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CAPÍTULO 2 ROCHAS SULFETADAS X IMPLANTAÇÃO DE OBRAS CIVIS

2.3 FATORES INTERVENIENTES NA GERAÇÃO DE ARD

Diversos fatores podem interferir na taxa de geração ácida, entre eles a composição química do maciço rochoso e a superfície específica/forma/tamanho das partículas de sulfetos, bem como a interação do oxigênio na superfície dos cristais, o regime hidrológico, a temperatura e o pH do meio, a permeabilidade do substrato e a ação de microorganismos específicos (Robertson, 1994).

A composição química do maciço rochoso interfere nas taxas de geração ácida, em função do tipo, teor e reatividade dos sulfetos presentes, bem como da disponibilidade de minerais efetivamente neutralizadores (Dobos, 2000). Aguado et al. (1996) acreditam que quanto maior conteúdo de ferro presente na composição dos sulfetos, maior é a sua susceptibilidade às reações de oxidação.

Segundo Flann & Lurkasgewski (1970), os sulfetos apresentam diferentes graus de reatividade (Tabela 2.3), onde a presença combinada com a pirrotita interfere de forma significativa na capacidade de oxidação dos sulfetos, em função de processos eletroquímicos, conforme evidenciado nas experiências de cinética de intemperismo realizadas por Kwong (1993).

A estrutura da pirrotita é baseada em um pacote hexagonal fechado, porém desorganizado, onde a composição química é variável e a deficiência de ferro na sua estrutura pode resultar em uma simetria que varia de monoclínica a hexagonal, sendo a forma hexagonal a mais reativa (Blowes et al., 2003).

Tabela 2.3 - Série de reatividade dos sulfetos.

Mineral Grau de reatividade

Pirrotita - Fe1-x S 1º

Pirrotita - Fe1-x S e Pirita - FeS2 2º Pirrotita - Fe1-x S e Arsenopirita - FeAsS 3º

Arsenopirita - FeAsS 4º Pirita - FeS2 5º Calcopirita - CuFeS2 6º Esfalerita - ZnS 7º Galena - PbS 8º Calcocita - Cu2S 9º

Nicholson & Scharer (1994) relatam que a produção de acidez a partir da oxidação da pirrotita, sob condições de pH > 3,5 (reação 13), depende da sua composição química e estrutura cristalina.

Fe(1-x)S(s)+ (2-0,5x)O2 + xH2O (1-x)Fe+2+ SO4-2 + 2xH+ (13) Dessa forma, apesar da sua maior reatividade, a pirrotita gera menor acidez a partir da sua oxidação, quando comparada à pirita (Reação 11).

Entretanto, sob condições de pH < 3,5, quando a pirrotita passa a ser oxidada pelo Fe+3, são observados incrementos significativos nos índices de acidez gerados, conforme apontado pela reação 14.

Fe(1-x)S(s)+ (8-2x) Fe+3+ 4H2O (9-3x)Fe+2+ SO4-2 + 8H+ (14) Além disso, Nicholson & Scharer (1994) e Blowes et al. (2003) relatam que as taxas de oxidação da pirrotita, sob condições atmosféricas, são superiores às da pirita em 20 a 100 vezes, o que pode estar correlacionado à instabilidade na sua estrutura cristalina. Coutinho (1997) aponta a existência de piritas reativas e inócuas, cuja distinção pode ser feita através da imersão de amostras desse mineral em solução saturada de Ca(OH)2. Se

a pirita for reativa, em 5 minutos forma-se um precipitado gelatinoso de coloração verde-azulado (FeSO4), que posteriormente é oxidado para Fe (OH)3, de cor castanha,

quando exposto ao ar e à luz, num processo que dura cerca de 30 minutos. Caso não haja a formação desse precipitado, a pirita é considerada não-reativa.

A partir de várias análises químicas realizadas em piritas reativas e não-reativas, Midgley (1958) constatou que a inércia da pirita deve estar possivelmente relacionada à presença de cátions de elementos metálicos (Zn, Cu, Pb Sn, As e Sb), que promovem a estabilização da sua estrutura.

A presença de neutralizadores no substrato pode favorecer a redução das taxas de geração ácida. Contudo, a produção de alcalinidade, oriunda da dissolução dos carbonatos, é limitada pela sua solubilidade (inferior à dos sulfatos de ferro hidratados formados pela oxidação da pirita), assim como pela quantidade de água retida no substrato e pelas condições de pH e pressão de CO2 do meio (Carucio & Geidel, 1996).

Da mesma forma, assim como a precipitação de óxidos e hidróxidos férricos insolúveis na superfície dos cristais de pirita promovem uma colmatação superficial dos sulfetos, funcionando como uma barreira para a difusão do O2 e favorecendo a redução gradativa

da velocidade das reações, a presença dessa película sobre cristais de carbonato pode limitar a solubilização do mesmo (Gomes et al., 1996).

A superfície específica dos grãos (área exposta por unidade de massa) também é um parâmetro que interfere na taxa de oxidação dos sulfetos. Estudos experimentais desenvolvidos por Nicholson (1994) demonstram que o índice de oxidação da pirita é proporcional à área de reação disponível, ou seja, quanto maior a superfície específica do sulfeto (partículas menores) mais rápido poderá ser o seu processo de alteração. Observações relatadas por Dold (2000, apud Abrahão 2002) sugerem que as taxas de oxidação da marcassita são superiores às da pirita, possivelmente devido à sua morfologia geminada e ao pequeno tamanhos dos grãos.

Segundo Lowson (1982), a forma cristalina e o tamanho dos grãos de sulfetos também interferem na velocidade das reações de oxidação. Experimentos realizados por Czerewko et al. (2003) revelam que dentre várias amostras de pirita analisadas, a morfologia do sulfeto exerce um forte controle nas taxas de oxidação, que se mostram superiores em função da presença de cristais de pirita framboidal (Figura 2.3), devido à sua maior porosidade e superfície específica quando comparada, por exemplo, com cristais cúbicos.

Figura 2.3 - Micrografia de partícula de pirita framboidal, sob a forma de massas esféricas, disposta em aglomerado (Czerewko et al., 2003).

Coutinho (1997) aponta as partículas de pirita, com dimensão compreendida entre 4,76 e 9,5 mm, como sendo as responsáveis por maiores taxas de oxidação, enquanto os trabalhos experimentais realizados por Carucio & Geidel (1996) revelam que cristais de pirita maiores que 50 µm permanecem estáveis, quando comparados a cristais com dimensões inferiores a 25 µm.

A presença de oxigênio dissolvido em solução promove um aumento nas taxas de oxidação dos sulfetos, quando comparada à ação do oxigênio atmosférico na superfície dos cristais (Rao et al., 1995). Dessa forma, o regime hidrológico exerce grande influência no processo de geração de ARD, uma vez que submete o substrato rochoso a períodos de circulação e retenção de água e oxigênio dissolvido (Abrahão, 2002).

De acordo com os experimentos relatados por Carucio & Geidel (1996), as reações de oxidação de sulfetos e produção de acidez são favorecidas por regimes hidrológicos, marcados por grandes intervalos entre os períodos de precipitação pluviométrica de grande magnitude, ao passo que a maior produção de alcalinidade está condicionada à ocorrência de chuvas freqüentes e de baixa intensidade.

Diversos estudos apontam que quanto maior a temperatura do meio, maior é a atividade microbiológica e difusão do O2 atmosférico nos sistemas aquosos (Steger, 1982),

contribuindo com aumentos significativos na velocidade de oxidação dos sulfetos. A figura 2.4 apresenta um gráfico da evolução dos índices de pH ao longo do tempo, onde valores acima de 4,5 favorecem teores significativos de sulfatos e baixas concentrações de Fetotal em solução, com pouca geração de acidez. Por outro lado, sob

condições de pH entre 3,5 e 4,5 as soluções apresentam altos teores de sulfato, geração de acidez, acréscimo na concentração de Fetotal e baixa relação de Fe+3/Fe+2. Quando o

pH atinge valores inferiores a 3,5, ocorre um elevado teor de sulfato, geração de acidez, elevado teor de Fetotal e uma alta relação de Fe+3/Fe+2 (Kleinmann et al., 1981).

Figura 2.4 - Gráfico pH x Tempo (Adaptado de Stumm & Morgan, 1981).

Reações nos estágios I e II:

FeS2 + 7/2O2+ H2O Fe2++ 2SO42-+ 2H+

Fe2+

+ 1/4O2 + 5/2H2O Fe(OH)3 ↓+ 2H+

Fe2+

+ H+ + 1/4O2 Fe3++ 1/2H2O

Reações no estágio III: Fe2+

+ H++ 1/4O2 Fe3++ 1/2H2O

FeS2 + 14Fe3++ 8H2O 15Fe2++ 2SO42-+ 16 H+

Tempo pH

Carucio & Geidel (1996) relatam que quanto maior a permeabilidade/porosidade do substrato, menor é a retenção de água, o que favorece as reações de oxidação dos sulfetos e produção de acidez, ao passo que condições opostas de percolação auxiliam as reações produtoras de alcalinidade. Nesse sentido, as atividades de escavação e desmonte de rochas também interferem nas taxas de geração ácida, uma vez que alteram as condições de permeabilidade do maciço rochoso, facilitando o contato do O2

atmosférico/umidade com a superfície do material reativo, o que ocasiona um aumento na velocidade de oxidação dos sulfetos (Ritchie, 1994).

Quanto à atividade microbiológica no processo de geração ácida, Sasaki et al. (1998) relatam que a ação bacteriana acelera em 5 a 6 ordens de grandeza a taxa de oxidação dos sulfetos, quando comparada com a reação puramente química.

Singer & Stumm (1970) determinaram que a taxa de oxidação do Fe2+ apresenta um aumento de aproximadamente 5 ordens de magnitude, passando de 3x10-12 mol.L-1.s-1 para 3x10-7 mol.L-1.s-1, quando na presença de bactérias da espécie Thiobacillus

ferrooxidans.

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