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Os ensaios in vitro de permeação cutânea têm se tornado cada vez mais utilizados para viabilizar a administração tópica de fármacos a partir de novas formulações (82). Aqui, esse estudo foi conduzido no intuito de verificar o direcionamento do fármaco para os folículos pilosos ocasionado pelas nanopartículas, a importância da via folicular para a penetração cutânea do fármaco livre e encapsulado e, sobretudo, para avaliar a capacidade das nanopartíclas desenvolvidas em atingir as estruturas pilossebáceas da pele, que é o local de ação do fármaco encapsulado, mesmo na presença de excesso de sebo, como acontece durante o quadro de acne (1).

Inicialmente os ensaios de permeação foram realizados com pele de suínos intacta e não processada. Foram avaliadas as nanopartículas NP-QS-CDM-3, NP-AH-CDM-4 e a formulação comercial. Os resultados estão demonstrados na Figura 24.

Figura 24. Quantidade permeada de fármaco na pele de suínos sem processamento. EC: estrato córneo;

FP: folículo piloso; PR: pele remanescente. (p < 0,05)

Verificou-se que fosfato de clindamicina presente na formulação comercial (Adacne Clin®) permeou significativamente mais as camadas da pele em comparação ao fármaco encapsulado nas nanopartículas. A NP-QS-CDM-3 reduziu em 120 vezes a penetração do fármaco no estrato córneo, e 6 vezes a penetração na pele remanescente (epiderme viável + derme). Já a NP-AH-CDM-4 restringiu 2 vezes a penetração do

fármaco no estrato córneo e 20 vezes na pele remanescente. Isso pode ser explicado tanto pela presença de promotores de absorção na formulação comercial, como o propilenoglicol (83), que ajuda a permeabilizar mais o estrato córneo da pele, quanto pelo controle de liberação do fármaco promovido por ambas as nanopartículas desenvolvidas. Essa restrição de permeação é benéfica ao tratamento da acne por evitar exposição sistêmica do fármaco e por reduzir a interação dele com camadas da pele que não são de interesse (84).

No entanto, no tocante à penetração do fármaco nos folículos pilosos da pele, tanto a formulação comercial quanto as NP-AH-CDM-4 resultaram numa mesma concentração do fármaco recuperado dessas estruturas (p < 0,05), e as nanopartícula NP- QS-CDM-3 promoveram uma redução significativa, (p > 0,05) porém sutil do fármaco penetrado nesses anexos da pele. Assim, pode-se observar que ambas as nanopartículas foram capazes de aumentar a proporção de fármaco retido nos folículos pilosos em relação ao retido nas camadas da pele, evidenciando um direcionamento da penetração da clindamicina. É importante ressaltar que os folículos pilossebáceos é justamente o local onde a acne se desenvolve (1) e, portanto, esse direcionamento é bastante adequado para seu tratamento.

Testes adicionais foram então realizados para avaliar a capacidade de penetração do fármaco nas diferentes camadas da pele a partir das nanopartículas quando a pele estava em uma condição mais semelhante à encontrada nos quadros de acne, em que as unidades pilosebáceas são acometida por aumento da produção de sebo (1,85). Dessa forma, a permeação foi realizada com pele de suínos tratadas com sebo utilizando-se as mesmas formulações (Figura 25).

Figura 25. permeação da pele tratada com sebo. A: quantificação da permeação das nanopartículas NP-

QS-CDM-3, NP-AH-CDM-4 e formulação comercial (Adacne Clin®) no estrato córneo (EC); B: quantificação da permeação das nanopartículas NP-QS-CDM-3, NP-AH-CDM-4 e formulação comercial (Adacne Clin®) no: folículo piloso (FP) e C: quantificação da permeação das nanopartículas NP-QS- CDM-3, NP-AH-CDM-4 e formulação comercial (Adacne Clin®) na pele remanescente (PR). (p < 0,05)

Diante dos dados apresentados, observou-se que o excesso de sebo dificultou a permeação do fármaco através do estrato córneo (Figura 25A), sendo que apenas a formulação comercial apresentou penetração de quantidades detectáveis de clindamicina nesta primeira camada cutânea. Para a camada mais profunda da pele, a mesma situação se repetiu.

Quanto à penetração de clindamicina nos folículos pilosos (Figura 25B), a nanopartícula NP-AH-CDM-4 ofereceu um forte direcionamento do fármaco para essa estrutura, promovendo a penetração de praticamento o dobro do fármaco que as nanopartícula NP-QS-CDM-3 e de 2,5 vezes a quantidade de fármaco penetrado a partir da formulação comercial. Dessa forma, observou-se que a nanopartícula que possui o ácido hialurônico como polímero possui capacidade de direcionamento mesmo em ambiente que mimetiza o processo de hiperprodução sebácea no quadro de acne. Vale destacar que a formulação comercial reduziu mais que a metade a capacidade de promover a penetração do fármaco nas estruturas pilossebáceas nesse ambiente oleoso, em comparação ao analisado quando a pele estava intacta.

De forma a confirmar o direcionamento e a importância na via folicular para a penetração cutânea da clindamicina livre ou nanoencapsulada, foram realizados ensaios de permeação em peles que tiveram os folículos pilosos obstruídos, com e sem tratamento com o sebo. Esses ensaios foram comparados ao ensaio de permeação em pele intacta e os dados estão apresentados abaixo nas Figuras 26 e 27.

Figura 26. Quantificação da clindamicina nas camadas da pele com folículos selados após 24 horas de permeação; EC: estrato córneo; PR: pele remanescente. (p < 0,05)

Figura 27. Quantificação da clindamicina nas camadas da pele tratada com sebo e com folículos selados

após 24 horas de permeação; EC: estrato córneo; PR: pele remanescente. (p < 0,05)

Diante dos dados apresentados, observou-se que a via folicular não é imprescindível para a permeação cutânea do fármaco a partir da formulação comercial. Nesse caso, o estrato córneo é a via mais significativa para promover a sua permeação cutânea. Já para as nanopartículas desenvolvidas (NP-QS-CDM-3 e NP-AH-CDM-4), a via folicular mostrou-se imprescindível, uma vez que a sua falta praticamente inviabiliza a penetração do fármaco para as demais estruturas da pele. Esse fato justifica a utilização das nanopartículas poliméricas em formulações em que os folículos pilosos são o alvo principal.

Além disso, quando calculamos o fator de direcionamento folicular do fármaco para as três formulações testadas variando-se o tipo de pele (Figura 28), verificamos que o direcionamento para o folículo piloso das nanopartículas testadas em relação às demais estruturas é estatisticamente superior à formulação comercial.

Figura 28. Direcionamento folicular da formulação comercial (Adacne Clin®) e das nanopartículas (NP- QS-CDM-3 e NP-AH-CDM-4) em pele intacta e pele sebácea.

Verifica-se, ainda, que o direcionamento é maior quando a pele é tratada com sebo. Isso reforça a vantagem dessas nanopartículas em relação à formulação comercial, no que se refere ao direcionamento ao local de ação do fármaco. Além disso, a nanopartícula NP-AH-CDM-4 chegou a direcionar 7,5 vezes mais que a formulação comercial, mesmo em pele sebácea, chegando a um nível próximo de 100 % de direcionamento do fármaco para o local de ação.

Por fim, destaca-se que, considerando as similaridades entre as nanopartículas de quitosana e de ácido hialurônico no que se refere ao diâmetro, PDI, morfologia, pH e perfil de liberação, e a diferença em relação a carga superficial delas, sendo a NP-AH- CDM-4 negativamente carregada e a NP-QS-CDM-3 positivamente carregada, nanopartículas de carga negativas parecem ser mais eficientes no direcionamento da liberação de fármacos nela encapsulados para os folículos pilosos da pele na presença de lípideos. Esse maior direcionamento pode estar relacionado ao fato de que o estrato córneo da pele é negativamente carregado em pH fisiológico (86) e que as vias apendiciais desta forma propiciam uma melhor acomodação das nanoestruturas que possuem a mesma carga do estrato córneo. Outros estudos, no entanto, deverão ser realizados para tentar provar essa hipótese.

(HET-CAM)

Apesar dos polímeros quitosana e ácido hialurônico utilizados como matrizes para a produção das nanopartículas neste trabalho terem sua biocompatibilidade bem estabelecida, e do pH das dispersões das nanopartículas serem compatíveis para sua aplicação na pele, o agente reticulante utilizado na produção das nanopartículas, bem como a incorporação do fármaco podem conferir à formulação certa toxicidade. Desta forma, o potencial irritativo das duas nanoformulações desenvolvidas foi avaliado por meio de ensaio HET-CAM.

O ensaio HET-CAM é um teste muito usado para avaliar o potencial irritante de formulações, evitando a realização de testes em animais os quais necessitam de aprovação de comitês de ética.

Na Figura 29 estão apresentadas as imagens que foram capturadas durante 0,5, 2 e 5 min após a exposição da CAM às amostras de nanopartículas testadas em comparação aos controles positivo e negativo para avaliar seu potencial irritante.

Figura 29. Sequência ilustrativa das imagens do ensaio de HET-CAM demonstrando o efeito dos controles positivo (NAOH 1 M), negativo (NaCl 0,9%) e nas nanopartículas NP-QS-CDM-3 e NP-AH- CDM-4 e formulação comercial na membrana cório-alantoide após 30 segundos, 2 minutos e 5 minutos.

O controle positivo proporcionou a ocorrência de diversas alterações vasculares na membrana logo nos primeiros segundos, como o aumento da vascularização e calibre dos vasos, além de uma alteração da coloração associada ao rompimento dos vasos e extravasamento de sangue. Em contraposição, o controle negativo (solução fisiológica) não apresentou a ocorrência de nenhum desses fenômenos, semelhando ao que ocorreu com as nanopartículas testadas NP-QS-CDM-3, NP-AH-CDM-4 e na formulação comercial. Todas as formulações testes obtiveram assim um índice de irritabilidade inferior a 0,9. Com isso, as formulações testadas, inclusive a formulação comercial de clindamicina foram classificadas como formulações não-irritantes e, portanto, adequadas para aplicação na pele humana.

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