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Excepções à OPA 39

No documento Caso study : a fusão Zon / Optimus (páginas 39-42)

6. Dever de Lançamento de OPA 36

6.2. Excepções à OPA 39

Com a evolução do regime dos valores mobiliários e da própria vida societária, verificaram-se situações em que, não obstante das participações sociais imputadas a um accionista ultrapassarem os limites percentuais de direitos de voto estabelecidos no artigo 187.º, a aquisição efectiva do controlo não se materializava, ou ocorria tendo na sua génese um facto que a legitimava, dando assim origem à necessidade do ordenamento jurídico prever excepções ao dever de lançamento de OPA.

Através da análise ao Código dos Valores Mobiliários é possível distinguir excepções assentes em quatro níveis61: inexigibilidade ou prova negativa do domínio (art. 187º

n.º2); derrogações – resultantes de lançamento prévio de OPA geral, saneamento financeiro, ou fusão de sociedades – (art. 189º); suspensão do dever (art. 190º); e substituição no cumprimento do dever (art. 191º n.º2).

Tomando em consideração o tema central da presente dissertação, é útil e desejável a análise da derrogação do dever de lançamento de OPA derivada da fusão de sociedades.

Conforme explanado supra62, no decorrer de um processo de fusão, as administrações gozam de total discricionariedade para avaliar os seus patrimónios e apurar as relações de troca das suas participações sociais. No seguimento desses cálculos é estipulada a atribuição de acções para os sócios da(s) sociedade(s) extinta(s), podendo resultar numa alteração do controlo e da estrutura accionista da sociedade incorporante ou resultante de fusão.

Pese embora o facto de que, regra geral, a fusão de sociedades resulta numa fragmentação das participações sociais, se na sequência operação de concentração se verificar, directa ou indirectamente, a ultrapassagem dos limites de direitos de votos considerados como pressupostos do dever de lançamento de OPA, recai sobre os accionistas a quem as participações são imputadas a obrigação de efectuar esse

61 Cfr. PAULO CÂMARA, Manual de Direito dos Valores Mobiliários, cit., p. 653. 62 Cfr. supra ponto 4.4.

incumprimento do dever imposto.

Todavia, esta situação nem sempre se materializa uma vez que a lei concede às operações de fusão a excepcional capacidade de legitimar a aquisição do controlo, derrogando a obrigação inerente à mesma, exigindo no entanto que os accionistas das sociedades participantes tenham previamente aprovado em assembleia geral essa intenção, cumprindo assim o requisito constante da alínea c) do número 1 do art.º 189.º63.

Deste modo, a derrogação do dever justifica-se essencialmente em factores inerentes à vontade das partes, na medida em que para a fusão se concretizar é previamente exigida a deliberação nesse sentido, emitida por maioria qualificada dos accionistas presentes nas assembleias gerais das sociedades fusionadas64, bem como a prévia negociação dos seus órgãos de administração do projecto de fusão. Assim, as modificações sociais decorrentes da junção de sociedades foram antecedidas pela votação dos seus accionistas, levando a que a nova posição de controlo seja alvo do seu consentimento, restando à CMVM pronunciar-se sobre a derrogação nos termos do n.º2 do art.º 189.º.

Contudo, não podemos deixar de nos interrogar sobre o motivo pelo qual o regime das derrogações concede aos accionistas, no artigo 189.º, a capacidade de afastar o dever de lançamento de OPA em sede de fusão, mas não o permite noutras situações de aquisição de valores mobiliários. Consideramos que o facto de, no caso de fusão, os accionistas potencialmente beneficiários da OPA prescindirem do seu direito através de uma deliberação da Assembleia Geral aprovada por maioria qualificada não é suficiente para justificar esta posição legislativa.

Imaginemos a seguinte situação: o accionista A detém 20% do capital social e direitos de voto da sociedade X, mas pelos mais variados motivos pretende aumentar a sua participação na sociedade e adquirir mais 30% do capital social. Independentemente

63 Não obstante da alínea c) do n.º1 do artigo 198.º apenas exigir a deliberação da assembleia geral da

sociedade emitente dos valores mobiliários em relação aos quais a oferta seria dirigida, consideramos

que deve existir semelhante deliberação em todas as sociedades participantes no processo de fusão, respeitando o artigo 100 n.º 2 CSC. No mesmo sentido JULIANO FERREIRA, Excepções ao Dever de

Lançamento de Oferta Pública de Aquisição, cit., 207.

possuir na sua esfera jurídica a obrigação de efectuar uma oferta pública de aquisição sobre a totalidade das participações da sociedade.

Com efeito, consideramos que o legislador deve rever o regime das derrogações de forma a permitir que a estrutura accionista, reunida em Assembleia Geral, tenha igualmente a possibilidade de derrogar o dever de lançamento de OPA no âmbito das restantes aquisições de valores mobiliários, em semelhança com o que sucede nas operações de fusão65.

Por último, cumpre fazer uma breve nota relativa ao possível conflito de interesses entre o accionista que passará a deter a posição de controlo e os demais. Não obstante do legislador não fazer qualquer referência quanto ao eventual impedimento do exercício de voto nas deliberações que visam aprovar a fusão e derrogar o dever de lançamento de OPA, é de ponderar a possibilidade de apenas poderem intervir nas mesmas os accionistas cujas participações sociais não ultrapassem, em resultado da fusão, os limites constitutivos do próprio dever.

Esta opção legislativa, adoptada em alguns ordenamentos jurídicos que não o nosso66, evita que os accionistas com maior poder e participações societárias sujeitem a sua posição aos demais, permitindo que a derrogação em questão seja deliberada por quem não beneficie directamente da mesma67.

65 Não obsta a nossa opinião o facto de que o Projecto de Fusão, previamente elaborado em conjunto pelas administrações das sociedades envolvidas, permitir aos accionistas tomar conhecimento dos motivos, condições e objectivos da operação, conferindo-lhes uma maior protecção para deliberar a derrogação de OPA.

66 A título de exemplo, repare-se que na Bélgica ocorre a impossibilidade dos accionistas beneficiários da derrogação da OPA votarem na deliberação da fusão.

67 Como estabelece Juliano Ferreira “... admitir a participação no processo deliberativo do accionista

que apenas será beneficiado pela aprovação da fusão constitui a aceitação de um desiquilíbrio injustificado entre accionistas, pois o voto daquele não só servirá para formação do quórum constitutivo (1/3) como (...) para preencher o quórum deliberativo (2/3), permitindo, dessa forma, impor aos demais uma situação de factual sujeição ...” in Excepções ao Dever de Lançamento de Oferta Pública de Aquisição, cit., 209.

No documento Caso study : a fusão Zon / Optimus (páginas 39-42)

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