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Um conceito fundamental na caracterização de sinais caóticos é a dependência sensível às condições iniciais (DSCI). A DSCI significa que, para duas condições iniciais muito próximas, os sinais resultantes vão se distanciando exponencialmente, em média, tornando-se totalmente distintos após algumas iterações.

Uma forma prática e operacional de verificar a DSCI das órbitas é por meio dos números de Lyapunov. Para um mapa em RK, cada órbita tem K números de Lyapunov, que medem

a taxa de divergência exponencial média entre duas órbitas próximas ao longo de K direções ortogonais. Essas direções são dadas pela dinâmica do mapa. A primeira será a direção ao longo da qual a divergência entre as órbitas é a maior. A segunda será a direção de maior divergência dentre as direções perpendiculares à primeira. A terceira direção será a de maior divergência dentre as direções perpendiculares à primeira e à segunda e assim por diante. Os fatores de separação em cada uma dessas direções são os números de Lyapunov da órbita, associados a uma condição inicial.

Considerando-se uma esfera S de raio pequeno com centro no ponto associado à condição inicial da órbita x(0) e examinando o resultado de uma iteração do mapa f(·) sobre os pontos dessa esfera, o resultado é uma forma elipsoidal com eixos mais longos nas direções em que f(·) proporciona uma maior separação entre duas condições iniciais próximas e eixos mais curtos nas direções em que f(·) proporciona uma menor separação entre duas condições iniciais próximas. As mudanças nos eixos desse “elipsóide” imagem, ao longo das iterações, são dadas pelos números de Lyapunov. Eles medem a quantia de alongamento ou encurtamento dos eixos. Essa ideia é ilustrada na Figura 2.1 para o caso bidimensional.

Mais formalmente, basta substituir a esfera em torno de x(0) e o mapa f(·) pela esfera de raio unitário S1 e a matriz jacobiana Df(x(0)), já que o interesse está no comportamento

infinitesimal em torno de x(0). Sendo

Capítulo 2 − Conceitos de sinais caóticos de tempo discreto 14 x(0) fn (x(0)) 1 fn (·) (ρn 1) (ρn 2)

Figura 2.1: Evolução de uma disco de raio unitário após n iterações do mapa f (·).

a matriz jacobiana da função resultante da n-ésima iteração do mapa f(·), JnS1 será um

elipsóide com K eixos ortogonais. Os eixos serão maiores que 1 nas direções de expansão e menores do que 1 nas direções de contração. As K médias geométricas das taxas de expansão dos K eixos ortogonais são os números de Lyapunov. Ou seja, para k = 1, · · · ,K, sendo (ρn

k) o

comprimento do k-ésimo maior eixo ortogonal do elipsóide JnS1, para uma órbita com ponto

inicial x(0), o k-ésimo número de Lyapunov Lk associado à condição inicial x(0) é dado por

Lk = lim n→∞(ρ

n

k)1/n, (2.5)

se o limite existir. A partir de Lk, pode-se obter o k-ésimo expoente de Lyapunov associado

à condição inicial x(0), dado por

κk = ln Lk. (2.6)

Sendo S1 a esfera de raio unitário em RK e B uma matriz K × K, os tamanhos dos eixos

ortogonais do elipsóide BS1 podem ser calculados diretamente como sendo as raízes quadradas

dos K autovalores da matriz BBT e as direções dos eixos serão dadas pelos K autovetores

correspondentes. Usando esse resultado, é possível calcular analiticamente os números de Lyapunov em alguns casos, dados o mapa, a matriz jacobiana Jn e a condição inicial.

Por exemplo, considere-se o mapa conhecido como cat map, dado por x(n + 1) = f(x(n)) = " 2 1 1 1 # " x1(n) x2(n) #

mod 1 = Ax(n) mod 1, (2.7) no qual a notação x mod 1 se refere ao número x + k, com k sendo o único inteiro que faz

Capítulo 2 − Conceitos de sinais caóticos de tempo discreto 15 com que 0 ≤ x + k < 1. Assim, 14,92 mod 1 = 0,92 e −14,92 mod 1 = 0,08. Nesse caso, a matriz jacobiana Df(x) é constante e igual à matriz A para qualquer x. Usando o resultado citado anteriormente, os tamanhos dos eixos da elipse formada após a aplicação de fn serão

as raízes quadradas dos autovalores de An(An)T. Como A é uma matriz simétrica, ou seja

A= AT, esses serão os mesmos autovalores de An, que podem ser calculados como λn

i, sendo

λi, i = 1, 2, os autovalores de A, dados por λ1 = 2,618 e λ2 = 0,382. Assim, um disco de

raio r será transformado em uma elipse com raios rλ1 e rλ2 após uma iteração do mapa e

em uma elipse com raios rλn

1 e rλn2 após n iterações do mapa. Usando (2.5), os números de

Lyapunov para esse mapa serão dados por L1 = λ1 = 2,618 e L2 = λ2 = 0,382 e os expoentes

de Lyapunov serão κ1 = ln L1 ≈ 0,962 e κ2 = ln L2 ≈ −0,962.

Entretanto, para quase todos os mapas não existe forma analítica de determinar os expoen- tes de Lyapunov a partir do mapa e da matriz jacobiana. Geralmente, a matriz Jn= Dfn(x(0))

é difícil de ser calculada com precisão para valores grandes de n, sendo necessário fazer uma aproximação do elipsóide imagem JnS1 por meio de algoritmos computacionais.

Dado que o elipsóide JnS1 tem eixos de tamanho pk nas direções uk, a abordagem direta

para obter os expoentes de Lyapunov seria o cálculo da matriz JnJTn e a obtenção de seus

autovalores p2

k. No caso de o elipsóide possuir direções em que ele é alongado e comprimido, ele

será muito longo e muito fino para um valor de n grande. A matriz Jnserá mal condicionada e

os autovalores de JnJTnvão conter números muito grandes ou muito pequenos, o que causa erros

de precisão numérica nos algoritmos computacionais. Por essa razão, o cálculo do elipsóide JnS1 na forma direta deve ser evitado.

Uma forma indireta que funciona melhor consiste em acompanhar o elipsóide conforme ele evolui. Sendo {x(0), x(1), · · · , x(n − 1)} os pontos de uma órbita do mapa f(·) com condição inicial x(0) e usando a regra da cadeia, é possível escrever Jn na forma

Jn= Dfn(x(0)) = Df(x(n − 1)) · · · Df(x(0)). (2.8) Assim, é possível calcular JnS1 uma iteração por vez. Iniciando com uma base ortonormal

{(u0

1), · · · ,(u0K)} para RK, calcula-se os vetores (z11), · · · ,(z1m) como

(z11) = Df(x(0))(u01), · · · ,(z1K) = Df (x(0))(u0K). (2.9) Esses vetores estão sobre o elipsóide Df(x(0))S1, mas não serão necessariamente ortogo-

nais. Para contornar essa situação, é necessário obter um novo conjunto de vetores ortogonais {(u1

Capítulo 2 − Conceitos de sinais caóticos de tempo discreto 16 utilizando o processo de ortogonalização de Gram-Schmidt, obtém-se

(y11) = (z11) (y12) = (z12) − (z 1 2) · (y11) k(y1 1)k 2 (y 1 1) (y13) = (z13) − (z 1 3) · (y11) k(y1 1)k 2 (y 1 1) − (z1 3) · (y12) k(y1 2)k 2 (y 1 2) ... (y1 K) = (z1K) − (z1 K) · (y11) k(y1 1)k 2 (y 1 1) − · · · − (z1 K) · (y1K−1) (y1 K−1) 2 (y 1 K−1). Fazendo (u1

k) = (y1k), para k = 1, · · · ,K, obtém-se um conjunto de vetores ortogonais que

geram um elipsóide com o mesmo volume de Df(x(0))S1. A partir daí, bastaria continuar o

procedimento, calculando o valor do jacobiano Df(·) no segundo ponto da órbita, obtendo- se o conjunto de vetores {(z2

1), · · · (z2K)} e, após a ortogonalização, o conjunto de vetores

{(u2

1), · · · (u2K)}. Entretanto, para eliminar o problema dos números muito grandes ou muito

pequenos, é necessário normalizar a base ortogonal a cada passo. Para tanto, obtém-se a nova base ortonormal fazendo (u1

k) = (yk1)/ k(y1k)k para k = 1, · · · ,K.

Em seguida, calcula-se a matriz jacobiana no próximo ponto da órbita e obtém-se uma nova base ortonormal {(y2

1), · · · (y2K)}, a partir do conjunto de vetores

Df(x(1))(u11), · · · ,Df(x(1))(u1K). (2.10) Fazendo isso, a cada passo j, (yj

k)

mede a taxa de crescimento na direção k devido a ação de uma iteração do mapa. Dado que, usando um valor de n suficientemente grande,

ρk ≈ (y1 k) · (y2 k) · . . . · k(yn k)k , (2.11)

é possível estimar o valor do k-ésimo expoente de Lyapunov pela da expressão κk ≈ ln k(y

1

k)k + · · · + ln k(ykn)k

n . (2.12)

Pode-se mostrar que uma órbita com o maior expoente de Lyapunov positivo apresenta DSCI [Abraham et al., 2004]. Assim, calculando os expoentes de Lyapunov para uma um mapa x(n + 1) = f(x(n)), é possível determinar se o sistema apresenta DSCI. Se o maior expoente de Lyapunov κ1 for positivo, o que equivale ao maior número de Lyapunov L1 ser maior que

Capítulo 2 − Conceitos de sinais caóticos de tempo discreto 17 algumas iterações do mapa.

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