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A temática da implementação de políticas públicas está, como referido anteriormente, ainda pouco explorada em Portugal, não obstante a sua importância e a enorme pertinência do seu estudo no nosso país (Cardim, 2006; Mota, 2016; M. de L. Rodrigues & Silva, 2012).

Para além da parca produção científica nesta temática mais abrangente, a análise da implementação de políticas públicas na área relativa ao património cultural e à sua preservação e valorização está ainda numa fase muito incipiente, face à pouca atenção política que recebe e aos reduzidos envelopes financeiros que detém.

Face a este contexto, existem poucos estudos empíricos que possam servir como base clara para a nossa investigação e para a formulação de hipóteses claras. Neste sentido, este trabalho reveste-se de um caráter exploratório, numa tentativa de conduzir um dos primeiros estudos sobre este tema, com o objetivo principal de perceber quais os fatores que influenciam, positivamente e negativamente, a implementação das políticas públicas na gestão dos centros históricos Património Mundial Cultural, em Portugal.

A questão de investigação da qual partiu toda a investigação aqui apresentada é, portanto, a seguinte:

Quais os principais fatores críticos da implementação de políticas públicas de gestão dos centros históricos Património Mundial Cultural, em Portugal?

Face à parca existência de estudos sobre implementação, sobretudo nesta área, em Portugal, este tema será explorado através do recurso aos quadros de análise (frameworks of analysis) disponibilizados pela literatura referente aos Estudos de Implementação, que identificam um conjunto de possíveis fatores que poderão influenciar a implementação de políticas públicas.

A prossecução do objetivo geral supracitado será, portanto, realizada de uma forma indutiva e teoricamente orientada, tal como aconselhado em análises da implementação de políticas públicas cujos objetivos sejam descritivos e compreensivos, em detrimento de objetivos preditivos e prescritivos (Mota, 2016).

Este objetivo geral podia ser atingido, de acordo com a literatura consultada e as teorias propostas, através da recolha dos seguintes dados: caracterização dos atores diretamente envolvidos na gestão dos centros históricos; identificação dos objetivos definidos e das atividades desenvolvidas; identificação da origem e quantidade de recursos financeiros, humanos e logísticos; identificação e caracterização das parcerias estabelecidas; caracterização do envolvimento e participação dos cidadãos; identificação dos resultados e impactos das políticas públicas seguidas.

Para além da caracterização destes elementos, seria necessário ainda identificar e analisar de forma mais aprofundada quais os fatores facilitadores e inibidores para a implementação das políticas públicas, assim como os desafios referidos para o futuro.

Tendo como base a questão acima citada, a investigação realizada tinha estes grandes objetivos gerais:

 Descrever quais os atores que estão diretamente e indiretamente envolvidos no processo de implementação da gestão dos Centros Históricos Património Mundial Cultural;

 Descrever os objetivos e atividades dos planos de gestão dos Centros Históricos Património Mundial Cultural, bem como os resultados e impactos dessas atividades;

 Compreender quais os fatores que influenciam a implementação das políticas públicas de gestão dos centros históricos Património Mundial Cultural, em Portugal.

Face a estes objetivos e à natureza exploratória do estudo, o método de investigação que nos pareceu mais adequado para este trabalho é o estudo de caso múltiplo.

De acordo com Yin (2003, pp. 13–14), o estudo de caso é caracterizado tecnicamente por ser um método que aborda um determinado fenómeno contemporâneo, no seu contexto real, e que é especialmente adequado quando a fronteira entre o fenómeno e o contexto no qual este se desenrola não é particularmente bem definida. Para além disso, o estudo de caso também é indicado para lidar com o facto de, num contexto real, poderem existir muitas mais variáveis de interesse do que pontos de recolha de dados, e para beneficiar

do desenvolvimento prévio de proposições teóricas que possam direcionar a recolha de informação e a análise da mesma (Yin, 2003, pp. 13–14).

Tendo em linha de conta esta definição apresentada anteriormente, pode-se depreender que o estudo de caso é particularmente adequado para estratégias de investigação que procuram responder a perguntas de “como” e “porquê” sobre um acontecimento ou fenómeno contemporâneo, sobre o qual o investigador tem pouco ou nenhum controlo (Yin, 2003, p. 9). Assim, a grande vantagem do estudo de caso relativamente a outros métodos de investigação é a sua capacidade para examinar, aprofundadamente, um determinado caso no seu contexto real, o que permite encontrar respostas que possam ajudar a explicar o fenómeno que está a ser estudado (Yin, 2004).

As vantagens da escolha do estudo de caso múltiplo, ao invés do estudo de caso único, enquanto metodologia de investigação deve-se, segundo Yin (2004), ao facto de esta escolha ser uma forma de contornar a crítica de que os estudos de caso são, de alguma forma, únicos e idiossincráticos e, assim, têm valor limitado para além desse contexto específico.

No sentido de efetuar uma investigação sobre a implementação de políticas públicas de preservação e valorização do património cultural foram identificados quatro casos possíveis de estudo: o centro histórico de Angra do Heroísmo, o centro histórico de Évora, o centro histórico do Porto e o centro histórico de Guimarães. Esta escolha pode ser justificada pelo facto de todos eles estarem incluídos na lista de Património Mundial da UNESCO e terem, por isso, maior visibilidade e responsabilidade na preservação do seu património cultural, no sentido de conseguirem manter esse estatuto.

A escolha de centros históricos como casos passíveis de estudo, em vez de outro tipo de Património Mundial, como monumentos isolados, é justificada por estes estarem inseridos num contexto muito complexo, onde a preservação do património é apenas mais uma das várias necessidades que existem num centro histórico de uma cidade habitada e viva. Esta escolha também foi motivada pelo facto de este ser um tipo de património classificado que pode ser comparado mais facilmente, visto que é expectável que estes casos tenham contextos semelhantes, acabando por permitir a recolha e análise de informação comparável.

Em relação aos casos estudados neste trabalho, estes foram três dos quatro referidos anteriormente: o centro histórico de Évora, o centro histórico do Porto e o centro histórico

de Guimarães. O centro histórico de Angra do Heroísmo não foi possível de analisar devido a constrangimentos de recursos, visto que esta cidade se localiza no arquipélago dos Açores.

A análise dos estudos de caso efetuados foi feita com base em dois métodos de recolha de dados: a análise documental (por exemplo, os planos de gestão) e entrevistas a responsáveis pela gestão dos centros históricos.

A escolha pela realização de entrevistas como forma de recolha de informação para análise deve-se à perspetiva de que estas permitem conhecer factos importantes, para além de possibilitarem uma forma de se compreenderem opiniões, atitudes, comportamentos ou processos, o que se enquadra perfeitamente no âmbito deste trabalho (Rowley, 2012, pp. 261–262). A escolha pela realização de entrevistas semiestruturadas é explicada pelo facto de ser expectável que este tipo de entrevista permita que as opiniões dos entrevistados sejam mais facilmente expressas, visto que se trata de uma entrevista mais aberta do que uma entrevista estruturada ou um questionário (Flick, 2009, p. 150). A utilização de um guião para a entrevista aumenta, segundo Flick (2009, p. 172), a possibilidade de comparação entre as várias entrevistas realizadas e permite que os dados estejam mais estruturados, como resultado dessa utilização.

As entrevistas efetuadas nesta investigação foram realizadas a técnicos que pertencem a uma organização responsável pela gestão de cada um dos centros históricos em análise. Estas entrevistas foram realizadas entre abril e julho de 2016, tendo sido todas elas gravadas, para posterior transcrição, com a autorização expressa dos entrevistados.

Face aos objetivos acima referidos, as entrevistas foram feitas com base no seguinte guião:

1. Definição das Políticas Públicas:

a. Contexto da candidatura a Património Mundial: quando? quem? qual o processo?

b. História da definição dos planos: quando? quem? como?

d. Exequibilidade esperada/expectável dos objetivos no momento da definição

e. Atribuição clara de responsabilidades

f. Articulação com as orientações da UNESCO

2. Implementação

a. Atividades desenvolvidas

b. Recursos: financeiros (percentagem de financiamento público, privado e 3º setor) (suficiente ou não); humanos (competências técnicas; nº suficiente; têm dedicação exclusiva; grau de autonomia; estabilidade da equipa); logísticos (quais; suficientes ou não)

c. Parcerias (relações com outras instituições): quem? (nomes e tipologia: públicas, privadas ou 3º setor); para fazer o quê?

d. Coordenação entre as diversas parcerias (relações verticais e horizontais; nível de formalização das relações; frequência de reuniões; existência de liderança)

e. Envolvimento e nível de aceitação dos cidadãos

f. Resultados

g. Impactos (articulação com os objetivos)

3. Desafios

a. Fatores facilitadores e inibidores da concretização dos planos

b. Desafios de atividade

c. Desafios de contexto (contexto socioeconómico; mudanças políticas; financiamento)

Após a realização das entrevistas e da análise dos documentos pertinentes para a investigação, foi feita uma análise qualitativa dos dados recolhidos, triangulando as diversas fontes de informação no sentido de se conseguir uma análise o mais válida possível.

Ao longo do processo de recolha dos dados foram encontradas diversas limitações e constrangimentos para aceder a informação considerada relevante.

Em primeiro lugar, e como referido anteriormente, o facto de este trabalho ser realizado com poucos recursos financeiros impossibilitou que fosse analisado um caso pertinente para este estudo, em concreto o caso do centro histórico de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, nos Açores.

Em segundo lugar, houve durante todo o processo bastantes dificuldades para se conseguir proceder às entrevistas programadas, o que acaba também por justificar o facto de terem sido feitas apenas três entrevistas, uma para cada caso. Para além disso, não foi possível identificar, nos casos analisados, quais os stakeholders relevantes em todos os casos, que pudessem dar outras perspetivas e informações para esta investigação.

Por último, é também de destacar a diferença entre a documentação técnica disponível publicamente nos vários casos, o que acabou por dificultar a análise, principalmente ao caso de Guimarães, visto que este não possui um plano de gestão, que se revelou ser um documento muito importante para o estudo dos restantes casos.