• Nenhum resultado encontrado

3 CAPÍTULO II Articulando perspectivas teóricas: A Teoria Das Representações

3.2 Estratégias de Enfrentamento

Nos últimos tempos, diversas áreas do conhecimento vêm discutindo o conceito de enfrentamento. Na Sociologia, por exemplo, o enfrentamento é entendido como as formas pelas quais a ordem social se adapta às crises. Enquanto isso, na Biologia, o conceito é definido com base na ideia de adaptação do organismo a agentes nocivos. Na Psicologia, por sua vez, o termo tem sido utilizado buscando compreender a maneira com a qual o sujeito se adapta a diferentes fases do desenvolvimento e a situações estressantes, tais quais o acometimento de uma doença, a perda de um ente querido, entre outros (Nascimento & Nunes, 2011).

Vários estudos sobre estratégias de enfrentamento na área de saúde vêm sendo desenvolvidos. Estes retratam o enfrentamento da quimioterapia por cuidadores de crianças (Almico & Faro, 2014), da relação entre percepção e estratégias de enfrentamento utilizadas por pais/cuidadores de crianças com doenças crônicas (Coletto & Câmara, 2009), da utilização de estratégias de coping por familiares de pacientes oncológicos hospitalizados (Fetsch et al., 2016; Mattos, Blomer, Campos, & Silvério, 2016), do enfrentamento de mulheres com câncer de mama em quimioterapia (Silva, Zandonade, & Amorim, 2017), isto porque é cada vez maior o interesse de profissionais da saúde em avaliar a maneira como as pessoas lidam com situações estressantes e conflituosas, para, a partir disso, planejar intervenções (Martins, Filho, & Pires, 2011).

Embora existam diferentes abordagens teóricas sobre o coping, neste estudo será utilizada a perspectiva cognitiva do coping, proposta por Lazarus e Folkman, por considerar os aspectos simbólicos e o contexto ao qual o sujeito está inserido.

Na perspectiva de Lazarus e Folkman, o conceito de enfrentamento, ou estratégias de coping, refere-se a esforços cognitivos e comportamentais que o sujeito utiliza com o intuito de manejar demandas estressantes internas e externas. Em outras palavras, são esforços para adaptar-se a determinada situação de estresse que se constitui em uma sobrecarga de seus recursos, diante de uma ameaça ao bem-estar, visando lidar da melhor forma possível com esse evento estressor, reduzindo ou minimizando seu caráter aversivo. Assim, o indivíduo, em uma situação de estresse, pode fazer uso de várias estratégias de enfrentamento, as quais podem mudar de momento para momento, de acordo com o estágio do evento estressor (Lazarus & Folkman, 1984).

O modelo proposto por esses autores compreende quatro nuances: 1) coping enquanto interação entre o indivíduo e o ambiente; 2) coping exercendo controle ou domínio da situação estressora, administrando-a; 3) coping pressupondo a avaliação do fenômeno, no sentido de compreender como o indivíduo o percebe, interpreta e representa; 4) coping enquanto um esforço do indivíduo para lidar com as demandas advindas do evento estressor (Antoniazzi, Dell‟aglio, & Bandeira, 1998).

De acordo com esta abordagem, as estratégias de enfrentamento classificam-se em duas categorias: focalizadas no problema ou centradas na emoção. As primeiras são estratégias ativas de aproximação ao evento estressor. Elas visam analisar a situação vivenciada, de modo a buscar alternativas para resolvê-las. As segundas, por sua vez, podem representar atitudes de afastamento em relação à fonte de stress, no geral, são atitudes adotadas pelos sujeitos quando estes percebem que não há como modificar os estressores. (Mattos et al., 2016).

Em vários contextos como, por exemplo, o do cuidado para com um familiar doente, são utilizadas tanto estratégias focadas no problema quanto na emoção, inclusive de forma simultânea, tendo em vista que elas não são mutuamente exclusivas. Os tipos de estratégias que serão utilizados dependerão de como a família estrutura-se diante do diagnóstico, do tipo de enfermidade, do percurso que será percorrido durante o tratamento (Santos, 2013), e, de modo geral, da avaliação que será feita sobre a situação estressora, considerando os riscos envolvidos na situação e os recursos disponíveis para lidar com o problema (Barros, 2007).

Neste processo de avaliação incluem-se, sobretudo, as representações sociais que eles têm sobre o objeto câncer.

Além do coping focado no problema e do coping focado na emoção, Dias e Leite (2014) apontam que recentemente um terceiro tipo de estratégia vem sendo discutido: coping focado nas relações interpessoais, na qual, para a resolução da situação estressora, o sujeito busca o apoio nas pessoas que fazem parte do seu círculo social. Todavia, esse novo tipo de estratégia ainda é pouco estudado (Maia, Sendas, Lopes, & Mendes, 2016).

Importante ressaltar também que embora diversos autores caracterizem as estratégias de enfrentamento enquanto adaptativas ou mal adaptativas (Kohlsdorf & Costa Júnior, 2008; Del Bianco Faria & Cardoso, 2010; Capelo & Pocinho, 2016), o coping em si não é uma questão de estratégias adaptativas ou mal adaptativas, sua eficácia precisa ser analisada em cada contexto e a mesma estratégia, a depender da situação, pode apresentar resultados diferentes (Lazarus & Folkman, 1984).

Em relação ao enfrentamento dos fatores advindos do adoecer de câncer, Fetsch et al. (2016) esclarecem que eles dependerão de “atributos pessoais, como saúde e energia, sistema de crenças, metas de vida, autoestima, autocontrole, conhecimento, capacidade de resolução de problemas, práticas de apoio sociais e a utilização de estratégias de coping” (p.18). É preciso considerar, ainda, as vivências dos cuidadores em termos de “representações de suas famílias de origem que são passadas de geração para geração, conforme o meio físico e sociocultural” (Coletto & Câmara, 2009, p. 106).

Sobre este aspecto, autores como Mattos, Blomer, Campos e Silvério (2016) desenvolveram um estudo que tinha como objetivo avaliar as estratégias de enfrentamento adotadas por familiares de indivíduos em tratamento oncológico. Deste, participaram dez familiares de pacientes em tratamento no Hospital Nossa Senhora da Conceição, em Santa Catarina. Os resultados revelaram que as principais estratégias utilizadas dizem respeito a retirar o foco da doença, utilizar drogas lícitas e buscar suporte familiar ou religioso.

Em outro estudo, realizado por Del Bicando Faria e Cardoso (2010) as estratégias de enfrentamento mais utilizadas por cuidadores familiares de crianças com câncer na perspectiva do Inventário de Estratégias de Coping de Lazarus e Folkman estão a “resolução de problemas” e a “fuga e esquiva”. As autoras ressaltam, ainda, que por meio de uma entrevista semiestruturada foi possível pensar em outras modalidades de enfrentamento, tais como a crença em Deus, a adesão ao tratamento, a busca por orientações médicas, a negação,

a comparação com outras situações vistas no hospital e a utilização de expectativas positivas como forma de encarar a situação.

Aprimorar o conhecimento acerca do processo de enfrentamento dos cuidadores frente ao adoecer de câncer torna-se importante no sentido de planejar ações que promovam a utilização de estratégias que minimizem o sofrimento dos sujeitos. Além disso, conhecer as estratégias de enfrentamento dos cuidadores, sobretudo com vistas à promoção de saúde, possibilita um olhar para além dos aspectos biológicos dos sujeitos.

3.3 Representações Sociais e Estratégias de Enfrentamento na experiência de cuidado de