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4 RELATO DE UMA PRÁTICA: PROPOSIÇÕES SOBRE A ORGANIZAÇÃO DOS

4.6 Experiência maluca

Em meio a tanta tinta e tanta cor, iniciei a aula perguntando às crianças as cores de suas preferências. Cada um foi dizendo a cor ou as cores que lhe agradavam e eu fui separando EVAs correspondentes às cores. Organizei placas com as cores e convidei as crianças para irmos ao gramado e brincarmos da brincadeira Elefantinho colorido. As crianças ficaram surpresas, pois desconheciam a brincadeira. Começaram então a questionar como "funcionava" tal brincadeira.

As plaquinhas foram confeccionadas por mim com quadrados de EVA de várias cores colados em palitinhos de churrasco. Espalhei pelo gramado as placas e ensinei a brincadeira à turma. Conforme ia dizendo as cores as crianças pegavam as plaquinhas correspondentes e no final da brincadeira quem tivesse mais plaquinhas seria o vencedor. Iniciei a brincadeira e constatei que todos haviam compreendido a brincadeira. Deixei de ser o Elefantinho e passei a "função" a uma menina da turma. Ela deu continuidade à brincadeira enquanto eu fui registrando fotograficamente. No final da brincadeira, o interesse das crianças estava em contar as placas. Deixei que fizessem a contagem sozinhos. Alguns demonstraram independência desde o começo, outros solicitavam a minha ajuda o tempo todo.

Fizemos as contagens e parabenizamos o vencedor e todas as crianças pelo sucesso da brincadeira, porque concluímos que todos respeitaram as regras e conseguiram reunir um bom número de placas. As crianças gostaram muito da brincadeira e por isso decidimos brincar mais uma vez, alterando o personagem do Elefantinho várias vezes, a fim de possibilitar a todos ser a "voz do comando".

Outras crianças que estavam próximas desse espaço também demonstraram interesse pela brincadeira e ficaram por alguns segundos assistindo. Apesar de haverem ganhadores, as crianças não se preocuparam em ganhar, mas em pegar as fichas e contá- las, sem se chatearem se não fossem os ganhadores.

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Concluímos a brincadeira pela segunda vez e convidei-os para uma roda de conversa. Estavam alvoroçados e queriam falar sobre suas placas e cores. Iniciei a conversa perguntando o que eles tinham achado da brincadeira. Todos se mostraram muito contentes e afirmaram que "a brincadeira do Elefantinho Colorido era muito legal". (DIÁRIO DE CAMPO, 20/11/2013).

Fui questionando as crianças sobre as cores e sobre o que elas representavam. Uma das crianças falou que a cor azul era dos meninos e a cor rosa das meninas. Notei que a mesma criança durante a brincadeira não recolheu a cor rosa quando esta foi a "ordem" do Elefantinho. Perguntei por que ele achava que azul era cor de menino e rosa a cor de menina e obtive a seguinte resposta. "Na minha casa a toalha azul é do meu pai e a rosa é da minha mãe." (DIÁRIO DE CAMPO, 20/11/2013).

Continuamos a conversa e outra criança respondeu: "Mas o meu pai disse que não tem problema se a menina usa azul e o menino usa rosa." Fui percebendo que o que estava acontecendo era uma convenção que a própria sociedade nos impõe desde quando as mães preparam a chegada dos bebês. É como se o mundo e os gêneros estivessem divididos em duas cores.

Um dos meninos, espontaneamente, levantou o braço e disse "Eu gosto de rosa". Em seguida duas meninas disseram "Eu gosto de azul". E assim, pouco a pouco, a turma foi se dividindo entre o rosa e o azul. Seus argumentos estavam baseados no que ouviram de seus pais. Tudo era justificado a partir da frase "O meu pai disse que (...)" ou "a minha mãe disse que (...)".

Depois de muita "justificação", concluímos que se um menino gostar de rosa continuará ser menino e se uma menina gostar de azul continuará ser menina, porque o importante não é a cor. Achei interessante porque conseguimos chegar a essa conclusão juntos, sem eu precisar afirmar categoricamente que o gosto pela cor não determinava se a pessoa era do sexo masculino ou feminino.

Perguntei a elas o que achavam se o mundo fosse apenas de uma cor, ou seja, se todas as coisas fossem azuis ou rosa. A primeira reação foi rir, ficaram se olhando e rindo. Depois pensaram um pouquinho até que uma criança respondeu que isso não era possível. Convidei as crianças para irmos ao gramado da escola. Entreguei a elas uns óculos que eu havia feito de celofane. Ajudei as crianças a colocarem e fomos observar como seria o mundo só de uma cor.

As crianças ficaram deslumbradas, queriam escolher as cores e diziam "Profe to vendo tudo roxo!", "É muito legal!". Deixei que explorassem todas as possibilidades de

cores e depois perguntei o que acharam da experiência de verem a escola apenas de uma cor.

- Não ia se legal, porque dai tudo ia se igual! - É mais dai não te graça!

- A gente nem ia sabe o que era!

- Eu gostei do óculos, mas só que é melhor a escola ter um monte de cor! (DIÁRIO DE CAMPO, 20/11/2103).

A conversa continuou até que um menino reafirmou nossa conclusão anterior "O legal é um monte de cor, não só uma". Fiquei feliz com a conclusão dele e da turma que imediatamente concordou com a afirmação do amigo. Durante todo o ano letivo, alguns meninos não aceitavam beber o leite no copinho cor de rosa por acreditarem que o importante era a cor. Depois da nossa conversa, dois desses meninos deixaram de se importar com a cor do copo.

No dia seguinte, convidei as crianças para brincarmos de misturar as cores. Separamos os materiais que iríamos utilizar e organizamos as mesas. As crianças escolheram as cores que seriam misturadas e iniciaram a atividade. Estendi o tecido e elas iniciaram a pintura do seu retrato. Conforme pintavam, iam relatando o que estavam desenhando e solicitavam os materiais que necessitavam.

4.7 (Re) Criando com Argila

Neste dia levei para a sala pacotes de argila e pedaços de madeira. Contei às crianças que Miró também fazia esculturas. A primeira pergunta da turma foi o que era escultura. Expliquei o que era e mostrei a Xerox de uma das obras. Perguntei a elas o que achavam de fazermos uma escultura e elas concordaram na hora.

Imediatamente, começaram a organizar as mesas espontaneamente, o que eu achei ótimo. Sentaram-se e eu distribuí os pedaços de madeira. As crianças começaram a brincar com as rodas de madeira imitando volantes de carro. Exploraram a madeira até que um menino perguntou quando íamos começar as esculturas. Mostrei a elas a argila e disse que iríamos trabalhar com ela. Veio então a segunda pergunta "O que é argila Profe?" (DIÁRIO DE CAMPO, 22/11/2013).

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Expliquei que argila era um tipo de barro que pode ser usado para fazer as esculturas. As crianças fizeram cara de espanto e logo começaram a tecer comentários sobre o "barro".

- A minha mãe não gosta que eu me suje! - Profe a minha mãe não dexa brinca com barro! - Ela não vai gosta nada, nada disso!

- A minha dexa profe! Me dá um barro! (DIÁRIO DE CAMPO, 22/11/2013).

Percebi que algumas crianças estavam muito preocupadas com o que a mãe iria dizer se elas chegassem em casa sujas. A fim de "resolver o problema", entreguei a camiseta que usamos quando pintamos e elas vestiram. Abri o pacote de argila e dividi entre elas. Combinamos que quando precisassem de mais, era só pedir.

Algumas crianças começaram a explorar a argila assim que receberam e outras permaneceram olhando. Incentivei-as para que manuseassem a argila e fomos conversando durante a atividade. Notei que essa atividade proporcionou momentos agradáveis de conversação entre as crianças e eu.

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