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ESTRATÉGIAS DIDÁTICO-METODOLÓGICAS PARA O ENSINO DE FÍSICA

ENSINO DE FÍSICA NAS ESCOLAS DO CAMPO

5.2 ESTRATÉGIAS DIDÁTICO-METODOLÓGICAS PARA O ENSINO DE FÍSICA

Na dimensão “Educação no Campo ou Educação do Campo?”, discutimos aspectos referentes à identidade das escolas do campo, tendo como plano de fundo da discussão o currículo dessas escolas. Dando continuidade, ao longo dessa dimensão, abordaremos os aspectos metodológicos do ensino de Física realizado nas escolas do campo.

Na apresentação dos Marcos Normativos da Educação do Campo (BRASIL, 2012) a PA é destacada como uma das experiências que se encontra consolidada e que oferece possibilidades para o atendimento escolar no campo, sendo reconhecida pelos sistemas de ensino, comunidades do campo e pelos movimentos sociais e sindicais, além de estudiosos da área da educação.

A PA “[...] consiste numa metodologia de organização do ensino escolar que conjuga diferentes experiências formativas distribuídas ao longo de tempos e espaços distintos, tendo como finalidade uma formação profissional.” (TEIXEIRA; BERNARTT; TRINDADE, 2008, p. 227) e, pela possibilidade de relação entre família, comunidade e escola vem sendo considerada como a melhor alternativa para a Educação Básica nas Escolas do Campo (BRASIL, 2012).

Como já mencionamos anteriormente, no Capítulo 3, um dos locais que vêm desenvolvendo a PA são as EFAs, que conforme Queiroz (2004) são 123 escolas - que ofertam os Ensinos Fundamental, Médio e Profissional - e estão distribuídas em 16 estados brasileiros.

Os dados obtidos a partir do levantamento bibliográfico sinalizam que dos 9 trabalhos selecionados, o contexto de 7 são as EFAs. Estes trabalhos apresentam discussões similares por serem todos do mesmo grupo de pesquisadores e ter pelo menos um autor em comum.

O perfil metodológico das Escolas Famílias Agrícolas (EFAs) é baseado na Pedagogia da Alternância (PA), que é uma alternativa para a Educação no campo, pois como se sabe o ensino neste contexto não contempla as necessidades da população que vive neste universo. Alguns problemas educacionais encontrados nas escolas no meio rural dão origem à necessidade de uma proposta educacional específica para o campo.

Os autores de T7 citam alguns fatores que podem ser considerados problemas nas escolas do campo, tais como: o distanciamento entre a escola e a realidade local, a necessidade dos alunos permanecerem nas propriedades rurais em função do trabalho da família e impossibilidade de acompanhar o calendário escolar tradicional.

Na mesma perspectiva, os autores de T6 (p. 8) também destacam o distanciamento entre os conceitos presentes nos livros didáticos e o que é vivenciado pelo aluno: “Para o aluno de zona rural, muitos temas estudados nos livros estão distantes de sua realidade, este perde o estimulo em estudar, abandona a escola e acaba voltando para a lavoura sem ter perspectivas futuras [...]”.

Sobre o abandono da escola pelos jovens rurais, cabe salientar que

O número de analfabetos de todas as idades é sempre maior na área rural do que nas cidades, especialmente entre os garotos de 5 a 11 anos, e entre os que têm 24 anos ou mais. Há muito mais pessoas sem instrução ou com apenas o nível fundamental incompleto na área rural do que nas cidades . Para todos os demais níveis de escolaridade (fundamental completo, médio incompleto, médio completo, superior incompleto, superior completo), os jovens das cidades estudam mais do que os jovens no campo (CASTRO et al., 2013, p. 20-21).

Do mesmo modo, os autores de T3 (p. 2) argumentam que

A falta de contextualização dos conteúdos curriculares com as realidades nas quais os alunos se inserem, torna o processo de ensino aprendizagem mais difícil, pois não suscita a curiosidade e o interesse genuíno dos ed ucandos.

Assim, nesse trabalho (T3, p. 2), os autores destacam a importância de

[...] considerar os conhecimentos prévios, a cultura, do educando, e no que tange à Educação do Campo, do sujeito do campo. Além disso, é preciso assumir a pugna por uma educação libertadora, garantindo a qualidade e respeito à cultura do sujeito do campo.

A Educação Libertadora para Freire (1983) não é a simples transmissão ou transferência de saber e/ou de cultura e implica na superação da contradição educador- educando.

No que se refere ao ensino de Física, os autores de T4 (p. 6) enfatizam que “[...] a Física deve ser contextualizada e relacionada a fenômenos cotidianos, culturais e sociais de um determinado meio”. Nesse sentido, Ricardo (2010, p. 34) argumenta que “A ideia de um ensino de Física contextualizado está cada vez mais presente no discurso dos professores e educadores, o que não significa, necessariamente, que seja uma prática corrente na escola”.

No PPP da escola E1 há um indicativo para a necessária contextua lização:

Há muito vemos o trabalho docente ser desenvolvido de forma isolada dentro da escola. Essa prática não atinge os resultados almejados. Sendo assim, torna -se necessária uma mudança de postura dos profissionais da área de educação, considerando as realidades individuais e culturais de cada aluno, e com isso ter como referência a relação que existe entre os envolvidos na atividade educativa. (PPP1).

Nessa perspectiva, T3 (p. 6) aponta a necessidade da utilização de um vocabulário adequado sobre os conhecimentos científicos e relacionado à realidade dos indivíduos porém a partir de pesquisa os autores identificaram que os estudantes apresentam grande dificuldade e atribuíram a “[...] dificuldade dos monitores/professores da utilização de uma física distante, “abstrata” e cheias de fórmulas sem sentido fenomenológico, histórico e conceitual”.

Sobre a educação em Ciências na Educação do Campo, conforme T8 (p. 179), “[...] é condição necessária da PA e assim, a busca por relações entre Educação do Campo, PA e Ciências torna-se uma etapa essencial na formação do camponês, para o exercício da sua camponia”.

Nos trabalhos desenvolvidos em EFAs identificamos que em todos foi utilizada a Etnofísica enquanto estratégia didático-metodológica. Nesse sentido, de acordo com T3 (p. 4): “No que tange ao Ensino de Física é importante ressaltar o uso da Etnofísica, uma vez que ela nos possibilita perceber a relação entre a Física e a realidade das EFAs”.

Os autores de T2 salientam que buscaram realizar um estudo que possibilitasse uma relação entre o conhecimento científico e os conhecimentos populares das EFAs. Esse estudo foi balizado na Etnofísica, que segundo eles é a “[...] área da Física que busca compreender, a partir dos próprios grupamentos sociais, a sua visão de mundo”.

Concordamos com Anacleto e Dos Santos (2006, p. 2-3) quando afirmam que a Etnofísica é “[...] um importante recurso para conhecer o comportamento de uma sociedade, de cada indivíduo, valorizando-os como seres humanos pertencentes a uma história e a uma sociedade maior”.

[...] a Etnofísica auxilia no entendimento dessa diversidade cultural e histórica nos diferentes contextos, gerando novas abordagens de tema, fazendo com que o educando se sinta parte do processo de ensino-aprendizagem, e mais ainda, como participante da sociedade em que vive, aproximando as relações entre individuo e a instituição, e o sujeito e objeto de estudo.

Em T6 (p. 1-2) é discutida a utilização de atividades experimentais como uma possibilidade de consolidar os conhecimentos teóricos, destacando que a sua utilização tem sido impossibilitada pelo currículo:

Observa-se frequentemente no Ensino Médio a existência de uma pequena quantidade de aulas de Física, embora se constate um conteúdo programático demasiadamente extenso, de modo que há grande dificuldade para que sejam incorporados tópicos relevantes de Física Moderna e Contemporânea, visando atualizar o currículo com temáticas capazes de proporcionar uma vis ão mais abrangente e adequada acerca das fenomenologias e tecnologias que influenciam diretamente o modo de vida atual. Por outro lado, a inadequação da estrutura curricular tem impossibilitado o /desenvolvimento de atividades experimentais que permitiriam consolidar os conhecimentos teóricos adquiridos, bem como desenvolver uma série de competências e habilidades solicitadas nas atuais orientações curriculares presentes na LDB, nas DCNEM e em documentos como os PCN.

Quanto à utilização de atividades experimentais, Chaves (2014) defende que podem ser potenciais no sentido de contribuir para que os estudantes possam construir o conhecimento científico através de seus conhecimentos prévios, destacando a possibilidade dessas atividades serem utilizadas tanto para explicar conteúdos como para problematizar.

Conforme a autora as atividades experimentais podem ser utilizadas de diferentes maneiras conforme o objetivo do professor para a aula, no entanto quanto mais próximas essas atividades forem da realidade dos estudantes, mais significado terão para eles e assim, contribuirão de forma mais efetiva no processo de ensino-aprendizagem.

Salientamos que além de atividades experimentais outras estratégias que poderiam ser utilizadas, embora que não tivessem sido mencionadas pelos professores entrevistados nem nos trabalhos publicados nos eventos e que fizeram parte do corpus desta pesquisa, são as Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) e os júris simulado, entre outras metodologias que favoreçam a argumentação em sala de aula e nas quais o aluno assuma o papel de sujeito do conhecimento.

Quanto às TDIC, entendemos que podem ser usadas de diferentes formas dependendo do objetivo da aula, desde atividades mais pontuais como o uso de um software, de uma simulação até a construção de um blogue. No entanto, não é mera inclusão destas tecnologias em sala de sala que garante que suas potencialidades sejam exploradas, mas o uso que é feito delas. As TDIC devem contribuir como recursos a favor dos planejamentos e execução das

atividades, ao mesmo tempo em que reforçam o papel do professor como mediador e sua autonomia, saindo do mero reprodutor do livro didático (LEONEL, 2015).

Desta forma, balizados em Almeida e Da Silva (2011), enfatizamos que as TDIC precisam ser integradas ao currículo de forma crítica, sendo necessário que o professor possa apropriar-se da cultura digital e das propriedades intrínsecas das TDIC, refletindo sobre por que e para que usar a tecnologia, de que forma utilizar e quais contribuições essa utilização trará. Ademais,

[...] julgamos pertinente que a formação inicial u ltrapasse o instrumentalismo técnico e crie a noção de que a simples inclusão das tecnologias não resolve todos os problemas educacionais, mas é o uso consciente e crítico delas que contribui com o enfrentamento desses problemas. Sendo o professor um dos principais agentes de transformação, é urgente repensar a sua formação e lutar pela valorização de sua função. Além disso, em uma sociedade em constante processo de mud ança, é necessário investir nos processos de formação continuada. (LEONEL, 2015, p. 259).

Além disso, cabe ressaltar que as TDIC podem superar as barreiras geográficas e viabilizar que os educadores, muitas vezes atuando de forma isolada, possam interagir com outros educadores, favorecendo assim o compartilhamento de conhecimentos e práticas. Nesta perspectiva, a constituição de comunidades virtuais de práticas pode contribuir com esse compartilhamento e com o processo de formação permanente dos educadores, desde que estejam digitalmente incluídos (LEONEL, 2015).

No que se refere ao júri simulado, salientamos que a sua utilização em sala de aula apresenta muitas potencialidades, como o favorecimento da capacidade argumentativa e de justificativas coerentes, além da possibilidade de troca de papeis entre os estudantes (BERNARDO et al., 2013).

Para Vieira, Melo e Bernardo (2014, p. 204):

[...] em atividades de júri simulado, os estudantes podem assumir diferentes papéis enunciativos, tais como defensor, oponente ou juiz dos argumentos produzidos [...]. Além disso, os estudantes podem permutar os seus papéis, experimentando posições com as quais eles não necessariamente concordam.

Esses autores argumentam que com atividades como os júris, os alunos tornam-se ativos no processo de ensino-aprendizagem e que estes são potenciais para o debate de questões sociocientíficas, por favorecem a argumentação.

Na mesma perspectiva, Germano, Neves e Silveira (2016) apresentam o resultado de uma pesquisa realizada com duas turmas de 9º ano do Ensino Fundamental. A pesquisa consistiu na análise da implementação do tema "Fontes de Energias Modernas" a partir de produções dos alunos, anotações em diário de campo e mini relatórios. As atividades

desenvolvidas foram organizadas em seis momentos, sendo que o quarto momento destinou- se à realização de um júri simulado entre os estudantes.

O júri simulado ocorreu após serem feitos questionamentos sobre os tipos de fontes de energia conhecidas pelos estudantes e, dentre as opções levantadas pelos mesmos foram escolhidas por eles para a realização do júri, a energia eólica e a energia nuclear. Como resultados da pesquisa são apontados o desenvolvimento de argumentos sólidos por parte dos estudantes a fim de defender seus pontos de vista e uma abordagem mais crítica dos fenômenos físicos a partir do estabelecimento de relações entre os conceitos e os seus cotidianos (GERMANO; NEVES; SILVEIRA, 2016).

Portanto, entendemos que a partir da construção do currículo há a necessidade de escolha de estratégias didático-metodológicas coerentes com os objetivos de cada aula e que favoreçam e fomentem a participação, a argumentação e o desenvolvimento de um olhar mais crítico.