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3.4.2 FATORES EXTERNOS ÀS BOLSAS DE VALORES

SUMÁRIO

3.4.2 FATORES EXTERNOS ÀS BOLSAS DE VALORES

Os desafios referentes a fatores externos às bolsas devem-se ao fato de essas instituições não se relacionarem somente com empresas e investidores para promover a sustentabilidade em seus mercados. Em suas atividades, as bolsas influenciam diversos agentes e juntamente com o governo, legisladores e reguladores podem aumentar a percepção e a preocupação ambiental no setor financeiro. ( Figura 5)

Figura 5- O papel das bolsas de valores e sua relação com diferentes stakeholders

Fonte: Adaptado de BM&FBOVESPA, 2013.

Nitidamente, vemos uma relação de reciprocidade em que, ao mesmo tempo em que são demandadas pelo público por maior transparência e proteção aos investidores, as bolsas podem estimular essa percepção no mercado de capitais ao implementarem

iniciativas de sustentabilidade robustas e efetivas.109 (RESPONSIBLE RESEARCH, 2010, p.28)

Porém, alguns obstáculos e dificuldades ainda se apresentam no caminho sustentável do mercado financeiro e de capitais, os quais apresentaremos a seguir.

1- Visão de Curto Prazo dos Investidores

O primeiro obstáculo a ser superado é a visão de curto prazo predominante na

maioria dos investidores no mercado financeiro. Exemplo disso é o fato de que dos

1.226 signatários do PRI, 1032 são administradores profissionais de recursos (asset e

investment managers) totalizando US$ 34 trilhões sob administração de ativos até abril

de 2013. Apenas em 2011 foram registrados aproximadamente US$ 118 trilhões sob administração dessas instituições –fundos de pensão, hedge funds, fundos mútuos – o que mostra que muitos dos investidores ainda não estão atentos às questões da sustentabilidade.110

Uma solução, sugerida pela própria SSE, seria promover a educação dos investidores e atrair reguladores e policymakers para discutir questões de longo-prazo que assegurem a continuidade dos negócios e a estabilidade no mercado financeiro e de capitais.111 Deste modo, as companhias listadas poderiam reconhecer o valor atribuído pelos investidores e promover cada vez mais práticas sustentáveis – geralmente custosas e que produzem seus efeitos no longo e até longíssimo prazo. (RESPONSIBLE RESEARCH, 2010)

2- Padrões de Reporte de Informações ESG

O segundo desafio a superar é a padronização dos relatórios corporativos. Muitas empresas ainda não publicam suas informações de sustentabilidade de

109

Ponto importante são os treinamentos, e engajamento das partes interessadas. A BM&FBOVESPA, por exemplo, promove workshops para companhias listadas e treinamentos em parceria com o GRI para orientar o reporte de informações. A Deutsche Borse adotou outra estratégia, que ao invés de promover treinamentos, disponibiliza eletronicamente uma base de dados de ESG com mais de 1800 companhias listadas. O que mostra que as bolsas podem servir de plataformas que concentram essas informações e encorajam a publicação de tais fornecendo aos investidores acesso fácil a informações relevantes. (RESPONSIBLE RESEARCH, 2012, p.32)

110

Dados estimados pela City UK. Disponível em: http://www.thecityuk.com/research/our-work/reports-list/fund- management-2012/ Acesso Setembro 2013

111

Aproximadamente 70% das negociações nas bolsas de valores dos EUA e da Europa são feitas por investidores de alta frequência que se preocupam com mínimas variações de preços das ações para, em grandes quantidades de negócios, obter lucro no mercado a vista. No Brasil, o volume destes investidores ainda é incipiente se comparado com os mercados mais desenvolvidos, representando aproximadamente 10% dos volumes negociados.

forma clara. Muitas o fazem meses depois que seus balancetes financeiros são

publicados diminuindo a relevância das questões de ESG para a análise do mercado acerca da companhia.

Para amenizar essa questão, o reporte integrado de informações tem sido a solução advogada pela maioria das instituições preocupadas com a sustentabilidade no mercado de capitais. (RESPONSIBLE RESEARCH, 2010, p.30) Algumas iniciativas nesse âmbito foram mencionadas anteriormente ao tratamos das iniciativas de padronização e de estímulo ao reporte de informações não financeiras neste capítulo.

3- Governança e Fóruns internacionais

A questão da participação em fóruns e comitês internacionais de governança constitui, não um obstáculo, mas a solução para o aumento de

coordenação das bolsas em âmbito global. A UNCTAD, o Pacto Global das Nações Unidas e o PRI são exemplos de como isso tem sido feito internacionalmente. Essas instituições e associações internacionais são cruciais no diálogo com as bolsas de valores e podem auxiliá-las a implementar as melhores práticas e regras de sustentabilidade em seus mercados visando suprir a demanda de investidores e outras partes interessadas.

A SSE recomenda, ainda, que cada bolsa tenha um Comitê de Sustentabilidade voltado para integrar as diversas iniciativas das bolsas em todo o mundo e que o comitê reporte ao Conselho de Administração de cada uma delas as questões relacionadas, desde as regras de listagem até o ambiente regulatório e o engajamento dos investidores para com a sustentabilidade. (RESPONSIBLE RESEARCH, 2010)

4- Bolsas de Valores Sociais

Como último ponto, a criação de Bolsas de Valores Sociais pode ser uma solução para os fatores externos às bolsas de valores tradicionais. Podem ser potenciais parceiras das bolsas de valores tradicionais e sensibilizar o mercado com as preocupações humanas que balizam suas atividades. Exemplos são a UK- Social Stock Exchange, a BVSA no Brasil (apresentada no próximo capítulo deste trabalho) e a

Essas bolsas geralmente funcionam de forma filantrópica, sem fins lucrativos, financiando projetos sociais, ambientais e de geração de benefícios para a sociedade como um todo. São importantes veículos de atração de capital para essas iniciativas e devem ser exploradas pelas bolsas tradicionais como modelo de parceria e criação de novos valores no mercado financeiro e de capitais.

Delineados os principais fatores externos às bolsas, cabe ainda destacar que os participantes do mercado são parte sensível da demanda por sustentabilidade e evidentemente influenciam na decisão das bolsas em implementar estratégias de desenvolvimento sustentável. A pesquisa da SSE de 2012 identificou que ONGs e sociedade civil são as que mais estimulam esse tipo de iniciativa, enquanto os bancos de investimento e corretoras de valores ainda se mostram indiferentes. (RESPONSIBLE RESEARCH, 2012, p.34)

A falta de demanda por parte dos investidores, ou a falta de clareza de como eles são impactados por questões de ESG quando da escolha de seus investimentos e a falta de suporte regulatório na implementação de rigorosas regras de investimento sustentável e o “enforcement” constante para questões de publicação de informações não financeiras, são parte deste desafio. Nesse sentido, após a desmutualização das bolsas, sua função auto reguladora foi, em muitos mercados nacionais, transferida ao órgão governamental pertinente, o que constitui mais um desafio para que as bolsas consigam sozinhas im ementar a ões de “enforcement” em seus mercados.

Exemplo desse fato é que somente 10% das bolsas consideram que a implementação de mecanismos que promovam a sustentabilidade, a divulgação de informações ESG, as alterações de regras de listagem, e outras medidas estão sob sua exclusiva competência. Enquanto mais de 50% das bolsas consideram essa uma responsabilidade conjunta entre a bolsa e o órgão regulador. (RESPONSIBLE RESEARCH, 2012)

Sendo assim, consideramos que algumas mudanças regulatórias são necessárias para criar um mercado de capitais sustentável. Este, do modo como se encontra hoje, é moldado por forças de mercado e por medidas regulatórias. Do mesmo modo, o desenvolvimento de um mercado de capitais sustentável requer o suporte dos formuladores de política dado que os fatores que precisam ser integrados para o seu

desenvolvimento são, em geral, complexos, e reúnem conhecimentos do mercado que nem sempre já estão decodificados ou padronizados globalmente. É nítida a necessidade de intervenção estatal e política neste sentido.

Para ilustrar esse argumento, utilizamos a ideia de Porter e Linde (1995a, p.100) que destacam que a regulação pode atuar como estímulo à inovação, sinalizando ineficiências do mercado e criando oportunidades de melhorias tecnológicas e operacionais das companhias. A regulação ainda diminui a incerteza dos investimentos ambientais e garante a igualdade entre as firmas impedindo que uma companhia possa ganhar competitividade de forma oportunista evitando investimentos em sustentabilidade. Sendo assim, os mercados que se anteciparem, internacionalmente, obterão vantagens e fornecerão às empresas nacionais a possibilidade de serem “early movers” nas inovações e investimentos em produtos e serviços “verdes” abrindo novos segmentos de mercado para o investimento sustentável.

Ainda neste sentido, Karl Polany (1944) ajuda a explicar como os aspectos relacionados à preocupação ambiental foram inseridos no mercado financeiro por meio da autorregulação. O argumento é de que ela tenha sido a resposta encontrada pelo mercado às pressões sociais constituindo-se um instrumento de defesa contra a destruição dos mecanismos e estruturas do próprio mercado financeiro. A ideia principal é de que haveria um “du o movimento” no ua de um ado a sociedade se movimentaria exercendo pressões relacionadas à proteção de certos valores, tais como proteção ambiental, direitos humanos e responsabilidade social e de outro, o mercado se movimentaria para proteger os elementos fundamentais da economia de mercado através da autorregulação. (TOSINI, 2013, p.23)

Assim, o mercado financeiro e de capitais apesar de antecipar certos aspectos do investimento sustentável através da autorregulação de mercado, precisa de elementos direcionadores através de uma política econômica- ambiental numa espécie de estratégia nacional e até internacional para a trajetória do desenvolvimento sustentável. O capital financeiro busca a simples valorização de si mesmo e dificilmente irá incorporar sozinho a preocupação ambiental. Portanto, é crucial o papel das instituições, sejam elas públicas ou privadas, tais como as bolsas de valores e

organismos de regulação para implementar regras e padrões que estimulem os investimentos sustentáveis.