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Caracterização dos Contextos Educativos

2. Intervenção no Contexto A – Creche

2.2. Estratégia 2 – As Nossas Histórias

A segunda intervenção neste contexto direciona-nos para o mundo das histórias infantis. É inegável que estas fazem parte da infância e promovem o desenvolvimento do sentido criativo e imaginativo das crianças. Afirma Veloso “O que as histórias contam à criança permite um estilhaçar de paredes de vidro que a limitam, levando-a a pensar no mundo que quer conquistar […]” (2005, p. 23). Para além de promoverem a imaginação, as histórias fomentam o gosto pela leitura. Para o presente projeto de investigação, a leitura de uma história como estratégia de transição, permitiu a criação de um momento de tranquilidade e a melhoria da etapa que se seguia na rotina.

As crianças do contexto A chegam à instituição em diferentes horas da manhã. São recebidas pelas equipas pedagógicas nas respetivas salas. Ao longo do estágio, verifiquei que depois do acolhimento se seguia, de imediato, o lanche da manhã. Era visível a dificuldade em lidar com esta transição. As crianças ainda se estavam a recompor da separação com as famílias e logo tinham que se dirigir para um outro espaço. Senti que, entre estes dois momentos da rotina, faltava uma estratégia que facilitasse esta transição. A nota de campo que se segue descreve a dificuldade de uma transição neste período.

Nota de Campo – 12 de outubro de 2016 Intervenientes: Equipa pedagógica; Crianças

Local: Sala de atividades; Refeitório

“Meninos vamos lanchar” – É a frase proferida pela educadora que assinala o avançar na rotina. Foram precisos mais de quinze minutos para reunir todo o grupo na porta da sala. Não é fácil retirá-los das suas brincadeiras. A educadora e a auxiliar andam numa correria a removê-los individualmente das zonas onde brincam. Choro constante. As que acabaram

de chegar ainda nem estão recompostas das dolorosas despedidas. Choro também da parte destas. Mas ainda assim, iniciamos o percurso pra o refeitório. Ignorando as chorosas crianças, inicia-se a cantiga do “Indo eu, indo eu”, bastante comum nesta sala.

Ruído sonoro que faz aumentar ainda mais o volume do choro das crianças. É normal, afinal elas precisam de ser ouvidas. Mas quem é que consegue ouvir uma criança que

102 Era bastante óbvio que as crianças precisavam de um momento de harmonia antes de prosseguir na rotina. Em reflexão com a cooperante, decidimos então que as histórias poderiam constituir uma estratégia facilitadora desta transição, algo que se veio a comprovar ao longo do estágio. No início, poucas crianças se interessavam pela história e continuavam a brincar, o que perpetuava a agitação da ida para o refeitório. Compreendo que para as crianças que continuavam a brincar, a história não tinha a mesma importância do que a brincadeira. Por outro lado, é certo que nem todos os meninos têm que se interessar sempre pelas histórias. Ainda assim, verifiquei que o público que se interessava e escutava o conto foi crescendo gradualmente. A transição entre o acolhimento e o lanche foi-se apaziguando, bem como o próprio momento do lanche.

Soares afirma que “Quem ouve histórias desenvolve a capacidade de entender e imaginar, enriquecendo a sua leitura do mundo. Criam-se condições para que se amplie o seu mundo simbólico e desenvolva a consciência das suas emoções […]” (2013, p. 18). Para além dos objetivos referidos no parágrafo inicial, que relacionam a presente estratégia com os momentos de transição, a leitura de um conto permite a criança desenvolver diferentes competências pessoais e sociais, como a comunicação e a imaginação. Ao longo da investigação, esta estratégia foi evoluindo. Se na fase inicial da sua implementação, apenas os elementos da equipa adulta liam as histórias, com o avançar da mesma (estratégia), também as crianças começaram a “ler” para os colegas. A escolha das da narrativa passou a ficar a cargo dos meninos. Devo afirmar que a escolha recaía quase sempre sobre a mesma história. A nota de campo que se segue relata a importância que as histórias assumiram no momento de transição referido.

103 Pouco tempo após ter chegado à sala, o João pediu a história. Sem que eu me pudesse aperceber, as restantes crianças foram-se sentando no tapete. Sem que ninguém as informasse, descodificaram o propósito da minha ida ao armário com o João. Este episódio não foi exceção neste contexto. O momento do conto nesta fase da rotina começou a fazer sentido para as crianças deste grupo. É importante referir que no segundo período de estágio neste contexto, observei que este momento estava já cristalizado na rotina, não como uma estratégia de transição, mas como um momento de maior duração. No início da sua implementação, a duração temporal desta estratégia era bastante reduzida e, por esta razão, constituía uma estratégia facilitadora do momento de transição. Ao regressar novamente ao contexto, a leitura da história contava com uma duração temporal superior e assinalava o início do dia na sala.

Nota de Campo – 2 de novembro de 2016 Intervenientes: Educadora-Estagiária; João

Local: Sala de atividades; Refeitório

Pouco depois de ter entrado na sala, o João dirigiu-me um pedido. “A itóia”. Queria ir buscar a história para ler aos colegas. Encaminhámo-nos então para o armário, a fim de

efetuarmos a seleção de um livro. Embora soubesse que se referia a uma história em particular (era sempre a mesma), decidi pegar num outro livro com bebés na capa e

mostrei-o ao João.

Ed. Est. – Vamos ler a história dos bebés hoje, João? João: – Não! A “itóia”.

Ed. Est. – Mas esta também é uma história. É a história dos bebés. É diferente! João: – Naaão! A “itóia”

Ed. Est. – Ok João. Então vamos lá ver se os outros meninos também querem a que tu escolheste.

Incrível a capacidade das crianças. Quando me virei para trás, a maior parte do grupo já estava sentada no tapete, esperando por nós.

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