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4 VIOLÊNCIA E JUVENTUDE: UMA TELA PARA O BORDADO

4.3 A fabricação da violência em Alagoas

Alagoas tem sido destaque em âmbito nacional, a partir dos Mapas da violência, como já indicado, no que se refere à violência contra a população geral e contra jovens negros, de forma mais específica. Isso tem suscitado discussões e pesquisas locais, na tentativa de compreender esse fenômeno e apresentar possíveis soluções. Por entendermos que a violência se dá por meio de diferentes formas de fabricação de discursos, práticas e modos de inscrições, seguiremos discutindo a fabricação da violência em Alagoas.

Ao pensarmos nessa fabricação da violência, pensamos nas possíveis associações em rede e seus efeitos, ao logo de todo o processo histórico de constituição política e socioeconômica. Processo esse que está atrelado a diversas formas de violência que permeiam a formação de territórios de pobreza e de exclusão em Alagoas. Territórios estes onde se encontra grande parte da população negra.

Podemos pensar a necessidade de discutir mais sobre os sujeitos como atores dessas práticas violentas e analisar também a constituição socioeconômica deste estado, posto que, Alagoas, segundo Lira (2007), desenvolveu-se economicamente a partir de uma produção agroindustrial da cana-de-açúcar, que provocou uma forte concentração de terra e de renda e situações de exclusão social. Segundo o autor, essa produção agrícola levou a “uma forte concentração de recursos públicos e privados nas mãos de uma pequena fração da população” (LIRA, 2007, p.31).

A concentração de terras e essa produção agroindustrial se deram num processo de extermínio de povos indígenas, escravidão de negros e exclusão também de outros moradores das áreas rurais. De acordo com Lira (2007, p. 54), “esse processo de concentração de terra e indústria no meio rural, nas mãos de poucas famílias, teve amplo apoio financeiro dos governos federal, estadual e municipal”. Com isso, vemos que a exclusão das classes pobres aconteceu de forma processual, envolvendo relações de poder entre Estado e sociedade civil.

O histórico de abuso de poder, a exclusão das classes pobres e a negação de políticas sociais mostram uma produção de violência, que atravessa a

constituição socioeconômica e política de Alagoas. Essa questão é importante para entendermos as formações dos territórios de pobreza deste estado, nos quais se situa a maioria da população negra, que está sendo apontada por estatísticas como mais vitimizada pela violência.

Ao falarmos de violência, seria interessante considerar as transformações sociais na contemporaneidade que resvalam na sociedade como um todo, e não só na local. E, assim, pensar a violência que aparece como um dos problemas da atualidade, como algo que envolve uma complexidade de fatores e não restringi-la a um subproduto de um local, por isso, tomamos a violência como algo que tem sido fabricado, a partir de diversos modos de inscrição.

Pontuamos que, além disso, é preciso pensar também em como está sendo fabricada a violência mais recentemente, em Alagoas. Referimo-nos, principalmente, à última década, na qual houve esse destaque à violência entre os jovens, trazido pelos Mapas da violência, e que apresenta uma crescente no número de homicídios destes, mostrando assim para uma forma de violência física levada ao extremo.

Vale destacar que os altos índices sobre violência têm indicado que esta não se dirige só as populações de jovens e jovens negros, mas também a mulheres e homossexuais22, o que não será discutido aqui, mas é algo que nos leva a pensar em problematizar a violência também em relação ao gênero e à homofobia, presentes em Alagoas. De acordo com o mapa da violência de 2013, Alagoas ocupa o 3º lugar no índice de homicídios de mulheres, em geral, e o 2º lugar no índice de homicídios de mulheres jovens, ficando atrás somente do estado do Espírito Santo, neste caso. (WAISELFISZ, 2013).

A violência que atinge uma parcela específica da população – os jovens pobres – é um grande indicador da falta de acesso desta às políticas sociais. Os altos índices de violência, dentre tantos outros índices negativos no estado, têm servido para estampar as ações de governo do Estado (ou ausências destas). Estes índices passaram a ser tomados como indicadores de um problema que requer atuação imediata.

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Alagoas apresentou o maior índice (0,58 por 100mil habitantes) de violência contra homossexuais, em 2012. Estes dados são apresentados pela Secretaria de Direitos Humanos, no Relatório sobre violência homofóbica no Brasil: ano de 2012.

Temos uma população (jovens pobres e jovens pobres negros), ou seja, um alvo que está envolto por formas de saber, e instrumentos ou procedimentos estabelecidos pelos programas e projetos, por exemplo, cursos de capacitação, que direcionam os jovens, indicando o que e como eles têm que fazer determinadas coisas. Isso quer dizer que se têm, portanto, sujeitos que constituem uma população-alvo dos investimentos do governo, por meio de políticas públicas. Entretanto, colocamos em questão o processo que constituiu essa juventude como alvo dessas políticas, visto que, perpassa aqui uma ótica de investimento para o futuro desses jovens, ou seja, esses investimentos não foram realizados antes, e agora que os jovens são vitimizados pela violência homicida, de forma alarmante, é preciso pensar em estratégias de resolução desse problema.

Os dados estatísticos surgem aí como subsídios para a criação de certas políticas públicas, no entanto, não levam a questionamentos de como foram constituídos. Olhar somente para os dados é distanciar-se das relações de poder mediadas por diversos atores e práticas. Falamos, assim, de uma violência que extrapola a questão física e que perpassa os modos de vida da população alagoana, não como uma reprodução de comportamentos, mas como agenciamento de diversos atores.