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FATORES AMBIENTAIS ASSOCIADOS AO RENDIMENTO DAS PESCARIAS

Conforme descrição detalhada do ciclo de vida já apresentada nos capítulos anteriores, camarões peneídeos são invertebrados de longevidade curta, com um ciclo de vida complexo. Os pré-adultos e adultos vivem no mar aberto, onde se reproduzem. As larvas passam por vários estágios, à medida que migram em direção às zonas costeiras onde, por metamorfose, se transformam em pós-larvas e se assentam e se desenvolvem até os estágios iniciais juvenis, quando retornam ao oceano (PÉREZ-FARFANTE, 1969, LARSON; AVYLE; BOZEMAN, 1989, GILLETT, 2008).

Vivendo em “habitats” costeiros altamente variáveis durante as fases de pós-larvas e juvenis, peneídeos estão particularmente sujeitos a fortes variações no recrutamento e no tamanho do estoque, governadas pelas condições ambientais. Camarões peneídeos jovens são especialmente sensíveis a mudanças na salinidade da água, - podendo ser afetados pela descarga fluvial no habitat estuarino que lhe serve de berçário (GARCIA; LE RESTE, 1981; ROGERS et al. 1993; BENÉ; MOGUEDET, 1998; DIOP et al. 2007).

Neste capítulo, se procurará mostrar evidências da premissa maior deste trabalho de que há uma relação de causa e efeito entre a variabilidade da vazão do rio Amazonas, durante o período de maior intensidade de imigração das larvas, assentamento das pós-larvas nas zonas costeiras e desenvolvimento de juvenis, no segundo semestre do ano, e a abundância da população adulta de camarão rosa (F. subtilis), bem como com o rendimento das pescarias no ano seguinte.

9.2 Material e métodos Fontes de dados

Foram utilizados na presente análise séries de dados mensais das pescarias industriais do camarão rosa (F. subtilis) na plataforma continental amazônica brasileira, juntamente com dados da vazão do rio Amazonas e de algumas outras

variáveis ambientais (Tabela 9.1). Os dados das pescarias compreendem desembarques mensais em quilogramas de caudas, considerados representativos da captura total, esforço de pesca, em número de dias de mar, e captura por unidade

de esforço ( ), em quilogramas por dia no mar, tomado como um índice de

abundância da população.

Tabela 9.1 – Variáveis pesqueiras e ambientais utilizadas na presente análise.

Algumas das análises levaram em conta apenas os dados referentes ao período de 1982-2006. No início da atividade os dados costumavam ser reportados apenas em termos de desembarques mensais por empresa e há dúvidas quanto à sua consistência nos primeiros anos. Também, ainda não foi possível obter estimativas consistentes da produção total e esforço de pesca para o período de 2007 a 2010, quando uma quantidade importante dos desembarques passou a ser destinada ao mercado local e não vem sendo informados. De qualquer forma, os dados disponíveis para este período são suficientes, pelo menos, para estimar a cpue.

A principal variável ambiental utilizada nas análises foi a vazão mensal média do rio Amazonas, em , medido na estação hidrológica de Óbidos, situada na zona intermediária do curso do rio. Estes dados estão disponíveis na base de dados da Rede Hidrometeorológica, sob a responsabilidade da Agência Nacional de Águas (ANA), e pode ser obtido no site: http://hidroweb.ana.gov.br/.

Dados oceanográficos, incluindo temperatura média mensal da superfície do mar na área de ocorrência das espécies e o índice multivariado das fases do El Niño e La Niña (índice ENSO multivariado - MEI), utilizados como informações auxiliares, foram

obtidos da Agência Nacional dos Estados Unidos para Atmosfera e Espaço (NASA) e estão disponíveis nos sites:

http://poet.jpl.nasa.gov/e http://www.cpc.ncep.noaa.gov/data/indices/.

Os dados foram organizados e sistematizados em planilhas eletrônicas com o software livre "OpenOffice.org" e convertidos em arquivos de texto que foram analisadas com o software livre estatístico "R" (Cran r-project.org).

Procedimentos

O padrão de comportamento da cpue foi determinado a partir das médias mensais, compreendendo os períodos de 1980 a 1986 e 1998 a 2000, quando não foi estabelecida a parada da pesca (defeso) e as operações de pesca foram realizadas durante todos os meses do ano. De maneira semelhante, o padrão de comportamento da vazão do rio Amazonas e da temperatura de superfície do mar foi determinado a partir das médias mensais da vazão e da temperatura, respectivamente, durante todo o período considerado.

As análises foram realizadas considerando uma escala temporal mensal e anual. Como primeiro passo, foi realizada uma análise exploratória gráfica de dados usando as facilidades do software R, com o objetivo de visualizar o padrão de intra-anual e inter-anual das variáveis e avaliar a associação entre o índice de abundância da população (cpue) e a vazão do rio Amazonas, bem como entre o rendimento das pescarias versus o esforço de pesca e a vazão do rio, considerando diferentes defasagens entre as variáveis.

As relações entre as variáveis foram inicialmente avaliada por meio de gráficos das anomalias, representadas pelas observações padronizadas para a média e o desvio padrão, que correspondem à variável padronizada , dada pela expressão:

Análises detalhadas foram então realizadas através de métodos estatísticos para avaliar a intensidade da relação entre as variáveis, tendo em conta uma escala de tempo mensal e anual. A associação entre a intensidade da vazão do rio e a ocorrência de episódios de El Niño também foi considerada.

Diferentes categorias foram atribuídas aos anos tendo em conta a ocorrência prévia de episódios de ENSO como segue: - anos regulares; - ocorrência de El Niño nos últimos dois anos; - ocorrência de El Nino nos últimos três anos. A adoção deste procedimento foi baseada na premissa de que a ocorrência anterior de um episódio de El Niño resulta em uma menor vazão do rio Amazonas no segundo semestre do ano e em condições favoráveis para o desenvolvimento de camarão rosa (F. subtilis). A ocorrência de boas condições ambientais em anos sucessivos pode resultar em influência positiva adicional na abundância população e no rendimento da pesca.

As relações foram avaliadas através de um modelo de análise de covariância (ANCOVA) que combina elementos da análise de regressão múltipla e da análise de variância. A variável resposta é contínua e há, pelo menos, uma variável explanatória contínua e outra categórica (CRAWLER, 2007). Para evitar o pressuposto de que a é diretamente proporcional ao esforço de pesca, o modelo foi aplicado ao rendimento, ao invés da cpue, contra o esforço de pesca, a vazão do rio Amazonas e a categoria de ano.

Foi investigada a influência do nível da vazão média do rio Amazonas nos meses anteriores sobre o futuro rendimento mensal da pescaria, bem como do nível de vazão média do rio de junho a novembro sobre o rendimento total das pescarias no ano seguinte. Os modelos completos para as relações são dados então por:

para dados mensais para dados anuais

Onde:

, covariável, é o esforço de pesca em dias de mar;

, covariável, vazão média mensal do rio Amazonas defasada 4 meses;  , fator que indica classe de anos;

, covariável, vazão média mensal do rio Amazonas de junho-

novembro do ano anterior;

, índice referente à defasagem aplicada à vazão do rio.

Uma vez determinado o modelo completo procedeu-se a estimação dos parâmetros procurando-se retirar aqueles que não tinham significância estatística de forma a se obter um modelo mínimo adequado. Os modelos foram ajustados inicialmente através do critério dos mínimos quadrados e uma vez determinado o modelo mínimo foi feita a análise dos resíduos.

Além da técnica de regressão linear múltipla, um modelo não linear proposto por GRIFFIN; LACEWELL; NICHOLS (1976) também foi ajustado aos dados mensais e anuais:

para dados mensais

para dados anuais

Os termos e correspondem ao rendimento máximo,

ponto máximo da função, para determinado nível médio de vazão do rio, mensal e para o período de junho a novembro, respectivamente.

A análise dos resíduos dos modelos foi realizada procurando-se verificar a normalidade e autocorrelação. Este diagnóstico dos resíduos foi realizado através de uma análise gráfica, assim como por meio da estatística de Durbin-Watson, para avaliar a autocorrelação, e o teste de Shapiro para avaliar a normalidade. Quando a série residual é positivamente auto-correlacionada em defasagens mais próximas, resulta numa subestimação do erro padrão e também em intervalos de confiança mais estreitos para a declividade. Neste caso o modelo foi reajustado através do critério dos mínimos quadrados generalizados, incluindo um termo de autocorrelação (COWPERTWAIT; METCALFE, 2009).

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