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Estratégias pragmáticas

1.7 O papel auxiliador das estratégias de tradução

1.7.3 Estratégias pragmáticas

O último grande grupo de estratégias proposto por Chesterman (Chesterman 1997) refere-se às estratégias pragmáticas que estão relacionadas com a escolha de informação do texto de partida, escolha essa que é feita pelo próprio tradutor com base no conhecimento que tem do público-alvo da tradução que vai executar. Este tipo de estratégia manipula a própria mensagem constante do texto de partida e costuma implicar mudanças maiores em relação ao texto de partida, sendo que a probabilidade de inclusão de estratégias sintácticas e semânticas é bastante significativa.

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A primeira denomina-se filtragem cultural e está ligada à norma inicial de Toury (Toury 1995: 56), alternando entre, por um lado, uma tradução em aceitabilidade, ou seja, uma tradução de itens culturais específicos da cultura de chegada por outros itens com valor cultural equivalente na cultura de chegada de acordo com as normas que aí vigoram, e, por outro lado, uma tradução em adequação.

A mudança do grau de explicitação é a estratégia seguinte que alterna entre dois extremos, o da implicitação e o da explicitação. O primeiro tende a acontecer quando o tradutor acredita que o leitor é capaz de inferir a informação que foi omitida; já o segundo extremo tende a surgir quando a informação existente no texto de partida é considerada insuficiente para o leitor, sendo que é esta a opção mais frequente.

A terceira estratégia é a mudança de informação que pode ser executada através da adição de nova informação que não é possível inferir do texto e que é considerada pelo tradutor como sendo relevante para o leitor do texto de chegada. O processo oposto também é válido pelo que, por vezes, o tradutor pode omitir ou resumir informação que considere irrelevante ou redundante.

A estratégia seguinte é a mudança interpessoal e está relacionada com todas as escolhas que impliquem uma mudança na relação entre o texto e o autor, como por exemplo, mudanças no nível de formalidade do texto, o grau de emotividade, o nível do léxico técnico, entre outros aspectos.

De seguida, Chesterman refere a estratégia da mudança elocutória que provoca alterações no tom do texto de chegada em relação ao texto do qual parte. Esta estratégia recorre, por vezes, ao auxílio de outras estratégias, como por exemplo, mudar uma oração que no texto de partida está na voz activa e passá-la para voz passiva no texto de chegada para modificar o tom do acto de fala.

A estratégia seguinte é a mudança de coerência e está relacionada com a disposição lógica da informação no texto ao nível conceptual, podendo, por exemplo, juntar parágrafos.

Chesterman faz também referência à estratégia da tradução parcial que abrange, por exemplo, a sumarização, a transcrição, a tradução só de sons, e outros tipos de tradução parcial.

A mudança de visibilidade é igualmente uma estratégia pragmática e é ela que permite que o trabalho do tradutor seja visível no próprio texto. Os seus recursos são os comentários entre parênteses, a adição de explicações ou as notas de tradutor, entre outros,

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e trazem o tradutor das sombras para a luz, tornando-o visível no texto que produz e transportando o autor para um segundo plano.

A transedição é a nona das estratégias pragmáticas propostas por Chesterman e é posta em prática quando o texto de partida apresentam uma escrita fraca ou mesmo errada, fazendo com que o tradutor considere necessária uma reordenação radical ou mesmo recorrer à reescrita.

De acordo com Chesterman, sempre que o tradutor decide recorrer a este tipo de estratégias tem como objectivo cumprir as normas comunicativas, sociais e tradutórias que vigoram na comunidade de chegada em que se insere. É por essa razão que diferentes contextos e épocas, bem como as experiências vividas por diferentes tradutores, vão necessariamente resultar em traduções distintas, porque para que ele possa desempenhar o papel social que lhe foi incumbido de acordo com o que a sua comunidade entende como expectável, é preciso cumprir as normas que esta lhe impõe. É possível argumentar que o cumprimento dessas normas por parte do tradutor pode ser opcional, mas nesse caso terá de aceitar uma série de consequências que advêm do seu comportamento desviante, como de resto foi dito anteriormente.

Deste enquadramento teórico no âmbito dos Estudos de Tradução é possível concluir que, de facto, é o sistema de chegada que opta por determinados textos de partida em detrimento de outros, bem como por determinadas culturas de partida em detrimento de outras de modo a colmatar lacunas que possam existir na cultura de chegada ou para lhe apresentar novas tendências e estilos que poderão ser mais facilmente aceites pela cultura de chegada quando apresentados por meio do texto traduzido. Além disso, é sempre o tradutor quem decide quais os traços do texto de partida que devem ser transferidos, bem como o seu nível de importância, e é ele quem decide o tipo de estratégias a adoptar de acordo com a finalidade e objectivo que entende que o texto de chegada deve desempenhar na cultura de chegada. Todas as decisões a tomar no decorrer do processo tradutório são da responsabilidade do tradutor enquanto mediador cultural e, por conseguinte, enquanto conhecedor de duas culturas distintas.

Nesse sentido, Toury afirma:

[translations are] textual-linguistic facts of one textual tradition only: the target‘s. It is clear that from the standpoint of ST [ = the source text] and SL [ = the source language], translations have hardly any existence, even if everybody in the source culture ‗knows‘ of their existence (which is hardly ever the case).

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They do not affect either the source linguistic and textual systems and norms, nor ST as such, on the other hand, they may well affect the textual and/or linguistic norms, and even systems, of the target recipient culture. (Toury 1986: 1120)

Torna-se assim óbvio que a tradução é um fenómeno que pertence apenas ao polissistema de chegada e que a sua relação com o texto e cultura de partida não os influencia, dado que a existência do texto traduzido não tem importância para a produção literária do polissistema de partida. Toury confirma esse facto propondo normas tradutórias que funcionam paralelamente à função que o texto de chegada vai desempenhar na cultura de chegada e que não são equacionadas durante a composição do texto que lhe dá origem.

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