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3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

3.2 Estratégias e definições sobre a produção de dados

Uma das características fundamentais dos estudos que priorizam a abordagem qualitativa, segundo Yin (2010), é a interpretação dos dados feita no contexto. Para tanto, as fontes de evidência utilizadas nesse estudo constituíram-se de entrevistas semiestruturadas, observações e análise de artefatos físicos. Além das três entrevistas concedidas pelos pescadores, contribuíram para análise dos dados outras “conversas” com outros moradores da Ilha da Pintada. Assim, pode-se dizer, que o relato de esposas, filhos e

41 netos de pescadores, ainda que não tenham sido explicitados nesse estudo, também colaboraram para a compreensão do fenômeno em questão.

Entrevistas são consideradas por Yin (2010) como um dos recursos mais importantes para o estudo de caso, constituindo-se mais como conversas guiadas, que investigações estruturadas. No entanto, elas devem ser sempre consideradas apenas relatos verbais, visto que as respostas dos entrevistados estão sujeitas aos problemas comuns de “[...] parcialidade, má lembrança e articulação pobre ou inexata, sendo necessário corroborar os dados da entrevista com informações de outras fontes.” (YIN, 2010, p.135).

Por se tratar de um estudo de caso etnográfico as entrevistas realizadas podem ser consideradas como conversas informais em que há uma cooperação efetiva dos informantes. Segundo Spradley (1987, apud ANDRÉ, 2000), em estudos etnográficos o pesquisador deve se portar como um aluno que está diante não de um sujeito que explica e responde as questões propostas, mas de um professor cujo saber e ideologia própria perfazem sua visão de mundo.

Com o propósito de estabelecer um guia para as “conversas”, um roteiro de perguntas foi criado (Apêndice A). Sob a forma de um esquema básico, o roteiro permitiu, de certo modo, que não fossem esquecidos ao longo da conversa questionamentos que proporcionassem respostas ao problema de pesquisa.

Vale ressaltar que, ao longo da entrevista, foram realizadas muitas adaptações visto que os pescadores se propuseram a contar muitas histórias, as quais permitiram, sobretudo, desenvolver intuitivamente ideias sobre o modo como lidam com as questões do dia a dia da pesca artesanal.

Lüdke e André (1986) apontam que além do respeito pela cultura e pelos valores do entrevistado, o entrevistador tem que estimular o fluxo natural de informações por parte do entrevistado. Aliás, estar aberto ao relato dos participantes, sem preocupar-se demasiadamente com a linguagem é característica da pesquisa em Etnomatemática (D’AMBROSIO, 2001).

A fim de compreender os saberes dos pescadores com maior riqueza de detalhes possíveis, suas falas foram gravadas em áudio para que pudessem

42 ser ouvidas o número necessário de vezes pelo pesquisador. Somado a isso, foram registradas algumas imagens que permitiram ir além do que foi dito pelos entrevistados, logo, a observação constituiu outra fonte importante para a produção de dados.

Realizada em seu ambiente natural, a observação é considerada por Marconi e Lakatos (2010) como a técnica chave do método etnográfico. Compreendida por Angrosino (2009, p.74) como “[...] o ato de perceber um fenômeno, muitas vezes com instrumentos, e registrá-los com propósitos científicos” a observação constitui um desafio peculiar na pesquisa Etnomatemática: o de observar com “outros olhos”. Perceber o outro partindo de um olhar baseado na sua realidade sociocultural e não por meio de um recorte parcial de quem vê de fora requer, conforme Rosa e Orey (2012), cautela dos pesquisadores, para que não corram o risco de transmitir as informações “[...] com base em fatos e fenômenos julgados a partir de nossa própria visão e de nosso perfil cultural.” (p.867).

Isso vai ao encontro do princípio da relativização apontado por André, (2000), quando afirma que o ato de situar o eixo de referência no universo investigado, descentralizando da sociedade do observador, consiste no maior obstáculo das pesquisas etnográficas. Ou seja, ao ser instado a interpretar e descrever uma cultura diferente da sua própria, o pesquisador , na medida do possível, “despir-se” de suas concepções e visão de mundo, buscando olhar e conhecer o outro sob o olhar do outro. Nesse mesmo sentido, Campos (2002, p.47) aponta que “[...] é necessário que durante os momentos de estranhamentos nas leituras do mundo do outro, esforcemo-nos em eliminar ao máximo nossas bagagens disciplinares e pré-conceitos.”.

Aliás, é relevante destacar que o papel do observador, segundo Angrosino (2009), pode variar em função do seu grau de envolvimento com o que está sendo pesquisado, podendo ser categorizado como: invisível; observador–como-participante; participante-como-observador ou; participante totalmente envolvido. Em particular, nesse estudo, adotou-se o papel de observador-como-participante visto que, sob essa postura “[...] o pesquisador é conhecido e reconhecido, mas relaciona-se com os “sujeitos” da pesquisa apenas como pesquisador.” (ANGROSINO, 2009, p.75).

43 Juntamente com as entrevistas e observações, também se recorreu à análise dos artefatos que permitiram constatar a evolução dos saberes da pesca, mediante à verificação das mudanças ocorridas ao longo do tempo. Conforme definição etimológica, a palavra artefato vem do latim arte factus, que significa feito com arte (CUNHA, 1982). No entanto, o conceito de artefato utilizado nesse estudo apoia-se em um sentido antropológico dado por D’Ambrosio (2009), o qual conceitua artefatos como “[...] manifestações concretas da criatividade humana, transmissíveis de indivíduo para indivíduo através de contato direto ou remoto.” (p.140).

A partir dessa definição, podem ser considerados como artefatos os objetos, documentos escritos, imagens, fotografias e outros materiais que dão sentido às ações do homem no passado e que representam o dito e o feito na história da humanidade. Sob a visão de D’ Ambrosio (2005) o ser humano modifica a realidade pela introdução de novos fatos, artefatos e mentefatos, portanto, quando se objetiva entender o homem é preciso, sobretudo, compreender o significado dos artefatos e mentefatos por ele concebidos e criados.