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Uma perspectiva contemporânea destaca a relação existente entre estresse e recuperação. A ênfase se dá no equilíbrio entre os níveis de estresse e a capacidade restauradora (de recuperação) do atleta, pois um eventual desequilíbrio (maiores níveis de estresse e menores níveis de recuperação) poderia levar a prejuízos na saúde, desempenho e até mesmo à síndrome do OT (Costa & Samulski, 2005).

Portanto, um maior estado de estresse ou uma mais extensiva síndrome de OT demandará, proporcionalmente, maior estado de recuperação a fim de se obter uma razão equilibrada entre estresse e recuperação. Uma parte crucial desse balanço estresse-recuperação é o gerenciamento do ciclo sono e vigília do atleta, especialmente durante períodos de treinamento intenso e de competição (Halson, 2008). No entanto, enquanto a atenção dada à relação entre sono e desempenho atlético já está bem estabelecida, evidências subjacentes ao papel do sono na recuperação ainda são pouco entendidas.

Tal fato é surpreendente de ambas as perspectivas – científica e aplicada – dado que atletas, frequentemente, relatam que o sono pode ser uma ótima estratégia de recuperação, sendo considerado pela maioria dos especialistas do esporte como um dos modos mais eficazes de recuperação – física e mental – e com uma forte relação proposta entre sono e treinamento ótimo (Halson, 2008; Venter, 2014). Enquanto o sono REM tem um papel na ativação cerebral periódica, localizada nos processos recuperativos e na regulação emocional, o papel do sono NREM é garantir os benefícios para a conservação de energia e a restauração do sistema nervoso e muscular (Vyazovskyi & Delogu, 2014).

A recuperação é um processo inter e eminentemente (intra) individual, personalizado e ativo, configurado por vários aspectos – psicológicos, fisiológicos, social, de humor, comportamental e regenerativo – orientado para ação, a fim de reestabelecer as habilidades de desempenho por um devido período de tempo (Kellman & Kallus, 2001; Samulski, 2009). A recuperação, então, não deve ser compreendida isoladamente, caracterizada pela simples ausência do estressor anteriormente existente.

Tabela 2. Aspectos moduladores do processo recuperativo Características da Recuperação

Recuperação é um processo dependente do tempo.

Recuperação é dependente do tipo e duração do estressor.

Recuperação depende da redução, mudança ou eliminação do agente estressor. Recuperação é um processo específico e depende da avaliação individual.

Recuperação termina quando o estado psicofísico de eficiência é restabelecido e a homeostase é alcançada.

Recuperação inclui ações propositais (recuperação proativa), assim como processos psicológicos e biológicos automatizados de restauração do estado inicial

(recuperação passiva)

Recuperação pode ser descrita em vários níveis (fisiológico, psicológico, sociocultural e ambiental).

O processo de recuperação envolve vários subsistemas orgânicos. Vários subprocessos de recuperação podem ser dissociados.

Recuperação é intimamente ligada a situações cotidianas (ex: sono, contato social, alimentação adequada).

(Adaptado de Kellmann et al., 2009).

Assim, a recuperação é um processo temporal, individual, e que deve estar inserida no planejamento da periodização do treinamento desportivo, devidamente contemplada nas rotinas de treinamento, viagens e competição, a fim de reestabelecer as habilidades de desempenho por

um devido período de tempo. Faz-se importante diferenciar recuperação de desempenho, pois a primeira se refere ao nível, no qual os indicadores retornam à linha de base após um período distinto de exercício, destacada pela análise no curso de tempo a partir de um prévio estressor (viagem e; ou competição) (Fullagar et al., 2015).

O desempenho (performance), por sua vez, é a efetivação de uma partida na qual os atletas desenvolvem o máximo potencial em términos individuais e coletivos, está relacionado às vias metabólicas predominantes em cada modalidade esportiva, aos substratos energéticos requisitados, grau de treinabilidade, inter-relações funcionais, dentre outros fatores intervenientes (Maughan et al., 2000).

No futebol, diversos fatores também podem interferir na performance da equipe, sejam eles individuais ou grupais. Assim, a performance no futebol depende do domínio tático e técnico específico da modalidade, além do equilíbrio psíquico relevante à prática e de fatores fisiológicos, tornando a sua prática demasiada complexa e multifatorial (Weinberg & Gould, 2001). Assim, faz-se importante compreender a díade estresse e recuperação, como partes complementares do treinamento e da competição, bem como o papel do sono neste processo.

O monitoramento contínuo e longitudinal de medidas de sono, estresse e recuperação no futebol pode ser útil para a detecção de alterações disfuncionais nas fases mais precoces, de modo que as informações obtidas a partir dessas avaliações podem ser usadas para otimizar os programas de formação e de recuperação individual, com vistas à melhora do desempenho (Brink et al., 2010). Caso contrário, o estresse crônico do exercício (exaustivo) pode causar uma inibição da resistência e da disposição do atleta a suportar mais a dor, atingindo um estado de fadiga.

Além da fadiga muscular, a fadiga mental também deve ser destacada com relação à recuperação de atletas, caracterizando-se por uma mudança no estado psicofisiológico, causado

por prolongados períodos de intensa demanda de atividade cognitiva (Badin, Smith, Conte & Coutts, 2016; Marcora et al., 2009, Smitht al., 2016). Essa mudança é gradual e cumulativa e pode incluir aumentada resistência contra maiores esforços (Meijman, 2000), mudanças no humor (Broadbent, 1979; Holding, 1983) e sentimentos de cansaço e falta de energia (Boksem & Tops, 2008), resultantes da atividade cognitiva e de seu custo metabólico (Parks et al., 1988). Cada vez mais atletas, treinadores e desportistas, em geral, assumem que a recuperação também deve ser aplicada para os processos mentais. A literatura sobre recuperação pós- exercício tem focado quase que exclusivamente na recuperação da fadiga periférica (Rattray et al., 2015). Esta também pode impactar o funcionamento cognitivo, por meio do nível de alerta. Em um contra-ataque intenso, no futebol, exige-se rápido processamento de informação e responsividade. Isso também fica claro em outras situações comuns à dinâmica do jogo, por exemplo, em que o vento muda a trajetória da bola e níveis mais altos ou mais baixos de alerta podem determinar um desfecho bem ou mal-sucedido daquele evento esportivo.

O alerta tem sido enfatizado na produção e manutenção da vigilância ótima e na

performance em tarefas conforme estudos da Psicologia Cognitiva (Posner & Petersen, 1990).

No esporte, igualmente, o alerta é importante para o processamento e seleção de informações, bem como a sustentação desses processos durante a consecução do desempenho atlético. Na sequência, explicar-se-ão os tipos de alerta e demais componentes da atenção.

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