categoria.

No contexto do trabalho dos motoboys, é importante inicialmente, entender como funcionam as regras para os profissionais que se aventuram pelas ruas das cidades. Outro ponto que merece reflexão é pensar se as leis são respeitadas ou não, já que existe uma cultura de permissividade quanto a obedecer ou não as leis. Casos como o uso do cinto de segurança no banco traseiro dos carros é um exemplo de lei que não “pegou”, pouco respeitada pelos brasileiros.15

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