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Estudos de aceitabilidade de formulações pediátricas

2. Revisão da literatura

2.4. Estudos de aceitabilidade de formulações pediátricas

A aceitabilidade consiste na aceitação global da forma farmacêutica, independentemente da sua forma de administração. A aceitabilidade de uma forma farmacêutica tem subjacente um conjunto de fatores que devem ser considerados no momento do desenvolvimento de medicamentos, designadamente:

 Adequação da forma farmacêutica de acordo com a faixa etária;  A palatabilidade quando se trata de um medicamento oral;  O volume ou tamanho da dose a ser administrada;

 O uso de dispositivos para administração da dose;  A clareza nas informações de rotulagem;

 O sistema de fecho da embalagem primária e secundária [31].

O conceito “palatabilidade” semanticamente expressa o significado de qualidade daquilo que é palatável, isto é, agradável ao paladar. As substâncias de paladar amargo causam certos reflexos de rejeição inatos nos seres humanos [32, 33].

A palatabilidade consiste no principal fator para a aceitação de um medicamento pediátrico de administração oral, sendo definida como a aceitação geral do sabor, cheiro e textura, ou seja, a sensação que provoca na boca, um fator primordial no que se refere à adesão terapêutica. Por norma, as crianças rejeitam medicamentos não palatáveis. As formas farmacêuticas pediátricas possuem edulcorantes e aromatizantes para mascarar o sabor desagradável e aumentar a adesão terapêutica. Como tal, a avaliação da palatabilidade consiste numa parte fundamental do desenvolvimento de medicamentos pediátricos orais. A palatabilidade assume-se, assim, como um dos primordiais determinantes para a adesão medicamentosa em crianças e o acesso a formas pediátricas palatáveis e seguras pode ter um efeito significativo na morbilidade infantil [34].

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Por conseguinte, é fundamental a obtenção de informação acerca da palatabilidade da substância ativa aquando da fase inicial do desenvolvimento do medicamento. Isto porque se a substância ativa em estudo revelar características negativas, poder-se-á recorrer a determinadas medidas que podem contribuir para otimizar a palatabilidade do medicamento, tais como o uso de excipientes, abrangendo edulcorantes, adoçantes e aromatizantes; modificar o tamanho das partículas da substância ativa ou excipientes; revestir a substância ativa e/ou a forma farmacêutica final [31, 35].

Contudo, importa referir que, apesar de existir uma intenção de aumentar a aceitabilidade do medicamento será necessário ter em conta que a forma farmacêutica pediátrica não deverá ser demasiado atrativa para a criança, ou seja, ser muito parecida com guloseimas, para que se possa evitar o aumento do risco de intoxicação medicamentosa acidental. Ressalva-se também que quando se trata de um medicamento pouco palatável e que se tenha mostrado que a palatabilidade pediátrica ainda não pode ser melhorada e que as formas farmacêuticas alternativas não podem ser desenvolvidas, ou daqueles que já são palatáveis, mas que apresentam dificuldade de deglutição, poder-se-á misturar o medicamento com alimentos e/ou bebidas, caso seja comprovada a compatibilidade entre ambos, como forma de melhorar a sua administração e aceitação [31, 35].

Uma revisão sistemática da literatura realizada em 2013, na qual foram avaliados os instrumentos usados no estudo da palatabilidade e facilidade de deglutição em ensaios clínicos com formas pediátricas orais, num período compreendido entre 2008-2013, revela que a palatabilidade de formas farmacêuticas pediátricas é avaliada frequentemente através de ensaios clínicos com recurso a escalas visuais, todavia sem uma metodologia estatística padrão que permita analisar os resultados. Contudo, essas escalas têm sido muito aceites pela comunidade científica, sendo exemplo a escala hedónica facial, adaptada para crianças, na qual quem prova a forma farmacêutica manifesta a sua aceitação do produto, tendo em conta categorias preestabelecidas com variação gradativa, descritas através de imagens de expressões faciais ordenadas numa sequência que indica um sorriso, designando a aprovação da forma farmacêutica e uma face triste, indicativa da reprovação do produto. Outro exemplo consiste na escala visual analógica, que contém uma linha contínua, fixada nos extremos por termos que correspondem à intensidade baixa de algum atributo à esquerda, e à direita por termos que dizem respeito à intensidade elevada do mesmo atributo, onde quem prova o produto assinala a sua perceção num ponto da linha [36].

Mais recentemente, uma revisão de literatura centrada na aceitabilidade de medicamentos pediátricos em várias formas farmacêuticas, abrangendo comprimidos, comprimidos dispersíveis e mastigáveis, mini-comprimidos, cápsulas, mini-cápsulas, líquidos orais, gomas orais, entre outras, revela que são precisas mais informações no que concerne à influência de atributos sensoriais para além do sabor (forma, tamanho e volume) na palatabilidade de

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formas farmacêuticas diferentes de líquidos orais (como mini-comprimidos e gomas orais) [37]. O desenvolvimento de formas pediátricas palatáveis consiste num desafio que a indústria farmacêutica ainda enfrenta para que as preparações adequadas estejam disponíveis para todas as faixas etárias e acessíveis a toda a população [34].

Preparações farmacêuticas, como são exemplo as pastilhas, chupa-chupas e gomas, com maior tempo de contacto com a cavidade bucal, têm uma dificuldade acrescida no mascaramento de um sabor indesejável. A utilização de medicamentos com sabor desagradável na população pediátrica, conduz, por vezes, à necessidade de combinação com alimentos ou sumos para encobrir o sabor. Porém, estas medidas podem ter um efeito negativo na eficácia e na segurança do medicamento [38], podendo por vezes ocorrer interações entre o fármaco e os alimentos.

Sempre que se introduz no mercado uma nova forma farmacêutica de um medicamento destinado a diferentes faixas etárias é importante efetuar análises sensoriais, de modo a avaliar a aceitabilidade do medicamento. Em suma, a aceitabilidade de um medicamento pediátrico deve ser avaliada em crianças [34].

Em 2007, foi publicado um Regulamento Pediátrico Europeu -European Paediatric Regulation - que obriga as empresas a considerar as crianças no desenvolvimento inicial de medicamentos com uma nova substância, para uma nova indicação ou com uma nova via de administração. O regulamento exige, por exemplo, que as empresas desenvolvam um plano de investigação pediátrica discutindo os ensaios clínicos propostos em crianças de diferentes idades e as formulações para comercialização futura [39]. Desde 2013, a conceção farmacêutica de qualquer medicamento pediátrico recentemente comercializado deve estar em conformidade com a Guideline on the Pharmaceutical Development of Medicines for

Paediatric Use. As empresas devem justificar a via de administração, a forma de dosagem, as

características da formulação, a segurança dos excipientes, a frequência de dosagem, o sistema de fecho do recipiente, o dispositivo de administração, a aceitação pela criança e a informação do utilizador [40].

O crescimento humano não é um processo linear. Como tal, as crianças não são adultos pequenos e as doses pediátricas não podem ser calculadas (extrapoladas) como uma fração padronizada da dose para adultos. Em vez disso, o desenvolvimento e uso de formulações pediátricas requer um conhecimento específico sobre os aspetos relacionados com as características de absorção, distribuição, metabolismo e eliminação do medicamento, isto é, farmacocinética (PK), bem como a sua interação com os órgãos recetores, ou seja, a farmacodinâmica (PD) [41]. Além disso, deve perceber-se que a permeabilidade e a solubilidade de uma formulação em crianças podem diferir dos adultos, o que significa que o

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A farmacoterapia segura e eficaz para idades pediátricas requer o desenvolvimento oportuno de medicamentos e de informações sobre a sua aceitabilidade e palatabilidade, adaptadas à faixa etária, condição fisiológica e tamanho corporal da criança. São necessários estudos desenvolvidos especificamente para crianças.

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