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2.1 O Sistema Jurídico Anglo-Saxônico {Common Law)

2.1.1 Evolução Histórica

A divisão da história do direito inglês em quatro fases é fundamental a sua compreensão: 1) o período anterior à conquista normanda em 1066, tipificado como anglo- saxônico; 2) o período que compreende a conquista normanda (1066) até o advento da dinastia dos Tudors (1485), que é o da formação do common law, no qual um sistema de direito novo, comum a todo o reino, desenvolve-se e substitui os costumes locais; 3) o período de 1485 a 1832, marcado pelo desenvolvimento ao lado do common law, de um sistema complementar e, às vezes, rival, que se manifesta nas regras de eqüidade; 4) o período que vai de 1832 até os dias atuais, no qual o common law vem sofrendo um desenvolvimento sem precedentes da lei e adaptando-se a uma sociedade cada vez mais complexa e dirigida pela administração“*^^.

LOSANO, Mario G. Op. cit., p. 120.

MACIOCE, Francesco. L'Evoluzione della Responsabilità Civile nei Paesi di Common law. In: MACIONE, Francesco. La Responsabilità Civile nei Sistemi di Common Law. Padova: Cedam, 1989. Apud FARIA, Guiomar T. Estrella. Op. cit., p. 103.

DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Tradução de Hermínio A. Carvalho, p. 284.

a) A Fase Anglo-Saxônica (século V a 1066)

Embora o domínio romano tenha durado quatro séculos na higlaterra, do imperador Cláudio até o começo do século V, não deixou mais vestígios do que o período celta na França ou ibérico na Espanha. Para os historiadores do direito inglês, a história do período anglo-saxônico começa após a perda deste domínio, quando diversas tribos de origem germânica — saxões, anglos, dinamarqueses, partilharam entre si a Inglaterra, por volta do século VI, quando a missão de Santo Agostinho de Cantorbéry, em 596, converte a Inglaterra ao cristianismo. As leis eram redigidas, não em latim, mas em língua anglo-saxônica e regulavam aspectos muito limitados das relações sociais, às quais se estende a concepção atual do direito, tais como as Leis de Aethelbert, do rei do Kent, redigidas em língua anglo- saxônica do ano 600 e que comportavam noventa frases breves, bem como as leis do rei dinamarquês Canuto (1017-1035), que são mais elaboradas e anunciam a passagem da era tribal para a feudal, ressaltando-se, que neste período não havia direito comum {common

lawr\

b) A Fase de Formação do Common Law (1066-1485)

Em 1066, o período tribal termina, e começa o feudalismo na Inglaterra, além disso, inicia-se uma relação entre a escola italiana e o common law nascente representada por

Lanfrancus Dialectius, arcebispo de Cantuária, que se dedica ao estudo do direito inglês, de

origem anglo-saxônica, começando, assim, juntamente com o arcebispo Teobaldo e outros juristas versados no direito romano e germânico, o núcleo que deu origem ao common law. Em seguida, a curia legis, ou seja, a corte de Guilherme, toma-se o centro da vida administrativa e jurídica do novo reino, em tomo da qual, rapidamente passou a orbitar uma classe profissional forense muito homogênea, de onde saíram os magistrados que, com suas sentenças, começaram a criar o common law, o direito que seria comum para quase a totalidade das ilhas britânicas. Guilherme, o Conquistador, proclama expressamente que o direito anglo-saxônico se mantém em vigor e ver-se-ão até os dias atuais, juristas e juizes ingleses invocarem, quando as circunstâncias o exigem e mesmo aplicarem esta ou aquela lei da época anglo-saxônica. Esta conquista constitui-se num acontecimento relevante para o direito inglês, pois traz à Inglaterra um poder forte, centralizado, rico de uma experiência administrativa já testada no ducado da Normandia.

O common law surge das cinzas da conquista normanda da Inglaterra, que se manteve por cerca de cento e cinqüenta anos de tirania, e que impôs um truculento Código

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Penal aos saxões, para garantir os privilégios dos normandos. Houve, ainda, a imposição de tributos para o Rei João, que levou o interior da Inglaterra à penúria, sendo extremamente difícil de agüentar, até que o Rei João (1199-1216) foi forçado a assinar a Magna Charta em 1215, quebrando a regra normanda, surgindo assim a nação inglesa'^'*^. Nesta fase já se verificava uma preferência para que os elaboradores das decisões fossem leigos, pois os reis normandos que começaram a construir as fundações do direito anglo-saxônico, através de uma relativa e sofisticada administração de justiça no início do século XII, deixavam importantes decisões governamentais nas mãos das comunidades locais, a fim de que tais potentados, embora agindo sob comissão real, largamente fizessem justiça livres da supervisão e interferência real"^"*^. Aliás, uma das maiores diferenças entre o common law e o

civil law, é a grande importância que é dada aos juristas neste sistema, do que,

comparativamente, ao common law, pois neste último, a maior importância é dada às decisões proferidas antes das cortes superiores'^"^'*.

Tratava-se, portanto, de um direito consuetudinário, porque, num sentido particular, o costume, que é fonte deste direito, tem origem, não no comportamento popular, mas na atuação dos juizes, com o uso do método do precedente judicial. Por sua vez, a Inglaterra, com o seu sistema feudal, não conheceu o esfacelamento do poder e da soberania que a monarquia sofreu na França. Com a conquista da Inglaterra pelos normandos, o poder real se desenvolveu de modo diferente, pois o feudalismo adquiriu um aspecto muito diverso do que tinha na França ou na Itália, tendo em vista que os senhores normandos que acompanharam Guilherme I, o Conquistador (Duque da Normandia, 1027-1087), à Inglaterra, vêem-se num país conquistado, cuja língua é estranha e cujos habitantes e costumes são por eles desprezados. Desta forma, o Conquistador soube precaver-se dos perigos que representariam vassalos muito poderosos, de modo, que na distribuição de terras aos seus súditos não possibilitou a formação de nenhum grande feudo, a fim de que nenhum grande barão pudesse disputar poder com ele. Todos os senhores dependiam diretamente do rei, além disso, a organização político-administrativa feudal inglesa manifestou-se na redação, a partir de 1086, do Domesday, documento que abrangia os quinze mil domínios (manors) e os duzentos mil lares então existentes na Inglaterra. Este caráter militar organizado, do feudalismo inglês, é

SCULLY, Gerald W. Op. cit. p. 15 L

'‘^^DAMASKA, Mirjan R. The Faces of Justice and State Authority: a Comparative Approach to the Legal

Process, p. 38.

GRAY, John C. The Nature and the Sources of the Law. 1909, p. 252. Apud APPLE, James G.; DEYLING, Robert P. A Primer on the Civil-Law System, p. 34.

um dos elementos que vai permitir, em oposição ao Continente europeu, o desenvolvimento do common law^^.

Neste quadro, a descentralização político-administrativa era demandada, todavia levou tempo, tanto é que a Alemanha triunfará com seu esfacelamento político somente no fmal do século XIX. Por sua vez, a Inglaterra só conhecia o esfacelamento do direito entre os costumes locais, pois o direito aplicado pela cortes reais apresentou-se, Nestas condições, de início, como um direito público, distinto dos costumes reais que as jurisdições tradicionais aplicavam. Desta maneira, segundo DAVID: “ao contrário destes, aquele valia para todo o reino; por isso foi chamado comune ley ou common law. Aconteceu, porém, que os particulares, por diversas razões, abandonaram as jurisdições locais, que julgavam seus processos de acordo com os costumes locais, e dirigiram-se em todos os casos, para julgamento, às cortes reais, porque estas julgavam de acordo com regras processuais mais

modemas e porque a execução de suas decisões era garantida de maneira mais eficiente”"^^.

Como as cortes reais desejavam aumentar as suas competências, começaram a atender todos os tipos de litígios, com fundamento numa ficção que lhes permitia, em todos os casos, pretender, que o litígio a elas submetido deveria ser tratado pela Coroa, de modo que o

common law deixou de ser público e começou a abranger todas as situações, inclusive de

direito privado'^’. Desta forma, o direito inglês não continha verdadeiramente direito material, mas uma série de regras processuais, que eram técnicas para resolução de conflitos'*'**. Por sua vez, ao centralizar a administração da justiça, a monarquia criou as cortes reais, que tiveram papel fundamental na elaboração e unificação do direito. Como o direito judiciário, cuja prática decorre das necessidades da vida social, o common law é desde o início direito unitário, o que, na época era exceção à regra.

Mais cedo do que na França, os reis da Inglaterra conseguiram, desde o século XII, impor sensivelmente a sua autoridade sobre o conjunto do território do seu reino, bem como desenvolver a competência das suas próprias jurisdições senhoriais e locais. Vários tribunais foram criados, dentre os quais o Saccarium, Court of Exchequer (Tribunal do Tesouro), desde

0 século Xn, para as finanças e os litígios fiscais; o Court of Common Pleas (Tribunal de Queixas Comuns), a partir de 1215, para julgar litígios entre particulares relativos à posse da terra, ambos com assento em Westminster. Havia também o King's Bench — bench coram

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DAVID, René. Op. cit., p. 285.

______ . O Direito ingiês, p. 4.

Idem, p. 4-5. Idem, p. 7.

rege (Tribunal do Rei), que era itinerante e seguia o rei nos seus deslocamentos, tendo sua

sede em Westminster, no século

Nesta fase, as funções de advogado ou procurador eram confundidas com aquelas do juiz, pois inexistia procurador que assumisse a tarefa de obter a prova e preparar o processo, enfim, que atuasse especificamente em favor da parte, como seu representante processual. Isto não foi possível até que os governantes patrimoniais da Inglaterra e da França desenvolvessem as instituições de direito real. Nas cortes reais da Inglaterra, o advogado tomou-se o representante exclusivo das partes e era recrutado, quase sem exceção, dentre aquelas pessoas que sabiam escrever, ou seja, o clero, categoria cuja maior fonte de renda era a advocacia. Todavia, as preocupações do serviço eclesiástico de um lado, e a expansão do ensino juri'dico entre as classes superiores, de outro, provocou exclusão do clero da carreira jurídica, mas também a organização dos advogados leigos em quatro Inns of Court, que treinavam os advogados na prática dos litígios e na arte da advocacia, e um forte movimento para que estes monopolizassem os cargos judiciais e outras funções que exigiam conhecimento jurídico'^^'^.

No século xn, o costume permanece como única fonte de direito na Inglaterra, através dos costumes locais, das cidades nascentes {borough customs), dos costumes dos mercadores (sobretudo os de Londres, os pie powder, os pés poeirentos), chamados de lex

mercatoria, mais tarde ley merchant ou merchant law‘^^\ A expressão common law, usada na

Inglaterra desde o século XIU, é geralmente empregada para indicar o sistema jurídico que começou a se formar na Inglaterra a partir da conquista normanda, e que foi sucessivamente adotado, com algumas diferenças, nos Estados Unidos, no Canadá anglófono, na Austrália, na Nova Zelândia, na índia e, em grande parte, por outros países, que foram colônias inglesas, na chamada commonwealth, ou comunidade britânica de nações. É também chamado de sistema inglês ou direito anglo-saxônico e tem como característica principal o precedente judicial como fonte de direito, isto é, a ratio decidendi de uma decisão adotada por um juiz, com base em um caso análogo ao que é submetido à sua apreciação.

Não se deve confundir a expressão common law com direito comum que, num sentido geral, indica qualquer disciplina que se relacione com uma outra mais ampla. Chamava-se direito comum por oposição aos costumes locais próprios de cada região, além disso, foi chamado durante vários séculos de comune ley (lei comum), porque os juristas

“^^GILISSEN, John. Introdução histórica ao direito, p. 210.

WEBER. Max. Max Weber on Law in Economy and Society, p. 199-200.

ingleses continuaram a usar o direito francês, o law french, até o século XVDl'*^^. Ressalte-se, que o sentido do common law é bastante diverso da expressão direito comum, íus commune, usada no Continente europeu para designar, a partir do século XVI, o direito emdito elaborado com base no direito romano e servindo de direito suplementar às leis e costumes de cada país'*^^. A elaboração da comune ley, direito inglês e comum a toda a Inglaterra, será obra exclusiva dos Tribunais Reais de Justiça, vulgarmente designados pelo nome do lugar onde vão estabelecer-se a partir do século XDI: Tribunais de Westminster'*^'*. Estes tribunais eram jurisdições de exceção, competentes unicamente em casos excepcionais, para cada um dos quais existia um processo particular, e foram levados a elaborar um novo direito, comum a toda a Inglaterra, a comune ley ou common law e tinham a obrigação de se submeterem a quadros processuais rígidos, sendo esta a principal razão que impediu a recepção dos conceitos do direito romano, juntamente através dos diversos costumes locais da Inglaterra^^^.

Neste período, observa-se a concentração do interesse dos juristas ingleses com a efetividade da justiça através do processo, pois o common law é um conglomerado de processos próprios para assegurar, em casos cada vez mais numerosos, a solução dos litígios. Para descrever o direito inglês no seu conjunto, Ranulfo Glanvill, que era um autor do século xn (1187-1189) e Henry de Bracton, autor do século XHI, expõem com naturalidade (em latim) os princípios, estudam sucessivamente os writs, pelos quais podem ser demandados os Tribunais de Westminster, as crônicas judiciárias, escritas em francês judiciário {law french) e conhecidas pelo nome de Year Books, que informam sobre o direito inglês de 1290 a 1536, e possuem o seu interesse no processo e omitem em regra a solução de mérito do litígio“*^^.

c) A Fase da Difusão da Eqüidade (1485-1832)

Em decorrência da dependência restrita do common law aos processos formalistas, verificou-se que, no decorrer do tempo, o common law ficou exposto ao perigo de não poder desenvolver-se com liberdade suficiente para dar satisfação às necessidades da época e da

escíerose resultante da rotina dos operadores do direito. Assim sendo, surgiu um sistema

complementar, que se manifestava nas normas de eqüidade, originariamente inspiradas nas idéias de justiça natural, razão pela qual adquiriu este nome, não sendo mais nem menos justiça natural do que o common law, ressaltando-se que a equity faz parte do direito inglês

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Idem, p. 207. Idem, p. 208.

lUCHl, p. ZVJO.

DAVID, René. Os grandes sistemas do direito contemporâneo. Tradução de Hermínio A . Carvalho, p. 286.

Idem, p. 294.

ainda que não o faça do sistema common law, tal como sustenta WILLIAMS; “Eqüidade é direito no sentido que ela é parte do direito da Inglaterra: ela não é direito somente no sentido de que não é parte do common law”^^^.

Esta particularidade importante do sistema common law, — a eqüidade — era administratada pelos chanceleres. Desde cedo, no período medieval, o chanceler teve importância real. O seu órgão, a chancelaria, era responsável pela impetração de writs nas cortes de common law. Depois, após longo processo, a chancelaria tomou-se uma corte, mas de forma diferente, não seguia rigidamente as regras do common law, t sim princípios de eqüidade, pois o chanceler era o “guardião da consciência do rei”, tinha o poder de não aplicar normas injustas. Ressalte-se que, com o decorrer do tempo, podia-se falar de normas, princípios e doutrinas de eqüidade assim como de “direito”. A eqüidade tomou-se quase sistema de antidireito, embora, de certo modo, o sistema de direito complementasse o da eqüidade, e vice-versa. A eqüidade tinha um remédio, que podia ordenar o pagamento de determinada quantia ou compelir alguém a fazer algo: a injunção, uma ordem determinando que certa pessoa deveria fazer ou não fazer um ato específico. Era executável, e tinha força obrigatória, pois se houvesse o descumprimento daquele a quem a ordem fosse dada, o chanceler poderia declará-lo desrespeitoso à ordem judicial, e determinar a sua prisão'*^*.

A partir do século XII, qualquer pessoa poderia requerer justiça ao rei, através de

petition of rights, avaliada pelo chancheler, que examinava o pedido e, se o considerasse

fundamentado, enviava uma ordem, chamada writ (em latim: breve ; em francês: bref), a um xerife (agente local do rei) ou a um senhor para ordenar ao réu que desse satisfação ao queixoso, caso não houvesse tal justificativa, o réu podia ser coagido a se explicar perante um dos tribunais reais"*^^. O writ de hipoteca, abaixo transcrito, é esclarecedor quanto ao tema: “O rei ao sheriff, saúde. Dá ordem a N. para que ele com justiça e sem demora restitua a R. tanta terra (ou a mesma terra) naquela vila que ele lhe empenhou por cem marcos por um prazo já expirado, como lavrado, e que aceite os dinheiros de R. por isso (ou que lhe deixe quite a terra por isso, como disse). E se o não fizer, que o intimes devidamente a ir a tribunal

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o chanceler, um dos principais colaboradores do rei, estimula o desenvolvimento dos

writs, objetivando atrair maior número de litígios para as jurisdições reais, o que fez com os

mesmos se tomassem rapidamente modelos sem uma avaliação profunda do caso. Assim, provocaram a reação dos senhores feudais que, através da Magna Charta de 1215, conseguem

WILLIAMS, Glanville. Learning the Law, p. 26.

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Idem, ibidem.

colocar freios às jurisdições reais sobre as dos barões ou grandes vassalos e, pelas Provisões de Oxford de 1258, obtêm a proibição de criar novos tipos de writs. Somente em 1285, o

Statute of Westminster II, documento relevante na história do common law, possibilita a

conciliação entre os interesses do rei com os dos barões, determinando o status quo, porque o chanceler não podia criar novos writs, mas podia passar writs em casos similares (in consimili

casu), disposições estas que vigoraram até 1832^*^\

Desta forma, o direito inglês desenvolveu-se, desde o século XIII, com base nesta lista de writs, ou seja, através das açÕes judiciais sob a forma de ordens do rei, o que fez com que o processo fosse mais importante do que as regras de direito material, consolidando o princípio remedies precede rights^^'. Seu poder era suficientemente forte para defender não somente sua autonomia, mas também as liberdades sociais, aliando-se, na época do absolutismo dos Tudors e Stuarts, com o Parlamento, contra o poder real“*^^. A compreensão das lutas e da história da Inglaterra, bem como da conquista dos normandos e do feudalismo, é essencial para entender esta fase inicial do processo de consolidação do common law, como menciona POLLOCK: “O Direito da terra inglesa não pode ser entendido sem uma ampla explanação histórica; ele não pode ser compreendido sem aprender quão peculiar a história inglesa da terra foi, da conquista normanda, sem comparar os divergentes percalços do feudalismo inglês e continental”'*®'*.

No século XV, o direito inglês passa a ter estrutura dualista, que o opõe ao direito continental. Desta forma, é composto, de um lado, pelo common law, constituído stricto sensu pelas regras definidas pelas cortes reais de Westminster (cortes de common law) e, de outro, pela equity (rules of equity), que eram os remédios admitidos e aplicados por uma corte real específica, a corte de chancelaria“*®^. As relações entre as duas cortes passaram por uma violenta crise no século XVH, com a intrusão do rei nas cortes de common law, de modo que o Parlamento suprimiu uma jurisdição que estava vinculada à prerrogativa real e que ameaçava ainda mais a liberdade: a da Star Chamber, subsistindo somente a corte de chancelaria competente em matéria cível'*®®. Assim, a partir do século XIV, os particulares, não podendo obterem justiça dos tribunais reais e estupefatos com as soluções dadas para suas causas, dirigiram-se ao rei para pedir-lhe que interviesse para tranqüilizar a consciência e fazer obra de caridade. O recurso, em semelhante caso, passava normalmente pelo chanceler,

GLANVILL. De legibus et consuetudinibus regni Angliae. 1187. Apud GILISSEN, John. Op. cit., p. 218. GILISSEN, John. Op. cit., p. 210.

■'“idem, p. 211.

^^^CONSTANTINESCO, Léotin-Jean. Traité de Droit Comparé - Introduction au Droit Comparé, p. 24-25. POLLOCK, Sir Frederic. The History of Comparative Jurisprudence. Journal of Comparative Law, p. 78, DAVID, René. O direito inglês, p. 9.

Idem, ibidem.

que o transmitia ao rei, se o julgasse oportuno. Desta forma, o chanceler, no século XV, torna- se cada vez mais autônomo, estatuindo em nome do rei e do conselho, que a ele deve ser delegada tal competência, o que fez com que sua intervenção fosse mais solicitada, devido aos obstáculos que o processo e a rotina impunham aos juizes do common law.

Por conseguinte, tais decisões, tomadas inicialmente em consideração à eqüidade do caso particular, tomam-se mais sistemáticas, criando as doutrinas eqüitativas, que constituíam

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