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Estrutura Genérica Potencial (EPG)/Estrutura Esquemática

FORMAÇÃO GENÉRICA

4 CONTEXTO DE SITUAÇÃO, CONTEXTO DE CULTURA E PROPÓSITOS COMUNICATIVOS

4.3 Estrutura Genérica Potencial (EPG)/Estrutura Esquemática

Em nossa pesquisa, como já mencionamos, trabalharemos com a noção de gênero do ponto de vista da linguística sistêmico-funcional, a qual vincula o gênero ao conceito de

contexto – sem o qual nenhum fenômeno linguístico pode ser entendido – e de registro.

Essa concepção de gênero está ligada diretamente com a noção hallidayana de linguagem, na qual a linguagem é designada como “um sistema sociossemiótico que relaciona vários sistemas de significação constituintes da cultura humana, na produção dos sentidos, materializando-se no texto […]” (PINHEIRO, 2002, p. 262).

Com base nessa noção de gênero, alguns autores consideram que, para a abordagem da análise de gêneros, se deve levar em consideração as fases e/ou os estágios existentes nos textos, para isso, apontam algumas propostas de análise; tais como: (i) Estrutura Genérica Potencial, de Halliday; Hasan (1989); (ii) Estrutura Esquemática, de Martin (1985), entre outras.

Conforme Motta-Roth; Heberle (2005), a Estrutura Genérica Potencial (doravante EPG, e no original Generic Struture Potential), postulada por Halliday; Hasan (1989), foi estabelecida a partir do entendimento de configuração contextual, de Halliday, e de

estrutura textual, de Hasan. Assim, a partir da conjunção desses dois conceitos, os autores

postulam a EPG.

A EPG é composta por elementos considerados opcionais ou obrigatórios em um gênero. O reconhecimento desses elementos dá-se através de uma compreensão do texto e do contexto. Assim, podemos considerar que há um sentido construído pela materialização de um texto, o qual pode estar explícito ao leitor; bem como há um sentido que tem a sua construção estabelecida pelo conhecimento de mundo do leitor de um gênero. Em outras palavras, é justamente essa integração de texto e contexto, conforme Halliday; Hasan (1989), que desvela e possibilita o entendimento de quais elementos são obrigatórios e opcionais a partir da configuração do contexto.

O campo, as relações e o modo, os quais formam o que se entende de contexto de situação, como foi discutido na seção 4.1 deste trabalho, são as variáveis responsáveis pela configuração contextual. Como podemos constatar:

Essas variáveis são responsáveis pela configuração contextual ([…] CC) e permitem-nos fazer previsões sobre qualquer texto apropriado a um dado contexto, i. é, de qualquer texto que possa ser considerado um exemplo “em potencial” de um gênero específico. Enquanto a CC determina uma classe de situações, o gênero se configura na linguagem que desempenha o papel apropriado àquela classe de acontecimentos sociais (MOTTA-ROTH; HEBERLE, 2005, p. 17)

Essas três variáveis se inter-relacionam com os elementos textuais opcionais ou obrigatórios de um gênero identificados como uma EPG. Essa EPG se dá por meio da expressão verbal de uma CC, e, assim como essa configuração, é dependente de um conjunto específico de valores, os quais estão ligados ao campo, às relações e ao modo (MOTTA-ROTH; HEBERLE, 2005).

Motta-Roth; Heberle (2005), com base em Halliday; Hasan (1989), afirmam que há uma relação entre os traços específicos do contexto, a organização sequencial e a recorrência de determinados elementos textuais obrigatórios e opcionais da EPG, bem como é possível uma inversão dessa relação; o que deixa claro que a caracterização da estrutura genérica não se dá de forma rígida, mas pode haver variações, assim, os exemplares de um gênero específico pode ter suas variações que devem estar enquadradas em limites possibilitados por uma EPG, os quais estão associados às considerações, a seguir, vejamos:

1) Que elementos DEVEM ocorrer em cada exemplar de um determinado gênero? (Elementos obrigatórios)

2) Que elementos PODEM ocorrer, embora não precisem estar presentes em cada exemplar de um determinado gênero? (Elementos opcionais)

3) Que elementos PODEM ocorrer MAIS DE UMA VEZ ao longo do texto? (Elementos iterativos)

4) Que elementos TÊM UMA ORDEM FIXA de ocorrência se comparados a outros elementos?

5) Que elementos TÊM UMA ORDEM VARIÁVEL de ocorrência se comparados a outros elementos? (MOTTA-ROTH; HEBERLE, 2005, p. 18)

Os elementos textuais obrigatórios em uma EPG, geralmente, aparecem em uma ordem específica determinada pelo contexto, conforme Motta-Roth; Heberle (2005). Assim, esses elementos, por serem mais regulares, ajudam na identificação e/ou no reconhecimento de um gênero em meio social. E, como o próprio nome obrigatório deixa transparecer, esses elementos são componentes essenciais de um texto em sua totalidade de uma configuração textual específica, por isso se tornam definidores de gêneros em sociedade. Digamos que, em um determinado agrupamento de um gênero x, é possível que esses elementos textuais apareçam de forma obrigatória e caracterizem esses gêneros em uma mesma família, a partir de suas similaridades.

Os elementos textuais opcionais, como o próprio nome deixa explícito, não têm uma regularidade em sua recorrência, por isso se tornam facultativos na EPG de um gênero (MOTTA-ROTH; HEBERLE, 2005). Assim, por exemplo, pode não haver uma recorrência desses elementos de forma regular e padronizada em todos os gêneros que pertencem a determinado agrupamento; ou ainda, no que diz respeito a um gênero específico, esses elementos podem ocorrer de forma facultativa, por isso esses elementos textuais opcionais representam as variações que podem ocorrer em um mesmo gênero; este vinculado a uma determinada atividade social.

Os elementos iterativos são os elementos textuais que têm mais de uma recorrência em um gênero, no entanto não têm uma ordem fixa e rígida dessa recorrência na EPG (MOTTA-ROTH; HEBERLE, 2005). Assim, esses elementos aparecem de forma aleatória, o que não prejudica a construção do sentido de gênero pelo leitor.

O estudo da EPG possibilita ao analista de gênero uma melhor compreensão de quais elementos textuais podem ou devem ocorrer em um gênero; em qual sequência esses elementos podem ou devem ser evidenciados; qual a frequência ou recorrência desses elementos. Em outras palavras, o pesquisador, através da análise da EPG de um gênero, evidenciará os elementos obrigatórios, opcionais ou iterativos, os quais são responsáveis pela construção do sentido desses gêneros em meio social.

Há uma aproximação entre a Estrutura Genérica Potencial, proposta por Halliday; Hasan (1989), e as Estruturas Esquemáticas postuladas por Martin; Rose (2008), uma vez que ambos aceitam que essa estrutura deve ser estudada levando-se em consideração o campo, as relações e o modo. No entanto, Halliday; Hasan (1989) propõem que a análise

seja realizada a partir da observação do registro, ao passo que Martin (1992) considera que a análise deve ser realizada a partir do gênero (contexto de cultura), uma vez que o estudo do gênero (contexto de cultura) relaciona-se para o entendimento da estruturação da linguagem vinculada ao uso; já o registro (contexto de situação) refere-se para a manifestação imediata do texto (VIAN JR.; LIMA-LOPES, 2005). A esse respeito, vejamos a consideração, a seguir:

[…] Ambas as perspectivas, embora estejam no âmbito funcional de Halliday, seguem parâmetros distintos. A diferença entre elas está no ponto de partida para a observação do fenômeno: Martin parte do gênero e Hasan, do registro. Enquanto Martin defende que o gênero é instanciado mediante escolhas das variáveis de registro, Hasan afirma que essas variáveis é que são realizadas pelo gênero. Dessa forma, para Martin, é o gênero que pré-seleciona as variáveis de registro, associando-as a partes especificadas da estrutura textual, a chamada estrutura esquemática, como indica o autor (VIAN JR.; LIMA-LOPES, 2005, p. 34).

Vian Jr; Lima-Lopes (2005) afirmam que Martin (1992) considera que há cinco motivos para o analista de gênero trabalhar com a análise tendo como ponto de partida o estudo do gênero (contexto de cultura), e não o registro (contexto de situação):

1. Se o analista de gênero começa o estudo do gênero de um nível que não se organize com base nas metafunções, então, ele poderá evidenciar várias ocorrências vinculadas a diversos tipos de significados;

2. Ao estudar o gênero como definidor do registro, o analista evidencia que nem sempre todas as combinações entre campo, relações e modo podem existir;

3. Ao considerar o gênero como responsável pela estrutura esquemática, o analista alcança uma maior praticidade na análise das possíveis mudanças que venham ocorrer nos estágios de um determinado gênero;

4. Ao considerar a distinção entre gênero e registro, considerando-os dois planos distintos, o analista poderá verificar mais singularidades dos desenvolvimentos de um gênero, através de elementos provenientes do contexto de cultura e do contexto de situação no qual se insere;

5. Ao estudar um texto a partir do contexto de cultura, o analista de gênero poderá evidenciar significados que irão completar os significados observados através do estudo do registro. Assim, Martin (1992) considera relevante uma análise que leve em consideração a inter-relação do gênero e do registro, isto é, um estudo conjunto do gênero e do registro.

Martin (1992) aponta que tanto a sua proposta como a de Hasan (HALLIDAY; HASAN, 1989) pretendem uma inter-relação entre a estrutura esquemática e as variáveis de registro. No entanto, há diferença entre os trabalhos existentes, pois Martin (1992) considera que há uma rede de relações entre os diversos textos, por isso eles não devem ser analisados partindo do contexto de situação. É justamente essa rede que possibilita a distinção dos gêneros no âmbito funcional. Conforme Vian Jr; Lima-Lopes (2005, p. 37):

Martin (1992 […]) afirma que tanto o seu modelo quanto o de Hasan (Halliday; Hasan, 1989) propõem uma correlação entre a estrutura esquemática e as variáveis de registro. Contudo, os modelos divergem, essencialmente, pelo fato de que, para Martin, existe uma rede de relações entre os diferentes tipos de textos, o que não pode ser mapeado partindo-se do contexto de situação. Essa rede de relações é o que permite a diferenciação funcional dos gêneros. De fato, uma das críticas de Martin (1992 […]) ao trabalho de Hasan (Halliday; Hasan, 1989) reside no fato de o modelo da autora não tecer generalizações a respeito de uma possível relação comparativa entre EPGs.

Martin (1992; 1997) considera o gênero como um processo social, o qual tem estágios orientados com uma determinada finalidade, que se realiza através do registro. Assim, os gêneros representam processos sociais, uma vez que se realizam por meio da interação entre falantes ou entre escritores e leitores, por isso esses gêneros são organizados em fases e/ou estágios que permitem a construção do sentido dos textos. Assim, essas fases se realizam de forma funcional e interativa para atingir o objetivo final de um gênero (AUGUSTO, 2006).

Assim como Augusto (2006), Vian Jr; Lima-Lopes (2005) apontam que Martin (1992) considera que o gênero é formado por estágios, os quais estão interligados e são responsáveis pelo diálogo que há entre as partes e o todo de um texto. Vejamos nas palavras de Vian Jr; Lima-Lopes (2005, p. 39).

Martin (1992) afirma que um gênero é composto de estágios, os quais podem ser definidos como elementos componenciais responsáveis pelo desenvolvimento e pela realização de uma interação. Cada um desses elementos tem uma função dentro do gênero, contribuindo com parte de seu propósito.

Seguimos para a análise dos gêneros cartas em estudo a definição de gênero, com base na Linguística Sistêmico-Funcional (LSF), bem como trabalhamos com a estrutura esquemática do texto, conceito que possibilita o entendimento da organização/estruturação de um gênero em estágios (MARTIN, 1992), uma vez que julgamos mais propício começarmos por uma abordagem que leve em consideração o gênero como ponto de partida, a qual acreditamos mais ampla. Como veremos na análise, a partir da leitura da amostra, iremos identificar a estrutura esquemática dos gêneros em estudo, com o intuito de caracterizá-los e de verificar sua organização textual.