• Nenhum resultado encontrado

3.1.1

História e Princípio

Apesar de todos os métodos acima descritos, a primeira sugestão de voo por sustentação estática, dada pouco depois da natureza do vácuo ter sido descoberta, foi proposta em 1670, por um monge jesuíta, Francesco Lana de Terzi, que sugeriu um veículo aéreo por evacuação de ar no seu livro “Prodromo dell'Arte Maestra”, publicado em Brescia na Itália.

O modelo pioneiro de Francesco (fig. 27) usava quatro esferas perfeitas de cobre, que seriam evacuadas internamente, com cerca de 8 metros de diâmetro e um décimo de milímetro de espessura. Embora tais estruturas nunca conseguissem aguentar a pressão da atmosfera em condições reais, e que o seu projeto nunca tenha sido construído, todos os cálculos hidrostáticos envolvidos eram válidos e o princípio muito pertinente.

Figura 27 – Embarcação voadora de Francesco de Lana[33]

A partir desta proposta e nos tempos modernos, as soluções encontradas usando este princípio passam pela utilização de gases mais leves que o ar, analisados no capítulo anterior, para conseguir a impulsão desejada. No entanto, como também já foi referido, cada um tem as suas desvantagens e todos apresentam entraves ao uso pleno desta tecnologia.

Os balões de vácuo, como solução alternativa, apresentam um poder elevatório máximo (fig. 24), e poderiam permanecer a flutuar permanentemente através do bombeamento do ar que se encontre dentro do volume limitado, utilizando também esse sistema para regular a densidade total, e assim a sua cota vertical.

Outra grande vantagem desta abordagem é devida à mais fácil obtenção de impermeabilidade no envelope da aeronave face à utilização de gases mais leves que o ar. Isso dá-se devido ao tamanho molecular das partículas do ar ser maior que a de gases mais leves e, portanto, é mais simples conter todo o gás sem que este escape.

Esta solução, como proposta por Francesco, exigiria para cada uma das esferas uma casca rígida de forma a que o interior possa ser evacuado.

O problema principal com este conceito, no entanto, é que mesmo com um vácuo relativo no interior da casca, a pressão atmosférica exerceria forças enormes sobre esta, fazendo com que esta colapse caso não seja suportada. Embora seja possível reforçar a casca com uma estrutura interna, é teorizado que qualquer estrutura à compressão, forte o suficiente para suportar as cargas, iria pesar tanto que invariavelmente excederia a capacidade total de elevação do aeróstato, impedindo o voo.

Tal conclusão, analisada nas próximas subsecções, afastou os intelectuais desta ideia, e impediu o sucesso do projeto.

3.1.2

Restrições dos Materiais

Fazendo uma análise simplista às forças atuantes em meia casca esférica (fig. 28), pode notar-se que a pressão atmosférica 𝑃𝑎, sendo independente da direção, é exercida uniformemente na área da secção equatorial da esfera oca em estudo.

A força total aplicada na área superficial desta semi-esfera de raio r é, portanto, dada por: 𝐹 = 𝑃𝑎∙ 𝐴 = 𝑃𝑎∙ 𝜋 ∙ 𝑟2 .

Figura 28 – Pressão atmosférica e forças de simetria atuantes em meia casca esférica [34]

Para a esfera se encontrar em equilíbrio estático, a força total em cada hemisfério tem que se equilibrar ao longo do equador. Para calcular o esforço de compressão a que o sistema estaria sujeito, divide-se esta força pela área da parede que suporta as pressões, que para o caso de paredes finas se pode simplificar como sendo um retângulo de comprimento 2𝜋𝑟 e largura h. A tensão compressiva é então dada por:

𝜎 =𝜋𝑟 2𝑃 𝑎 2𝜋𝑟ℎ = 𝑟𝑃𝑎 2ℎ (1)

Onde h é a espessura da casca.

Sabendo que a casca será evacuada, o estado neutro de flutuação ocorre quando o volume ocupado pela esfera tem a mesma densidade que o ar. Como o volume de ar que a esfera desloca é dado por 4

3𝜋𝑟

3, então a massa desse ar seria 4 3𝜋𝑟

3∙ 𝜌

𝑎, onde 𝜌𝑎 é a densidade do ar. Fazendo a aproximação anterior para o volume da casca, este seria 4𝜋𝑟2ℎ e a respetiva massa será de 4𝜋𝑟2ℎ ∙ 𝜌𝑒, onde 𝜌𝑒 é a densidade da esfera assumida como homogénea. Igualando e simplificando ambas as massas, resulta:

4 3𝜋𝑟 3∙ 𝜌 𝑎 = 4𝜋𝑟2ℎ ∙ 𝜌𝑒 ⟺ ℎ 𝑟= 𝜌𝑎 3𝜌𝑒 (2)

A combinação com a equação (1) resultou no valor da tensão de compressão na secção equatorial da casca esférica:

𝜎 =3 2.

𝜌𝑒

𝜌𝑎. 𝑃𝑎 (3)

Segundo Akhmeteli e Gavrilin [34], substituindo os valores para ligas de alumínio, este cálculo poderia estimar um esforço inferior ou correspondente à resistência à compressão deste material, validando assim o conceito. No entanto, como também é referido por estes autores, esta análise é insuficiente para prever a resistência de uma fina casca esférica quando evacuada.

Em 1915, R. Zoelly e A. Van der Neut realizaram um importante trabalho teórico sobre cascas esféricas, usando a teoria clássica das pequenas deflexões e pela solução de equações diferenciais. Com base neste trabalho, a pressão crítica de encurvadura elástica para cascas esféricas, finas e completas é dada por

𝑃𝑐𝑟 = 2𝐸ℎ 2 √3(1 − 𝜗2).

1

𝑟2 (4)

Onde 𝐸 é o módulo de elasticidade e 𝜗 é o coeficiente de Poisson da casca. Escrevendo a equação anterior na forma 2𝐸(

ℎ 𝑟 )

2

√3(1−𝜗2) e substituindo para um valor

típico de 𝜗 = 0.3, a equação simplifica-se para:

𝑃𝑐𝑟 = 1.21𝐸( ℎ 𝑟 )

2 (5)

Substituindo uma dedução da equação (2) na equação (4) é dada uma condição necessária para uma casca ser viavelmente evacuada:

𝐸 𝜌𝑒2 =

9𝑃𝑐𝑟√3(1 − 𝜇2)

Se esta expressão for resolvida para a densidade atmosférica e for atribuído o valor típico ao coeficiente de Poisson, obtém-se um requisito de cerca de 4.5 ∙ 105𝑘𝑔−1𝑚5𝑠−2.

Akhmeteli e Gavrilin afirmam que esse valor nem sequer poderia ser alcançado usando o diamante ( 𝐸

𝜌𝑠2≈ 1 ∙ 10

5), e recomendou que se deveria deixar cair a hipótese de que a casca é um material homogéneo, propondo uma estrutura em ninho de abelha, nunca tendo esta, porém, avançado do papel [34].

No momento do desenvolvimento desta teoria clássica, que levou à equação (4), não havia trabalho experimental que a corroborasse e vários anos mais tarde, alguns testes relatados no California Institute of Technology [35] mostraram que a pressão crítica de encurvadura experimental poderia ser tão baixa quanto 25% do valor teórico dado pela equação (4).

O valor obtido por meio desta equação foi então considerado como o limite superior da encurvadura elástica clássica, enquanto vários investigadores iniciaram estudos com o objetivo de explicar essas diferenças bastante drásticas entre a teoria e a prática. Rapidamente se suspeitou que o efeito da curvatura e imperfeições na forma esférica poderiam ter sido responsáveis pelas discrepâncias.

Depois de uma série de suposições simplificativas necessárias, von Kármán e Tsien [35] desenvolveram uma fórmula para o limite de flexão elástica inferior da pressão de colapso, que para o mesmo valor de 𝜗 resultou em:

𝑃𝑐𝑟 = 0.37𝐸( ℎ 𝑟 )

2 (7)

Este valor da pressão de colapso pode dizer-se que corresponde à pressão teórica mínima que mantem a forma geométrica da casca, com deformações finitas, em equilíbrio. Esta equação pareceu comparar-se favoravelmente com resultados experimentais, e na prática, a pressão crítica de encurvadura é mais próxima do valor obtido pela equação (7), sendo esta fórmula frequentemente recomendada para projetar estes sistemas.

Por outro lado, a pressão de encurvadura superior dada pela equação (4), apenas poderá ser usada caso sejam tomadas precauções experimentais e de fabrico extremas.

De qualquer forma, e após esta correção, é verificado que o valor experimental da pressão crítica de encurvadura para 𝜗 = 0.3 é 3.27 vezes inferior ao valor teórico, representando assim um desafio ainda mais significativo no projeto de cascas esféricas evacuadas, de modo que tal design ainda não se encontre disponível com os atuais métodos de produção.

3.1.3

Aplicação em Condições Extraterrestres

Um aeróstato evacuado deve, pelo menos, flutuar segundo a lei de Arquimedes e resistir à pressão externa, dependendo da sua geometria.

Shikhovtsev [36], procura enquadrar estas duas condições em situações

extraterrestres, concluindo que de todos os planetas e luas conhecidos no sistema solar, apenas a atmosfera venusiana tem a densidade grande o suficiente para, com a impulsão gerada, ser capaz de superar o peso de uma casca rígida que consiga resistir à pressão externa quando evacuada. De uma forma prática, isto seria possível empregando materiais compósitos de alto desempenho, abaixo da altitude de cerca de 15 km.

Independentemente do seu peso, para qualquer que seja o material selecionado, este teria também que sobreviver na atmosfera venusiana que é altamente corrosiva.

Shikhovtsev mostra também que planetas com atmosferas densas, frias e de alto peso

molecular são os mais adequados para estes aeróstatos de vácuo, mas este, no entanto, é um tipo raro de atmosfera.

Documentos relacionados