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CAPITULO II – U MA EDUCAÇÃO PARA O A MOR : A ÉTICA DO CUIDADO A PARTIR DA

2. A família, a educação e os idosos na Evangelii Gaudium e a

2.1. A Exortação Apostólica Evangelii Gaudium

Nesta não exaustiva análise que tenciono realizar da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium79do Papa Francisco, pretendo referir os pontos relativos à família, educação, os

idosos e cuidado com os mais velhos, como venho já fazendo desde o início deste relatório.

77 Antónia Cristina PERDIGÃO, “A ética do cuidado na intervenção comunitária e social: Os pressupostos

filosóficos”, Análise Psicológica (2003), 4 (XXI), 485.

78Manuel MADUREIRA DIAS, “Avisão cristã da família”, in Communio, III, 6 (1986) 517. 79 PAPA FRANCISCO, Evangelii Gaudium, dado em Roma a 24 de Novembro de 2013.

Há imagem do que já abordei no primeiro capítulo, no que respeita à questão da sociedade atual, também o Papa Francisco inicia a sua Exortação Apostólica alertando para o “risco do mundo atual com a sua avassaladora oferta de consumo” e para a “tristeza individualista que brota do coração comodista e mesquinho, da busca desordenada de prazeres superficiais, da consciência isolada”, escusado será dizer que tudo isto faz sobressair a “falta de espaço para os outros”, acabando assim por “deixar de se gozar a doce alegria do amor” (EG 2).

Numa primeira parte da sua Exortação o Papa Francisco, apela a uma renovação missionária, renovação esta que tenha como ponto de partida uma “Igreja em Saída”, que vá ao encontro das pessoas, envolvendo-as e acompanhando-as de forma a que elas mesmas frutifiquem e levem a todos a boa e alegre mensagem do Evangelho. A sua vontade é a Igreja chegue a “todas as periferias humanas”, sendo esta uma Igreja aberta a todos e a todas sem exceção e sem discriminação pretende assim, o Papa, uma pastoral de conversão (cf. EG 20-47).

Numa segunda parte o Papa reflete sobre a crise atual, crise esta que leva a uma “crise do compromisso comunitário”, onde se verificam as desigualdades sociais e uma idolatria louca pelo dinheiro e pela economia e aqui o Papa diz não a uma economia de exclusão, que coloca de parte os pobres e mais desfavorecidos (cf. EG 50-60). É preciso então, levar a alegria do Evangelho a todos os povos, propondo uma mudança de mentalidade que coloque de parte a idolatria do dinheiro e que se preocupe com aqueles que sofrem com a crise.

No que à família diz respeito mais concretamente, o pontífice menciona que a mesma está a passar por uma profunda crise, particularmente no que concerne à “fragilidade dos vínculos”, o que é grave porque se trata da “célula básica da sociedade, o espaço onde se aprende a conviver na diferença e a pertencer aos outros e onde os pais transmitem a fé aos filhos” (EG 66). Sendo o matrimónio um compromisso de amor onde se partilha o afeto e a comunhão, o mesmo torna-se ameaçado pelo “individualismo pós-moderno e globalizado que favorece um estilo de vida que debilita o desenvolvimento e a estabilidade de vínculos entre as pessoas e distorce os vínculos familiares.” Para esta problemática do individualismo e da falta de afetividade o Papa propõe que os cristãos insistam na proposta de “reconhecer o outro, de curar as feridas, de construir pontes, de estreitar laços e de nos ajudarmos a “carregar as cargas uns dos outros”” (EG 67). Será de todo reforçar que a família não é um assunto que se deve colocar de lado, muito pelo contrário “estudos

recentes demonstram que as relações familiares são uma prioridade e uma preocupação para a maioria das pessoas.”80

O que se propõe é um aprofundamento das relações, particularmente neste tempo em que existem variadíssimos instrumentos de comunicação humana. O “desafio é descobrir e transmitir a “mística” de viver juntos, misturarmo-nos, encontrarmo-nos, darmos o braço, apoiarmo-nos, participarmos nesta maré um pouco caótica que pode transformar-se numa verdadeira experiência de fraternidade”, levando tudo isto a “oportunidades de encontro e solidariedade entre todos” (EG 87).

Sendo a família a célula básica da sociedade, torna-se imprescindível que a mesma, comunicando, partilhe as suas fraquezas os seus problemas e as suas alegrias, no sentido de se poder criar um ambiente de abertura familiar que permita a proliferação da afetividade e comunhão e não o contrário, o fechamento em si próprio e a despreocupação com os outros.

Concretamente aos idosos, o Papa refere a necessidade de ouvir tanto os jovens como os idosos, uma vez que, “tanto uns como outros são a esperança dos povos” daí a necessidade de se ouvirem ambos e de haver uma partilha de experiências. “Os idosos fornecem a memória e a sabedoria da experiência, que convida a não repetir tontamente os mesmos erros do passado” (EG 108). Fazendo um paralelo com o discurso que o Papa Francisco fez no Vaticano aquando do encontro internacional de idosos e avós a 28 de Setembro de 2014 o mesmo reiterou que um “povo que não cuida dos avós “é um povo sem futuro” porque “perde a memória”.81 Mais uma vez surge o alerta da necessidade de se

ouvirem os mais velhos e de lhes dar o espaço necessário dentro da comunidade e, sobretudo no seio familiar, porque a experiência dos mais velhos é uma ajuda fulcral na construção das relações.

Para além das questões ligadas à economia, à relação das ciências com a teologia e uma pastoral voltada para o encontro com as pessoas, o Papa refere na sua Exortação Apostólica a preocupação com os mais pobres, mas também e essencialmente o cuidado que devemos prestar aos mais frágeis. O Papa refere que os cristãos são “chamados a cuidar dos mais frágeis da terra” (EG 209). Segundo Francisco “é indispensável prestar atenção e debruçarmo-nos sobre as novas formas de pobreza e fragilidade, nas quais somos

80 Maria Teresa RIBEIRO, “Família e psicologia: intervenções educativas, preventivas e terapêuticas”, in

CONSELHO PONTIFÍCIO PARA A FAMÍLIA, Léxico da Família: Termos ambíguos e controversos sobre

família, vida e aspetos éticos, ed Princípia, Cascais, Maio 2010, 445.

81 DISCURSO DO PAPA FRANCISCO no encontro Internacional de idosos e avós no Vaticano a 28 de

Setembro de 2014, http://portugues.clonline.org/default.asp?id=792&id_n=20438, [consultado a 22 de Abril de 2015].

chamados a reconhecer Cristo sofredor: os sem-abrigo, toxicodependentes, os refugiados, os povos indígenas, os idosos cada vez mais sós e abandonados” (EG 210).

Neste sentido, torna-se cada vez mais indispensável falar-se de uma ética do cuidado, ética esta que se volte para o cuidado com os mais vulneráveis, criando assim, na sociedade associações e instituições que colaborem na educação e no desenvolvimento de métodos que tornem possível o incremento de valores do cuidado para com os mais frágeis, porque, cada “pessoa é digna de dedicação” (EG 274).

Concluindo esta análise da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium, é de referir ainda que na parte final o Papa refere a necessidade do diálogo como uma caminho para a paz e chama ainda a atenção para a indispensabilidade do diálogo inter-religioso, e para a necessidade de se manter viva a chama da evangelização.

Trazendo alegremente esta boa notícia que é o Evangelho, o Papa Francisco reflete sobre a necessidade de um novo impulso missionário, que leve a todos, sem exceção a alegria do Evangelho, alegria esta que deve ser espelhada por todos neste nosso mundo, que cada vez mais se torna individualista e consumista. Torna-se necessário dar voz aos mais pequenos, aos mais frágeis, fazendo com que eles tomem parte deste mundo e que, sobretudo possam fazer parte deste mundo enquanto pessoas que são. Mais do que qualquer outra coisa torna-se essencial dar espaço à proximidade, à afetividade e ao diálogo como caminho para a comunhão entre as pessoas. Mais do que tudo é preciso que não haja medo de se chegar ao outro e de o acompanhar pelo tempo que precisar.