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O trigo é amplamente utilizado na alimentação humana sob a forma de farinha, facilitando o consumo deste cereal, e possibilitando a adequada utilização de suas propriedades tecnológicas e nutricionais (MIRANDA & EL-DASH., 2002; ORTOLAN, 2006). A farinha de trigo é definida como o produto obtido a partir da moagem do grão de trigo Triticum aestivum, e/ou de outras espécies do gênero Triticum, sendo classificada em tipo I, tipo II e integral (BRASIL, 2005), de acordo com a Instrução Normativa n° 8 de 2 de junho de 2005, do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), denominada Regulamento Técnico de Identidade e Qualidade da Farinha de Trigo.

Segundo MACEDO (2009), o volume nacional de produção de farinha de trigo atingiu 7.050.000 toneladas e o consumo de 39,17 kg per capita. Deste total, 54,7 % foram destinados à panificação, 14,2 % a produção de massas, 11,06 % a produção de biscoitos, 18,03 % o uso doméstico, e 2 % foram usados para outros fins. Entre os

alimentos elaborados com farinha, os pães e as massas alimentícias constituem os alimentos mais difundidos na dieta do brasileiro, representando importante fonte de carboidratos (ORTOLAN, 2006).

Na indústria de alimentos, a qualidade da farinha de trigo varia, diferentemente, para usos distintos nos produtos, além de ser definida pela sua capacidade de produzir, uniformemente, um produto final atrativo e com custo competitivo e, ainda, ser representada, usualmente, por várias medidas e características que as experiências têm indicado como significantes no uso final (FARONI et al., 2002). Assim sendo, o termo “qualidade da farinha” é relativo e denota a adequação da farinha para um certo uso, não tendo nenhuma relação com seu valor nutritivo. Ressalta-se, igualmente, que uma farinha de boa qualidade para o pão não o é, necessariamente, para bolos e vice-versa. Além disso, a qualidade da farinha é bastante diferente entre uma amostra que irá produzir um pão daquela que irá produzir um biscoito, dependendo diretamente do tipo de trigo do qual é proveniente, assim como do processo de produção (BENASSI & WATANABE, 1997).

Dada a grande diversidade de farinhas de trigo, é necessária a utilização de vários métodos para determinar essas características. Os métodos mais utilizados são os relacionados com as características reológicas da massa, a partir de sistemas simples de mistura de água e farinha. Existe uma série de aparelhos para medir estas propriedades, tais como farinógrafo, extensógrafo e alveógrafo. A definição de uso final de uma farinha deve ser feita após a avaliação conjunta dos resultados obtidos após todas as análises (GUTKOSKI et al., 2007).

2.2.1 Composição química da farinha de trigo

A farinha de trigo consiste, basicamente, de amido (70-75 %), água (14 %) e proteínas (10-12 %). Apresenta, também, polissacarídeos não amiláceos (2-3 %) e lipídeos (2 %) que, mesmo estando presentes em quantidades menores, exercem um papel importante na produção de alimentos derivados da farinha de trigo (ORTOLAN, 2006). Os teores máximos de cinzas de 0,8, 1,4 e 2,5 %, são empregados para se classificar as farinhas em tipo I, tipo II e integral, respectivamente (BRASIL, 2005).

O controle da umidade da farinha de trigo, é desejável para que o seu teor não seja superior a 15 % (BRASIL, 2005), exigidos pela legislação brasileira, não somente por motivos econômicos, já que a farinha é comercializada em base úmida mas,

também, pela manutenção da qualidade e do valor nutricional durante o armazenamento.

A composição da farinha de trigo é o resultado da interação das condições de cultivo do trigo (interferência do solo, clima, pragas, manejo da cultura e da cultivar), em soma à interferência das operações de colheita, secagem e armazenamento, fatores estes que influem diretamente sobre o uso industrial deste produto (MIRANDA & EL- DASH, 2002; GUTKOSKI, 2007).

Assim, pode-se observar nas tabelas abaixo (Tabela 2 e 3), a variação entre os teores dos constituintes do trigo e da farinha de trigo.

Tabela 2 - Composição química da farinha de trigo tipo I

1

TACO (2007); 2 FAO (2002); 3 USP (2006).

A importância dos cereais, incluindo o trigo, na nutrição de milhões de pessoas de todo o mundo é altamente reconhecida, podendo ser considerados como fonte de energia e de proteínas, nas dietas da população dos países em desenvolvimento. Entretanto, as suas proteínas apresentam uma qualidade nutricional limitada devido à deficiência de alguns aminoácidos essenciais, principalmente a lisina (FAO, 1992).

Componentes (g/100g) TACO / UNICAMP 1 FAO 2 USP 3 Umidade 13 12 10,5 Proteína 9,8 8,6 11,7 Lípides 1,4 1,0 1,4 Cinzas totais 0,8 0,4 0,5 Fibra alimentar total 2,3 2,1 2,8 Carboidratos 75 73,9 76

Tabela 3 – Conteúdo de proteína e de aminoácidos essenciais em alguns cereais

Aminoácidos Essenciais (mg/100 g) Cereal Proteína

(g/100 g)

Lys Ile Leu Met Phe Thr Trp Val His

Arroz Polido1 7,2 258 308 589 168 381 255 83 435 168 Trigo2 12,2 179 204 417 94 435 183 68 276 143 Milho2 9,5 167 230 783 120 305 225 44 303 170 Sorgo2 10,1 126 245 832 87 306 189 87 313 134 Centeio2 11,0 212 219 385 91 276 209 46 297 138 Aveia2 13,0 232 236 454 105 313 207 79 319 131

Lys: Lisina; Ile: Isolceucina; Leu: Leucina; Met: Metionina; Phe: Fenilalanina; Thr: Treonina; Trp: Triptofano; Val: Valina; His: Histidina; 1 USDA (2006); 2 FAO (1981).

Fonte: adaptado de VIEIRA (2007).

Ressalta-se ainda, como pode ser visto na Tabela 3, que dentre os cereais, o trigo apresenta o maior teor de Phe.

2.2.2 Proteínas da farinha de trigo

A proteína contida nos cereais é significativa para seu valor nutricional, e no caso de alguns alimentos, como o trigo, é também importante para as propriedades funcionais (SILVA, 2003). Dentre as farinhas dos diferentes cereais, apenas a do trigo possui habilidade de formar uma rede elástica e contínua, que retém o gás carbônico liberado durante todo o processo de fermentação da massa pelas leveduras, permitindo sua expansão (GIANIBELLI et al., 2002; GALERA, 2006). As proteínas do glúten são as principais responsáveis por estas características, sendo que a qualidade destas varia em função das variedades de trigo plantadas e condições de cultivo, como adubação, temperatura, índice pluviométrico, dentre outros. Essas proteínas podem ser classificadas de acordo com a solubilidade (OSBORNE, 1907), citado por SGARBIERI (1996), com a estrutura molecular (KREIS & SHEWRY, 1985), com a estrutura química (MACRITCHIE & LAFIANDRA, 1997), com similaridades químicas e genéticas (SHEWRY et al., 1997), citado por SANTOS (2008).

As proteínas presentes na farinha de trigo podem ser divididas em dois grupos, de acordo com a solubilidade: as formadoras e as não formadoras do glúten. Dentre as proteínas não formadoras do glúten, que representam cerca de 15-20 % do total presente no trigo, estão as albuminas e as globulinas. Estas proteínas são, principalmente, monoméricas, apresentando peso molecular inferior a 25.000 Da, e apresentam menor importância tecnológica (MACRITCHIE & LAFIANDRA, 1997; GIANIBELLI et al., 2002; GALERA, 2006).

Já as proteínas formadoras do glúten, que consistem em cerca de 80 -85 % do total presente no trigo, são insolúveis em água, mas capazes de formar uma rede viscoelástica, que permite a retenção de gases produzidos durante a fermentação microbiana da massa (LOOKHART et al., 1993; MACRITCHIE & LAFIANDRA, 1997; GIANIBELLI et al., 2002; VAN DER BORGHT et al., 2005).

Quando a farinha de trigo é misturada com a água e homogeneizada mecanicamente, no processo de fabricação de pães, ocorre a hidratação das proteínas gliadina e glutenina que passam a formar um complexo protéico pela sua associação por pontes de hidrogênio, ligações de Van der Waals e pontes dissulfeto, formando, assim, o glúten (BOBBIO & BOBBIO, 2001).

A principal diferença entre estes dois grupos de proteínas de reserva relaciona-se com a funcionalidade. A gliadina é constituída de apenas uma cadeia polipeptídica, enquanto que a glutenina é formada por várias cadeias polipeptídicas, unidas entre si por ligações dissulfeto. Esta estrutura confere elevado peso molecular à glutenina, sendo responsável, também, pela elevada insolubilidade desta proteína (GIANIBELLI et al., 2002). As gliadinas, são prolaminas monoméricas, cujo peso molecular situa-se entre 30.000 e 80.000 Da, e são formadas por apenas uma cadeia, tornando-se extremamente viscosas quando hidratadas. Estas são ricas em prolina e glutamina e apresentam baixo nível de lisina. Possuem resíduos de cisteína capazes de formar pontes dissulfeto intramoleculares, podendo ser separadas em 4 diferentes tipos, α-, β-, γ e ω, baseando- se na mobilidade por SDS-PAGE. Na formação da massa, as gliadinas atuam promovendo a extensibilidade, característica reológica importante para a formação adequada da massa (VERMEYLENA et al., 2005; VAN DER BORGHT et al., 2005). Estas proteínas podem se associar entre si ou com cadeias de gluteninas, através de interações hidrofóbicas e pontes de hidrogênio (VAN DER BORGHT et al., 2005).

As gluteninas representam cerca de 85 % das proteínas poliméricas, cuja característica principal consiste na presença de ligações dissulfídricas intra e intermoleculares formando, assim, cadeias compostas por subunidades. São formadas

por dois grupos de subunidades, os de alta massa molecular (HMW) – 80.000 a 120.000 Da e os de baixa massa molecular (LMW) – 30.000 a 55.000 Da, ligadas entre si por pontes dissulfeto (MACRITCHIE & LAFIANDRA, 1997). Estas proteínas conferem à massa resistência à extensão (VAN DER BORGHT et al., 2005).

As subunidades de LMW se subdividem de acordo com a mobilidade em SDS- PAGE em dois grupos, subunidades B e C, com massa molecular igual a 40.000 e 50.000 Da, respectivamente. As subunidades de gluteninas HMW ou tipo A, têm massas moleculares de 90.000 a 136.000 Da (EDWARDS et al., 2007). As LMW representam 60 % do total de gluteninas presentes no endosperma do trigo, entretanto, devido à similaridade de massa molecular com as gliadinas, a visualização em SDS-PAGE unidimensional fica prejudicada (GIANIBELLI et al., 2002).

No que se refere às subunidades HMW, embora representem um dos componentes minoritários das proteínas do endosperma do trigo, são essenciais no processo de panificação, por serem o principal fator determinante da elasticidade do glúten (GIANIBELLI et al., 2002). Nestas subunidades, encontra-se elevado conteúdo de resíduos de cisteína, que por sua vez, relacionam-se com a promoção das ligações dissulfídricas entre as subunidades HMW e LMW, responsáveis pela formação das proteínas poliméricas (WRIGLEY, 1988; LEMELIN et al., 2005).

Apesar de que no presente trabalho as proteínas do glúten não se encontrarem intactas, uma vez que foram parcialmente hidrolisadas, não se pode descartar a possibilidade de utilizar a farinha de trigo resultante na fabricação de pães, uma vez que outros cereais, que não contém glúten, ou apresentam baixo teor deste nutriente, são utilizados com esta finalidade. Ressalta-se, ainda, que a farinha resultante poderá ser utilizada, também, na fabricação de vários produtos tais como bolos, biscoitos e mingaus, além de manter suas propriedades como agentes espessantes e gelificantes em diversas preparações culinárias (GRISWOLD, 1972).

3 APROVEITAMENTO DE RESÍDUOS AGROINDUSTRIAIS

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