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Família e políticas sociais

1. Família Maceió (AL) 2 Classes sociais Maceió (AL) 3 Representa-

1.6. Família e políticas sociais

As políticas sociais de apoio à família se estabeleceram no rastro histórico do processo capitalista de produção, assumindo contornos de interesse do capital e garantindo condições adequadas ao processo de exclusão social. Assim como se organizam os trabalhadores, as mulheres, os idosos, os negros, os índios, os sem terra e os desempregados, as famílias também se estruturam em apoio a estes setores e efetivando ações que possibilitem o desenvolvimento dos seus membros.

Entretanto, o tratamento sócio-político da organização familiar nunca foi tema em evidência na discussão sobre a sociedade, nem elemento preponderante no dimensionamento dos movimentos e políticas sociais. Ela, quase sempre, aparece transvertida nas questões da sexualidade, da mulher, dos direitos da criança e do adolescente, do feminismo, etc. Sua realidade é tratada perifericamente, provocando uma desmobilização política frente à esta questão social.

Na Constituinte de 1988, os movimentos sociais de mulheres, crianças e adolescentes, índios, negros, camponeses sem terra, ambientalistas, idosos e deficientes, se fizeram presentes, mobilizando amplos setores da população. Entretanto, “nenhuma força importante

se apresentou avançando propostas em nome de um movimento de organizações familiares”

(COSTA, 2000:21), confirmando assim o aspecto periférico destas políticas.

A manipulação conservadora do tema por parte de entidades religiosas ou educacionais e das forças políticas dominantes, gerou uma dificuldade de articulação e mobilização de segmentos comprometidos com mudanças sociais amplas e profundas. Além disso, os anos 60, ao provocarem mudanças significativas nos caminhos do Serviço Social, libertando-o das amarras funcionalistas, trouxe a prevalência de uma visão transformadora e crítica da sociedade, incluindo a família no interior da questão mais ampla, contraditória e complexa do conflito de classes. Esta nova orientação relativizou a importância do trabalho com a família, em favor de ações junto à comunidade e movimentos sociais (COSTA, 2000:23). É importante ressaltar o caráter nucleador da família, pois lá também se encontra a realidade da mulher, da criança, do idoso, do adolescente, do homem, do trabalhador, etc.

Neste sentido, os movimentos sociais e as políticas públicas, voltadas para as instituições específicas da estrutura social, acabam alcançando a realidade familiar. Esta realidade é também resultante dos ventos do welfare state e dos direitos sociais, cunhados no mundo capitalista. Estes evidenciam o indivíduo como centro das políticas sociais em detrimento do foco voltado para a família ou comunidade. Porém, a crise do estado de bem estar refletiu uma certa consciência do esgotamento da perspectiva em torno do indivíduo, retomando a preocupação com a família e a comunidade.

Desta forma, compreende-se o motivo de as políticas sociais voltadas para a família ainda não terem apresentado resultados significativos, pois estas, de uma maneira geral, não alteraram o quadro de exclusão social e pobreza de grande parte daquela, no quadro da realidade brasileira. Acrescente-se a isso o fato de que as políticas sociais voltadas para família em si, não são prioridade para o Estado e as elites dominantes. É bem verdade que o tratamento dado pelo Estado mínimo ao conjunto das políticas sociais, se aplica às ações específicas voltadas para a família. Entretanto, não se pode perder de vista que a família é uma ilustre desconhecida na efetivação dos programas e políticas sociais (CARVALHO, 2000:101).

A Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS, refere como primeiro objetivo “a

proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice” (item I do Art. 2º da

Lei 8742/93)4. Além disso, apresenta como um dos seus princípios “o respeito à dignidade do cidadão, a sua autonomia e ao seu direito a benefícios e serviços de qualidade, bem como à

convivência familiar e comunitária, vedando-se qualquer comprovação vexatória de

necessidade” (item III do Art. 4º da Lei 8742/93)5. Portanto, ainda que a família seja um dos focos das políticas sociais, explicitadas nesta legislação, não se trata de uma focalização na família de “per si”, evidenciando-se também a maternidade, a infância, a adolescência e o idoso. Ela ainda faz parte dos maiores abandonados.

No caso das sociedades capitalistas onde se evidenciam os interesses das classes dominantes, as políticas sociais são conduzidas nesta perspectiva, assim como a organização familiar das diferentes classes sociais. São características marcantes do capitalismo, tendo o Estado como mínimo para os trabalhadores e máximo para o capital. Nessa perspectiva, a

4 Grifos nossos 5 Idem nota anterior

política social se restringe a programas focais, dirigidos exclusivamente à parcela mais pobre da população, desresponsabilizando o Estado e fortalecendo os programas de caráter assistencialista. Assim, o Estado mantém políticas sociais de caráter marcadamente elitista e assistencialista.

Neste contexto, precisamos considerar de uma maneira especial, o “apartheid” social vivido pelas famílias mais pobres e que constituem a maioria da realidade brasileira. Trata-se de uma realidade enfrentada por estas no contexto de uma solidariedade conterrânea e parental, “cuja identidade é marcada pela carência, sangue e terra natal” (CARVALHO, 2000:97). É uma experiência que provoca a assimilação de novos valores no que se refere a número de filhos, força de trabalho da mulher e o tratamento dado ao homem como provedor em vez de chefe.

Uma outra forma de enfrentamento desta realidade é o estabelecimento de relações de apadrinhamento. Assim, a família cria laços com membros de classe média e alta, usufruindo as sobras do consumo destas. Estes “padrinhos” retomam ações sociais assistencialistas concretas, não investindo em políticas e serviços sociais de caráter público.

A estratégia de famílias usuárias da solidariedade missionária de Igrejas ou seitas, que criam serviços assistenciais, é uma terceira opção. Esta reproduz o “apartheid” social, pois alimenta a cumplicidade com a pobreza estabelecida.

Estas formas de enfrentamento nos permitem compreender a subalternidade (CARVALHO, 2000:100) expressa nos comportamentos destas famílias: alcoolismo, uso de drogas, participação em furtos e assaltos, explosões de violência urbana, agressões a membros da família (muitas vezes, crianças) e vizinhos. São formas de reação ao processo de exclusão arquitetado pelo capital, e que conta com o apoio de um Estado omisso e ideologicamente elitista e concentrador de rendas. “No contexto de apartheid social (...) essas famílias formam

pequenas comunidades que, na verdade, se guetificam, dado o grau de pobreza e exclusão”

(CARVALHO, 1997:15).

Neste sentido, os programas de emprego e renda, complementação da renda familiar e redes de serviços de apoio psicossocial, cultural e jurídico, poderá fortalecer estas famílias, desde que estes reconheçam sua condição de cidadã e rompam com a cultura da tutela.

Neste trabalho interessa-nos compreender o foco das políticas sociais voltadas para a família enquanto forma adequada ou não às representações sociais das diferentes classes sociais. Interessa-nos verificar se aquelas atendem aos interesses, objetivos e valores propostos pelos membros destas.

Assim, inclui-se aqui uma breve discussão sobre o significado da teoria das representações sociais.

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