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Criatividade e inovação: em busca do outro

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m 1941, um engenheiro suíço chamado Georges de Mestral caminha- va com seu cão pelos Alpes e foi incomodado por inúmeras sementes de bardana que se prenderam em sua roupa e no pelo de seu cachorro. O homem estranhou a dificuldade em retirar essas sementes, que precisavam ser removidas uma a uma. Por isso, resolveu analisá-las ao microscópio e descobriu que a fixação era feita por centenas de “microganchos” que se prendiam a pequenas argolas. Isso despertou em Georges a ideia de criar um material com a mesma estrutura para juntar dois objetos de modo que se pudesse soltá-los quando desejado. No entanto, o inventor levou 7 anos para conseguir encontrar um material adequado e desenvolver o produto que ficou conhecido como VELCRO®. Hoje, a marca é a principal fabricante

de fixadores com sistema de ganchos e argolas do mundo.

O exemplo acima é um relato de um processo criativo que gerou um produto extremamente inovador. Este é apenas um dos incontáveis exem- plos de ideias inovadoras que transformaram o negócio de uma empresa. No entanto, uma inovação pode ser vista sob a óptica de uma ideia nova que gera um negócio novo; de uma ideia nova que transforma uma empresa existente; de um processo novo, em uma empresa existente; ou ainda como mudanças significativas nas formas de as pessoas gerir suas carreiras e suas competências no contexto social e organizacional. Além de eventualmente criar rupturas em um mercado, a criatividade é importante para a flexibili- dade das organizações em períodos de tempo cada vez menores, uma ne- cessidade cada vez mais crescente (LEAL, 2007). Essa flexibilidade também é necessária para garantir a competitividade de uma empresa durante osci-

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lações no ambiente (MACHADO, 2004). A importância da criatividade no contexto organizacional também decorre do fato de que “são as pessoas que são criativas na resolução de problemas, na tomada de decisão, na pesquisa e no desenvolvimento de novos produtos, serviços ou métodos de trabalho” (BRAIA et al., 2014, p. 45). Como será visto adiante, a inovação é resultado da implementação eficaz de ideias provenientes da criatividade (RODRI- GUES & VELOSO, 2013; BRAIA et al., 2014). Portanto, mesmo que a empre- sa tenha uma área de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) com o objetivo de inovar, as pessoas ainda são os agentes responsáveis por isso (MACHADO, 2004). Além disso, as organizações procuram pela criatividade do dia a dia, que não está necessariamente associada à dimensão criativa das obras de grandes artistas (BRAIA et al., 2014). Neste caso, nota-se que a criatividade se estende a todas as áreas, não se limitando a um departamento de P&D dentro de uma empresa, e é bastante relevante no cenário econômico mun- dial. É também importante lembrar que a criatividade e a inovação também são temas relevantes para a sociedade como um todo, e principalmente para instituições sociais, como as famílias e as escolas. Sendo assim, pretende-se aqui explorar conceitos importantes de serem compreendidos por aqueles que podem se beneficiar do melhor entendimento das condições que permi- tem surgir a criatividade e a inovação nos ambientes sociais.

No ranking “The Global Innovation Index” (WIPO, 2015) de 2015, que avalia as dimensões de inovação em 141 países do mundo, o Brasil ocupou apenas a 70ª posição. No índice, que vai de 0 a 1,00, o Brasil alcançou 0,51 ponto. Em comparação, o Chile conseguiu 0,71. O primeiro colocado no ranking, a Suíça, alcançou a pontuação 1,00. O que faz o Brasil ter um de- sempenho tão ruim em termos de inovação?

As respostas podem estar na perspectiva em que se analisa a criativida- de e a inovação. Portanto, é necessário investigar a questão também no nível cultural. De acordo com McLean (2005), o ambiente social influencia tanto a intensidade quanto a frequência do pensamento criativo. Por ambiente social, entende-se o conjunto de características culturais e estruturais de um sistema que moldam a vida dos indivíduos participantes (JOHNSON, 1997). A cultura, que será estudada a seguir, é um fator determinante para a forma como a cognição e a motivação de uma pessoa são desenvolvidas, e defi- ne, portanto, como um indivíduo aborda a solução criativa de problemas (CHUA et al., 2015). A cultura também pode ser estudada no nível organi- zacional, podendo ser analisado seu papel de estímulos ou obstáculos da criatividade em uma empresa.

De acordo com Schein (2009), o papel da liderança numa organização também é fundamental para definir as condições em que a cultura da em- presa se forma. Portanto, pode-se assumir que um entendimento distorcido acerca das condições propícias para criatividade e inovação em uma empre- sa, por parte dos gestores, pode levar a barreiras culturais que dificultam

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práticas inovadoras dentro da organização. É importante destacar, no entan- to, que a decisão de ser ou não inovadora é parte da estratégia da empresa e da sociedade, assim como é fundamental que as políticas públicas edu- cacionais passem por este tema. Mas o que pode nos ajudar a desenvolver indivíduos mais criativos e sociedades inovadoras?

Cultura e criatividade: condições e processos para a inovação

Berger e Luckmann (1997), sobre a socialização de um indivíduo, apon- tam que o processo de conhecimento da realidade é uma construção social afunilada pela linguagem por meio de tipificações. Ou seja, ao definir uma pessoa como “homem, europeu, comprador, jovial”, são estabelecidos os modos como se deve interagir com ela. Dito em outras palavras,

(...) a linguagem tipifica as experiências, permitindo-me agrupá-las em amplas categorias em termos das quais tem sentido não somente para mim, mas também para meus semelhantes. (BERGER & LUCKMANN, 1997, p. 59)

É importante destacar que essas tipificações não são resultadas apenas das experiências vividas por um indivíduo, mas já são determinações sociais antes da existência deste. O mesmo ocorre com a objetivação da realidade, ou seja,

A realidade da vida cotidiana aparece já objetivada, isto é, constituída por uma ordem de objetos que foram designados como objetos antes de mi- nha entrada na cena. (BERGER & LUCKMANN, 1997, p. 38)

Os autores discutem as raízes do processo de institucionalização, ou seja, o controle social. Isso ocorre uma vez que qualquer atividade huma- na está sujeita ao hábito, já que toda ação repetida com frequência se torna modelada em um padrão (BERGER & LUCKMANN, 1997). Isso ocorre para que o esforço de sobreviver seja reduzido, pois se evita que toda atividade do cotidiano tenha de ser repensada e reaprendida a cada dia. No momen- to em que esta tipificação de ações habituais passa a ser recíproca, passa a haver uma instituição. Além da reciprocidade, a institucionalização implica controle e predeterminação de quais agentes irão realizar quais tarefas. Em outras palavras, “dizer que um segmento da atividade humana foi institu- cionalizado é dizer que este segmento da atividade humana foi submetido ao controle social” (BERGER & LUCKMANN, 1997, p. 80). Com isso, pode- se definir instituições como estruturas estáveis e com padrões de comporta- mento recorrentes (HUNTINGTON, 1965).

Aqui, já é possível ter uma pista de como esse processo de construção da realidade pode afetar a criatividade em uma organização. Como driblar

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a tipificação das ações habituais de modo a pensar em novas ideias? Além disso, o controle social decorrente da institucionalização também não limita o pensamento “fora da caixa”? As respostas podem estar no modo como a cultura é construída, como será visto mais adiante.

Geert Hofstede (1997) define três níveis de programação mental: na- tureza humana, personalidade e cultura. No primeiro nível, há a natureza humana, que é algo universal e herdado e está relacionada à capacidade de sentir medo, raiva, alegria, etc. No entanto, o autor afirma que essa natureza não é tão humana, uma vez que outros animais também possuem. Numa li- nha semelhante, Berger e Luckmann (1997, p. 72) afirmam que “embora seja possível dizer que o homem tem uma natureza, é mais significativo dizer que o homem constrói sua própria natureza, ou, mais simplesmente, que o homem se produz a si mesmo”. No segundo nível de programação mental da teoria de Hofstede, está a personalidade, que se caracteriza por ser algo específico a determinado indivíduo e é herdado e também aprendido ao longo da vida. No terceiro nível, existe a cultura, que é específica ao grupo e aprendida. Ou seja, a cultura sempre é uma determinação social e nunca natural. Bauman (2012, p. 91) acrescenta “ele é uma personalidade mas tam- bém tem uma personalidade, é um ator mas também objeto de sua própria ação, ao mesmo tempo criador e criatura”.

As diferenças entre uma cultura e outra são expressas, para Hofstede (1997), em quatro níveis de manifestação cultural. São eles: símbolos, heróis, rituais e valores. Em relação aos símbolos, pode-se dizer que são palavras, gestos, figuras e objetos que traduzem um significado apenas reconhecido por quem compartilha a cultura. Os heróis são pessoas que servem de mo- delo de comportamento numa cultura por possuírem características alta- mente valorizadas por esta. Nota-se que essas pessoas podem ser vivas ou falecidas, reais ou imaginárias, no caso dos heróis mitológicos. O terceiro nível de manifestação cultural trata dos rituais, ou seja, “atividades coleti- vas, tecnicamente supérfluas, para atingir fins desejados, mas considerados essenciais numa determinada cultura” (HOFSTEDE, 1997, p. 23). O último nível consiste no núcleo da cultura e é chamado de valores. Trata-se da pre- ferência de um estado de coisas em relação a outro. Normalmente, esses estados possuem uma característica dualista, como “mau ou bom” e “sujo ou limpo”. De acordo com Hofstede (1997), os valores são aprendidos na in- fância e por volta dos 10 anos de idade, a estrutura básica de valores de um indivíduo já está consolidada. Por conta desta aquisição precoce, a maioria dos valores são inconscientes e extremamente difíceis de serem modificados ao longo da vida.

Edgar Schein (2009) buscou analisar a cultura em níveis, ou seja, “o grau pelo qual o fenômeno cultural é visível ao observador” (SCHEIN, 2009, p. 23). No nível mais superficial e visível, Schein designa os artefatos, estru- turas e processos organizacionais que são visíveis a um observador externo

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da cultura. Tratam-se da linguagem, arquitetura, produtos, arte, vestuário, mitos, rituais, lista explícita de valores, etc. Nota-se que os artefatos são fá- ceis de serem observados, porém difíceis de decifrar. Por exemplo, ao entrar em uma catedral, uma pessoa não familiarizada com o cristianismo pode ter sua atenção direcionada aos vitrais coloridos. No entanto, apesar de serem visíveis, os vitrais apresentam significados mais profundos que necessitam de um estudo mais denso. No segundo nível, estão as crenças e valores ex- postos, que são embutidos na filosofia ou em uma ideologia e servem como guia para lidar com situações de incertezas ou incontroláveis. Normalmen- te, as crenças e os valores foram promulgados por líderes, profetas e funda- dores num primeiro momento e, dadas à eficiência na redução de incerteza, passaram a ser suposições indiscutíveis e valores compartilhados. No ter- ceiro nível, o mais profundo, Schein coloca as suposições básicas, que são pensamentos e sentimentos inconscientes e assumidos como verdadeiros. Nota-se que este nível é a concretização do segundo nível, já que as hipóte- ses acerca das crenças e valores que reduzem à incerteza passam a ser não apenas verdadeiras, mas a realidade em si. Um exemplo de suposição básica é o direito individual estar acima do coletivo em algumas sociedades. Desse modo, comportamentos realizados fora dessas premissas são inconcebíveis para um membro do grupo. As suposições básicas também são fundamen- tais para a estabilidade de um grupo e podem ser equiparadas ao núcleo da cultura definido por Hofstede (1997) como valores. Vale ressaltar que “as mentes humanas necessitam de estabilidade cognitiva; assim, qualquer desafio ou questionamento de uma suposição básica despertará ansiedade e defensividade” (SCHEIN, 2009, p. 30), portanto, esse é o nível que garante a estabilidade da vida social.

As interpretações de Hofstede (1997) e Schein (2009) sobre os níveis de cultura possuem algumas semelhanças. Os símbolos de Hofstede podem ser comparados aos artefatos de Schein, já que ambos tratam de estados obser- váveis. Em relação aos heróis e às crenças e aos valores expostos, há uma convergência na influência de líderes e pessoas consideradas exemplos para a sociedade. Além disso, ambos os autores discutem que há um núcleo mais profundo que sustenta toda cultura, chamado por Hofstede de valores e por Schein de suposições básicas.

É interessante notar que, para que haja um funcionamento coerente de uma cultura, tem de haver um alinhamento entre os níveis. Uma empresa cujo fundador era inovador e tem a característica de buscar novas ideias en- raizada em seu núcleo também deve evidenciar esse perfil em seus aspectos superficiais (símbolos ou artefatos). Ou seja, se a criatividade é um fator im- portante desde a fundação da empresa e faz parte dos valores e suposições básicas, é primordial que essa importância seja levada para todos os outros níveis culturais, de modo a se evitar contradições. O mesmo pode-se pensar sobre uma escola, grupos profissionais e cidades. Seria a criatividade um

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fator importante, desejado e estimulado ou não? Qual a abertura que se tem para o novo?

O Dicionário Escolar da Língua Portuguesa da Academia Brasileira de Letras (2008) define criatividade como: “s.f. 1. Capacidade de inventar, de criar, de inovar, de conceber na imaginação. 2. Qualidade de quem ou do que é ino- vador, original”. O dicionário também traz a definição de “criar”, segundo a qual se trata de “dar existência a, tirar do nada” e “ formular na mente, imaginar, inventar”.

No entanto, Boden (1999) indica que esta ideia de “formar algo do nada” não só é inacessível para o método científico, como é impossível.

Leal (2007, p. 74) traz algumas definições de criatividade de autores influentes no assunto:

Sternberg: “[...] produção de algo que seja original e de valor, e que •

além de original deve ser útil e executável”.

Torrance: “[...] processo de se tornar sensitivo a problemas, defici- •

ências e lacunas, e, assim, formar ideias ou hipóteses com relação a esses problemas ou deficiências; testar hipóteses, modificando-as e revendo-as sempre que necessário”.

Stein: “[...] processo criativo apontando três fases: a primeira é mar- •

cada pela reflexão ou preparação; a segunda resulta em uma síntese do que ocorreu na primeira; enquanto a terceira seria decorrente da sensibilidade estética profunda e que resulta na ‘iluminação’”. Alencar e Kao: “[...] geração de ideias novas, sendo um processo •

intencional voltado para o aprimoramento individual e coletivo de uma organização ou mesmo da sociedade em geral”.

Bono: “[...] necessidade de rejeitar padrões estabelecidos e olhar •

as coisas de uma forma diferente, apresentando cinco usos para o pensamento criativo: melhoramento, solução de problemas, valor e oportunidade, futuro e motivação”.

As definições mencionadas trazem algumas semelhanças. Nota-se o uso do termo “processo”, sugerindo que há uma ordem ou curso no desenvol- vimento de uma ideia criativa. Além disso, também são constantes as ideias de novidade, originalidade e solução de problemas.

Braia et al. (2014) trazem uma definição de criatividade que sintetiza a ideia de vários autores: atualmente, os autores definem criatividade enquan- to geração de ideias originais, úteis e apropriadas (STERNBERG & LUBART, 1999 apud BRAITA et al., 2014; ZHOU & SU, 2010), em qualquer domínio, no que diz respeito a produtos, serviços, processos ou procedimentos, por indi- víduos ou equipes (WOODMAN, SAWYER & GRIFFIN, 1993 apud BRAITA et al., 2014), sem que seja necessária a implementação dessas ideias (AMABI- LE, CONTI, COON, LAZENBY & HERRON, 1996 apud BRAITA et al., 2014) (BRAIA et al., 2014, p. 46).

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Nota-se que a síntese de Braia et al. destaca o processo de geração de ideias e não, necessariamente, a implementação destas. Como Zhou e Hoe- ver (2014) e Amabile (RODRIGUES & VELOSO, 2013) destacaram, a efe- tivação das ideias criativas está mais relacionada à inovação. Numa linha semelhante, Loewenberger (2013) define criatividade como o processo de geração de ideias originais e inovação como a implementação ou exploração de ideias criativas. Machado (2004, p. 8) define inovação como um “proces- so de desenvolvimento e implantação de uma novidade incluindo novos processos ou o desenvolvimento de novas ideias”, podendo ser aplicada a novas tecnologias, produtos, processos organizacionais ou novos arranjos.

É importante ressaltar que a criatividade acontece em diversos cam- pos, como na educação, nas artes, nas ciências, nos negócios e na sociedade de uma forma geral (RUNCO & ALBERT, 2010). Nas organizações, pode-se observar que, neste nível, costuma-se focar as atenções na inovação, já que uma organização é um agrupamento de pessoas e, como visto anteriormen- te, quando se fala em grupo de indivíduos, costuma-se falar em inovação em vez de criatividade. No entanto, observa-se que esta é, na realidade, uma condição necessária para a ocorrência de inovação.

Nas definições apresentadas antes, pode-se perceber a constante pre- sença dos termos “original” e “novidade”. Machado (2004) argumenta que o termo “originalidade” refere-se à qualidade de original, inicial e originá- rio; enquanto “novidade” relaciona-se ao caráter de novo, inovação ou uso novo para algo já existente. Em seu estudo, a autora opta por utilizar o con- ceito de inovação relacionado com “novidade”, mas novo no contexto da organização. Por outro lado, Boden (1999) levanta uma questão semelhante no estudo da criatividade ao fazer uma distinção entre “criatividade-P” e “criatividade-H”. De acordo com a autora, o primeiro caso é psicológico, numa situação em que a pessoa em questão não poderia ter pensado em determinada ideia antes, independentemente de outras pessoas já terem pensado. O segundo caso refere-se à criatividade histórica, na qual, no sur- gimento de uma ideia, ninguém na história a havia tido. Para Boden (1999), a “criatividade-H” resulta em uma ideia radicalmente original.

Com isso, nota-se que há diferenças entre “original” e “novo”. No en- tanto, visto que o foco da criatividade é na geração de ideias e não, necessa- riamente, na implementação destas, as duas condições são relevantes no con- texto organizacional. Além disso, ideias podem não ser originais no mundo ou na história, mas podem ser novas no contexto da empresa. Por exemplo, a implementação do sistema de venda direta por meio de consultoras, como fazem a Natura e a Avon, pode não ser mais uma ideia original no contexto histórico, mas pode ser uma novidade no contexto de um mercado que não possui esse tipo de venda e será original para a organização. Outro exem- plo pode ser a invenção do post-it da 3M. Adesivos já eram fabricados pela empresa, porém, após uma tentativa fracassada de um dos pesquisadores

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em criar uma cola mais forte, foi feita uma cola mais fraca por acaso e que não deixava resíduos. A ideia da 3M foi aplicar essa cola leve em papéis que pudessem ser colados de forma temporária. Com isso, surgiu o post-it.

No Ocidente, um dos pioneiros nos questionamentos sobre a noção de criar algo foi Platão. Em sua obra A República (1965), o autor, por meio do personagem Sócrates, questiona se uma obra de arte não se trata apenas de uma imitação de algo que já existe, em detrimento de uma criação nova. Platão considerava que arte e poesia eram gêneros de mimese, uma vez que ou imitavam estados da alma, ou as formas do plano das ideias, que sempre existiram e são imutáveis. De acordo com ele, não havia a possibilidade de criar nada novo, e qualquer tentativa de criação artística era apenas um es- forço para igualar ou imitar as formas ideais (RUNCO & ALBERT, 2010).

Aristóteles, discípulo de Platão, também reforça a ideia da mimese em sua obra Poética (2008), considerando as expressões artísticas humanas imi- tações:

A epopeia e a tragédia, bem como a comédia e a poesia ditirâmbica e ain- da a maior parte da música de flauta e de cítara são todas, vistas em con- junto, imitações. Diferem entre si em três aspectos: ou porque imitam por meios diversos ou objetos diferentes ou de outro modo e não do mesmo. (ARISTÓTELES, 2008, p. 37)

No oriente, a ideia prevalecente entre o Budismo, Confucionismo e Hinduísmo era de que a criação de algo novo era um tipo de descoberta ou mimese (RUNCO & ALBERT, 2010). Vale destacar que devido à ênfase do Budismo no ciclo natural, a ideia de criar algo do nada não tinha lugar no universo.

A ideia cristã acerca da noção de criação foi influenciada pelo Gênesis da