• Nenhum resultado encontrado

201 Evanildo Bechara, op cit., p 415.

202 Idem, ibid., p. 434.

39

Em (59), observa-se que o complemento direto pode ser representado por um nome ou sintagma nominal (59 a), pronome (59 b) ou ainda por uma oração subordinada substantiva (59 c e d). Assim sendo, o complemento direto subdividir-se-á em nominal (59 a), pronominal (59 b) e oracional (59 c e d). Segundo Inês Duarte204 e Evanildo Bechara205, o complemento

direto pronominal, representado por um pronome átono ou acusativo (59 b), é visto como uma forma comutada do complemento direto nominal. Para estes autores, a comutação do complemento nominal ou oracional só pode ocorrer através de um pronome pessoal com função sintática de objeto direto (átonos ou acusativos) ou de um pronome indefinido neutro (isto, isso e aquilo):

(60) a. Ela abriu o armário. b. Ela abriu-o.

c. Ela viu a brisa. d. Ela viu-a.

e. Ela pensa que abriu o armário. f. Ela pensa isto.

g. Ela duvida isso/aquilo.

A exemplo da comutação, a passivização e a posição são referidas em Mário Vilela206

como duas marcas categoriais do complemento direto. De acordo com o que se descreve neste autor, a passivização representa a propriedade sintática que torna possível a transformação de uma frase na voz ativa para a voz passiva com a qual o sujeito da voz ativa passa a complemento agente da passiva e o complemento direto a sujeito da voz passiva conforme se pode notar do contraste entre (61 a) e (61 b):

(61) a. A Domingas contemplou aquela casa.

b. Aquela casa foi contemplada pela Domingas.

Embora em investigadores como F. Palmer207 e Eduardo Paiva Raposo et alli208 se

defenda que a transformação de uma frase na voz ativa para a voz passiva só ocorre com verbos que tenham complemento direto, Evanildo Bechara209 admite a possibilidade de certos

verbos, como assistir, ocorrerem na voz passiva em situações em que regem complemento oblíquo:

(62) a. A senhora assistiu à missa.

b. A missa foi assistida pela senhora.

Quanto à posição, frases apresentadas em (60) e (61) ilustram que o complemento direto nominal ou pronominal se localiza à direita do verbo. Este padrão posicional pode alterar em frases negativas (63 a), interrogativas (63 b) e exclamativas parciais (63 c), nas quais se posiciona à esquerda do verbo, um estudo, portanto, que retomaremos mais adiante:

(63) a. Não o encontrei no armário.

204 Inês Duarte, Língua Portuguesa: Instrumentos de Análise, p. 142. 205 Evanildo Bechara, op. cit., p. 416.

206 Mário Vilela, op. cit., pp. 44-45. 207 F. R. Palmer, op. cit., p. 149.

208 Eduardo Buzaglo Paiva Raposo et alii, op. cit., vol. 2, p. 1166. 209 Evanildo Bechara, op. cit., p. 417.

40

b. Que artigo procuravas no armário? c. Que belo artigo encontrei no armário!

Em determinadas construções, o complemento direto, tal como o sujeito, pode apresentar um valor nulo ou arbitrário. Assim, para Maria Helena Mira Mateus et alii, o complemento direto será considerado nulo numa das seguintes situações sintáticas210:

a. Quando constituído por verbos transitivos que selecionam um constituinte com interpretação arbitrária ou vaga, como ler, escrever, comer, beber:

(64) a. O filho mais velho lia todo o dia. b. O filho mais velho comeu outra fruta. c. O filho mais velho escreveu um livro.

b. Em construções em que aparece como um constituinte retomado ou anaforizado de uma oração coordenada:

(65) a. O filho mais velho comeu uma maçã e o mais novo também comeu [ ]. b. O filho mais novo comprou uma maçã e o mais novo também comprou [ ].

c. O filho mais velho viu o pai no Jardim Municipal e o mais novo também viu [ ]. c. Quando resulta como resposta a uma frase interrogativa total direta:

(66) a. O filho mais novo também uma maçã? Comeu []. b. Chegaste a ver o pai? Sim, Vi [] no Jardim Municipal.

Conforme se observa no membro direito de (66 a e b), o complemento direto ocorre sem realização lexical e fónica, ao contrário da sua realização no membro esquerdo. Também de ocorrência não transitiva direta, a tradição gramatical luso-brasileira regista um número reduzido de complemento direto introduzido pela preposição a, recebendo, por isso, a designação de complemento direto preposicionado. Este complemento ocorre nos seguintes casos:

a. Com determinados verbos que designam sentimentos como amar, louvar, temer ou consolar:

(67) a. Amar ao próximo. b. Sempre louvou a Deus. c. Consolou à mãe.

b. Com o pronome relativo quem enquanto palavra regente de orações relativas com antecedente expresso:

(68) a. Conheci o indivíduo a quem a mãe pediu auxílio. b. Não conheci o indivíduo a quem a mãe pediu auxílio.

c. Vi o senhor a quem se deve tirar o chapéu em matéria de inundação.

c. Com formas pronominais oblíquas em reforço das formas pronominais átonas acusativas a fim de desambiguar um dado contexto discursivo (69a), bem como em situações de inversão do par sujeito-verbo (69b)

(69) a. Conheci-o a ele e ele a mim. b. Ao forasteiro o tempo esqueceu.

41

De modo sintético, pode-se considerar o complemento direto como um constituinte frásico com realização nominal, pronominal ou oracional selecionado por um verbo transitivo direto, posicionado à direita ou à esquerda do predicado, comutável por um pronome átono acusativo ou por um pronome indefinido neutro e, portanto, passível de transformação (da voz ativa para a voz passiva). Sem alusão em muitas obras dedicadas ao ensino da língua portuguesa, o complemento direto também pode ser nulo, sobretudo em situações em que a expressão nominal ou pronominal denota vacuidade ou arbitrariedade significativa e em situações em que não vem realizado fónica e lexicalmente. É um complemento, portanto, que se carateriza por apresentar traços sémicos /+Humano/ e /- Humano/.

1.2.4.2. Complemento indireto

A exemplo do complemento direto, o complemento indireto é um constituinte oracional sintaticamente associado ao conceito de transição verbal, porém, à transição verbal indireta. Por isso, é habitualmente definido como o constituinte que «representa o ser animado a que se dirige ou destina a acção ou estado que o processo verbal expressa»211. Para

um conhecimento pormenorizado deste complemento verbal, analisemos, por conseguinte, os seguintes enunciados:

(70) a. Nunca mais escreveu à Domingas.

b. O mau tempo trouxe outra realidade à minha família. c. Os amigos ofereceram-nos toda a ajuda necessária.

Assim como se assinala em Isabel Hub Faria et alii212, os exemplos enumerados acima

demonstram que o complemento indireto é um constituinte frásico com realização nominal (70 a e b) e pronominal (70 c), com traço semântico /+ Humano/ (Domingas, minha família, nos) e, em geral, regido por um verbo transitivo indireto (70 a) ou ditransitivo (70 b). Vale sublinhar, por outro lado, que o complemento indireto realizado através de um nome ou sintagma nominal (70 a e b) vem sempre precedido da preposição a, ao passo que o complemento indireto realizado através de uma forma pronominal dativa (me, te, lhe, nos, vos, lhes) dispensa esta preposição.

Um estudo sobre a sintaxe posicional do constituinte em voga implicaria que se procedesse a uma diferenciação entre complemento indireto nominal (70 a e b) e complemento indireto pronominal (70 c). Deste modo, poderíamo destacar vários padrões posicionais do constituinte frásico em estudo:

a. Complemento indireto nominal: à direita do verbo em construções transitivas indiretas (70 a) e à direita do complemento direto e à esquerda do verbo em construções

ditransitivas (70 b);